Acórdão nº 2401/11.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | CARVALHO MARTINS |
Data da Resolução | 25 de Setembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: S (…), Requerente nos autos de insolvência de pessoa singular, à margem referenciada, não se conformando com a decisão que indeferiu o seu pedido de exoneração do passivo restante, veio dele interpor recurso de apelação, alegando e formulando as seguintes conclusões: 1. No caso em apreço a Recorrente não violou a condição imposta pela al. d) do n.° 1 do artigo 238° do CIRE, como se entendeu na sentença recorrida.
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O facto da Recorrente ter abandonado a Maia, em 2007 na sequência do divórcio, na altura, sem emprego e sem alimentos para o filho, e ter procurado refúgio juntos dos pais — não se pode concluir daí que, a Recorrente teve consciência de impossibilidade de, só por si, superar a situação difícil que atravessava, e que, se iniciou então o prazo de 6 meses para a sua apresentação. De facto, 3. Quando saiu, veio à procura de nova vida - e conseguiu obter emprego com vencimento de valor igual ao do salário mínimo, mas a que acrescem outros proventos pois, tudo tem feito para melhorar a sua situação (vide declaração de I.R.S. juntas com a petição, e das quais resultam rendimentos bem superiores ao salário base).
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À data da saída (2007) o património estava intacto, (existindo a casa, mobílias, e a empresa de que era único gerente, o ex-marido) — e tal património ficou a ser administrado pela ex-marido, tendo a Recorrente apenas direito à sua meação 5. A casa — Único bem valioso — que fora adquirido por 12.000 contos (59.855,75 €) foi vendido em 2009 - dois anos depois da fuga - por 75.000,00 €, ou seja por valor superior ao capital mutuado - vide relatório do Sr. Administrador e reclamação de crédito do credor.
E, 6. Os outros bens (mobílias) fora extraviadas pelo ex-marido, que tinha a sua posse, e não pela ora Recorrente.
E; 7. Somente, com a notificação à Recorrente, feita pela Agente de Execução em 02.06.2011 (doc. 8 junto com a p.i.) onde lhe era exigido o pagamento de juros na sequência da casa vendida, e de que, tinha ainda juros para pagar em valor superior ao capital mutuado, sendo exigido ainda a indicação de novos bens à penhora - Só então é que a Recorrente tomou consciência de que apesar de estar a trabalhar lutando por melhorar a sua vida, dificilmente tinha perspectivas sérias de melhoria da sua situação económica até porque, o ex- marido, responsável solidário, continua a não pagar alimentos, e, a não pagar ou assumir qualquer pagamento dos débitos comuns.
E, 8. Face a tal consciência — ou seja que era a única que lutava para sair de tal situação, pois o ex-marido, nem o filho ajuda — resolveu então apresentar-se a insolvência, o que fez em 01.09.2011, ou seja cerca de 90 dias depois daquela notificação de 2 de Junho de 2011, ou seja, antes do decurso do prazo legal (6 meses).
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Face a esta factualidade, bem demonstrada nos autos - é claro que, não foi com a fuga, em 2007, que se iniciou o prazo para a apresentação - mas tão-somente, mais recentemente, quando a Recorrente, teve plena consciência de que, só por si, e com a casa já vendida, não tinha perspectiva séria de resolver todos os problemas (dela e do ex-marido).
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Tal prazo de apresentação não é um prazo de caducidade - e de qualquer modo não foi violado pela Recorrente, e, mesmo que se entendesse que tal prazo fora ultrapassado, certo é que, o prazo só por si não leva ao indeferimento, pois, tem que ser acompanhado doutro requisito - que tal comportamento, causou e agravou os prejuízos para os credores, tal como é jurisprudência pacífica, e ainda que tal prejuízo tem que ser provado pelos credores/administradores, pois não se presume E, 11. O credor principal, com a venda, obteve, um valor superior ao capital (75.000,00 €) logo não se agravou a situação, pois, o simples vencimento de juros, hoje não é entendido como prejuízo para efeito de verificação deste requisito (vide jurisprudência pacifica do STJ e da Relação de Coimbra atrás citada)..
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Por outro lado, para além do crédito hipotecário — solidário da Recorrente e do ex-marido — resta uma dívida à Segurança Social de 1.200,00 € - que, no prazo de 5 anos, atentos os rendimentos dela, facilmente pagará, e, o crédito do BES, é um crédito resultante dum aval crédito ainda não exigido ao devedor principal, desconhecendo-se se tal devedor paga ou não o crédito, daí que, também, quanto a este, não possa afirmar-se que o eventual atraso da Recorrente na apresentação, agrave tal crédito — que pode e deve ser exigido não à Recorrente, mas ao devedor principal.
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No decurso de tempo em 2007 (saída da Maia) e a apresentação - não só a situação não se agravou, pois, o credor principal, vendeu a casa e obteve valor superior ao capital mutuado, restante juros por pagar — como, pelo contrário, a Recorrente que fugira sem esperança e sem perspectiva, recuperou a sua vida, já provendo ao seu sustento e do filho, e estando em condições de libertar fundos para em 5 anos, resolver o passivo restante.
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Na douta sentença - presume-se uma situação de impossibilidade de cumprimento, decorrente do divórcio, que não é verdadeiro, e que os factos e elementos dos autos (emprego, venda da casa etc...) provam o contrário, e, presumiu-se que os prejuízos não só existiam, como se agravaram - o que também não é verdadeiro, pois, a simples existência de juros moratórios, não é entendido como prejuízo, para efeito de tal dispositivo legal, e, de qualquer modo, tal prejuízo e agravamento não se pode presumir, como se faz, na douta sentença recorrida — pois como é jurisprudência pacífica, compete ao credor/administrador tal prova, não podendo o julgador presumir e concluir, nos termos em que o fez.
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Neste caso concreto — a Recorrente só, após a venda da casa, e notificação consubstanciada no doc. 8, numa fase em que já obtivera emprego e estabilidade económica, e quando se apercebeu de que o ex-marido nada pagava ou amortizava das responsabilidades conjuntas, é que teve consciência de que dificilmente, só por si, saldaria todas as dívidas, e, só então decidiu apresentar-se - o que fez em tempo.
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Tal situação não agravou o prejuízo já existente para os credores, traduzindo apenas em juros moratórios, pois o capital fora recuperado na totalidade, e tal prejuízo, no conceito da al. d) do artigo 238° do CIRE não pode ser equivalente a existência desses juros — e, de qualquer modo não se presume, competindo a sua prova ao credor/administrador.
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É assim manifesto que, com os dados existentes nos autos, não se podia nem presumir o agravamento dos prejuízos, nem a sua existência, como não se podia entender, como entendeu, que a simples fuga após o divórcio, na procura de melhoria da sua situação - que se verificou de facto - consubstancia uma consciência de impossibilidade de cumprimento, quando é exactamente o contrário (é uma forma de melhoria, e não de agravamento da situação).
Desta forma, 18. Não está verificada, como erradamente se entendeu, a existência dos requisitos previstos da al. d) do artigo 238°, n.° 1 do CIRE — pelo contrário, verifica-se que a Recorrente se apresentou em tempo, e que não existiu nem prejuízo, nem o seu agravamento para os credores, em suma fez-se errada interpretação de tal disposição legal.
Não foram produzidas contra alegações.
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Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: São ocorrências materiais, com interesse para a decisão da causa: Na decisão proferida considerou-se, segundo resulta da alegação efectuada na petição inicial e que foi considerada confessada na sentença que decretou a insolvência, dando por assente que: 1 - A requerente divorciou-se em 08-01-2007, ficando com um filho menor a cargo.
2 - Na sequência do divórcio, o ex-marido, deixou de pagar a pensão de alimentos para o filho, situação que ainda hoje se mantém, obrigando a requerente a abandonar a Maia, pois, à data não tinha emprego e não podia suportar, as suas despesas, e...
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