Acórdão nº 285/06.9TCSNT.L1.2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução20 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa I - “A” e “B”, interpuseram a presente acção de condenação sob a forma de processo ordinário, contra “C” - Companhia de Seguros, S.A., “D” – Cooperativa Agrícola de ..., ... e “E”, pedindo que os RR. sejam condenados a pagar-lhes a quantia de € 216.810,85, sendo € 30.000,00 à A. e o restante ao A., acrescida de juros de mora desde a citação e, ainda, da quantia a fixar em execução de sentença relativamente a danos patrimoniais futuros.

Alegam que o A. foi atropelado por um veículo segurado na 1ª R., por culpa exclusiva do condutor deste, 3º R., que conduzia por conta e no interesse da 2ª R – sofrendo ambos os AA. os danos cujo ressarcimento pecuniário peticionam, pelo referido montante.

Os 2º e 3º RR. contestaram, impugnando a factualidade deduzida na petição inicial, defendendo a improcedência total da demanda e excepcionando a ilegitimidade passiva.

A 1ª R. contestou, impugnando a factualidade deduzida na petição inicial, propugnando a improcedência total da demanda e excepcionando a ilegitimidade activa de ambos os AA..

Os AA replicaram, sustentando a improcedência das excepções.

O Instituto da Segurança Social, IP, deduziu contra os três RR. pedido de reembolso das prestações de segurança social pagas ao A., no valor de € 14.399,61, acrescido de juros de mora, à taxa legal, a contar da notificação da reclamação e até integral e efectivo pagamento – pedido esse admitido por despacho de fls. 135.

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgaram improcedentes as excepções de ilegitimidade activa e passiva, bem como se julgaram improcedentes os pedidos formulados pela A. “B”, sendo os RR absolvidos dos mesmos.

II - Relativamente à decisão a respeito da ilegitimidade passiva, a R. “C” interpôs recurso, que foi admitido como de agravo, cujas alegações concluiu nos seguintes termos: 1-A ora recorrente não se conforma com a douta sentença proferida nos autos por entender que não foi feita a melhor interpretação do disposto no art 29º/1 do DL 522/85 de 31/12.

2- É um facto que o capital seguro obrigatório à data dos factos é de 600.000,00 € mas, no caso em presença, a apólice de seguro de responsabilidade civil da “C” SA tem um capital de 50.000,000,00.

3- A mui douta interpretação do tribunal a quo pode colocar-se em todos os processos judiciais, mormente tendo em atenção que o A pode sempre ampliar o pedido, diríamos, até, o infinito.

4- Deve entender-se que, na redacção da al a) do art 29º quando se indica a expressão “pedido formulado” está a atender-se ao pedido liquido que foi formulado pelo A.

5- Verifica-se a violação do disposto no art 29º DL 522/85 de 31/12 o que se alega para todos e os devidos efeitos legais.

Não foram produzidas contra-alegações.

III - Relativamente à decisão a respeito da improcedência do pedido formulado pela A. “B”, apelou a mesma tendo terminado as respectivas alegações, concluindo: 1-O douto despacho recorrido que julgou improcedentes os pedidos da apelante, deve ser revogado, pois nele não se fez a correcta interpretação dos factos e adequada aplicação do direito, no que concerne aos arts 483º e 496º do CC que são violados.

2- Em 1/2/2006 a apelante intentou acção de condenação sob a forma de processo ordinário contra as apeladas assistindo-lhe por via dessa acção a condenação das RR no pagamento de uma indemnização como ressarcimento do dano directo e não patrimonial que sofreu.

3- Na sequência do sinistro resultaram diversas sequelas para o marido da apelante, também ele A. nos presentes autos 4- Como consequência directa do acidente e das lesões nele sofridas o marido da A passou a não conseguir concretizar o débito conjugal.

5- Dos factos supra aludidos e constantes também da p i decorre clara e inequivocamente que houve uma violação directa, ilícita e culposa do direito de personalidade da apelante que se consubstancia no seu direito à sexualidade – cfr art 483º/1 CC.

6 -Na verdade, do acidente de viação resultou simultaneamente a violação de dois direito subjectivos: violação directa da integridade física e moral do marido da apelante; violação de forma directa do direito de personalidade da A. que se traduz no exercício normal da sexualidade conjugal.

7 -Os direitos de personalidade são direitos absolutos e por isso oponíveis em relação a terceiros sobre os quais impende o dever de se absterem de praticar ou deixar de praticar qualquer acto que ilicitamente ofenda ou ameace defender a personalidade de outrém.

8-O art 70º/1 do CC estabelece e consagra o direito geral de personalidade pelo qual a lei protege indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou qualquer ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, significando isto que, os bens, as funções, os estados e as forças, potencialidades e capacidades que são a expressão do “todo” que constitui a personalidade humana, gozam de tutela geral de directa do art 70º do CC.

9-Deste modo, além dos direitos de personalidade elencados nos arts 72º e ss CC decorre do principio geral do art 70º do mesmo diploma legal, outros direitos de personalidade, como é o caso do direito à sexualidade, designadamente quando materializado no âmbito do casamento, atento o inerente direito/dever da plena comunhão de vida, consagrado no art 1577º CC.

10- O direito à sexualidade é, pelo menos no âmbito do casamento, um direito de personalidade tutelado pela Lei.

11-No caso sub júdice a conduta ilícita e culposa do condutor do veiculo, propriedade da 2ª R, e segurado pela 1ª R, causou o dano físico ao marido da apelante, colocando-o numa situação de impossibilidade de cumprir o debito conjugal e violou directamente o dito direito de personalidade da apelante o cumprimento daquela debito conjugal.

12-A apelante tem, de facto, direito à indemnização ou compensação para ressarcimento do dano causado directamente pela supra aludida violação do seu direito de personalidade – art 483º/1 CC – tratando-se, obviamente, de ressarcimento do dano não patrimonial que, como tal, está previsto no art 496º CC.

Não foram produzidas contra-alegações.

Procedeu-se à selecção da matéria de facto e à realização de audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou totalmente improcedentes os pedidos do A., bem como o pedido de reembolso efectuado pelo Instituto da Segurança Social, I.P. e, em consequência, absolveu os RR. dos pedidos.

IV – Do assim decidido, apelou o A. que concluiu as suas alegações do seguinte modo: 1 – A sentença do tribunal a quo é posta, pelo presente recurso, em crise, quer na sua vertente de decisão de facto, quer na sua vertente de apreciação e subsunção que faz dos factos ao direito.

2 No que respeita à decisão de facto, o recorrente entende incorrectamente julgados os factos articulados nos quesitos 1º, 3º, 42º, 43º, 46º,47º e 49º, requerendo, em conformidade, pelo presente recurso, a respectiva alteração.

3 - Debruçando-nos sobre cada um daqueles quesitos, e tendo por principal linha de orientação, a própria linha de fundamentação seguida pela sentença, quanto ao quesito 49º, entende que a prova produzida, maxime, articulado (contestação), conjunto, do 2º e 3º R, e depoimento de parte do 3º R. impunham decisão diversa, sobretudo, no quadro de prova já considerada pela própria sentença.

4 - Concretamente, está provado: a) a actividade do Réu “E” – motorista “de pesados” (vide depoimento de parte, cuja gravação está identificada na sessão de julgamento de 15 de Outubro de 2010, e facto b provado); b) a condução por este dum veículo de mercadoria de pesados (facto B) provado), do 2º R (facto provado NN);c) A não impugnação pelo 2º e 3º R de que este ultimo conduzia sob o interesse e ordens do 2º R. (vide contestação, maxime, artigo apresentada de forma conjunta por 2º e 3º R.) d) a ausência de alegação por parte da 2ª R. de qualquer situação de utilização abusiva do veiculo desta por parte do R. “E”) 5 - Todos estes factos, de forma conjugada, impunham uma decisão diversa, sem que tal decisão 6 – Pelo que, perante a factualidade supra descrita, seja por confissão dos próprios 2º e 3º R, seja pela presunção que resulta de todos os factos supra referidos (e conduta processual do 2º e 3º R) deverá dar-se por provado que o condutor “E”, 3º R, dirigia o veiculo pesado de mercadorias sob o interesse e às ordens do 2ª R, assim, se alterando o quesito 49 em conformidade.

7 - Também relativamente ao quesito 3º deveria ter sido resposta diversa, tendo em conta o depoimento de parte prestado pelo 3º R.

8 - Lembrando que o ponto de vista regulamentar a faixa que delimita a berma da faixa de rodagem também é berma, o R. “E” afirmou quando prestou o seu depoimento que: “Juiz – Mas quando o Sr. “E” o atingiu, ou ele embateu no carro…- porque estão aqui as duas versões – ele estava na berma, ou estava na faixa de rodagem em que o senhor seguia? “E” – Estava em cima do traço da faixa de rodagem, à traseira do automóvel Juiz – Então porque é que o carro onde o senhor seguia o atingiu, passou por cima da berma, invadiu a berma? “E” – Não eu ia na faixa de rodagem Juiz – Então…”E” – O senhor…Juiz – Espere, Sr. “E”, ouça-me bem porque isto com a gravação, se não me ouve depois fica…Então se ele estava… o senhor diz que ele estava em cima da linha que delimitava a faixa de rodagem “E” – Sim Juiz – da berma … Se o senhor seguia na faixa de rodagem, como é que o atingiu? “E” – Atingiu-o … eu não o atingi, eu não sei como é que o senhor embateu na traseira do carro, eu não o atingi com o camião, o senhor bateu na traseira do camião, ele foi atingido pela traseira do camião Juiz Mas como é que isso aconteceu, se o senhor vinha na faixa de rodagem? Ó Sr. Dr. Juiz, isso ai já não sou capaz de lhe explicar (ruído) espelho retrovisor, parei, eu não sei como é que foi.. (depoimento identificado na acta da sessão de julgamento de 15 de Outubro de 2010, gravado no sistema integrado de gravação digital disponível no tribunal de acordo com aquela acta) 9...

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