Acórdão nº 1477/07.9TVLSB.L3-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelTOMÉ RAMIÃO
Data da Resolução22 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I- Relatório: Nuno, divorciado, empresário, residente na Rua (…), em Almada, intentou a presente ação declarativa, na forma ordinária, contra Abel, solteiro, treinador de futebol, residente na Rua (…), em Lisboa, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de €15.000 acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa anual de 4% desde 16/12/2005 até integral pagamento, bem como a pagar-lhe a quantia de €10.000,00 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos contados à taxa anual de 4% desde a citação até integral pagamento e, subsidiariamente, a pagar-lhe essas quantias com fundamento em impossibilidade culposa da prestação e, caso assim não se entenda e subsidiariamente, que seja anulada a sua declaração negocial, condenando-se o R, em consequência, na restituição dos €15.000 acrescidos de juros à taxa anual de 4% contados desde 16.12.2005 até integral pagamento. Pediu, ainda, que se declare, em qualquer caso, a inexistência de qualquer dívida por parte do Autor ao Réu, emergente do negócio versado nos autos e, consequentemente, a inexistência da obrigação de pagar ao Réu o valor inserto nos cheques que titulam as prestações convencionadas e que o Réu seja condenado, em qualquer caso, a restituir ao Autor os cheques em causa.

Alegou resumidamente: - Ter acordado com o Réu e com o seu irmão, a constituição de uma sociedade comercial que se dedicaria à exploração do restaurante que era explorado por sociedade do Réu, subscreveram o denominado contrato promessa de constituição de sociedade comercial por quotas, tendo nesse momento, o Autor entregue ao Réu um cheque no valor de €10.000 para pagamento da primeira prestação acordada, assim como os demais cheques destinados ao pagamento das subsequentes prestações. Pressuposto essencial para que se concluísse a contratação, as partes acordaram em que o Réu dissolveria a sociedade que, até então vinha explorando o restaurante, tendo este assegurado ao Autor que tal sociedade não tinha dívidas, com exceção de duas rendas do imóvel onde estava situado o restaurante, declarando o Réu que as iria pagar com o valor da primeira prestação que estava a receber.

- Quando se aproximava a reinauguração do restaurante, a luz foi cortada por via de uma dívida de €3.990. Abordado o R, referiu ter acordado com a EDP o pagamento a prestações, assegurando a inexistência de outras dívidas.

- Foi outorgada a escritura de constituição de sociedade comercial por quotas.

- Veio a eletricidade, posteriormente, a ser cortada por falta de cumprimento do plano de pagamentos. O senhorio informou que as rendas relativas não eram pagas desde setembro de 2003.

- Perante o que o Autor se convenceu da impossibilidade de confiar no seu sócio, tendo desistido de continuar a fazer parte da sociedade, do que informou o Réu, mais tendo avançado que não pagaria as 3.ª, 4.ª e 5.ª prestações – o cheque relativo à 2.ª prestação, no valor de €5.000, tinha já sido pago.

- Por carta, o Autor interpelou o R para pagar a quantia de €15.000, acrescida de €5.000 a título de dívidas da sociedade a fornecedores.

- Reclama tal quantia já que foi a verificação da existência de dívidas por parte da sociedade do R que determinou o insucesso do restaurante; o R atuou violando os deveres de boa fé na negociação que estabeleceu com o A, incorrendo na obrigação de o indemnizar por via da devolução das referidas quantias.

- Por outro lado, o Autor, que se tinha empenhado no desenvolvimento de tal projeto, sofreu desgosto, tristeza e frustração por não ter podido prosseguir com tal atividade, vendo lesada a sua imagem, daí resultando ainda desentendimentos com o seu irmão, com quem sempre manteve relação muito próxima. Por via do que pretende ser compensado com o pagamento de €10.000.

- Considera que lhe assiste o direito a recusar o cumprimento das prestações subsequentes, devendo ser-lhe restituídos os respetivos cheques.

- Caso assim não se entenda, sempre assiste ao Autor o direito a recusar a prestação, dado que o R não cumpriu as obrigações de ceder ao A. a exploração do restaurante sem que ele próprio ou a sua sociedade tivessem dívidas e de dissolver a sociedade unipessoal que detinha. Obrigações essas que entretanto se tornaram de cumprimento impossível, o que desobriga o A do cumprimento das suas prestações, com direito à restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.

- Sendo culposa a impossibilidade de cumprimento pelo R, incorre na obrigação de indemnizar o Autor pelos danos de natureza não patrimonial por ele sofridos.

- Caso assim não seja entendido, apela ao facto do Réu o ter induzido em erro, de forma intencional e consciente, para que este constituísse a sociedade.

- Deve a declaração negocial do Autor ser anulada, devendo ser restituído tudo o que foi prestado.

Citado, veio o Réu contestar, pugnando pela improcedência da ação, para além de invocar a caducidade do direito de ação por parte do A, bem como ao abuso do direito, já que foi o Autor que abandonou a sociedade.

O Autor replicou.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador no qual se julgou improcedente a exceção da caducidade do direito à anulação do negócio pelo Autor, e procedeu-se à seleção da matéria de facto.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a ação, condenou o Réu a pagar ao Autor a quantia de €7.500 (sete mil e quinhentos euros) acrescida de juros de mora vencidos desde 09.04.2007 até integral pagamento, à taxa anual de 4%, por danos morais decorrentes do incumprimento definitivo e culposo do contrato, absolvendo o R do mais peticionado.

Dessa decisão recorreu o Autor, vindo a ser, na sequência desse recurso, proferido Acórdão por esta Relação, que anulou a decisão recorrida na parte relativa ao pedido subsidiário de anulação do contrato de constituição da sociedade, determinando a baixa do processo para que seja formulado ao recorrente o convite a que alude o art.º 265.º n.º 2 do C. P. C., por preterição do litisconsórcio necessário, e subsequente decisão, e confirmando no mais a decisão recorrida, mais concretamente a condenação do Réu no pagamento quantia de €7.500 (sete mil e quinhentos euros) acrescida de juros de mora vencidos desde 09.04.2007 até integral pagamento, à taxa anual de 4%, por danos morais decorrentes do incumprimento definitivo e culposo do contrato (fls. 365).

Convidado o Autor a fazer intervir na lide o terceiro outorgante no contrato de sociedade, não o fez em tempo, invocando o justo impedimento, o que foi indeferido, motivando recurso de agravo que lhe deu razão (fls. 570).

Admitido o incidente, teve lugar a citação do chamado Dino, o qual fez seus os articulados do Autor.

E foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a presente ação no que respeita ao pedido de anulação do contrato de sociedade, absolvendo o R de tal pedido.

Desta sentença veio o Autor interpor o presente recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito devolutivo (fls. 622).

E fundamentou o respetivo recurso, formulando as seguintes, Conclusões:

  1. Os factos provados contrariam frontalmente os fundamentos da sentença recorrida, como resulta de uma leitura atenta dos mesmos, em especial, daqueles que se transcreveram no corpo destas alegações, de entre os quais se destaca o constante da alínea AS, por ser particularmente ilustrativo: O Réu [Apelado] ficou ciente de que a inexistência de dívidas anteriores e a dissolução da sociedade unipessoal que se dedicava à exploração do restaurante, era pressuposto essencial para a contratação por parte do Autor [Apelante].

  2. Tais factos revelam inequivocamente que o Apelado, de forma intencional, premeditada e consciente, isto é, com dolo, induziu o Apelante em erro, levando-o a contratar, pois: i.

    O Apelado chamou a si a formalização do contrato promessa – vd. alíneas N. e AI dos factos provados; ii.

    Começou por afirmar, em momento prévio à celebração do contrato promessa, que nem naquela data, nem posteriormente quando chegasse a altura da outorga do contrato definitivo de constituição da sociedade, a sua sociedade unipessoal R T tinha ou teria dívidas, exceção feita a duas rendas que seriam liquidadas com os € 10.000,00 que naquela altura (julho de 2004), lhe estavam a ser entregues – vd. alíneas AJ e AL; iii.

    Assegurou que a referida sociedade unipessoal seria dissolvida em momento prévio á contratação – vd. alíneas AM e AN; iv.

    Aproveitando-se da amizade e da confiança que o Apelante (e Chamado) nele depositavam, convenceu-os a que o que consta das alíneas supra não ficasse a constar do contrato – vd. alíneas AO, AP e AQ; C) Sendo certo que foi a convicção com que o Apelante ficou de que (i) a sociedade unipessoal do Apelado não tinha dívidas, (ii) as que tinha seriam pagas e (iii) tal sociedade seria dissolvida, que o levou (a ele e ao Chamado) a outorgar a escritura pública de contrato promessa, como resulta com notável clareza do facto provado na alínea AS acima reproduzido.

  3. O Apelado não cumpriu nada do que prometeu ao Apelante e Chamado – vd, alíneas R, AT, U, V, AA, AU, AV, AX, AZ e BN.

  4. O Apelado mentiu sucessiva e reiteradamente ao Apelante (e Chamado), levando-o a celebrar um negócio que bem sabia – como a alínea AS dos factos claramente o demonstra – que o Apelante (e Chamado) só celebraria em caso de inexistência de dívidas e dissolução da sociedade unipessoal que já detinha.

  5. Face ao exposto, é imperativo concluir pelo preenchimento do requisito da dupla causalidade do dolo previsto no art.º 253º, n.º 1, do Cód. Civil, pelo que deveria ter sido determinada a anulação do contrato de sociedade e o Apelado condenado na restituição ao Apelante dos € 15.000,00 que lhe foram pagos por este, acrescidos dos respetivos juros vencidos e vincendos.

  6. Ao decidir diversamente, o Tribunal a quo violou o disposto no art. 253º, n.º 1, do Cód. Civil.

    E...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT