Acórdão nº 30/11.7GAMIR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | CORREIA PINTO |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Relatório 1.
No 1.º Juízo Criminal de Coimbra, no âmbito do processo comum singular n.º 30/11.7GAMIR, foi julgado o arguido A...
, residente na Rua … , em Coimbra, a quem era imputada a prática, em autoria material e concurso real, de contra-ordenações previstas e puníveis pelos artigos 36.º, n.ºs 1 e 2, 39.º, n.ºs 1 e 2, 24.º, n.ºs 1 e 2, 138.º, 145.º, n.º 1, alínea f), e 147.º, todos do Código da Estrada, e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, previsto e punível pelos artigos 291.º, n.º 1, alínea b), e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal.
Realizado julgamento, o tribunal proferiu sentença onde decidiu nos seguintes termos: “Julga-se procedente a acusação, na qualificação perfilhada, e condena-se A..., pela autoria material de: − um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelos art.ºs 291.º, 1 b), e 69.º, 1 a), ambos do Cód. Penal; e das − contra-ordenações, p. e p. pelos art.ºs 13.º, 1 e 3, 24.º, 2 e 3, e 36.º, 1 e 2, 138.º, 145.º, 1 f), e 147.º, 1 e 2, todos do Cód. da Estrada, nas penas principal e acessória de: − cento e cinquenta (150) dias de multa, à razão de nove euros (€ 9) dia, num total de mil, trezentos e cinquenta euros (€ 1 350); e − sete (7) meses de proibição de conduzir veículos motorizados, respectivamente; e na sanção acessória parcelar de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de dois (2) meses, respectivamente, e na sanção acessória única, do cúmulo material, de inibição da faculdade de conduzir veículos motorizados pelo período de seis (6) meses.
Verificada que seja a hipótese do art.º 49.º, 1, do Cód. Penal, o arguido cumprirá cem (100) dias de prisão subsidiária.
Mais se condena o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (art.ºs 513.º, 1 a 3, 514.º, 1, ambos do Cód. Proc. Penal e 8.º, 5, e Tabela III do RCP).” 2.
O arguido, não se conformando com a decisão, veio interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: I) O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo Venerando Tribunal a quo, que condenou o ora apelante na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 9 (euros) euros, na pena acessória de 7 meses de inibição de conduzir veículos motorizados, e na aplicação efectiva da sanção de inibição de conduzir por dois meses, consequentemente, na pena única, quanto à sanção acessória, de 6 meses.
II) Bem esteve o douto Tribunal a quo ao determinar a aplicação de pena não privativa de liberdade no caso sub iudice.
III) Salvo o devido respeito, a pena de multa aplicada pelo douto Tribunal a quo é excessiva quanto aos dias de multa previstos e ao quantitativo diário fixado, atendendo à situação económico-financeira do apelante.
IV) O apelante é estudante, pai de duas filhas menores, sendo os rendimentos da sua companheira (cerca de € 1.700).
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O rendimento da companheira do apelante tem que fazer face a todas as despesas pessoais do agregado familiar, como alimentação, vestuário e saúde, às despesas da habitação, nomeadamente água, luz e gás, e de ensino das filhas menores do apelante.
VI) Mesmo requerendo e sendo deferido pelo Venerando Tribunal a quo, o pagamento da multa em que foi condenado, a prestações, devido ao imperativo legal ínsito no n.º 3 do artigo 47.º do Código Penal, teria que liquidar uma prestação mensal no valor de € 102,00 (cento e dois euros).
VII) O que impossibilitaria o agregado familiar de fazer face a todas as supra mencionadas despesas.
VIII) Por outro lado, ao apelante vê negada a possibilidade de requerer a substituição da pena de multa a que foi condenado, por prestação de trabalho a favor da comunidade, uma vez que as suas obrigações escolares, e o facto de ser ele cuida das filhas menores, na medida em que a companheira trabalha sobretudo por turnos, no período nocturno e os fins de semana, lhe preenchem a semana e os fins-de-semana.
IX) O Venerando Tribunal a quo quando fixou os dias da pena de multa e o quantitativo diário, salvo o devido e merecido respeito, não ponderou devidamente os critérios apontados pelo artigo 71.º do Código Penal, referentes à determinação da medida da pena.
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Entende-se que no caso concreto, a situação social e económica do apelante, imponha a previsão de uma pena de multa inferior à determinada, que, sem contrariar os fins da referida pena, lhe permitisse pagar sem recorrer à ajuda de terceiros.
XI) O apelante foi condenado na pena acessória de 7 meses de proibição de conduzir veículos motorizados.
XII) Entende o apelante, que atendendo ao facto da sua conduta não ter causado quaisquer danos a pessoas ou bens, e o mesmo não ter quaisquer antecedentes criminais ou no âmbito contra-ordenacional, não se justifica a previsão da sanção acessória superior ao mínimo legal (três meses).
XIII) Ao apelante foi ainda imputada a violação das regras estradais previstas nos artigos 36.º, n.º 1, 22.º, n.º 2, alínea b), 113.º, n.º 1, e 24.º, n.º 2, todos do Código da Estrada.
XIV) As referidas condutas constituem contra-ordenações graves.
XV) Não resulta provado nos autos que o apelante praticou contra-ordenação grave nos últimos 5 anos. Para além desta infracção, o apelante não tem quaisquer outros antecedentes de incumprimento de leis e/ou regulamentos sobre trânsito.
XVI) Foi aplicada ao apelante a sanção acessória efectiva de inibição da faculdade de conduzir pelo período de 2 meses.
XVII) Refere a douto Tribunal a quo: «A, suspensão da execução da execução da sanção acessória não a permite o legislador in casu. Efectivamente o artigo 141.º do Cód. da Estrada, faz depender a suspensão da execução da sanção acessória a aplicada a contra-ordenações graves, entre outros requisitos, do facto de se encontrar paga a coima, o que não se verifica relativamente às contra-ordenações em causa».
XVIII) Impõe-se referir que nunca o apelante foi interpelado, quer por autoridade administrativa, quer pelo douto Tribunal a quo, para liquidar qualquer coima, pelo que o não pagamento da mesma, até à presente data, não lhe pode ser imputado. Assim como não pode prejudicar o arguido, impedindo-lhe beneficiar da suspensão.
XIX) O apelante necessita da carta de condução para se deslocar e assegurar o transporte das filhas menores. A mãe, sua companheira, pela profissão que exerce não pode assegurar essas funções.
XX) No caso, uma suspensão da execução da sanção acessória, realiza de forma adequada e suficiente os objectivos de prevenção geral e especial, bastando ao apelante a ameaça da revogação da suspensão se, durante o período da mesma, praticar qualquer outra contra ordenação grave ou muito grave.
XXI) Mesmo que se considerasse que o exposto não é suficiente para fundamentar a suspensão da execução da pena acessória a que o apelante foi condenado, hipótese que de momento não se vislumbra, o condicionamento da suspensão à frequência de acções de formação e/ou a cooperação em campanhas de prevenção rodoviária, e/ou, à prestação de caução de boa conduta, nos termos previstos no art. 141.º do Código da Estrada, seria o suficiente para assegurar a realização das finalidades da punição.
XXII) A douta decisão em crise viola, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto nos artigos 71.º, n.º 1, 47.º, e 50.º, todos do Código Penal, e o artigo 141.º do Código da Estrada.
Termina sustentando que deve ser julgado procedente o recurso ora interposto e alterada a douta decisão decretada pelo Tribunal a quo no que concerne à fixação dos dias e quantitativo diário da pena de multa, ao período da pena acessória de inibição de conduzir, e à aplicação efectiva da sanção acessória de conduzir, com todas as devidas e legais consequências.
3.
O Ministério Público respondeu, concluindo: 1. Foi bem condenado o arguido pelo crime de condução perigosa, delito que foi objectiva e subjectivamente perfectibilizado claramente pelo seu comportamento.
2. A pena principal encontrada é justa e equitativa, além de adequada.
3. A pena e sanção acessórias foram justas, não podendo ou devendo ser dispensada a sua execução.
Termina afirmando que deverá ser negado provimento ao recurso e mantida na íntegra a sentença recorrida.
4.1 Neste Tribunal da Relação, o Ministério Público, com vista nos autos, acompanhando e aderindo às alegações do Ministério Público na 1.ª instância, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
4.2 O arguido, notificado nos termos do artigo 417.º do Código de Processo Penal, não respondeu.
5.
Colhidos os vistos e remetidos os autos a conferência, cumpre apreciar e decidir.
O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação.
Nos termos do artigo 412.º do Código de Processo Penal, a motivação do recurso enuncia especificamente os respectivos fundamentos e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do seu pedido.
Neste enquadramento, o objecto do recurso consubstancia-se na apreciação das seguintes questões: § Apreciar a adequação da pena principal, da pena acessória e das sanções acessórias, impostas ao arguido, pela prática do crime de condução perigosa de veículo rodoviário e de contra-ordenações no exercício da condução.
II) Fundamentação 1.
Factos relevantes.
1.1 Com interesse para a decisão a proferir, importa considerar que na sentença recorrida foram julgados provados os seguintes factos: “1. No dia … de 2011, pelas 11:20 horas, na via da Circular Interna, em Coimbra, depois de passar a Rotunda da Fucoli e em direcção aos HUC, … conduzia a viatura de matrícula … , ambulância do INEN, que na ocasião transportava uma doente desde Mira até aos HUC, o que fazia na faixa mais à direita das duas permitidas naquele local e sentido de marcha; 2. As duas faixas de rodagem da via tinham e têm o risco descontínuo a separá-las; 3. A ambulância tinha marcha de transporte de doente assinalada, com os sinais luminosos em uso para este tipo de situações; 4. … iniciou a ultrapassagem da viatura que seguia...
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