Acórdão nº 1567/10.0TBVIS-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução05 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. No processo 1567/10.0TBVIS, de que os presentes autos são apenso, foi declarada a insolvência de F (…) & J (…) Lda, por sentença proferida em 29.6.2010 e já transitada em julgado.

Declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência com carácter pleno, veio a Administradora emitir parecer nos termos do disposto no art. 188º, nº 2, do CIRE, concluindo que a insolvência deve considerar-se como culposa e que deve ser afectado pela qualificação da insolvência a gerente da insolvente M (…).

Invocou, em síntese, que não cumpriu a obrigação de prestar as contas de 2009, cujo prazo terminou em Julho de 2010; que a contabilidade da insolvente estava irregular relativamente ao ano de 2010; que não cumpriu as obrigações emergentes dos contratos de trabalho, despedindo os trabalhadores sem pagar as indemnizações devidas; tem dívidas à Fazenda Pública, de IMI sobre várias fracções do prédio de Marzovelos; vendeu imóveis da insolvente em benefício de credores e sem entrada de dinheiro, pelo que tais negócios foram resolvidos em benefício da massa insolvente.

Entende que se encontram verificadas as situações previstas no art. 186º, nº 2, a) e h), e nº 3, a) e b) do CIRE.

O Ministério Público emitiu parecer em sentido concordante, considerando que a qualificação da insolvência como culposa, nos termos do art. 186º, nº 2, a) e f) e nº 3, a) e b) do CIRE, deve afectar a gerente de facto e direito M (…) A requerida M (…)deduziu oposição, pugnando pela qualificação da insolvência como fortuita. Mais alegou que tudo fez para que a empresa ultrapasse as suas dificuldades, tentando diminuir o seu passivo com a alienação do património de que dispunha, com o qual realizou negócios vantajosos para a devedora. Referiu ainda que a devedora viu a sua situação agravada por um negócio celebrado com a Caixa Económica Montepio Geral e que deixou de pagar aos trabalhadores em Dezembro de 2009, sendo que ainda estava em prazo para requerer a insolvência da sociedade devedora.

A Comissão de Credores nada disse.

Foi proferido despacho saneador com dispensa da selecção da matéria de facto assente e controvertida. Nessa sequência, a ora recorrente apresentou requerimento probatório, consistente em prova testemunhal e prova documental, assim como requereu a gravação da audiência final. Tal requerimento foi indeferido, por intempestividade.

Procedeu-se à audiência de julgamento, durante a qual foi arguida a nulidade da não gravação da prova, nulidade que foi indeferida.

* A final foi proferida decisão que qualificou a insolvência da devedora “F (…)& J (…), Lda.” como culposa; declarou afectada pela qualificação da insolvência a sócia gerente da insolvente, M (…); declarou M (…) inibida durante 5 anos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa; determinou a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre massa insolvente que sejam detidos por M (…), a qual foi condenada na restituição dos bens ou direitos que já tenha recebido em pagamento desses créditos. Mais determinou que as custas ficassem a cargo da massa insolvente e da requerida M (…), em partes iguais.

* 2. M (…) interpôs recurso, tendo apresentado as seguintes conclusões, que se sintetizam: (…) 3. O Mº Pº apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.

III – Factos Provados 1 - A Sociedade F (…) & JJ (…), Lda, com sede em Viseu iniciou a sua actividade em Junho de 1982, tendo como objecto social a construção e reparação de edifícios e compra e venda de terrenos e edifícios -doc de fls. 16 e seg.

2 - Tem o capital social de 450.000€, assim repartido: - J (…) (falecido em Maio de 2009) ----------157.500€, - M (…) -----------------------------------------157.500€, - J (…) --------------------------------------------67.500€, - C (…) ------------------------------------------67.500€ -doc de fls. 16 e seg.

3 - À data do início do processo de insolvência, para obrigar a sociedade era necessária e suficiente a assinatura de um gerente -doc de fls. 16 e seg.

4 - A insolvência foi decretada por sentença proferida em 29-06-2010 na sequência do pedido formulado por 9 trabalhadores, despedidos em finais de Janeiro de 2010, cuja petição inicial foi remetida a juízo em 14-05-2010 - fls. 2 e seg e 52 e seg dos autos principais.

5 - Na petição inicial que deu início ao processo de insolvência e que não mereceu qualquer oposição da sociedade requerida, os requerentes alegaram que a insolvente deixou de pagar as remunerações correspondentes aos salários dos trabalhadores; que em 31-01-2010 procedeu ao despedimento ilícito dos trabalhadores; que, além das dívidas aos trabalhadores, a insolvente encontra-se numa situação de incumprimento generalizado aos fornecedores; que a requerida tem pendentes contra si diversas acções executivas e acções de condenação para pagamento de quantia certa, tendo sido considerado provado todo esse factualismo na sentença proferida em 29-06-2010 que decretou a insolvência da sociedade F (…) & JJ (…) Lda - fls. 2 e seg e 52 e seg dos autos principais.

6 - A sociedade F (…) & J (…) Lda procedeu ao depósito regular das contas dos anos decorridos até 2008 inclusive - doc. de fls. 16 e seg.

7 - O depósito das contas de 2009 não foi efectuado pela insolvente, terminando o prazo legal para o efeito em fins de Junho de 2010 - doc. de fls. 16 e seg.

8 - À data da declaração de insolvência, a contabilidade da devedora encontrava-se irregular relativamente ao ano de 2010, pelo facto de, com a mudança do sistema contabilístico de POC para SNC, não ter adoptado essa nova norma contabilística, que passou a vigorar a partir de 1-01-2010 - doc de fls. 48 e seg.

9 - No final do ano de 2008, a sociedade F (…)& J(…) Lda tinha um nível de capital próprio que ascendia a 656.904,77€ - doc. de fls. 48-75, 158 e seg..

10 - À data de 31-12-2008, a devedora tinha no seu activo um montante avultado de produtos e trabalhos em curso, relacionado com o prédio cuja construção iniciou em 2007, o qual tinha mais de 20 fracções, ascendendo o montante desses activos a 2.612.686,78€ - doc. de fls.48-75, 158 e seg.

11 - O montante de vendas e prestações de serviços do ano de 2009 ascende a 306.456,28€, que se refere aos activos fixos vendidos em Janeiro de 2009 à sociedade C (…) & Filhos SA, cuja administradora única era simultaneamente a gerente da ora devedora e, nessa dupla qualidade, interveio na escritura de compra e venda - doc. de fls. 32 e seg., 43 e seg.

12 - A venda referida em 11) foi resolvida em benefício da massa insolvente em 12 de Novembro de 2010 - doc. de fls. 25 e seg.

13 - No passivo da sociedade insolvente constam dívidas a instituições de créditos, credores comuns, trabalhadores, Segurança Social, Fazenda Pública, incluindo dívidas de IMI sobre várias fracções do prédio de Marzovelos em construção - apenso de reclamação de créditos.

14 - Os bens relacionados nos mapas de amortizações do ano 2008 e na contabilidade de 2009 não se encontravam disponíveis, por terem sido objecto de venda por escritura pública de 7-01-2009 quatro bens imóveis da insolvente à sociedade Construções (…) & Filhos SA - doc de fls. 32 e seg. e 48-75.

15 - A insolvente tem sede na morada fiscal da empresa (…) & Filhos SA, proprietária do espaço vendido pela insolvente - doc. de fls 43 e seg.

16 - A sociedade F (…) & J (…) Lda efectuou a transferência dos imóveis referidos em 14) sem que de tais vendas tenha resultado a efectiva entrada, nos cofres da devedora, de dinheiro proveniente da sociedade compradora - doc. de fls. 48-75 do PP.

17 - Em Março de 2010 a devedora celebrou escrituras de compra e venda de 3 imóveis que declarou vender a terceiros sem que de tais vendas tenha resultado a entrada de dinheiro, tendo sido acordada com os compradores uma compensação de saldos credores, em relação à devedora, da titularidade dos compradores ou de terceiros com eles relacionados - doc. de fls 338 e seg, 345 e seg, 354 e seg.

18 - As vendas referidas em 17) foram resolvidas em benefício da massa insolvente em 14 de Dezembro de 2010 - acções ordinárias apensas, com vista à impugnação dessas resoluções.

19 - Com o referido em 14), 16), 17), a devedora impediu o pagamento, pelo produto das vendas, das dívidas aos demais credores da devedora.

20 - Na contabilidade da insolvente de 2007, na rubrica do activo circulante constam 3 prédios, especialmente “ ( ..) ”, referidos em 17) por um valor de 1509.778,50€, tendo sido declarado um preço global de venda de 306.920,38€ na escritura de compra e venda celebrada em relação a tais prédios - doc. de fls. 32 e seg., 338 e seg., 345 e seg., 354 e seg.

21 - Os contratos referidos em 17) foram celebrados com Irmãos (…)Lda, V (…) Lda e P (…) Lda, cujos objectos foram respectivamente as fracções E, D e N e F do prédio inscrito na matriz sob o artigo 2430º, sito na Quinta de Baixo em Marzovelos, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Viseu - doc. de fls 338 e seg, 345 e seg, 354 e seg.

22 - Num dos imóveis vendidos localizava-se a sede da devedora - doc de fls. 16 e seg.

23 - A devedora adquiriu à Caixa Económica Montepio Geral, em 11-09-2001, um terreno pelo valor de 163.500.000$00 na expectativa de ali poder construir um prédio com 38 fracções, para o que teve de contrair mútuo com hipoteca nessa mesma instituição devedora - doc. de fls. 204 e seg.

24 - O terreno inseria-se numa área entretanto submetida a um Plano de Pormenor a elaborar pela Câmara Municipal de Viseu e que veio a limitar a área edificável naquela zona - doc. de fls. 204 e seg.

25 - Em consequência do referido em 24), o terreno referido em 23) ficou limitado à construção de apenas 13 fracções - doc de fls. 204 e seg.

26 - Em consequência do referido em 24), o terreno referido em 23) ficou com o valor de 55.934.210$50 - doc de fls. 204 e seg.

27 - A devedora não conseguiu obter judicialmente...

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