Acórdão nº 5110/03.0TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelORLANDO NASCIMENTO
Data da Resolução16 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.

1. RELATÓRIO.

A…e B..., Lda, propôs contra B...…, S.A., esta ação declarativa de condenação, ordinária, pedindo a sua condenação a entregar-lhe a quantia de € 1.279.349,90, relativa a indemnização por rescisão de contrato e indemnização de clientela, com fundamento em que esta interrompeu o fornecimento de material à A, não cumprindo o contrato de representação exclusiva que mantinham desde meados da década de 80.

Citada, contestou a R negando a existência de contrato de distribuição exclusiva, dizendo que cortou os fornecimentos à A. por esta lhe dever € 400.274,08, condicionando-os a pronto pagamento e pedindo a absolvição do pedido.

Em ação declarativa ordinária, que foi apensa, B...,S. A. pede a condenação de B…,Lda a entregar-lhe a quantia de € 434.993,10 relativa ao pagamento de produtos que lhe entregou e esta contestou dizendo que o saldo a favor de B...,S.A é apenas de € 358.310,47, cujo pagamento nunca negou, sendo certo que lhe é devida indemnização em quantia muito superior, já pedida em ação, como acima consta.

Realizada audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, julgando: - a ação principal improcedente e a R absolvida: - a ação apensa parcialmente procedente e a R condenada no apagamento da quantia de € 358.310,47, acrescida de juros de mora comerciais desde 25/9/2003 e absolvida do restante pedido Inconformada com essa decisão …, Lda dela interpôs recurso, na qualidade de A e de R, recebido como apelação, pedindo a sua revogação, a condenação de B …, S.A na ação principal e a absolvição, dela …, na ação apensa, formulando as seguintes conclusões:

  1. Da matéria dada como provada, resulta evidente que havia um acordo de distribuição exclusiva por parte da R.. a favor da A.., para que esta procedesse à comercialização dos produtos da R...

  2. Também resultou como provado que, por via dessas relações contratuais, se verificou uma inequívoca implantação no mercado português das marcas da R.. que, partindo do zero passaram a faturar mais de 950.000,00 € anuais.

  3. Ficou igualmente apurado que a atividade comercial da A. se ancorava na comercialização dos produtos da R.. e no contrato de distribuição que com ela mantinha.

  4. Também resultou inequívoco que a R. tinha uma participação equivalente a 50% no capital da A., o que tornava ainda mais evidentes as relações existentes entre ambas as sociedades.

  5. E também ficou apurado que havendo na altura uma dívida da A. para com a R., existia um plano de amortização dessa mesma dívida.

  6. É, assim, inequívoco o direito da A. de ser indemnizada pela R.. por via do incumprimento desta do contrato existente, ao ter-lhe posto ilegitimamente termo, indemnização essa que terá de ter em atenção, por um lado o enorme benefício que a R.. adquiriu com a atuação da A.., e por outro lado o enorme prejuízo que a A.. sofreu com a atuação da R..

  7. Houve celebração de contrato, incumprimento contratual da R.., danos emergentes do incumprimento contratual, e nexo de causalidade entre o comportamento inadimplente da R.. e os danos causados.

  8. O Meritíssimo Julgador recorrido, embora entendesse haver uma mera mora no pagamento de dívidas por parte da A.. à R.., considerou que isso justificava o seu comportamento de cessar as relações comerciais com a A., "consubstanciada na existência de urna divida pendente entre ambas vencida e não paga." i) Esquecendo, manifestamente que foi apurado que existia um plano de amortização da dívida em causa.

  9. Além do que a mora não significa incumprimento, nem por si só seria suficiente para justificar a atuação à R.. que claramente extravasou os ditames da boa-fé.

  10. Sendo o contrato existente entre A. e R.. um contrato inominado, não é disciplinado ou regulado expressamente pelo Código Comercial Português, não dispondo de um regime jurídico próprio.

  11. No entanto, têm-lhe sido aplicáveis as normas do contrato de agência, aprovado pelo Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho, que transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva N.º286/653/CEE do Conselho Europeu de 18.12.1986, não só porque existem fortes similitudes de objeto, mas também porque esta forma contratual assumiu-se como esquema negocial típico nas relações de comércio.

  12. Resulta dos autos inequívoco que a A., face à matéria apurada, tem direito a ser pela R.. indemnizada pelo facto desta ter posto termo às relações contratuais entre ambas.

  13. Isto fica ainda reforçado por ter ficado apurado que antes do contrato a R.. não tinha em Portugal qualquer relevância, que a atuação da A. fez com que as marcas da R.. passassem a ter enorme expressão em Portugal onde chegou a haver (e isto ainda nos anos 90 do século passado) vendas superiores a € 950.000 por ano, tendo a R.. vindo a beneficiar de uma enorme carteira de clientes angariada na sua totalidade pela A.

  14. O Acórdão do STJ de 04.11.2010, Processo 2916/05.9TBVCD.P1.S1 diz, na sequência de jurisprudência que se pode considerar unânime, que o regime de indemnização da clientela legalmente previsto para o contrato de agência é aplicável aos contratos de concessão comercial desde que o conteúdo concreto do contrato de concessão permita concluir que as obrigações assumidas e executadas pelo concessionário são análogas às de um agente.

  15. E o Acórdão do STJ de 04.05.2010, Processo 1538/09.0YRLSB-7, refere se por falta de regulamentação jurídica própria do contrato de concessão, se impõe o recurso às cláusulas negociais que plasmam a vontade das partes no pleno exercício da sua autonomia, nem sempre as mesmas cobrem todas as incidências contratuais, e daí que se venha recorrendo ao regime do contrato nominado com o qual tenha mais afinidades, o contrato de agência, por constituir, igualmente, um contrato de distribuição com larga margem de coincidência como se mencionou, aplicando, analogicamente, as respetivas disposições, sobretudo na parte relativa à cessação do contrato.

  16. E acrescenta: 9. Em tal âmbito encontra-se a indemnização de clientela não se configurando que as normas que a preveem sejam excecionais, e por isso insuscetíveis de aplicação analógica, constituindo sim simples normas reguladoras de um contrato especial, e desse modo suscetíveis dessa aplicação.

  17. A aliás douta sentença recorrida, reconhecendo a existência do direito da A. a ser indemnizada nos termos legais, afasta contudo esse direito alegando que a quebra do contrato seria imputável à A., por ser devedora à R.. de determinadas quantias.

  18. Esquecendo que, como foi provado, havia entre as partes um plano de pagamento para amortização da dívida – resposta ao quesito 22.º.

  19. Pelo que não tendo sido apurado incumprimento contratual por parte da A., nunca poderia a ação principal improceder.

  20. Neste tipo de contratos "...não é qualquer situação de não cumprimento, tout court, de uma ou mais obrigações, que legitima a outra parte, ipso facto, a resolver o contrato (...). A lei exige que a falta de cumprimento assuma especial importância, quer pela sua gravidade (...) quer pelo seu caráter reiterado, sendo essencial que, por via disso, não seja de exigir à outra parte s subsistência do vínculo contratual" – A. Pinto Monteiro, ob. Cit.

  21. Por outro lado, a matéria quesitada respeitante à ação apensa, foi toda ela julgada não provada.

  22. Tendo apenas sido apurado, e isso com referência à ação principal, que a A. A... tinha uma dívida para com a R.. de € 358.310,47, e que existia um plano de amortização da dívida – resposta aos quesitos 22 e 25.

  23. Não está apurado, nem foi alegado, que os valores em causa estivessem vencidos e fossem exigíveis, tanto mais que existia um plano para a respetiva amortização.

  24. Além do que, os únicos factos apurados no âmbito da ação apensa, são os que decorrem dos factos assentes e respeitam a pagamentos feitos pela … à B...… e à emissão por esta a favor da … de notas de crédito.

  25. Pelo que ação apensa deveria ter sido julgada improcedente por não provada. aa) Os valores e termos da indemnização devida pela R.. à A., são, por outro lado, calculados nos termos gerais de direito – art.º 32.º, 1, do Decreto-lei 178/86 bb) Avulta na indemnização a fixar a chamada indemnização de clientela, conforme determina o art.º 33.º do mesmo diploma legal.

    cc) Verificam-se no caso concreto os elementos que levam a que esse direito possa ser exercido pela A.: angariação de novos clientes; benefício da outra parte após a cessação do contrato; deixa a … de receber qualquer retribuição dos clientes que angariou.

    dd) E também não se verifica a condição para o não direito à indemnização, prevista no mesmo artigo, ou seja, cessação do contrato por motivo imputável à ….

    ee) Neste caso a indemnização de clientela é fixada em termos equitativos, com o limite de uma indemnização anual – art.º 34.º cit. Diploma.

    ff) Ora da matéria apurada, verifica-se que a atuação da A. … foi de tal ordem importante que dela resultou uma inequívoca implantação no mercado das marcas da R.. que partindo do zero chegaram a faturar anualmente mais de € 950.000 – resposta ao quesito 12.º.

    gg) Da documentação junta aos autos e também do que constitui facto notório neste tipo de atividade, a margem bruta das vendas para a concessionária ronda os 30%.

    hh) Em termos equitativos, será adequado que a R.. seja condenada a este título, a pagar à A. 30% do indicado valor...

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