Acórdão nº 5509/09.8TVLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Data da Resolução25 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa José instaurou acção declarativa, com processo ordinário, contra E, Indústria Gráfica S.A. pedindo que a ré seja condenada: A pagar-lhe a quantia de Esc. 10.318.949$00 acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal de 7% ao ano, até efectivo pagamento, sobre a importância de Esc. 9.185.000$00.

A abster-se de publicar a obra intitulada "Dicionário Auxiliar do Português" ou "Dicionário Auxiliar de Português" ou a mesma sob outro título e de nela fazer figurar o seu nome como autor, colaborador e revisor científico e pedagógico, enquanto não efectuar o pagamento de todas as importâncias em dívida e não estiverem completamente definidos os termos em que lhe cede os seus direitos exclusivos e de edição.

Alegou, em síntese que em 21 de Março de 1994 celebrou com a ré um contrato pelo qual, na qualidade de revisor científico da obra "Dicionário Básico de Português" vendeu àquela o trabalho de revisão da mesma obra, contra o pagamento da importância de Esc. 1.430.000$00 a pagar em 9 prestações, colaboração que desenvolveu integralmente, sendo que a ré não lhe pagou, da mesma importância, a quantia de Esc. 635.000$00; Tendo tido a informação que teria que rever mais páginas em virtude de a obra ir ficando cada vez mais ambiciosa, propôs receber mais Esc. 5.400.000$00, correspondentes a 540 horas de trabalho a Esc. 10.000$00 à hora, o que a ré aceitou e cumpriu; Em Julho de 1999 concluiu a revisão da obra, na qual acabou por despender 1610 horas, em virtude do acréscimo de número, extensão e refundição das entradas, pelo que solicitou à ré que pagasse mais Esc. 1.400.000$00, o que a mesma aceitou, não se tendo, contudo, concretizado o pagamento, uma vez que a demandada pretendeu pagar-lhe em livros, solução que não lhe convinha: Elaborou para a mesma obra um anexo e prefácio, tendo acordado com a ré o pagamento da quantia de Esc. 800.000$00; Na análise do texto pronto para publicação verificou a existência de erros, pelo que fez uma revisão total final, na qual despendeu mais 635 horas de trabalho, pelas quais deve ser remunerado à razão de Esc. 10.000$00 a hora A ré nunca lhe pagou as quantias de Esc. 635.000$00, Esc. 1.400.000$00, Esc. 800.000$00 e Esc. 6.350.000$00 atrás referidas, apesar das diligências que fez junto da mesma para esse efeito; O dicionário acima referido é uma obra em colaboração nos termos da alínea a), do n.º 1, do arte 16.º do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, o que lhe confere o direito de exigir as importâncias acima referidas, de impedir a publicação da obra enquanto aquelas não estiverem pagas e definidos os termos em que cede à autora os seus direitos sobre aquela, bem como de impedir que o seu nome figure no mesmo dicionário.

A ré contestou. Refutou por impugnação parte dos factos invocados e alegou que nunca aceitou o volume de trabalho que o autor refere, tendo os contactos para o efeito estabelecidos pelo demandante sido efectuados na pessoa de um colaborador externo sem qualquer vínculo laboral à empresa e na pessoa de uma outra pessoa sem qualquer vínculo jurídico à demandada.

Ademais o autor limitou-se a intervir na obra como mero revisor científico, nada tendo criado, tendo o seu trabalho se resumido à análise do trabalho de outrem e à apresentação de sugestões de alteração.

Concluiu pela improcedência da acção ou, no caso de assim não se entender, pela definição do valor dos serviços do autor em conformidade com a prova a produzir em audiência de julgamento.

Convocada audiência preliminar, o autor apresentou articulado superveniente, invocando ter tido conhecimento que a demandada publicou a obra em causa sob o título "Dicionário Actual da Língua Portuguesa", nela incluindo uma "nota de editores" igual à "introdução" que ele tinha elaborado, substituindo o anexo por ele feito por dois apêndices e inscrevendo na ficha técnica a menção de que a obra havia sido revista por equipas de professores, quando o autor foi o único revisor científico e pedagógico da mesma.

Argumentou que a ré é responsável pelos danos que causou aos seus direitos morais, que estimou em € 10.000,00, peticionando, em acréscimo aos pedidos já formulados, a condenação da ré no pagamento dessa quantia e em indemnização a liquidar em execução de sentença pelos danos patrimoniais.

Respondeu a ré, defendendo ser inadmissível o articulado superveniente e, no mais, reputando de falsos os factos articulados naquela peça.

(…) Após audiência de discussão e julgamento foi proferida decisão que admitiu expressamente a ampliação do pedido contida no articulado superveniente, por ser uma consequência do pedido primitivo, e, decidindo de mérito, julgou o pedido formulado pelo autor parcialmente procedente e nessa conformidade condenou a ré a pagar àquele: A quantia de Euros 10.150,53 (dez mil cento e cinquenta euros e cinquenta e três cêntimos) de capital; O valor de juros moratórios, vencidos e vincendos, às taxas anuais de 10% até 16 de Abril de 1999, 7% até 30 de Abril de 2003 e 4% desde essa data em diante e outras de juros civis que venham a vigorar, sobre a quantia de Euros 3.167,36 (três mil cento e sessenta e sete euros e trinta e seis cêntimos) desde 3 de Março de 1997 até integral pagamento; O valor de juros moratórios, vencidos e vincendos, às mesmas taxas anuais, sobre a quantia de Euros 6.983,17 (seis mil novecentos e oitenta e três euros e dezassete cêntimos) desde 20 de Setembro de 2000 até integral pagamento.

No mais, foram julgados improcedentes os pedidos formulados pelo autor e dos mesmos a ré absolvida.

Inconformados interpuseram, autor e ré, competentes recursos, cujas minutas concluíram da seguinte forma: Recurso da Ré: 1. O depoimento das Testemunhas, Dra. Maria (…) e Dr. Mário (…), acerca das horas alegadamente dispendidas pelo Autor na revisão científica do dicionário, impunha que a resposta dada ao artigo 12°, da base instrutória fosse, não provado, em vez de provado.

  1. De igual modo, o depoimento das testemunhas Dra. Maria (…) e Dr. Mário (…), determinavam que a resposta dada ao artigo 16°, da base instrutória, fosse não provado e não, provado.

  2. Por fim, do processo constam documentos que demonstram claramente que, se alguém deve qualquer quantia ao aqui Autor pelo exercício da sua actividade de revisor científico do dicionário em apreço, tal pessoa não é a ora Ré.

  3. Sendo que, não restam dúvidas que, por força do que emana dos documentos referidos (adenda ao contrato junta com a petição inicial, o próprio dicionário e as cartas em que o Autor interpela tal sociedade no sentido desta lhe pagar determinada importância, bem como as certidões do registo comercial da Ré e da (…), quem contratou o Autor não foi a aqui Ré, mas sim, a sociedade comercial "(…)".

  4. Ora, salvo o sempre devido respeito, que é muito, tais documentos têm de ser valorados no sentido sustentado pela Recorrente, sob pena de violação do princípio da aquisição processual, previsto no artigo 515°, do CPC e da descoberta da verdade material.

    (…) Do recurso do Autor (…) 11.a os factos dados como provados na sentença sob os n.º 20, 21 e 22 não permitem ao tribunal absolver a R. do pedido do pagamento da importância de 800.00$00 e respectivos juros, e antes impõem a condenação no quantitativo – quantidade – que vier a ser apurada em execução de sentença; 12.a Os factos dados como provados na sentença sob os n.º 25, 26 e 27 também não autorizam o tribunal a absolver a R. do pedido de pagamento da importância de 6.350.00$00 e respectivos juros e, pelo contrário, obrigam à condenação em quantitativo a apurar em execução de sentença; 13.a Ao absolver a R. dos pedidos referidos nas duas anteriores conclusões, a sentença recorrida violou o disposto no n.° 2 do art.° 661.° do CPC, pelo que se impõe a sua revogação e alteração no sentido apontado; 14.a Independentemente do seu mérito ou demérito, quando a sentença recorrida qualificou a obra do dicionário como obra colectiva, para decidir favoravelmente à Ré, foi além da defesa por esta apresentada e, por isso, violou o preceituado nos art.ºs 661, n.° 1, 3.°, 3.° - A e 264.° do CPC; 15.a A referida qualificação do dicionário em questão como "obra colectiva" está contra a própria posição da Ré, que sempre reconheceu como seus autores A T e A C que a ela prometeram vender os respectivos direitos de autor através dos "escritos" que constituem os factos 34 e 35 da sentença recorrida e os quais aparecem na obra, entretanto, publicada como únicos autores da mesma.

  5. a Os referidos "escritos" são meros contratos de promessa de venda de direitos de autor sobre o dicionário, para cujos contratos prometidos foi escolhida a forma de escritura pública, cuja obrigação é uma prestação de facto – a celebração do contrato prometido -, nada constando dos autos sobre a sua celebração, quer em matéria de alegação, quer em matéria de prova; 17.aAlém disso, tais contratos são nulos porque a sua validade depende do reconhecimento notarial das respectivas assinaturas, o que não se verifica; 18.a A obra colectiva é organizada por iniciativa de entidade singular ou colectiva e divulgada ou publicada só em seu nome; 19.a A obra em colaboração é divulgada ou publicada em nome dos colaboradores ou de algum deles como se verificou com o dicionário em questão; 20.a Um dicionário tanto pode ser uma obra colectiva quando o direito de autor cabe originariamente ao empresário e...

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