Acórdão nº 403/11.5TTCLD.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Dezembro de 2012
Magistrado Responsável | JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO |
Data da Resolução | 05 de Dezembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I – RELATÓRIO AA – SEGURANÇA PRIVADA, SA, com sede na Rua (…), Edifício (…), Loja 10, 0000-000 ..., recorreu para o Tribunal do Trabalho de ... da decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho que lhe aplicou a coima única de Euros 2.500,00 (resultante do cúmulo jurídico entre as coimas parciais de €1.800,00 e € 1800,00) pela prática (negligente) de factos que, no seu entender, integram os ilícitos contraordenacionais previstos e punidos, respetivamente, nas disposições conjugadas dos artigos 202.º, n.º 5, 554.º, n.º 3, alínea d) e 550.º, todos do Código do Trabalho de 2009 (processo administrativo da ACT n.º 321100182) e artigos 231.º, n.ºs 1 e 4, 554.º, n.º 3, al. d) e 550.º, também do Código do Trabalho de 2009 (processo administrativo da ACT n.º 321100180).
Tal decisão conjunta da ACT fundou-se nos Autos de Notícia levantados no dia 02/05/2011 e 9/05/2011 por uma sua Inspetora e que se mostram juntos a fls. 1 a 21 e 94 a 114, respetivamente.
O primeiro Auto (processo administrativo da ACT n.º 321100182) certificava a inexistência de documento disponível para consulta imediata no local, referente ao «Registo dos Tempos de Trabalho», à sua desconformidade, quando posteriormente apresentado pela arguida, com a escala interna de turnos que vigorava para os trabalhadores da mesma que prestavam serviço no Hospital das ...
[1] e à não menção dos intervalos de descanso ou interrupções da jornada de trabalho.
O segundo Auto (processo administrativo da ACT n.º 321100180) certificava a inexistência de documento onde se mostrasse registado o trabalho suplementar efetuado pelos trabalhadores que desempenhavam funções no Hospital das ..., sendo certo que os mesmos, segundo a referida escala interna de turnos, laboravam 12 horas diárias, nunca tendo tal «registo de trabalho suplementar» sido apresentado à ACT, mas, tão-somente, o registo do número de horas prestadas pelos mencionados trabalhadores. Notificada a arguida (fls. 23 a 25, no quadro do processo n.º 321100182 e 115, 116 e 118, no processo n.º 321100180), não veio a mesma apresentar oposição dentro do prazo legal.
Foi ordenada a apensação dos dois processos administrativos acima identificados, o que de facto veio a acontecer.
A arguida apresentou, no quadro do seu recurso da decisão administrativa, as alegações de fls. 53 a 91 (fax e depois original).
Recebido o recurso no Tribunal do Trabalho de ..., veio, a fls. 1, o Ministério Público deduzir acusação nos termos previstos no art.º 37.º do Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais e de Segurança Social aprovado pela Lei n.º 107/2009, de 14/09.
Recebido o recurso pelo juiz através do despacho de fls. 122 e 123 e com data de 06/12/2011, foi designado dia para a realização da Audiência de Discussão e Julgamento, a que se procedeu com observância do legal formalismo, conforme resulta de fls. 139 a 141, tendo, para o efeito, sido inquiridas cinco testemunhas (duas da acusação e três da defesa). Foi então proferida a Sentença Judicial de fls. 142 a 152, com data de 08/05/2012, onde, em síntese, foi decidido o seguinte: “Nos termos expostos, julgo improcedente e não provado o presente recurso interposto pela arguida “AA – SEGURANÇA PRIVADA, SA” e, consequentemente, pelos fundamentos “supra” expendidos, mantenho, na íntegra, a decisão administrativa recorrida.
Nos termos do disposto no art.º 8.º, n.º 4 do Reg. Custas Processuais, e Tabelas III anexa ao mesmo, vai a arguida condenada nas custas, com 4 Ucs de taxa de justiça, levando-se em conta a já paga.
Comunique à ACT.
Deposite.
Notifique.” * A sentença recorrida, no que toca à matéria que para aqui releva, fundou-se juridicamente na seguinte argumentação jurídica: “Ora, atenta a factualidade que resultou provada em julgamento, supra descrita, temos que resultam preenchidos os elementos objetivos dos respetivos tipos contra-ordenacionais em referência: a arguida não dispunha no local, facilmente acessível aos seus trabalhadores, e a quem nisso tivesse interesse, designadamente à ACT, de registo dos tempos de trabalho, com as características e especificidades legais; tal como não dispunha de registo de trabalho suplementar.
Igualmente da discussão da causa resultou provado o elemento subjetivo (na forma de imputação negligente) dos respetivos tipos de ilícito: falta de cuidado e atenção na organização dos tempos de trabalho, e na gestão dos recursos humanos.
Isto é, resultou provado que a arguida não observou, como deveria, os cuidados necessários no exercício da sua atividade empresarial, designadamente quanto à organização dos tempos de trabalho, e gestão dos recursos humanos.
Termos em quer, sem necessidade de mais considerações, se conclui pela improcedência do recurso, e consequente condenação da arguida como responsável pela prática dos ilícitos contraordenacionais em referência.
No que se reporta à moldura da coima aplicável, a determinação da medida concreta de cada uma das coimas “faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação” (cfr. art.º 18.º, n.º 1, do Dec. Lei nº 433/82, de 27/10, aplicável “ex vi” do art.º 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14/09).
Considerando que: - O volume de negócios da arguida, e o número já considerável de trabalhadores que emprega, com a inerente e relevante responsabilidade social; - É mediano o grau de culpa do legal representante da arguida, - Não resultou provado que tenham resultado para a arguida benefícios económicos relevantes da prática desta contraordenação; Tal conjunto de circunstâncias, e o seu valor atenuativo, legitima que este Tribunal mantenha, na medida fixada pela autoridade administrativa, a medida da coima única aplicada à arguida [2.500 €], que julgamos adequado e ajustado.” * A arguida, notificada de tal despacho e não se conformando como ele, veio interpor recurso do mesmo para este Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos de fls. 218 a 274 e ao abrigo do número 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, de 14/02, por, na sua perspetiva, «o mesmo se afigurar manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito até à promoção da uniformidade da Jurisprudência», tendo juntado decisões judiciais de diversos tribunais do trabalho (Leiria, Coimbra, Porto, Guimarães e ...) com julgamento contraditórios de, pelo menos, uma das contraordenações imputadas nestes autos à arguida (possuindo esta igualmente tal estatuto processual naqueles outros recursos). * A arguida, no final do seu recurso, formulou as seguintes conclusões (fls. 269 a 271): (…) * O ilustre magistrado do Ministério Público, notificado de tais alegações, veio responder-lhes nos moldes constantes de fls. 275, tendo sustentado que o recurso interposto pela arguida para este Tribunal da Relação de Lisboa não é admissível, atendendo ao valor da coima em que aquela foi condenada (€ 2.500,00) e ao disposto na alínea a) do número 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, de 12/02.
* A juíza do Tribunal do Trabalho de ... proferiu o despacho de fls. 276 e 277, no qual não admitiu o recurso para este Tribunal da Relação de Lisboa, em razão do valor da coima aplicada e do disposto na alínea a) do número 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, de 12/02, tendo, no entanto, mandado subir os autos a este tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 49.º, número 2 e 50.º, números 2 e 3 do citado diploma legal. * O ilustre magistrado do Ministério Público colocado neste Tribunal da Relação de Lisboa limitou-se a apor o seu visto nos autos.
* O relator deste recurso, face às divergências existentes ao nível dos tribunais da 1.ª instância relativamente à interpretação a dar ao artigo 202.º do Código do Trabalho de 2009, quando da sua aplicação a atividades como a da arguida (segurança privada), aceitou o mesmo, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 49.º, números 2 e 3 e 50.º, números 2 e 3 da Lei n.º 107/2009, de 12/02, ficando excluindo do seu objeto a violação do estatuído no artigo 231.º daquele primeiro diploma legal (ausência de registo do trabalho suplementar). * O ilustre magistrado do Ministério Público, face à admissão do recurso nos moldes acima descritos, proferiu parecer no sentido da tese defendida na sentença recorrida (fls. 283 e 284), tendo a arguida e recorrente, notificada de tal parecer, vindo a fls. 286, reiterar o teor das suas alegações de recurso. * Tendo os autos ido a vistos, cumpre apreciar e decidir.
* II – FUNDAMENTAÇÃO A sentença impugnada considerou a seguinte factualidade provada e não provada: «1 - A arguida “AA – SEGURANÇA PRIVADA, SA” dedica-se à atividade de prestação de serviços de segurança privada (CAE 80.100), tem sede na Rua (…), Edifício (…), loja 0.10, ..., e inúmeros locais de trabalho por todo o território português, conforme solicitação dos seus clientes.
2 - No ano civil de 2009 a arguida registou um volume de negócios do montante de € 6.198.896.
3 - Em Março de 2011 a arguida tinha um total de 548 trabalhadores, e tinha um dos locais de trabalho nas instalações do Hospital de ....
4 - No dia 18 de Março de 2011 o ACT realizou visita inspetiva à Portaria do Hospital de ..., onde se encontrava no exercício das suas funções a trabalhadora da arguida BB, a qual foi admitida ao serviço da arguida em 01/07/2006, com a categoria profissional de Vigilante, e desempenhava, à data da referida visita inspetiva, funções de chefe de grupo.
5 - A arguida não dispunha naquele local de trabalho de qualquer registo dos tempos de trabalho, nem o mesmo se encontrava aí acessível por qualquer meio, fosse aos trabalhadores da arguida, fosse a quem o quisesse consultar, designadamente os inspetores da ACT.
6 - Na referida Portaria do Hospital encontravam-se em poder da BB, relativas aos meses de Março e de Abril de 2011, as escalas de serviço dos trabalhadores da arguida a exercerem funções nas instalações...
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