Acórdão nº 145/10.9GCLSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR OLIVEIRA
Data da Resolução30 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório No processo comum singular 145/10.9GCLSA do Tribunal Judicial da Lousã o arguido A..., devidamente identificado nos autos, após julgamento realizado na sua ausência, foi condenado pela autoria material de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 204º, nº 2, alínea e) e 202º, alínea e) do Código Penal, na pena de dois anos de prisão.

    Foi ainda condenado a pagar ao demandante B... indemnização no valor de 240 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a notificação até integral pagamento.

    Inconformado com a decisão, dela recorreu o Ministério Público, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões:

    1. Não obstante a gravidade dos factos e as elevadas exigências de prevenção geral associadas ao tipo de ilícito criminal em apreço, afigura-se-nos que não deveria ter sido afastada, como foi, a possibilidade de aplicação de uma pena de substituição da pena de dois anos de prisão aplicada ao arguido, designadamente a suspensão da execução da mesma nos termos do art. 50° do Código Penal.

    B) Com efeito, tal como assinalado na douta sentença em recurso, resultaram diminutas as consequências da conduta do arguido (atento o valor dos bens subtraídos e dos danos causados).

    C) Por outro lado, os antecedentes criminais registados no seu CRC (três) são por crimes de diferente natureza, tendo-lhe sido aplicadas sempre penas de multa.

    O) Ademais, os factos que aqui lhe foram imputados foram praticados antes de duas das referidas condenações (e antes do trânsito em julgado de todas), pelo que o arguido não tinha ainda sido confrontado com a solene advertência ínsita nas decisões judiciais em apreço.

    E) É certo que o arguido se demarcou pela total ausência do processo, em nada contribuindo para melhor compreendermos as circunstâncias em que os factos foram praticados e nada trazendo a juízo que nos permitisse contextualizar a sua vida pessoal, familiar e económica.

    F) Mas se tal circunstância impedia o Mmº Juiz de formular o necessário juízo de prognose ditado pelo art. 50º do Código Penal para decidir (ou não) suspender a execução da pena aplicada, então deveria, a nosso ver, socorrer-se dos elementos de prova que a lei lhe permite obter para compensar a insuficiência dos elementos carreados pela acusação ou pela defesa, ao abrigo do disposto no art . 340º do Código de Processo Penal e em particular do art. 370º do mesmo diploma legal.

    G) Assim averiguava dos factos necessários à escolha e determinação da sanção, nos termos do art.. 71°, n.º 2, do Código Penal e das condições substâncias que permitiam formular uma decisão sustentada em matéria de substituição (ou não) da pena de prisão aplicada.

    H) Não o tendo feito decidiu a questão sem a necessária sustentação probatória, legitimadora do afastamento desta pena de substituição, assim ficando a douta sentença em impugnação ferida do vício contemplado no art. 410º, n.º 2, al. a) do Código de Processo Penal insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

    Nestes termos e nos demais de Direito, que doutamente se suprirão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, deve ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que, mediante prévia averiguação das condições económicas e sociais do arguido e da sua personalidade, pondere a suspensão da execução da pena de dois anos que lhe foi aplicada, assim se fazendo INTEIRA JUSTIÇA! Igualmente inconformado recorreu o arguido A...

    , extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1 - O presente recurso diz respeito apenas à matéria de direito; 2- O recorrente devida e legalmente notificado (com prova de depósito), não compareceu às sessões de julgamento, o que motivou que o mesmo fosse realizado na sua ausência, ausência que determinou a impossibilidade do Tribunal a quo efectuar qualquer juízo de prognose favorável no sentido de que a mera censura do facto e a ameaça de prisão fossem susceptíveis de realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e, por isso, lhe suspender a execução da pena aplicada; 3- Mais se refere na Douta Sentença em recurso que, e no mesmo sentido, se encontra inviabilizada qualquer outra medida de substituição da pena de prisão as quais pressupõem sempre o conhecimento das condições do arguido, ora recorrente; 4- Apesar de o recorrente ter antecedentes criminais, mas por crimes de natureza diferente, este é o único contra o património que lhe foi imputado e pelo qual foi condenado, sendo, no entanto diminutas as consequências da sua conduta, dado o valor dos objectos furtados tal como é igualmente referido na Douta Sentença em recurso; 5- Ao não estar presente nas sessões de julgamento, o recorrente não quis, de modo algum, furtar-se a ter de enfrentar as consequências dos seus actos, tanto mais que, e como melhor decorre dos actos de inquérito, confessou de imediato e sem reservas os factos que lhe eram imputados e colaborou com as autoridades sempre que para o efeito foi solicitado; 6- Uma vez em Portugal apresentou-se de imediato às autoridades onde foi notificado da Douta Sentença em recurso, 7- Procurou trabalho, disposto a fazer o que lhe aparecer, encontrando-se a trabalhar quer no corte de madeira, quer como pedreiro, quer ainda ajudando a mãe em trabalhos agrícolas, tendo ainda promessa de contrato de trabalho para o inicio do próximo ano no carte de madeira; 8- Apesar de pautado a sua actuação pela total ausência pelas razões expostas, recorrente entende que foi prejudicado na aplicação da medida concreta da pena, uma vez que lhe foi aplicada pena de prisão efectiva, quando podia a pena de prisão ser suspensa na sua execução; 9- O arguido/recorrente confessou todos os factos pelos quais foi condenado em sede de inquérito, o que voltaria a fazer em sede de julgamento, encontra-se a trabalhar e, acima de tudo, com vontade de o continuar a fazer, bem como se encontra familiar e socialmente integrado, vive com a mãe, pessoa doente e com parcos rendimentos (€ 246,38 mensais de pensão por invalidez) e que necessita da sua ajuda; 10- Por outro lado, desde a data da prática dos factos não voltou a delinquir, nem os que cometeu antes têm a natureza destes não tendo, por isso, processos pendentes; 11- Pelo que, entende que a simples ameaça da pena é suficiente para o afastar da prática de novos crimes, e que realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, bem como satisfaz, quer as razões de prevenção especial, quer as de prevenção geral; 12- Estão verificados os requisitos do regime de suspensão da execução da pena de prisão previstos no artigo 50°. C. Penal, suspensão simples ou sujeita a condições, com deveres ou regras de conduta nos termos dos artigos 51°. e 52°. do mesmo diploma legal; 13- O Tribunal a quo ao não suspender a execução da pena aplicada ao arguido/recorrente, violou o disposto no artigo 50°. do Código Penal e, consequentemente os princípios, penal e constitucionalmente consagrados, da proporcionalidade e da adequação.

    Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e, consequentemente, ser a Douta Sentença recorrida revogado na parte em que aplicou pena de prisão efectiva ao ora recorrente, assim se fazendo A COSTUMADA JUSTIÇA.

    Não ocorreu resposta aos recursos.

    Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer do seguinte teor: Pela nossa parte, concordamos inteiramente com a argumentação aduzida pelo Magistrado do MºPº na 1ª instância, que subscrevemos e entendemos que a decisão sub judice padece do vício de contradição insuficiência da matéria de facto para a decisão, p. na a) do artº 410° n° 2 do C.P.P. e ainda da nulidade a que se refere o artº 379º nº 1 c) por referência ao artº 374° nº 2 do C.P.P ..

  2. Vício da decisão a) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada Na verdade, características comuns a todos os vícios previstos nas diversas alíneas do artº 410° n° 2 do C.P.P., são o de fundamentarem o reenvio do processo para outro julgamento quando insanáveis no tribunal de recurso (artº 426° e 436° do C.P.P.) e o de resultarem do texto da decisão recorrida, sem influência de elementos exteriores àquela, a não ser as regras da experiência comum.

    Como se refere no Ac. STJ de 12/11/97, in Proc. 325007 in www.dgsi.pt , trata-se de "... vícios de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei.

    Vícios de decisão, não de julgamento como frisa Maria João Antunes (Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Janeiro-Março de 1994, pág 121) Enquanto subsistirem, a causa não pode ser decidida" Seguindo o mesmo aresto, agora no que tange à definição concreta do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, temos que a al. a) do nº 2 do artº 410º do C.P.P. refere-se à insuficiência que decorre da omissão de pronuncia, pelo Tribunal, sobre factos alegados pela acusação ou defesa ou resultantes da decisão da causa que sejam relevantes para a decisão, isto é, decorre da circunstância de o tribunal na factualidade vertida na decisão em recurso quando se verifica que faltam elementos que, tendo resultado da discussão podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação, e em que termos, ou de absolvição.

    O MºPº na 1ª instância alega nas "conclusões" da Motivação apresentada, que não constando da matéria de facto provada qualquer facto sobre as condições pessoais, económicas e sociais do arguido, se está perante o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada p. na a) do artº 410° nº 2 do C.P.P .. e com razão.

    Efectivamente, na matéria de facto provada, relativamente às condições pessoais e económicas dos arguidos, nada consta, parecendo-nos que, uma vez que o arguido não esteve presente em audiência, o tribunal a quo não investigou como podia e devia a...

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