Acórdão nº 147/07.2TMAVR-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução23 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório 1. Por apenso ao processo de inventário dos ex-cônjuges R (…) e G (…), no qual o único bem do activo era constituído pelo prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Aveiro, sob o n.º x.../20000211-A, foram reclamados os seguintes créditos: Pelo Ministério Público, em representação do Estado, 1.409,92€, relativos a IMI; Pelo Instituto da Segurança Social, 7.162,11€, relativos a contribuições de R (…), na qualidade de trabalhador independente.

Para além destes créditos, haviam já sido reclamados no próprio processo de inventário, para além de outros, os créditos da Caixa Geral de Depósitos, este garantido por hipoteca registada em 01/08/2000, e de “A(…), Ld.ª”, com penhora registada a seu favor desde 27/10/2006.

A Caixa Geral de Depósitos impugnou o privilégio invocado pelo Ministério Público, alegando que só os créditos inscritos para cobrança no ano de 2008 é que podiam beneficiar do referido privilégio.

O Ministério Público aceitou a impugnação e corrigiu o valor peticionado fazendo-o corresponder ao dos créditos inscritos para cobrança no ano de 2008.

  1. Em 22-05-2012 foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos onde se considerou que: «O crédito sob o n.º 1, na parte inscrita para cobrança no ano de 2008, no total de 754,83€, goza de privilégio imobiliário especial e é graduado em primeiro lugar (art. 748º do C.C.).

O crédito sob o n.º 2 goza de privilégio imobiliário geral sobre o bem imóvel, devendo ser graduado logo após os créditos referidos no art. 748 do CC, isto é: logo depois dos créditos por impostos ao Estado, preferindo à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores (art. 751 do C.C.).

O crédito da CGD goza de hipoteca. A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo - art. 686 do CC - é, por isso, também um direito real de garantia.

O crédito de “A (…)” goza de penhora registada. Pela penhora, o credor adquire o direito de ser pago pelo produto da venda dos bens penhorados com preferência a quaisquer outros credores que não tenham garantia real anterior - nº.1 do art. 822 do Código Civil, graduando-se os créditos garantidos pelas penhoras pela data dos respectivos registos.

Pelo exposto, decido verificar e graduar os seguintes créditos: 1º O reclamado pelo MºPº, relativo a IMI, inscrito para cobrança no ano de 2008, no total de 754,83€; 2º O reclamado pelo I. Segurança Social, no total de 7.162,11€; 3º O da CGD, no total de 108.718,59€, à data de 27.10.2011; 4º O de “A(…)”, no total de 10.705,03€; 5º O reclamado pelo MºPº, relativo ao restante IMI, no total de 655,09€; 6º Os restantes credores (inventário), rateadamente.» ***** 3. Inconformada com a sentença proferida, veio a Caixa Geral de Depósitos, S.A., interpor recurso de apelação de tal decisão, apresentando as seguintes conclusões: «1ª – A sentença de fls. reconheceu - e bem - o crédito reclamado pela ora recorrente CGD , S.A. “ … no total de 108.718,59 € , à data de 27.10.2011 … “, garantido por hipoteca sobre o “… único bem do activo prédio urbano descrito na CRP de Aveiro sob o número x.../20000211-A (…); 2ª - Foi também reconhecido, para além de outros, naquela sentença de fls. - e sem que mereça reparo - o crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social I.P , “…no total de 7.162,11 € , relativo a contribuições de trabalhador independente ” , que “… beneficia de privilégio imobiliário geral …”, nos termos do artigo 11º , nº 1 , do Decreto-Lei nº 103/80 , de 9 de Maio. (…) 5ª - Por Ac. Tc nº 363/2002, publicado no DR , nº 239 , Série I – A de 16/10/2002 , foi declarada “ …. a inconstitucionalidade com força obrigatória geral , das normas constantes do artigo 11º do Decreto – Lei nº 103/80, de 9 de Maio, e do artigo 2º do Decreto-Lei nº 512/76, de 3 de Julho, na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral nelas conferido à segurança social prefere à hipoteca, nos termos do art. 751º do Código Civil”.

  1. - Entendeu o Tribunal Constitucional que tal interpretação viola o princípio da confiança decorrente do princípio do Estado de direito democrático constitucionalmente plasmado no art. 2º da CRP.

  2. - Ao graduar o crédito do Instituto da Segurança Social, IP para ser pago pelo produto da venda do imóvel inventariado com preferência sobre o crédito hipotecário da ora recorrente CGD, S.A. violou a sentença recorrida o preceituado nos arts. 686º, nº 1 e 751º do C. Civil, art. 2º da CRP e a orientação constitucional vinculativa contida no citado Ac. TC. 363/2002».

Termina concluindo que a sentença recorrida seja revogada, proferindo-se acórdão que gradue o crédito da ora recorrente para ser pago pelo produto da venda do imóvel penhorado com preferência sobre o crédito do Instituto da Segurança Social, IP, com as demais consequências legais.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.

***** II. Objecto do recurso[2] A questão a decidir prende-se com a graduação de pagamento aos credores através da venda do imóvel que constitui o único activo do processo de inventário, impondo-se saber se deve haver prevalência do crédito da recorrente Caixa Geral de Depósitos, S.A. garantido por hipoteca, relativamente ao crédito do Instituto da Segurança Social, I.P.- Centro Distrital de Aveiro, que goza de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património do contribuinte à data da instauração do processo executivo.

Para o efeito cumpre, in casu, apreciar as seguintes sub-questões: - qual o regime processual aplicável ao presente recurso; - qual a lei relativa aos privilégios imobiliários aplicável; - infringiu ou não a sentença recorrida o preceituado nos artigos 686.º, n.º 1, e 751.º do Código Civil[3], o artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa[4] e a orientação vinculativa contida no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 363/2002.

***** III. Fundamentação de Facto Ao abrigo dos artigos 713.º, n.º 2 e 659.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e com base nos elementos constantes dos autos, para além dos créditos reclamados e respectivos montantes que constam na sentença de graduação, e não se mostram colocados em causa, resultam ainda provados os seguintes factos, com interesse para a decisão do recurso: - O crédito da Caixa Geral de Depósitos encontra-se garantido por hipoteca registada sobre o imóvel em 01/08/2000; - O crédito do Instituto da Segurança Social, IP, foi reclamado em 14-02-2012, na sequência de citação efectuada para o efeito nos termos do artigo 865.º do Código de Processo Civil, reportando-se às contribuições de R..., inscrito no regime dos trabalhadores independentes, em falta dos meses de Dezembro de 2001 a Novembro de 2005.

***** IV. Fundamentação jurídica IV.1. - Regime processual aplicável ao presente recurso Os presentes autos correm por apenso a processo de inventário instaurado no ano de 2007.

Porém, considerando que a presente reclamação de créditos deu entrada em juízo em 14-02-2012, e o recurso versa sobre a graduação efectuada na sentença aqui proferida, ao recurso é aplicável o regime processual decorrente do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, atenta a previsão ínsita nos respectivos artigos 11.º e 12.º.

***** IV.2. - Lei relativa aos privilégios...

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