Acórdão nº 875/11.8T4AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução08 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I - Relatório A autora instaurou a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra a ré alegando ter sido despedida por esta em 04/08/2011 e juntando cópia da decisão de despedimento proferida em procedimento disciplinar que lhe foi instaurado pela ré.

Realizada a audiência de partes, frustrou-se a tentativa de conciliação.

Notificada para o efeito, a ré juntou o procedimento disciplinar (doravante designado por PD) e apresentou o articulado a motivar o despedimento, no qual pugna pela declaração de que o despedimento da autora pela ré foi regular e lícito, com a consequente improcedência da acção.

Alega, em resumo, que a autora, sua trabalhadora, faltou injustificadamente ao serviço por mais de 10 dias consecutivos, sendo que, com esse comportamento, a autora quebrou a relação de confiança subjacente ao contrato de trabalho, impossibilitando a subsistência do vínculo laboral; consequentemente, incorreu em justa causa de despedimento.

Acrescenta que, em qualquer caso, sempre deveria ser excluída a reintegração da autora (art. 392º do CT).

*A autora contestou, tendo sustentado, em resumo, que: a) o procedimento disciplinar é inválido, porque violado o princípio do contraditório, na medida em que a ré procedeu à inquirição de testemunhas sem informar a autora da mesma; b) não faltou ao trabalho nos termos descritos na decisão de despedimento, dada a ilicitude da ordem da ré de transferência da autora de posto de trabalho que esta não acatou, sendo a partir e em consequência das ausências decorrentes desse não acatamento dessa ordem que lhe foram averbadas as faltas que motivaram o despedimento.

Em reconvenção pede a condenação da ré no pagamento de uma indemnização em substituição da reintegração, à data de € 5.820, das retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da data da propositura da acção e juros de mora a contar da data da citação.

*A ré apresentou resposta negando qualquer violação do princípio do contraditório, reafirmando o alegado no articulado motivador do despedimento e concluindo pela improcedência da reconvenção.

*A autora apresentou requerimento pedindo que se declare parcialmente nula a cláusula 3ª do contrato de trabalho junto pela ré com o articulado de resposta (constante de fls. 116/117), na medida em que menciona de forma genérica e indeterminada os locais onde a autora poderia prestar trabalho – fls. 122 a 124.

Apesar da oposição da ré (fls. 127 a 137), foi proferido despacho a admitir aquele requerimento como cumulação sucessiva de pedido – fls. 139 a 143.

*Procedeu-se a julgamento, com observância dos legais formalismos, após o que foi proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte: “Face ao exposto, julga-se a acção procedente, e em consequência decide-se: I) Reconhecer que o despedimento da autora A… promovido pela ré “R…,Lda, é ilícito por improcedência dos motivos justificativos do mesmo.

II) Declarar a nulidade da cláusula 3º do contrato junto a fls. 116/117 na parte em que permite a mudança do local de trabalho da trabalhadora sem exigir a não existência de prejuízo sério para o trabalhador e sem exigir a verificação de necessidades sérias de organização da empresa.

III) Condenar a ré a pagar à autora o seguinte: III.1) a quantia de € 3.880,00 a título de indemnização por antiguidade; III.2) a quantia de € 485,00 ilíquidos tantas vezes quantos meses decorreram e decorram entre 03.09.2011 e o trânsito em julgado da presente decisão a título de compensação conforme artº 390º do NCT – incluindo o correspondente a subsídio de férias e de Natal (proporcional) –, com dedução daquilo que a autora tenha recebido seja a título de subsídio de desemprego seja por via de outra actividade que tenha iniciado; III.3) juros de mora à taxa legal (presentemente de 4%), desde a presente data até integral pagamente.

Valor da acção (artº 98º-P do CPT): € 7.275,00.

Custas pela ré.

”.

*A ré recorreu da sentença, de facto e de direito, e do despacho de fls. 139 a 143 que admitiu a cumulação sucessiva de pedido, pugnando pela alteração de alguns pontos da matéria de facto que considerou incorrectamente julgados, bem como pela integral revogação de ambas as decisões impugnadas.

Para tanto, apresentou as seguintes conclusões: […]*A autora contra-alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões: […]*A ré respondeu às contra-alegações da autora, concluindo como segue: […]*Nesta Relação, a Ex.mª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o parecer que consta de fls. 318 a 324, concluindo que: a) não deve conhecer-se da nulidade da sentença invocada pela ré, por inobservância do art. 77º/1 do CPT; b) deve conhecer-se do recurso sobre a matéria de facto; c) deve improceder o recurso sobre a matéria de facto; d) no recurso da ré vem suscitada uma questão nova e da qual não deve conhecer-se – a do despedimento da autora com fundamento em uso de baixa fraudulenta para justificação de faltas; e) deve improceder o recurso da ré referente à matéria de direito, por inexistência de justa causa para o despedimento da autora; f) julgando-se improcedente o recurso da ré, não deve conhecer-se da ampliação do recurso requerida pela autora.

*A ré respondeu a esse parecer nos termos constantes de fls. 327 a 331, concluindo, como já tinha feito nas alegações, pela revogação das decisões recorridas.

*II – Questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, as questões suscitadas e a decidir são as seguintes: 1ª) Se deve conhecer-se das nulidades da sentença arguidas pela apelante.

  1. ) Se a sentença padece dessas nulidades, por não especificar os elementos de facto e de direito que justificam a decisão e porque os seus fundamentos estão em oposição com a decisão.

  2. ) Se deve tomar-se conhecimento do recurso, na parte em que no mesmo se impugna a decisão de 19/1/2012 que admitiu a cumulação sucessiva de pedido (fls. 139 a 143).

  3. ) Se devem ser admitidos o recurso sobre a matéria de facto da apelante e as contra-alegações da apelada.

  4. ) Se foi incorrectamente julgada a matéria de facto descrita nos pontos 20º), 23º), 30º) dos factos provados.

  5. ) Qual o fundamento que deve ter-se por invocado pela apelante, como justa causa para a cessação unilateral do contrato de trabalho, na decisão disciplinar que sancionou a apelada com o despedimento: apenas as faltas ao trabalho no estabelecimento de Santa Maria da Feira ou, também, as faltas ao trabalho no escritório de Ovar, bem assim como o recurso fraudulento à baixa médica a fim de se eximir à prestação de trabalho? 7ª) Se a cláusula 3ª) do contrato de trabalho em que a autora outorgou padece de uma qualquer causa de invalidade.

  6. ) Se a ré podia ter validamente determinado a transferência do local de trabalho da autora para um estabelecimento pertencente a outra empresa.

  7. ) Se o não cumprimento pela autora dessa determinação da ré, não comparecendo para prestar trabalho nesse outro estabelecimento, fez incorrer a autora em faltas injustificadas.

  8. ) Se a autora recorreu fraudulentamente ao mecanismo da baixa médica por doença para se furtar à prestação de trabalho.

*III – Fundamentação Questões prévias Primeira questão: Se deve conhecer-se das nulidades da sentença arguidas pela apelante.

Importa, antes de mais, emitir pronúncia sobre a arguição de nulidades da sentença levada a efeito pela apelante.

Fazendo-o, cumpre dizer, antes de mais, que a forma pela qual as nulidades foram arguidas respeita o comando normativo do art. 77º/1 do CPT.

Com efeito, num único requerimento datado de 23/5/2012 (Refª: 10250123 – fls. 238 e ss), a apelante começou por arguir nulidades da sentença, de forma expressa e separada (fls. 239 a 243), e a seguir interpôs recurso da mesma sentença, com apresentação das correspondentes alegações e conclusões (fls. 244 a 269).

Por outro lado, estando em causa uma acção que admite recurso ordinário, a arguição de nulidades deveria ser dirigida ao tribunal ad quem, o que a apelante também respeitou.

Termos em que se decide tomar conhecimento da arguição de nulidades feita pela apelante.

*Segunda questão: Se a sentença padece de nulidades, por não especificar os elementos de facto e de direito que justificam a decisão e porque os seus fundamentos estão em oposição com a decisão.

Adiante-se, agora, que a arguição de nulidades deve improceder.

De facto, não pode acolher-se, com o devido respeito, a afirmação da apelante no sentido de que “A sentença é nula porquanto não especifica os elementos de facto e de direito que justificam a decisão…”, com a consequente nulidade prevista no art. 668º/1/b do CPC.

Como escreveu Rodrigues Bastos a propósito da causa de nulidade em apreço, “A falta de motivação a que alude a al. b) do nº1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença.” – Notas ao CPC, III, 3ª ed., pág. 194.

Ora, a sentença impugnada não padece, manifestamente, do vício em consideração.

Os fundamentos de facto estão enunciados na descrição dos factos dados como provados – fls. 217 a 223.

Por outro lado, a fls. 224 a 235 da sentença recorrida, são invocadas, interpretadas e aplicadas aos factos provados as normas legais com fundamento nas quais se veio a concluir, a final, pela ilicitude do despedimento da apelada, posto que efectuado com fundamento em faltas injustificadas imputadas à trabalhadora mas que, em rigor factual e legal, não podiam ter-se por verificadas, com a consequente inexistência da infracção disciplinar com fundamento na qual a apelada foi despedida e efeitos jurídicos daí decorrentes (v.g. arts. 193º, 194º/1/3/4, 248º/1, 288º, 289º/1/b/c, 315º, 351º/1/2/a/d/e/g/3, 381º/b, 390º, 391º, todos do CT/09, 488º, 489º, 493º do CSC.

Consequentemente, tem-se por não verificada a causa de nulidade em apreço.

Sustenta a apelante, igualmente, que a sentença é...

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