Acórdão nº 1119/10.5TBPBL-E.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução12 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da segunda secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1. Relatório A 08 de Outubro de 2010, por apenso ao processo de insolvência nº 1119/10.5TBPBL, pendente no 3º juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Pombal, A (…) e E (…) instauraram acção especial para verificação ulterior de créditos contra a Massa Insolvente de MM (…) e esposa MJ (…), os credores dos insolventes MM e MJ (…)e contra os insolventes MM (…) e MJ (…) pedindo que: a) se considere justificado, verificando-o, o crédito dos autores supra reclamado, no total de € 161.481,40; b) se gradue o referido crédito com preferência sobre os demais, mercê do direito real de garantia de que goza, consubstanciado no direito de retenção do imóvel prometido vender; c) se declare separada da massa insolvente a “moradia bifamiliar tipo T4” erigida num lote de terreno “sito na Urbanização Quinta (...) da freguesia de São Silvestre, descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº (...) /20000306 da dita freguesia e omisso na matriz da mesma freguesia e com a licença de construção nº (...) /2002 passada pela Câmara Municipal de Coimbra em 01 de Março de 2002, e sendo a sua prorrogação em 19 de Setembro de 2003 até 01 de Junho de 2004” até que os autores obtenham pagamento da totalidade do seu crédito.

Para fundamentar as suas pretensões, os autores alegam, em síntese, que no dia 01 de Julho de 2004, na qualidade de promitentes compradores, no estado de casados, celebraram com os insolventes, estes na qualidade de promitentes vendedores, um contrato-promessa de compra e venda, livre de ónus ou encargos, relativo a uma “moradia bifamiliar tipo T4” a erigir num lote de terreno “sito na Urbanização Quinta (...) da freguesia de São Silvestre, descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº (...) /20000306 da dita freguesia e omisso na matriz da mesma freguesia e com a licença de construção nº (...) /2002 passada pela Câmara Municipal de Coimbra em 01 de Março de 2002, e sendo a sua prorrogação em 19 de Setembro de 2003 até 01 de Junho de 2004” , tendo entregue aos insolventes, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de cinquenta mil euros, acordando que a marcação da escritura pública de compra e venda ficaria a cargo dos insolventes[1], a qual se haveria de realizar até ao dia 30 de Janeiro de 2005, mas nunca antes dos autores terem vendido o apartamento tipo “T3”, sito na Rua (...) , em Coimbra, de que os autores eram donos, apartamento que foi vendido em 06 de Outubro de 2004. Em 07 de Julho de 2004 os autores e os insolventes celebraram um novo contrato-promessa de compra e venda relativo ao mesmo imóvel para substituir o primeiro contrato, mantendo-se porém todas as obrigações antes enunciadas. Em 14 de Outubro de 2004, autores e insolventes outorgaram um aditamento ao contrato-promessa de compra e venda no qual acordaram o reforço do sinal em mais vinte mil euros, valor que os autores logo pagaram e que a moradia a executar haveria de obedecer a uma “Memória Descritiva” que anexaram a esse aditamento ao contrato. No entanto, em Janeiro de 2005, os insolventes não marcaram a escritura pública do contrato prometido, não tendo sido ainda concluída a moradia, não tendo os insolventes ainda obtido a licença de utilização da moradia cuja venda haviam prometido fazer aos autores. Neste circunstancialismo, os autores comunicaram aos insolventes que haviam perdido o interesse no cumprimento do contrato-promessa, predispondo-se então os insolventes a facultar a imediata ocupação da moradia prometida vender aos autores, o que estes aceitaram. Passados mais de três anos sobre a ocupação da moradia cuja venda foi prometida pelos insolventes aos autores, há ainda trabalhos por realizar, não foi ainda obtida licença de habitação, nem foi marcada ainda a escritura de compra e venda da moradia, tendo os autores, a expensas suas, realizado alguns trabalhos na moradia cuja execução competia aos insolventes, despendendo nesses trabalhos o valor global de € 13.236,04. Entretanto, com o passar do tempo, os autores deixaram de ter interesse na concretização do negócio prometido pois deixaram de ter financiamento aprovado para tal aquisição, divorciaram-se um do outro, pretendendo levar vidas autónomas noutros locais que não o da moradia objecto do contrato-promessa.

Efectuadas as citações nos termos legais, a Massa Insolvente e de MM (…) e MJ (…) veio dar notícia do não recebimento, via citius, da contestação por si tempestivamente remetida, requerendo que seja considerada tempestiva a contestação por si oferecida. Após audição dos autores veio a ser proferida decisão que determinou o desentranhamento da contestação por não terem sido observadas as regras legais sobre subscrição múltipla dos articulados, proferindo-se seguidamente sentença que julgou a acção parcialmente procedente.

Inconformada com esta decisão, a Massa Insolvente de MM (…) e MJ (…) interpôs recurso de apelação contra a mesma, recurso que obteve provimento.

Julgou-se tempestiva a contestação oferecida pela Massa Insolvente de MM (…) e MJ (…), proferiu-se despacho saneador tabelar e fixou-se o valor da causa em € 161.481,40, dispensando-se a selecção da matéria de facto assente e controvertida.

As partes ofereceram as suas provas, requerendo ambas a gravação da audiência final.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, respondendo-se à matéria vertida nos articulados, proferindo-se seguidamente sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, reconheceu aos autores um crédito de € 151.021,34, acrescido de juros de mora à taxa de 4 % contados desde a citação, até integral pagamento, julgando improcedente o pedido de separação da massa insolvente da moradia objecto do contrato-promessa de compra e venda.

Inconformada com a sentença proferida, a Massa Insolvente de MM (…) e MJ (…) interpôs recurso de apelação terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “1.º O presente recurso tem por objecto analisar se a mera resolução do contrato por declaração unilateral, acompanhada da perda do interesse do promitente-comprador e desacompanhada de mora do devedor, preenche a previsão do artigo 808.º, n.º 1 do Código Civil e analisar a qualificação como benfeitorias de despesas suportadas pelos recorridos.

  1. Ao aceitar ocupar a moradia objecto de contrato de promessa os autores evidenciaram com toda a certeza que prescindiam do prazo inicial acordado para a conclusão do negócio e que não o consideravam já essencial; 3.º Os réus não incorreram em mora nos termos do artigo 805.º do Código Civil já que não se trata de um contrato com prazo certo imperativo, a obrigação não provem de facto ilícito e os réus insolventes não impediram a interpelação; 4.º Por não terem incorrido em mora a perda do interesse dos recorridos no negócio não pode ser equiparada ao não cumprimento da obrigação nos termos do n.º 1 do artigo 808 do Código Civil; 5.º Os artigos 801.º e 805.º do Código Civil devem ser interpretados no sentido de que a perda objectiva de interesse do credor na conclusão do negócio prometido só deve conduzir ao não cumprimento definitivo da obrigação por culpa do devedor quando este já se encontrar objectivamente em mora; 6.º A resolução do contrato de promessa de compra e venda operada pelos promitentes-compradores a 20 de Novembro de 2008 não preenche a previsão do disposto no n.º2 do artigo 442.º do Código Civil quando diz que “se o não cumprimento for devido a este ultimo [quem recebe o sinal], tem aquele [quem constitui o sinal] a faculdade de exigir o dobro do que prestou”; 7.º O n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil deveria ter sido aplicado na parte e com o sentido que lhe é dado na parte em que dispõe que “se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue”; 8.º Não podem ser integrados na categoria de “benfeitorias” nos termos do disposto no n.º1 do artigo 216.º do Código Civil o frigorífico, fogão, microondas, máquina de lavar louça e roupa, exaustor e placa de encastrar e caixa de correio em alumínio já que são objectos móveis, independentes do imóvel objecto de contrato promessa; 9.º Não foi alegado ou provado que aqueles bens móveis ainda permanecessem no interior do objecto de contrato de promessa de compra e venda.

  2. Sem prescindir, ainda que se considerassem como benfeitorias úteis, o frigorifico, fogão, microondas, máquina de lavar louça e roupa, exaustor e placa de encastrar e caixa de correio em alumínio podem ser levantados do objecto sem prejuízo da coisa, e como tal, nos termos do n.º 1 do artigo 1275.º do Código Civil não deve a recorrente ser condenada a indemnizar os recorridos pelo seu valor.

  3. São benfeitorias voluptuarias a um piso radiante e alarme por serem objectos que, integrando a coisa objecto de contrato de promessa, não lhe acrescentam qualquer valor ou utilidade.

    ” Os autores contra-alegaram pugnando pela total improcedência do recurso de apelação interposto pela Massa Insolvente de MM (…) e MJ (…) Proferiu-se despacho a deferir requerimento dos autores para esclarecimento do dispositivo, aí se consignando que o crédito reconhecido aos autores goza de direito de retenção sobre o imóvel objecto do contrato-promessa de compra e venda, admitindo-se o recurso interposto como de apelação, com subida nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    As partes foram convidadas para, querendo, se pronunciarem sobre a eventual alteração oficiosa da resposta ao artigo 51º da base instrutória e apenas os recorridos se pronunciaram no sentido de na resposta ao artigo 51º da petição inicial se relevar o conteúdo do documento nº 35 oferecido com a petição inicial.

    Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

    2. Questões a decidir tendo em conta o...

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