Acórdão nº 7860/06.0TBCSC.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA PARDAL
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO P & S, Lda intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra M, Lda alegando, em síntese, que é titular de um estabelecimento de restauração que já teve o nome de A… CAFÉ e que no dia 28/11/2005 foi celebrado um contrato promessa de cessão da totalidade das quotas da sociedade autora pelo preço de 100 000,00 euros, sendo as promitentes cessionárias suas actuais sócias e, no mesmo dia 28/11/2005, sem o conhecimento das promitentes cessionárias, a ré e a sociedade autora, ambas representadas por anteriores sócios da autora, promitentes cedentes das quotas da autora no contrato promessa, celebraram um contrato denominado “concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de estabelecimento”, em que a ré declarou ser titular da marca A… e da insígnia de estabelecimento A… CAFÉ e concedeu à autora licença para explorá-las, mediante o pagamento de uma retribuição, o que vinculou a autora apenas formalmente, por não ser essa a sua vontade real, em virtude de não ser a vontade das promitentes cessionárias das quotas da autora, a quem foi dito que o nome de A… CAFÉ pertencia à ré e que apenas fora assinado um documento para esta dar autorização para a sua utilização, mas nada lhes tendo sido dito sobre as obrigações contraídas nesse contrato pela autora.

Mais alegou que uma das promitentes cessionárias entrou na posse do estabelecimento logo em 1/12/2005 e que a escritura do contrato definitivo de cessão de quotas veio a ser outorgada em 13/01/2006, sem que aí fosse feita qualquer referência ao contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de exploração e sem que os cessionários tivessem consciência de que existia a obrigação de pagar uma contrapartida para além do preço da cessão das quotas e do valor das obras que aí efectuaram, o que aconteceu até Junho de 2006, altura em que a ré os surpreendeu exigindo-lhes o cumprimento do contrato de concessão de licença de exploração da marca e insígnia, tendo então a autora comunicado à ré que não reconhecia este contrato, não o aceitando e alterando o nome do estabelecimento de A… CAFÉ para K… CAFÉ, mas continuando a ré a exigir-lhes a quantia de 45 384,90 euros que não é devida, pois os representantes da autora e da ré agiram de má fé ao celebrar esse contrato, pelo que as circunstâncias que rodearam tal celebração integram a figura do abuso de direito e a tentativa de enriquecimento sem causa.

Concluíram pedindo a declaração de nulidade do contrato de concessão de licença de exploração de marca e de insígnia de estabelecimento, por ser simulado e de nenhum efeito, com fundamento na ocorrência dos vícios da vontade daqueles que então o outorgaram quer em representação da autora, quer em representação da ré.

A ré contestou alegando, em síntese, que as cessionárias promitentes do contrato promessa de cessão das quotas da autora sempre tiveram conhecimento do contrato de concessão de licença de exploração da marca e insígnia de estabelecimento, tal como vem expressamente declarado no artigo 6º do contrato promessa e como demonstra o facto de a autora ter vindo a cumprir outras cláusulas do referido contrato de concessão de licença de exploração.

Em reconvenção, alegou estarem em dívida as prestações relativas a sete meses de contrato, calculadas de acordo com os critérios do mesmo, no valor global de 5 294,90 euros, bem como a indemnização por não cumprimento também prevista no contrato, no montante de 40 000,00 euros.

Concluiu pedindo a improcedência da acção com a absolvição do pedido e a procedência da reconvenção com a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de 5 294,90 euros acrescida de juros vencidos de 399,30 euros e a quantia de 40 090,00 euros, ambas acrescidas ainda de juros vincendos e também a pagar multa e indemnização no valor de 2 500,00 euros, como litigante de má fé.

A autora replicou impugnando os factos alegados na contestação e concluindo como na petição inicial.

Saneados os autos e admitida a reconvenção, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo a ré no pedido e julgou procedente a reconvenção, absolvendo a autora do pedido de litigância de má fé, mas condenando-a a pagar à ré as quantias de 5 294,90 euros e de 40 090,00 euros, acrescidas de juros, sendo a primeira desde Agosto de 2006 e a segunda deste a citação, tudo até integral pagamento.

Inconformada, a autora interpôs recurso, que foi admitido como apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo.

A apelante alegou, formulando as seguintes conclusões: 1ª – O presente recurso versa matéria de facto e de direito (artº 698º, nº2 e 6 do CPC) e é da autoria de uma Senhora Juiz que não presidiu à realização do Julgamento.

2ª – Os sócios JP e JO – ao tempo da autora e da ré – agiram com dolo e má fé no contexto da negociação do contrato de fls 27, razão pela qual o mesmo é simulado e nenhum efeito.

(…) 12ª – Ao caso dos autos não se aplica o “instituto do levantamento da personalidade jurídica da sociedade” porque a ré não alegou qualquer factualidade caracterizadora do mesmo e durante o julgamento nada a este respeito ficou, sequer indiciariamente, provado.

13ª – A teoria defendida na Sentença recorrida legitima que, num julgamento onde, a dado passo se demonstre que o automóvel em litígio não é propriedade de quem em juízo o reivindica mas sim da empresa de leasing que o comprou e que beneficia da reserva de propriedade … será que o locatário da viatura pode agir em juízo como se fosse dono do carro? É claro que não.

14ª – A teoria defendida na Sentença – verdade judicial relativa – terá algum sentido numa situação de tentativa de reconstituição dos factos controvertidos (embora o esforço do legislador desde o ido ano de 1995 venha sendo no sentido da descoberta da verdade material para a boa decisão da causa) … jamais numa situação em que o registo demonstra a verdade sobre a titularidade do direito controvertido.

15ª – Há óbvio erro de julgamento gerador de nulidade da Sentença porque há contradição entre os factos dados como provados – als. G) e FF) dos factos provados – e o texto da Sentença, nulidade que se invoca desde já para todos os efeitos legais porquanto não se pode simultaneamente dar como provado o teor do nº1, nºs 1 e 2 do contrato de fls 27 e a afirmação constante da Sentença “o facto de, a posteriori, se concluir pela não existência do direito invocado …”.

16ª – Com a notícia nos autos de que a ré não é – ainda hoje – a titular do direito que reivindicava, nem o Tribunal nem aquela suscitaram o incidente de chamamento à acção do legítimo titular dos direitos identificados no nº1 do contrato de fls 27 (artº 320 e ss CPC).

17ª – Nos termos do artº 31 do CPI (Lei 52/2008 de 22/8), o titular da marca e da insígnia de estabelecimento (de que a ré se arroga ilegitimamente titular) pode livremente cedê-los a quem quiser, mas nos termos do artº 30, nº1, a) do CPI, o adquirente dos direitos registados no INPI, como é o caso versado nos autos, está obrigado a requerer o averbamento dos mesmos a seu favor.

18ª – E, nos termos do nº2 do citado artº 30 do CPI, os factos referidos no nº1 da citada norma legal “só produzem efeitos em relação a terceiros depois da data do respectivo averbamento”.

(…) 20ª – Nos termos do artº 467, nº1, d) do CPC “Na petição, com que propõe a acção, deve o autor formular o pedido”, determinando-se no artº 264º, nº2 do CPC que “O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes …” e nos termos do artº 661º, nº1 do CPC que “A sentença não pode condenar em quantidade ou objecto diverso do que se pedir”, tendo a Douta Sentença recorrida violado as referidas normas legais.

21ª – A Douta Sentença recorrida, ao decidir do modo como decidiu, condenou em objecto diverso do formulado em juízo pela ré, uma vez que esta não é titular do direito que para si reivindica na reconvenção, razão pela qual padece da nulidade prevista na al e) do artº 668º do CPC.

(…) 24ª – Tendo-se em consideração as conclusões acabadas de reproduzir impõe-se a anulação da Sentença recorrida a qual deve ser substituída por outra que julgue procedente o pedido formulado pela autora improcedente o pedido formulado pela ré”.

Não há contra-alegações e as questões a decidir são: I) Nulidade da sentença.

II) Alteração da matéria de facto.

III) Validade do contrato celebrado entre a autora e a ré ou sua...

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