Acórdão nº 245/09.8 GBACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelBR
Data da Resolução12 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I.

Relatório.

1.1. O arguido A...

, entretanto com os demais sinais nos autos, depois de submetido a julgamento, sob a aludida forma de processo comum singular, porquanto acusado pelo Ministério Público da prática de factos que o instituiriam como autor material, sob a forma consumada, de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos art.ºs 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, realizado o contraditório, viu-se condenado, além do mais por ora irrelevante, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 7,00, isto é, na multa global de € 700,00, e a que logo se fez corresponder a prisão subsidiária de 66 (sessenta e seis) dias.

1.2. Porque desavindo com o sancionamento imposto, recorre o dito arguido, extraindo da motivação através da qual minutou a discordância, esta ordem de conclusões: 1. Não foi feita prova de que o arguido tenha cometido os factos constantes da acusação, pelo que deveria ter sido absolvido.

  1. O Tribunal a quo não considerou provados os factos constantes de documentos, designadamente a sua situação de desemprego, e o seu internamento hospitalar em Moçambique.

  2. Não há anúncio de mal futuro se o agente diz à ofendida que lhe dava um tiro nos cornos.

  3. Tal conduta não preenche o tipo objectivo do crime de ameaça agravada.

  4. O mal ameaçado tem de ser futuro.

  5. No caso dos autos, a ameaça proferida esgotou-se naquele momento.

  6. Os factos dados como provados na sentença, conjugados com as regras da experiência comum, são insuficientes e até mesmo antagónicos para que se possa condenar o arguido pelo crime de ameaça agravada, donde a impor-se a sua absolvição, de harmonia com o principio in dúbio pro reo.

  7. Acresce que a factualidade dada como provada para a determinação da medida da pena aplicada ao arguido não permitia ao Tribunal que pudesse fixar a taxa diária da pena de multa a aplicar, condenação em custas e pena subsidiária.

  8. Donde não se compreender em que Factos ou provas o Tribunal a quo se sustentou para formular a sua convicção relativamente à condenação do ora recorrente.

  9. O que tudo significa que a decisão recorrida padece do vício de insuficiência da matéria de facto provada, até porque o Tribunal a quo poderia socorrer-se de prova suplementar, o que não se verificou.

  10. Decidindo pela forma em que o fez, a decisão recorrida preteriu ao disposto pelos art.ºs 40.º; 47.º; 70.º; 153.º e 155.º, todos do Código Penal.

    Terminou pedindo que no provimento do recurso: a) seja ordenada a revogação da sentença proferida, substituindo-se por aresto que o exima da responsabilidade decretada; b), acaso assim se não entenda, seja então ordenada a anulação do julgamento realizado e sua repetição.

    1.3. Acatado o estatuído pelo art.º 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, contra-alegou o Ministério Público, sustentando do improvimento do recurso interposto.

    1.4. Proferido despacho admitindo-o, cumpridas as formalidades devidas, foram os autos remetidos a esta instância.

    1.5. Aqui, no momento processual a que alude o art.º 416.º, do aludido diploma adjectivo penal, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer conducente a idêntico improvimento do recurso.

    1.6. Observado o subsequente art.º 417.º, n.º 2, responderam quer o recorrente, quer a recorrida B...R. Salgueiro, sustentando, respectivamente, do provimento e do improvimento da impugnação.

    1.7. No exame preliminar a que se reporta o n.º 6 do mesmo inciso, consignou-se que nenhuma circunstância determinava a apreciação sumária do recurso, ou obstava ao seu conhecimento de meritis, donde que a dever o mesmo prosseguir seus termos, com a recolha dos vistos – o que sucedeu –, bem como submissão à conferência.

    Urge, pois, apreciar e decidir.

    * II.

    Fundamentação de facto.

    2.1. A sentença recorrida teve como provados os factos seguintes: 1. O arguido, no dia … de Outubro de 2009, cerca das … horas, deslocou-se a casa da mãe de B..., sua ex-esposa, sita na Rua … , área da comarca de Alcobaça, a fim de ir buscar os filhos de ambos.

  11. Em tais circunstâncias de tempo e lugar, B... perguntou-lhe como pretendia resolver a situação dos veículos que ambos detinham enquanto casados.

  12. Foi então que o arguido, o qual se manteve no interior do veículo automóvel, começou a cuspir para o chão dizendo que lhe dava um tiro nos cornos.

  13. B... ficou com receio de que o arguido pudesse vir a cumprir aquela promessa.

  14. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com a intenção concretizada de amedrontar B..., provocando-lhe o receio de poder vir a ser lesado na sua integridade física ou vida.

  15. Sabia o arguido que tal conduta não era permitida e era punida por lei.

  16. B..., após os factos descritos em 3 ficou nervosa e transtornada, tendo, por período não concretamente apurado de tempo, ficado com receio de sair à rua sozinha, passando a andar acompanhada da sua mãe.

  17. B... deslocou-se à GNR de Pataias para apresentar queixa; aos serviços do Ministério Público de Alcobaça; deslocou-se ao escritório do respectivo advogado e às instalações do Tribunal Judicial de Alcobaça a fim de prestar depoimento em audiência de discussão e julgamento.

  18. O arguido encontra-se emigrado em Angola há cerca de 4 anos, deslocando-se, para gozo de férias, ao nosso País.

  19. É considerado pelos familiares como sendo um bom pai, uma pessoa paciente e pacata.

  20. Dos autos não consta que o arguido tenha antecedentes criminais registados.

    2.2. No que concerne a factos não provados, consignou-se na dita sentença, que: Não se provou qualquer outro facto alegado na acusação ou alegado durante a discussão da causa, com pertinência para a decisão desta ou que se mostre em oposição com os dados como provados.

    Nomeadamente, não se provou que B... tenha passado a viver em constante sobressalto, temor e inquietação, que não tenha conseguido dormir.

    2.3. A motivação probatória inserta na aludida sentença determina que: Para a formação da sua convicção fundamentou-se o Tribunal na análise critica e ponderada, à luz dos princípios que regem a matéria, dos meios de prova produzidos e examinados em sede de audiência de discussão e julgamento.

    O arguido não compareceu em julgamento, por estar ausente do país, pelo que não se colheu a sua versão dos factos.

    No que concerne especificamente à dinâmica dos factos e aos factos alegados no pedido de indemnização civil, a convicção do Tribunal formou-se com base nos depoimentos prestados por: - B..., ex-mulher do arguido e queixosa nos autos, a qual depôs de forma emotiva e demonstrando alguma animosidade relativamente ao arguido. Apesar disso, o Tribunal não retirou credibilidade ao seu depoimento, pois que se criou a convicção de que existem algumas questões mal resolvidas decorrentes da dissolução do casamento, sem que tal tivesse levado a testemunha a faltar com a verdade, tendo apenas exagerado na descrição do temor e ansiedade provocados pela conduta do arguido.

    Quanto aos factos relacionados com o pedido de indemnização civil, apesar de se ter inquirido a testemunha a esta matéria, a verdade é que não se pode valorar o seu depoimento nesta parte porquanto o mesmo assume a qualidade de depoimento de parte, já que os factos que alegou e se propôs provar não lhe são desfavoráveis, nem podem ser objecto de confissão. De todo o modo, o Tribunal permitiu a inquirição da demandante quanto a esta matéria apenas para conseguir demarcar e avaliar a credibilidade dos depoimentos das testemunhas que responderam a esta matéria.

    - … , irmão da queixosa e demandante cível, que relatou ter assistido aos factos e que confirmou a matéria que se deu como provada. Este depoimento revelou-se sério e empenhado em auxiliar na descoberta da verdade material. Não obstante a distância a que se encontrava do arguido, a testemunha esclareceu que o tom de voz que aquele usou quando se dirigiu à queixosa lhe permitiu ouvir o que era dito.

    Apenas se ficou na dúvida se a testemunha realmente percepcionou o arguido a cuspir para o chão, porém, atendendo à descrição que efectuou quanto ao posicionamento do veiculo automóvel conduzido pelo arguido, acabou por se conferir credibilidade ao depoimento também nesta parte.

    No que aos factos alegados no pedido de indemnização civil respeita, a testemunha esclareceu que a sua irmã ficou com receio do que pudesse acontecer e que quando saía a pé passou a fazer-se acompanhar da mãe, sendo que esclareceu que a demandante passou a tomar comprimidos para dormir. Para além disso, referiu que a demandante se deslocou à Guarda Nacional Republicana de Pataias para apresentar queixa e especificou que tal deslocação, por corresponder a 20 km, importa o gasto de € 5,00 em...

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