Acórdão nº 400/10.8TBMGR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução22 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

A espécie, o efeito e o modo de subida do recurso são os próprios, as conclusões das alegações não carecem de ser aperfeiçoadas, não se verifica qualquer circunstância que obste ao conhecimento do recurso e, em nosso entender, as questões a decidir são simples, pelo que estão reunidos os requisitos legais para julgamento sumário do recurso (artigo 705º, do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos), o que se passa a fazer de seguida.

*** 1. Relatório A 03 de Fevereiro de 2012, por apenso ao processo de insolvência referente a L (…) Lda.

foi proferida sentença de graduação e verificação de créditos que homologou a lista dos créditos reconhecidos pelo Sr. Administrador da Insolvência e os graduou nos seguintes termos: “Pelo exposto, e atenta a natureza do bens, e a natureza dos créditos reclamados, graduo os créditos reconhecidos e já verificados, quer inicialmente quer ulteriormente nos respectivos apenso, da seguinte forma, os quais serão pagos com o produto da venda, ou nos termos do plano, nos moldes determinados na lei após dedução das dívidas da massa e custas do processo (cfr. art. 172 do Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas) pela ordem seguinte: Sobre os imóveis inventariados: 1.º) Os dos Trabalhadores; 2.º) Os da Fazenda Pública; 3.º) Os da Segurança Social; 4.º) Os garantidos por hipoteca; 5.º) Os comuns, todos mencionados na lista de créditos actualizada e rectificada conforme supra exposto.

Sobre os bens móveis: 1.º) O dos Trabalhadores; 2.º) O da Fazenda Pública; 3.º) O do ISS, IP; 4.º) Os créditos comuns, ali mencionados.

” A 29 de Fevereiro de 2012, inconformado com a sentença, o Instituto de Segurança Social, IP/Centro Distrital de Leiria veio interpor recurso de apelação contra tal decisão, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “1. Referem-se as presentes alegações ao recurso interposto da sentença de verificação e graduação de créditos proferida no apenso da Reclamação de Créditos do processo de insolvência da sociedade L (…), Lda., no âmbito do qual a Segurança Social reclamou créditos relativos a contribuições obrigatórias e juros de mora decorrente entre Abril de 2001 e Março de 2010, no montante total de € 2.087.729,46 (dois milhões oitenta e sete mil setecentos e vinte e nove euros e quarenta e seis cêntimos).

  1. Os créditos da Segurança Social encontram-se garantidos por quatro hipotecas legais sobre dois imóveis apreendidos a favor da massa insolvente e também por penhor mercantil sobre a universalidade dos bens móveis que compõem o equipamento industrial da insolvente, bem como ainda gozam dos privilégios creditórios mobiliário e imobiliário previstos nos art.ºs 10.º e 11.º do Decreto-lei n.º 103/80 de 9 de Maio (actualmente nos art.ºs 204.º e 205.º do CRCSPSS) e que se mantêm com a limitação prevista no art.º 97.º, n.º 1, al. a) do CIRE.

  2. O aqui apelante – na pessoa da mandatária signatária, atento o estipulado no art.º 253.º n.º 1 do CPC, aplicável ex vi do art.º 17.º do CIRE – não foi avisado pelo Senhor Administrador da Insolvência nos termos do art.º 129.º, n.º 4 do CIRE, o que significa que os seus créditos foram necessariamente reconhecidos na sua totalidade e nos precisos termos dos da reclamação, não tendo sofrido impugnação.

  3. Sucede, contudo, que o Tribunal a quo, na parte da fundamentação da sentença não faz qualquer menção às hipotecas legais de que é titular a Segurança Social, nem ao penhor mercantil, acabando por graduar em quarto lugar os créditos “garantidos por hipoteca” relativamente a ambos os imóveis apreendidos, após os créditos privilegiados dos trabalhadores, das Fazenda Pública e da Segurança Social e, em terceiro lugar os créditos do ISS, IP relativamente ao produto da venda dos bens móveis apreendidos e que se encontram empenhados a favor da Segurança Social.

  4. Ora, apenas os créditos que gozem de privilégio imobiliário especial têm preferência face aos créditos hipotecários, conforme decorre do art.º 751.º do CC. Relativamente aos trabalhadores tal privilégio recairá sobre o imóvel em que prestem efectivamente a sua actividade profissional, cfr. art.º 333.º (anterior art.º 377.º) do CT, e, quanto à Fazendo Pública, apenas os créditos provenientes de IMI gozam de privilégio imobiliário especial relativamente ao imóvel a que diga respeito tal imposto (cfr. art.º 744.º do CC), já não gozando de tal privilégio os demais créditos – designadamente, os provenientes de IRC, IRS e IVA – o que, salvo melhor opinião, não ficou devidamente acautelado na sentença recorrida.

  5. No que diz respeito aos bens móveis, dispõe o art.º 666.º, n.º 1 do Código Civil que “O penhor confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos juros, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel…”, sendo que, no confronto entre esta garantia e os privilégios creditórios gerais, dever-se-á aplicar a norma constante do art.º 749.º do CC – “O privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidos pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente” (n.º 1).

  6. Efectivamente, o privilégio geral não é um verdadeiro direito real, os débitos garantidos são ilimitados, não incide sobre bens determinados, não existindo qualquer conexão com a coisa-garante, é desprovido do direito de sequela e, por não ser sujeito a registo, constitui um ónus oculto. Traduzindo-se, então, em mera preferência de pagamento, que só prevalece sobre os créditos comuns.

  7. Nestes termos, os créditos da Segurança Social que se encontram garantidos por penhor mercantil gozam de preferência de pagamento face aos privilégios mobiliários gerais dos trabalhadores e da Fazendo Pública quanto ao produto resultante da liquidação dos bens empenhados (neste sentido, entre outros, os Ac. N.º 3521/05 do TRC, de 21 de Março de 2006, in WWW.jurisprudencia.vlex.pt; Ac. TRC de 11/10/2005, proferido na Apelação n.º 2239/05, in www.trc.pt e Ac. TRC de 25/3/2010, proferido na Apelação n.º 101/09.0TBMGR-C.C1.

  8. Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida violou a Lei e, em particular, o art.º 666.º, 749.º e 751.º, todos do Código Civil e art.º 333.º (anterior art.º 377.º) do Código do Trabalho.

    ” Não foram oferecidas contra-alegações.

    Solicitaram-se várias certidões ao tribunal a quo de elementos reputados necessários ao conhecimento do objecto do recurso e, obtidos estes, nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

    2. Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 684º, nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da prevalência dos créditos do recorrente garantidos por hipoteca legal e voluntária[1] relativamente aos créditos dos trabalhadores pelo produto da venda do imóvel que não constitua local de trabalho destes e sobre os créditos reclamados pela Fazenda Nacional que não respeitam a IMI relativo a cada um dos imóveis apreendidos; 2.2 Da prevalência dos créditos do recorrente garantidos por penhor mercantil sobre os restantes créditos.

  9. Fundamentos de facto Ao abrigo do disposto no artigo 713º, nº 6, do Código de Processo Civil, aplicável ao presente caso, por identidade de razão, remete-se para os fundamentos da decisão do tribunal a quo a que se aditam os seguintes factos: 3.1 O Instituto da Segurança Social, IP/Centro Distrital de Leiria reclamou nestes autos créditos nos seguintes termos: - a importância de um milhão quatrocentos e um mil e noventa e três euros e três cents, relativa às contribuições obrigatórias dos meses de Abril a Novembro de 2001; Janeiro, Março a Dezembro de 2002; Janeiro de 2003 a Dezembro de 2004; Fevereiro a Setembro e Dezembro de 2005; Janeiro a Dezembro de 2006; Janeiro a Agosto, Outubro a Dezembro de 2007; Janeiro, Julho a Dezembro de 2008; Janeiro de 2009 a Fevereiro de 2010; - juros de mora no montante global de seiscentos e oitenta e seis mil seiscentos e trinta e seis euros...

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