Acórdão nº 511/10.0JAAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA VENTURA
Data da Resolução12 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. No Tribunal Judicial de Aveiro, após julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal singular, por sentença de 30-04-2012, o arguido – A..., residente em Rua … , foi: I. Absolvido do crime de tráfico de menor gravidade que lhe era imputado.

    1. Condenado como autor material de um crime de consumo de substâncias estupefacientes, p. e p. no art. 40º nº 2 do Dec-lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 3 (três) meses de prisão efectiva.

  2. Inconformado, o arguido interpôs recurso da sentença, tendo formulado na respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: 1-O presente recurso tem como objecto a matéria de facto e de direito da sentença proferida nos presentes autos.

    2- -A este propósito entende a defesa, que existe um facto relevante que devia ter sido dado como provado, factualidade essa que a dar-se como provada impunha decisão diversa, mormente, a absolvição do arguido pelo crime pelo qual vem acusado.

    3-De facto, de acordo com a prova produzida em audiência de julgamento, não deveria o tribunal a quo ter condenado o arguido, ao referir na sentença que a quantia estupefaciente detida pelo arguido, era superior ao consumo médio individual pelo período de 10 dias, já que o arguido declarou em sede de julgamento que consumia em média um grama por dia, por vezes mais.

    4-Ora, se a quantia detida pelo arguido era de 6, 30 gramas, e o mesmo consumia em média 1 grama por dia não era possível dar como provado que a quantia apreendida excedia o consumo do arguido durante o período de l0 dias.

    5- - Efectivamente em sede de julgamento foi perguntado ao arguido o seguinte: - Quanto é que o Sr. Consumia em média por dia? Arguido: “ Consumia uma grama por dia, ás vezes mais” (Cfr. Declarações proferidas pelo arguido no dia 23-04-2012, tal como se comprova através da acta de julgamento com tal data, sendo que da mesma consta que tais declarações estão gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso nesse tribunal).

    - Esse produto que lhe foi apreendido era só para seu consumo? - Arguido: “ Sim “. (Cfr. Declarações do arguido de dia 23-04-2012, tal como se comprova através da acta de julgamento com tal data, sendo que da mesma consta que tais declarações estão gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso nesse tribunal).

    6- Deste modo, de acordo com a prova produzida em julgamento, prova essa consubstanciada nas declarações do arguido, e na ausência de qualquer elemento de prova que contrarie as declarações do arguido, posição essa que o tribunal deu credibilidade ao mesmo quanto ao destino do produto estupefaciente, não deveria o tribunal a quo dar ter condenado o arguido pelo crime previsto no art. 40 nº 2 da Lei 15193. 22 Janeiro.

    7- Ao invés devia ter dado como provado o seguinte fato” O arguido consome em média uma grama de estupefaciente por dia, por vezes mais” e por conseguinte dar como no provado o seguinte: “ O produto estupefaciente detido pelo arguido excedia a quantia necessária para o seu consumo médio individual pelo período de 10 dias”.

    8- E devia dar como provado e não provado estes fatos indicados sob o n 7 do recurso, de acordo com as declarações transcritas sob o art.º 5 deste recurso, proferidas em sede de julgamento pelo arguido no dia 23-04-2012, e gravadas no sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso nesse tribunal.

    9-Significa isto também, que perante este fato que deveria ser dado corno provado, o tribunal ficando na dúvida quanto ao regime a aplicar, deveria sempre aplicar o regime constante da Lei 30/2000, já que se trata do regime mais favorável ao arguido.

    10-O Tribunal a quo errou ao não valorar, nem manifestar posição em sede de fundamentação de sentença, à concreta situação do arguido e ao prescindir de fundamentar o porquê de não atender ao fato relevante afirmado pelo arguido, que consumia em média uma grama de droga por dia e por vezes mais” (Vide neste sentido, FERNANDO GAMA LOBO. Droga, Legislação, Notas, Doutrina, Jurisprudência, Quid Juris Sociedade Editora, em anotação à norma referida, pág. 101 e à necessidade de verificação do elemento subjectivo).

    11- Nestes termos, deveria o arguido ser punido apenas pela previsão normativa prevista no art. 2n° 1 e 2 da Lei 30/2000, de 29 de Novembro, ou seja, devia ser punido apenas pela prática de uma contra-ordenação.

    12-A sentença recorrida ao não dar como provado e não provado os factos indicados sob o nº 7 deste recurso, verifica-se erro de julgamento que levara à anulação da sentença.

    13- O Mm° Juiz a quo não poderia ter aplicado os limites e valores contidos no mapa anexo à portaria nº 94/96, de 26 de Março, já que do exame laboratorial não consta o peso do princípio activo da Cannabis (resina).

    14- O Princípio activo da cannabis, ou seja, aquele que é responsável pela maioria dos seus efeitos psicotrópicos, é o tetrahidrocanabinol (TTHC). Então para a determinação do estado de toxicodependência é essencial, não só identificar a natureza da substância detida, com vista à demonstração que ela integra as tabelas anexas do Dec-lei 15/93 de 22/1, como ainda também o respectivo princípio activo, ou seja, no caso, demonstrar a percentagem de tetrahidrocanabinol (refere o artigo 9. ° da citada Portaria. (Neste sentido, vide o Ac. RP, de 18.04.2012, Proc. n.º 560/lO.8TABGC.P1).

    15-Como, in casu, não se determinou tal percentagem do princípio activo, qual é a consequência de tal facto? Existem duas posições a este respeito, sendo certo, que qualquer uma delas, impõe a absolvição do arguido pelo crime imputado.

    16- Refere a Jurisprudência do tribunal da Relação do Porto a este propósito: deduzida acusação contra o arguido pela detenção de 12 embalagens com heroína, com o peso liquido de 1,71g, que destinava ao seu consumo, sem que do exame efectuado pelo LPC constem os componentes do produto nem a percentagem do princípio activo, vedado fica ao tribunal conhecer o grau de pureza da substância estupefaciente identificada no produto como, daí, vedado lhe fica o recurso aos valores indicativos constantes o mapa anexo à. Portaria 94/964 Vide neste sentido, AC TRP de 17-02 – 2010, processo nº 871/08.2PRPRT.Pl, n.º convencional JTRP 00043555).

    17- Todavia, há quem entenda trilhar os limites jurisprudencialmente definidos para as quantidades médias para consumo individual durante um dia 18— A titulo de exemplo, o Acórdão do STJ de 15105/1996, proc. N° 48306 da 3° Secção, fixou tal quantidade em 2 gramas para o Haxixe (Vide também neste sentido, tratando-se de Jurisprudência maioritária, senão uniforme, Ac do STJ de 10/07/1991, in 13MJ 409,392; Ac do STJ de 5/2/199l, in BMJ 404, 151, Ac da RL de 9/1/1990, in BMJ, 393, 648; Ac do STJ de 30/01/1990, in BMJ, 393. 319).

    19- Neste sentido, também refere o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 13-10 – 2010, Proc: 46/09.3SFPRT:P1, nº convencional JTRP000, que se aplica sem margem para dúvidas à situação do recorrente, diz-nos o seguinte: “Os valores contidos no mapa anexo à Portaria nº 94/96 não são de aplicação automática. À acusação pelo crime de consumo do art. 40º 2 do Dec-lei nº 15/93 que afirma que o arguido detinha para 20- seu consumo 5,770 gramas de cannabis, mas não diz que essa quantidade excede a necessária para o consumo médio individual pelo período de 10 dias, é manifestamente infundada. Porém neste arresto é referido que, neste contexto, apenas a aplicação automática da Portaria 94/96, suportaria a conclusão de estarmos perante um consumo superior ao assinalado período, que, mesmo assim, não resistiria ao exercício do contraditório já operado no inquérito”.

    21- Ora, o tribunal a quo apesar de não referir nos factos dados como provados que a quantia detida era superior ao consumo médio individual pelo período de 10 dias, nem fazer referência aos valores constantes no mapa anexo à Portaria nº 94/96, acaba por fazer referir-se a esta tabela e respectivos valores na motivação da sentença.

    22- Acontece que O tribunal a quo aplicou tal tabela de forma automática, quando da mesma não consta a identificação do princípio activo da substância, mas apenas a identificação do peso líquido Cfr. Exame laboratorial junto aos autos).

    23- Ora, não podendo o tribunal a quo ter utilizado o critério apontado no mapa da Portaria 94/9õflá que o exame laboratorial indicou apenas o peso liquido, sem determinar a percentagem do produto activo da substância estupefaciente, haveria que utilizar o critério jurisprudencial para aferição e definição das quantidades médias para consumo individual durante um dia e que seriam de 2 gramas para a Cannabis.

    24- Deste modo, atenta a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT