Acórdão nº 4/07.2TAPNH.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução21 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

51 I. RELATÓRIO No 2º Juízo do Tribunal Judicial da comarca da Guarda o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, dos arguidos A...

e B...

, com os demais sinais nos autos, a quem imputava a prática, em co-autoria material, de um crime de fraude na obtenção de subsídio, p. e p. pelos arts. 2º, 36º, nºs 1, a) e b), 2 e 5, a), do Dec. Lei nº 28/84, de 20 de Janeiro, por referência ao art. 202º, b), do C. Penal.

Requerida a instrução, vieram os arguidos a ser pronunciados pelos factos e incriminação constantes da acusação pública.

Por despacho proferido na audiência de julgamento de 10 de Abril de 2012 (fls. 1843 a 1844) foram comunicadas aos arguidos, uma alteração não substancial dos factos que constavam da acusação/pronúncia e uma alteração da qualificação jurídica.

Concedido prazo para a defesa, responderam os arguidos nos termos de fls. 1849 a 1851, onde concluíram pela existência de uma conduta delituosa única a que corresponde o crime imputado na sua forma simples, devendo ser isentos de pena.

Por sentença 23 de Abril de 2012, foi cada um dos arguidos condenado, pela prática, em co-autoria, de três crimes de fraude na obtenção de subsídio, p. e p. pelos arts. 2º, 36º, nºs 1, a), 2, 5, a) e 8, b), do Dec. Lei nº 28/84, de 20 de Janeiro, na pena de 2 anos de prisão por cada crime e, em cúmulo, na pena única de 3 anos de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período de tempo.

* Inconformados com a decisão, dela recorrem os arguidos, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: “ (…).

  1. A douta sentença condena os arguidos com base em imputações jurídicas não constantes da Acusação, não tendo as mesmas sido objecto de qualquer alteração dos factos, nem da sua qualificação jurídica, o que conduzirá à sua nulidade, nos termos previstos no artigo 358º e 379°, al.b) do C. P. Penal.

  2. Da Acusação e da Pronúncia não resultam factos que sustentem a imputação aos arguidos do tipo legal de crime, por referência à utilização de documentos falsos, a que se refere a parte final da al.a) do nº 5 do citado artigo 36º.

  3. Por tal razão, quer no requerimento de abertura de instrução, quer na Defesa, oportunamente, apresentada se esgrimiram argumentos e invocações factuais que afastavam a agravação prevista no nº 2 e na 1ª parte da al. a) do nº 5 do artigo 36º (derivada da obtenção de subsídio em montante consideravelmente elevado).

  4. Surpreendentemente, a sentença recorrida vem entender que a agravação do tipo legal de crime prevista no artigo 36º, nº 2 e 5, al. a) do Decreto-lei nº 28/84, de 28 de Janeiro é particularmente grave pelo facto de os arguidos terem falsificado e utilizado os documentos em causa nos autos, acabando por, em nota de roda pé, considerar que a referência ao artigo 202º, al. b) do C. Penal, não tem aplicação in casu, pelo facto do Decreto-lei nº 28/84, de 28 de Janeiro não fazer remissão para tal norma e, ainda, pelo facto de tal preceito do C. Penal ter resultado de alteração muito posterior à da entrada em vigor daquele Diploma Legal.

  5. Desta forma, se o Tribunal a quo, após a produção da prova, tivesse entendido que a agravação do tipo legal de crime deveria ser efectuada com base na parte final da al. a) do nº 5 do artigo 36° do Decreto-lei nº 28/84, de 28 de Janeiro, deveria ter exarado despacho contendo tal alteração na qualificação jurídica, nos termos do disposto no artigo 358° do C. P. Penal.

  6. SEM PRESCINDIR, não pode o Tribunal a quo ter fundamentado a condenação dos arguidos com recurso, seja a título principal, seja a título meramente instrumental, a factos que consubstanciariam crimes prescritos, tendo a prescrição sido reconhecida e decidida com trânsito em julgado.

  7. Tendo a Acusação e a pronúncia imputado aos arguidos um crime de fraude na obtenção de subsídio e tendo, em conformidade com o que consta da Acta com a referência nº 2548371, o Tribunal a quo, entendido estarem em causa três resoluções criminosas distintas, tendo considerado tal facto uma alteração não substancial dos factos, importa concluir que tal alteração não cabe na previsão legal do artigo 358°, nº 1 e 3 do C. P. Penal, mas sim na previsão do artigo 359º do C. P. Penal, o que acarretará a anulação de todo o processado posterior a tal despacho.

  8. A douta sentença ao condenar os arguidos pela prática de três crimes e não apenas um, tendo por base uma nova imputação criminal, nascida de uma perspectivada tonalização mais grave da factualidade já existente, a defesa do arguido não foi acautelada, nem tão pouco assegurada, o que leva, indubitavelmente, à nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do C. P. Penal.

  9. Tal situação acarreta a nulidade da decisão e de todos os actos subsequentes e diferente interpretação e aplicação do artigo 358° do C. P. Penal não se mostra conforme com o disposto no artigo 32° n° 5 da Constituição da República Portuguesa.

  10. De toda a factologia considerada na sentença, impõe-se considerar apenas uma conduta e uma resolução criminosa, não sendo possível cindir distintas resoluções criminosas, como entendeu o Tribunal a quo.

  11. No presente caso, a existir, efectivamente, a prática de crime por parte dos arguidos, estaríamos perante um crime continuado e não perante três crimes, atendendo à proximidade temporal das condutas parcelares e do facto da actuação dos arguidos se cingir apenas a parte dos anos de 2002 e 2003, independentemente de se tratar de procedimentos inerentes à formação decorrentes entre os anos de 2001 e 2003.

  12. É manifesto e patente que a organização de tais processos ocorreu como um todo, ou seja, como uma resolução conjunta e unitária, não havendo resoluções intencionais e/ou factuais para cada programa ou para cada processo de candidatura, o que, inexoravelmente, nos conduz à consideração de uma única resolução e não de várias.

  13. A matéria de facto constante dos pontos 29 a 35, 42, 43, 59 a 64 dos factos provados deveria ter sido considerada NÃO PROVADA, atendendo a toda a prova documental constante dos autos, conjugada com os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento, os quais se encontram gravados, aqui se dando integralmente por reproduzidos.

  14. Entendemos, com o devido respeito, que ao longo de toda a audiência de julgamento não resultaram, de forma alguma, provados os factos acima referidos. Aliás, os mesmos foram contrariados pelos depoimentos, quer dos arguidos, quer das testemunhas, D... e pela principal testemunha dos autos, C... (por ser a única testemunha ouvida com conhecimento directo sobre os factos subjacentes aos presentes autos).

  15. Ficam, de forma indubitável, contrariados os factos dados como provados e acima identificados, pelo Tribunal a quo, existindo, in casu, erro de julgamento, consagrado no artigo 412°, n° 3, do CPP, sendo certo que o tribunal a quo considerou provados factos, sem que deles, para tal, tivesse sido feita prova, pelo que deveriam ter sido considerados não provados.

  16. Os factos dados como provados não têm correspondência com os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento, nomeadamente pelos arguidos e pela principal testemunha do processo, C....

  17. Existe contradição entre factos provados e não provados, mais concretamente, entre o ponto 6 dos factos provados e o ponto 1 dos factos não provados, não podendo dar-se como provado que no período compreendido entre Outubro de 2001 e Dezembro de 2003 a gerência da sociedade foi efectivamente exercida pelos arguidos B... e A..., para, ao mesmo tempo, considerar não provado que a B... adquiriu as quotas da Sociedade em Outubro de 2001.

  18. Assim sendo e não existindo outra fundamentação expendida na sentença recorrida, terá de se considerar como assente o que consta da certidão do registo comercial e que foi dado como provado nos pontos 3 e 4 dos Factos Provados.

  19. Verificando-se vício de contradição insanável, o mesmo afecta não só a sentença – fica sem se perceber o verdadeiro sentido da decisão recorrida, não podendo, por isso, sindicar-se e ser corrigido pelo tribunal de recurso – o que obriga ao reenvio do processo para novo julgamento restrito ao suprimento do vício e actos subsequentes por ele afectados (artigo 426° do C. P. Penal).

  20. Por outro lado, existe contradição entre factos provados, mais concretamente, entre os pontos 3 e 4 e os pontos 6 e 61 a 64.

  21. Apesar dos arguidos terem adquirido as quotas em Dezembro de 2001, a gerência apenas foi assumida em Março de 2002, não podendo, neste período intermédio ser responsabilizados por factos praticados perante terceiros.

  22. Já não andou bem a sentença recorrida ao dar como provados os factos constantes dos pontos 6 e 61 a 64 dos Factos Provados, em verdadeira contradição com a matéria considerada provada nos pontos 3 e 4.

  23. A conduta dos arguidos não se subsume no nº 2 e 5, al. a) do artigo 36° do Decreto-lei n° 28/84, de 20 de Fevereiro, mas sim no n° 6 do artigo 36° do mesmo Diploma Legal X) Logo que os arguidos se aperceberam que as informações prestadas e documentos fornecidos eram inexactos, não sendo os indispensáveis e exigíveis para a concessão do subsídio, de imediato, procederam à restituição dos montantes recebidos, a título de subsídios, nomeadamente da quantia de Euros.39.154,45 (trinta e nove mil cento e cinquenta e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos), tal como resulta dos autos, apesar de, tal como resulta provado na sentença, apenas terem recebido a importância de Euros.6.817,51 (seis mil oitocentos e dezassete euros e cinquenta e um cêntimos).

  24. Logo por este facto se pode concluir que não poderá ter lugar a agravação da incriminação prevista no nº 2 do artigo 36° do Decreto-lei 28/84, de 24 de Janeiro, a qual se encontra afastada pelos próprios factos considerados provados na sentença, atendendo ao facto de que toda a Acusação se encontra estruturada, no que se refere à imputação aos arguidos do crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, na...

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