Acórdão nº 95/1994.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelJOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Data da Resolução19 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I – RELATÓRIO AA e BB, (…), vieram ambos instaurar, em 06/01/1995, a presente ação declarativa de condenação emergente de acidente de trabalho com processo especial contra CC, com escritório na Avenida ..., (…), Lisboa, e DD, AG, com sede em (…), ..., Suíça, pedindo a condenação das Rés a pagar-lhes US40.000 Dólares, acrescidos de juros, à taxa legal, desde a data da morte de EE ou, caso assim se não entenda, desde a data da citação.

* Para tanto, alegaram, em síntese, serem pais de EE, o qual, tendo-se deslocado a Lisboa em gozo de férias, aí faleceu, no dia 12 de Fevereiro de 1993, por ter contraído paludismo quando exercia funções para a 2.ª Ré, na Nigéria, em execução de contrato de trabalho com esta celebrado.

Mais alegaram que a 2.ª Ré celebrou contrato de seguro com a 1.ª Ré, mediante o qual segurou EE pelo risco de morte em consequência de acidente de trabalho em 40.000 US Dólares, a pagar ao parente mais próximo do trabalhador segundo as leis do seu país.

Alegaram, ainda, que EE fora recrutado por FF, que se assumiu como representante da 2.ª Ré.

Por último, alegaram que a região da Nigéria onde EE exercia funções era propícia ao mosquito que transmite o paludismo, não procedendo a 2.ª R. à fumigação do espaço em que os trabalhadores se encontravam, o que aumentou o risco de doença, contraída por EE antes do seu regresso a Portugal e pese embora tivesse tomado uma vacina para evitar a doença e se encontrasse a tomar medicação profilática.

* Foi ordenada, por despacho de fls. 111, a citação das Rés (bem como do CRSS e do Centro Nacional de Pensões), o que veio a ser concretizado através de carta registada com Aviso de Receção relativamente à 1.ª Ré e às entidades de cariz social, conforme ressalta de fls. 112 (CNP), 117 (CC) e 137 (CRSS).

* A Ré CC contestou, a fls. 125 e seguintes, alegando, em síntese, que EE sofria de insuficiência cardíaca e de insuficiência renal, doenças que também contribuíram para o seu óbito.

Mais alegou que EE deu entrada no hospital onde viria a falecer muitos dias depois de a doença se ter manifestado, não lhe tendo, por isso, sobrevivido.

Alegou, ainda, que a contração da doença não constitui um acidente de trabalho, posto que EE esteve exposto a um risco comum e genérico a qualquer indivíduo que, ainda que temporariamente, habite a Nigéria, não se verificando um risco especial do trabalho ou do serviço a ser prestado e, por outro lado, não se sabe quando EE foi mordido pelo mosquito que provoca a doença, pelo que não pode afirmar-se que a doença foi contraída no local, no tempo e por causa do trabalho.

Por último, alegou que o contrato de seguro celebrado com a 2.ª Ré exclui expressamente da sua cobertura qualquer tipo de doença.

* O CENTRO NACIONAL DE PENSÕES deduziu pedido de reembolso a fls. 130 e segs., pedindo a condenação das Rés a pagar-lhe Esc. 267.000$00, quantia correspondente às prestações por morte pagas à Autora, em virtude do falecimento de EE.

* O pedido de reembolso formulado pelo CENTRO NACIONAL DE PENSÕES não foi contestado.

* A 2.ª Ré DD, AG, depois de diversas diligências infrutíferas com vista à sua citação pessoal, foi citada editalmente, tendo o Ministério Público assumido a sua defesa, sem que contestasse (cfr. fls. 266 a 269).

* Foi proferido despacho saneador, no qual se considerou regularizada a instância e se procedeu à fixação da matéria de facto assente e à elaboração da base instrutória (26 artigos), conforme ressalta de fls. 273 e seguintes.

Foram juntos pelas partes os respectivos requerimentos probatórios (fls. 281 e 285 e 286), cuja admissão ocorreu através do despacho de fls. 296, aí se tendo indeferido a prova pericial requerida pelos Autores.

* Por apenso aos presentes autos correu habilitação de herdeiros, deduzida em 05 de Dezembro de 2008, no âmbito da qual foram habilitados como herdeiros dos Autores os seus filhos GG e HH.

* Procedeu-se ao julgamento com observância de todas as formalidades legais, como resulta da respetiva Ata (fls. 376 a 379), tendo a prova aí produzida sido objecto de registo áudio.

A matéria de facto foi decidida por despacho proferido a fls. 386 a 390 que não suscitou quaisquer reparos, por não estar presente nenhuma das partes.

* A fls. 394 e seguintes, foi proferido despacho a julgar o tribunal da 1.ª instância competente em razão da nacionalidade e pronunciando-se no sentido de não ser a lei portuguesa aplicável ao caso dos autos, tendo sido solicitada a junção da lei nigeriana e suíça vigentes em 1993.

* A fls. 416, a Ré “DD” informou que alterou a sua denominação para “II, S.A. – SUCURSAL EM PORTUGAL”.

* Foi junta, por linha, tradução da Lei Laboral da Nigéria, do Despacho sobre a prevenção de acidentes e doença profissionais da Suíça, de 19 de Dezembro de 1983, da Lei Federal sobre Seguros – Acidentes da Suíça, de Março de 1981, do Despacho sobre seguros de acidentes da Suíça, de 20 de Dezembro de 1982, da Lei de Seguro de acidentes e doença profissionais da Suíça, entrada em vigor em 29/01/2010 e da Lei Federal sobre o contrato de seguros, de 02 de Abril de 1908.

* Foi então proferida a fls. 463 a 477 e com data de 28/10/2011, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes: “Pelo exposto, julgo a presente ação e, bem assim, o pedido de reembolso formulado pelo ISS-IP/CNP, totalmente improcedentes e, em consequência, absolvo ambas as Rés de todos os pedidos contra si formulados.

Sem custas.

Valor da ação: €32.194,41 (trinta e dois mil cento e noventa e quatro euros e quarenta e um cêntimos) – art.º 123.º do Código de Processo do Trabalho de 1981.

Registe e notifique.

” * Os Autores GG e HH, inconformados com tal sentença, vieram, a fls. 450 e seguintes, interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 537 dos autos, como de Apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, por efeito do número 1 do artigo 79.º do Código do Processo do Trabalho de 1981.

* Os Apelantes apresentaram, a fls. 451 e seguintes, alegações de recurso e formularam as seguintes conclusões: (…) * A Ré Seguradora apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, na sequência da respectiva notificação, tendo formulado as seguintes conclusões (fls. 512 e seguintes): (…) * A Ré empregadora, representada pelo ilustre magistrado do Ministério Público, apresentou alegações dentro do prazo legal e formulou as seguintes conclusões (fls. 526 e seguintes): (…) * Tendo os autos ido aos vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – OS FACTOS

  1. EE faleceu no dia 12 de Fevereiro de 1993. (al. A) da matéria de facto assente) b) O sinistrado faleceu no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, em consequência de “paludismo”. (al. B) da matéria de facto assente) c) Na data referida em a), a Ré JJ AG ... havia transferido a sua responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho para a Ré CC, S.A., mediante contrato de seguro, titulado pela apólice n.º 00000000. (al. C) da matéria de facto assente) d) Os Autores, AA e marido, BB, são pais de EE, o qual faleceu no estado de solteiro. (al. D) da matéria de facto assente) e) Com base no falecimento, em 12 de Fevereiro de 1993, do beneficiário n.º 000000000, EE, em consequência dos factos objeto dos presentes autos, foram requeridas no Centro Nacional de Pensões, atualmente ISS-IP/CNP, pela A. AA, as respetivas prestações por morte, as quais lhe foram deferidas. (al. E) da matéria de facto assente) f) Em consequência, o ISS-IP/CNP pagou à Autora AA, a título de despesas de funeral, o montante global de Esc. 267.000$00. (al. F) da matéria de facto assente) g) O sinistrado exerceu as funções de “tubista” para a Ré DD, AG ..., no campo petrolífero de Obiafu/Obrikon, na Nigéria, mediante contrato de trabalho com a mesma celebrado em 20 de Junho de 1992, o que fez desde então e até à data do seu óbito. (resposta ao quesito 1.º) h) Tais funções eram exercidas pelo Sinistrado num período semanal de quarenta horas, repartidas por cinco dias, em horários de oito horas diárias, tendo o sinistrado direito a um dia de descanso semanal. (resposta ao quesito 2.º) i) E como retribuição mensal, a Ré DD, AG ... pagava ao falecido a quantia de 1.100 US Dólares. (resposta ao quesito 3.º) j) Sendo as horas feitas para além do período semanal de quarenta horas, consideradas como extraordinárias e pagas a 6.61 US Dólares à hora. (resposta ao quesito 4.º) k) O Sinistrado tinha ainda direito a um período de férias pagas. (resposta ao quesito 5.º) l) A Ré DD, AG ... obrigou-se ainda, nos termos do mencionado contrato de trabalho, a segurar o sinistrado pelo risco de morte, em consequência de acidente de trabalho, incluindo acidente ocorrido durante as viagens do local de trabalho e no regresso, em montante de 40.000US Dólares, a pagar ao seu parente mais próximo, segundo as leis do seu país. (resposta ao quesito 6.º) m) O referido contrato de trabalho foi assinado em Portugal pelo sinistrado. (resposta ao quesito 7.º) n) Em 19 de Janeiro de 1993, o sinistrado viajou de Obiafu/Obrikon, na Nigéria, para Portugal. (resposta ao quesito 9.º) o) Quando o sinistrado embarcou para Portugal, já era portador da doença (Paludismo), contraída ainda na Nigéria e que apenas se veio a revelar quando já se encontrava em Portugal. (resposta ao quesito 13.º) p) O sinistrado e os seus companheiros de trabalho dormiam no referido campo petrolífero, em contentores que se encontravam a cerca de 0,5 metro do solo. (resposta ao quesito 15.º) q) O sinistrado encontrava-se, à data, vacinado com a vacina PASTEUR 5309, a qual lhe foi administrada em Lisboa, em 3 de Abril de 1992. (resposta ao quesito 7.º) r) No campo petrolífero de Obiafu/Obrikon, sito na Nigéria, alguns trabalhadores de origem filipina forma atacados de “paludismo”. (resposta ao quesito 20.º) s) O sinistrado sofria de insuficiência cardíaca e insuficiência renal. (resposta ao quesito 21.º) t) Tais doenças contribuíram também para o seu falecimento. (resposta...

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