Acórdão nº 51/10.7SAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR OLIVEIRA
Data da Resolução30 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório No processo comum singular 51/10.7SAGRD do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Guarda o arguido A... foi condenado por sentença depositada em 24.10.2011 como autor de um crime de receptação na pena de quatro meses de prisão.

Foi ainda condenado civilmente no pagamento ao demandante B... da quantia de cinquenta euros.

Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido A...

, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões:

  1. A sentença recorrida, embora douta, viola claramente o disposto nos art.ºs 43°, n.º 1, 70.° e 58.° do Código Penal.

  2. A aplicação ao arguido de pena de prisão efectiva não se encontra justificada e foi aplicada em clara violação e inobservância do poder/dever legalmente previsto e que impõe ao Tribunal a substituição da pena aplicada. Para além do mais, apenas terá efeitos nefastos, em nada contribuindo para sua reintegração e ressocialização.

  3. O tribunal "a quo" cometeu ilegalidade por inobservância da obrigatoriedade legal que decorre do disposto no art.º 43.°, n.º 1 do C.P .. Nos termos da mencionada disposição legal, a pena de prisão aplicada, em medida não superior a um ano, apenas não será substituída se a sua execução for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes, o que não se verifica nos presentes autos, nem tal fundamento consta da sentença recorrida.

  4. No caso vertente, a pena de prisão deverá ser substituída por pena de multa ou por prestação de trabalho a favor da comunidade.

  5. Esta pena, para além do papel activo do condenado, chama também a comunidade a participar no restabelecimento da paz jurídica, cumprindo, de forma exacta, a prevenção especial de socialização, não pondo em causa o mínimo exigido pela protecção dos bens jurídicos.

Nos termos expostos e nos melhores de direito, requer a admissão do presente recurso, dignando-se ordenar a substituição da douta sentença recorrida por outra em que se dê provimento ao recorrente.

O Ministério Público na primeira instância respondeu ao recurso, concluindo que deve ser julgado improcedente.

Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer do seguinte teor: No que ao mérito do recurso respeita, pese embora não se acompanhe o pretendido pelo recorrente, ou seja, a substituição da pena de prisão por multa, ou prestação de trabalho a favor da comunidade, uma vez que os seus antecedentes criminais claramente demonstram que as finalidades da punição não seriam atingidas por tais mecanismos, a que acresce, em desfavor, no que respeita à multa, a sua débil situação económica, esses mesmos antecedentes possibilitam ainda, ao que entendo, optar pelo cumprimento da pena em prisão por dias livres, contemplado no art." 450 do CP, não sendo de aplicar na situação uma pena de prisão efectiva consecutiva, já que aquela cumprirá de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Na verdade a sentença justifica a sua opção com as necessidades de prevenção, "uma vez que se corre o risco de o Arguido não compreender, de facto, que as suas acções têm importantes repercussões". Mas, se se atentar no diminuto tempo de pena de prisão em que o arguido foi condenado, claramente se pode concluir que não é por cumprir consecutivamente 4 meses de prisão, em vez de a cumprir em dias livres, que o recorrente se afastará do crime, para além da consecutividade na prisão lhe cortar, ainda mais, os laços ténues que mantém com o tecido social em que se encontra inserido. A pena de prisão por dias livres, ainda não aplicada ao recorrente, se golpeia, mas não secciona, os laços referidos, possibilitará, também, a aludida compreensão relativamente a acções delituosas na medida em que constitui um patamar no qual o mesmo se inserirá e poderá entender o rigor de uma pena consecutiva de prisão, sem contudo ainda a sofrer. E constituirá um último aviso relativamente à conduta que o mesmo pretende trilhar. É, no fundo, uma última tentativa que se deverá fazer e que ainda não foi testada, antes da prisão efectiva consecutiva, tendo ainda em conta que estamos perante uma pena curta de prisão.

Pelo que sou de parecer que o recurso merece provimento mas apenas no sentido do não cumprimento consecutivo da pena de prisão, devendo antes optar-se pelo cumprimento da mesma em dias livres.

Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, o recorrente não respondeu.

Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.

***II. Fundamentos da Decisão Recorrida Constam da sentença recorrida os seguintes fundamentos de facto e de direito que se transcrevem na parte relevante: Fundamentação de Facto: Factos Provados: 1) No dia 29 de Janeiro de 2010, pelas 8 horas, o arguido C... entrou, de forma não apurada, no quarto que o ofendido B..., ocupava na Residencial … , nesta cidade, local onde ambos pernoitaram.

2) Uma vez no interior, retirou de uma mala de cabedal de cor preta, uma carteira em tecido, também da mesma cor, que levou consigo, assim a fazendo sua, contra a vontade daquele.

3) Tal carteira continha os documentos de identificação e outros documentos daquele ofendido, nomeadamente: Passaporte, título de residência, carta de condução, cartão digital, cartão de crédito e multibanco do Banco Espírito Santo e respectivos códigos, cartão da segurança social, cartão de contribuinte, cartão médico, cartão do jumbo, livrete do veículo automóvel … , e ainda um telemóvel de marca Nokia 3310 e outro da mesma marca, modelo N82, a quantia de 23 euros, fotos, uma Bíblia em Russo e papeis vários.

4) Destes objectos foram recuperados a mala preta, a Bíblia Russa, o livrete do veículo automóvel e o passaporte.

5) Nesta mesma data, no estabelecimento de bebidas "…", nesta cidade, o arguido C..., vendeu o telemóvel Nokia N82, em idioma Russo, pelo preço de 50, 00 euros, ao arguido A..., não desconhecendo este que o mesmo havia sido furtado pelo arguido C....

6) Agiu o arguido A... de forma deliberada, livre e conscientemente, representando a possibilidade de adquirir objecto que tinha sido obtido por outrem mediante facto ilícito contra o património, (furto), conformando-se com tal possibilidade visando, dessa forma, obter para si uma vantagem patrimonial, o que veio a conseguir.

7) Tinha, o Arguido, A..., perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida criminalmente.

8) O Arguido foi condenado, no processo nº 202/02.5SAGRD, por sentença proferida em 05/05/2003, transitada em julgado em 20/05/2003, pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203°, nº 1 e 204°, nº 2 do CP e de um crime de receptação, p. e p. pelo art. 231°, nº 1 do CP, na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa pelo período de 2 (dois) anos.

9) O Arguido foi condenado, no processo nº 66/07.2SAGRD, por sentença proferida em 15/10/2007, transitada em julgado em 19/10/2007, pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelo art. 203°, nº 1 do CP na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), num total de €350,00 (trezentos e cinquenta euros).

10) O Arguido foi condenado, no processo nº 514/06.9SAGRD, por sentença proferida em 15/02/2008, transitada em julgado em 25/03/2008, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203°, nº 1 e 204° do CP na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa por 3 (três) anos.

11) O Arguido foi condenado, no processo nº 409/08.1SAGRO, por sentença proferida em 14/01/2009, transitada em julgado em 03/02/2009, pela prática de um crime de furto simples, p. e p. pelo art. 203°, nº 1 do CP na pena de 5 (cinco) meses de prisão, substituída pela prestação de 150 horas de trabalho a favor da comunidade.

12) O Arguido foi condenado, no processo nº 30/07.1SJGRO, por sentença proferida em 29/04/2009, transitada em julgado em 16/06/2009, pela prática de 2 (dois) crimes de furto simples, p. e p. pelo art. 203° do CP, 2 (dois) crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203°, nº 1 e 204°, nº 1, al b) do CP e 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p., pelo art. 203°, nº 1 e 204°, nº 2, al. e) do CP na única de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão, suspensa por igual período, em regime de prova.

13) O Arguido foi condenado, no processo nº 1002/09.7TAGRO, por sentença proferida em 08/10/2010, transitada em julgado em 10/11/2010, pela prática de um crime de falsidade de depoimento ou declaração, p. e p. pelo art. 359° do CP na pena de 220 (duzentos e vinte) dias de multa, à taxa de €5,00, num total de €1.1 00,00 (mil e cem euros).

14) O Arguido não compareceu nos serviços da OGRS para que se procedesse à elaboração do respectivo relatório social.

15) O Arguido encontra-se desempregado, mora sozinho e recorre à cozinha económica.

16) O Arguido encontra-se em vias de perder a sua casa de habitação.

Factos não provados: Com relevo para a boa decisão da causa, provaram-se todos os factos que constavam da acusação.

Fundamentação da convicção do Tribunal O Tribunal fundou a sua convicção, quanto à factualidade dada como provada, a partir da análise crítica do conjunto da prova produzida na audiência de discussão e julgamento e junta ao processo...

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