Acórdão nº 220/12.5TJPRT-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução26 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 220/12.5TJPRT-B.P1-Apelação Origem- 3ª Vara Cível do Porto Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues 5ª Secção Sumário: I- A multa cominada no citado nº 2 do artigo 523.º do CPC, é ao fim e ao cabo uma "pena pecuniária" mas não pode ser um simples somatório de parcelas, conforme o número de documentos juntos, nem pode dar lugar a duas condenações distintas quando apresentação dos documentos é feita no mesmo acto.

II- Embora o direito do locatário seja um direito de raiz obrigacional, assente no dever que recai sobre o locador de proporcionar ao locatário o gozo (temporário) da coisa, para o fim a que ela se destina, a lei faculta-lhe a possibilidade de lançar mão dos meios possessórios instituídos na lei.

III- O que releva, para efeitos de verificação do esbulho violento, nos casos de acção física exercida sobre as coisas, é que essa acção seja um meio de coagir uma pessoa a suportar uma situação contra a sua vontade.

**I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, reformado, residente na Rua …, …-r/c Dtº, veio instaurar o presente procedimento cautelar de restituição provisória de posse contra, C…, residente na Rua …, …, Porto e D… residente na Rua …, …, Porto.

Alega para tanto em resumo que é arrendatário há mais de 30 anos de um anexo para escritório situado junto à sua residência, que não foi formalizado por escrito, mas relativamente ao qual foram sempre emitidos recibos em contrapartida da renda mensal, sendo que, em 1988 foi assinada, pela antiga proprietária e pelo aqui Requerente, uma declaração onde constavam todos os imóveis arrendados.

O acesso a tal escritório sempre foi feito por uma entrada com portão no interior do imóvel junto à sua residência e desde há 30 anos que o utiliza, sem oposição, designadamente dos requeridos.

Acontece que, no dia 28 de Setembro de 2011, da parte da manhã, os requeridos, com a ajuda de alguns empregados, rebentaram as fechaduras do anexo-escritório, destruíram as portas e janelas e parte do seu interior e retiraram de lá todo o seu conteúdo, destruindo ficheiros, móveis, máquina de escrever, entre outros bens, tendo o acesso ao mesmo sido vedado com colocação de chapas.

*Sem audição da parte contrária, produzida a prova arrolada pelo requerente e por se mostrarem preenchidos todos os requisitas legais, foi o procedimento cautelar julgado procedente e em consequência ordenda a restituição imediata ao requerente do anexo existente junto ao … da Rua ….

*Devidamente notificada vieram os requentes deduzir oposição pedindo o levantamento da providência com o fundamento em que, ao contrário do que vem alegado na p.i., o requerente bem sabe que a propriedade do imóvel onde se encontra o anexo, cuja posse reivindica, nos presentes autos, pertence exclusivamente à requerida, há já mais de mais de três décadas, sendo, igualmente, do seu conhecimento que o gozo que o mesmo foi tendo dos espaços inseridos na propriedade da requerida, apenas constituiu uma mera tolerância por parte desta, que apenas se foi mantendo face a promessa do requerente que tal cessaria a curto prazo, o que não se verificou, em face do que se viu forçada a desimpedir o referido anexo para realizar algumas obras de conservação e manutenção do imóvel, mormente, a renovação da vedação e limpeza e reparação de alguns dos anexos, sendo certo que, o requerente nunca lhe pagou qualquer montante a título de renda ou outro pela utilização do espaço em causa.

Conclui, por não se verificarem os respectivos pressupostos, pedindo a revogação da providência decretada e, em consequência ser reconstruída a vedação que por si havia sido construída.

*Por decisão de 30/07/2012 foi julgada improcedente a oposição e, em consequência, mantida a providência anteriormente decretada.

*Não se conformando com a sentença assim proferida vieram os opoentes interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: A - Por despacho de 27/07/2012, constante da acta lavrada da audiência de discussão e julgamento, foram os Recorrentes, C… e D…, condenados em duas multas, a primeira no valor de 2 UC’s e a segunda no valor de 1,5 UC`s pela junção de um conjunto de documentos; B - Porém, quer em virtude dos Recorrentes terem, logo nos articulados respectivos-oposição e requerimento de resposta ao pedido de litigância de má fé, manifestado o seu propósito de apresentar os documentos em causa, assim que os obtivessem, justificando dessa feita, a impossibilidade da sua junção com aqueles, quer considerando o carácter relevante dos mesmos para a apreciação da causa, conforme foi considerado pelo próprio Tribunal a quo, é injustificável a condenação em multa aplicada aos Recorrentes; C - Acresce ainda, que ao conjunto de documentos apresentados, no mesmo acto processual-audiência de julgamento, entendeu o Tribunal a quo aplicar duas multas, decidindo, assim, de forma contrária ao entendimento jurisprudencial dominante, porquanto a referido junção foi requerida no mesmo requerimento e, consequentemente, no mesmo momento, logo no início da audiência, o que apenas motivaria uma única pronúncia por parte do Tribunal recorrido; D - Mais, as multas aplicadas são excessivas à luz do critério da proporcionalidade, considerando a relevância dos documentos para a decisão da causa, bem evidente no facto da inquirição de todas as testemunhas indicadas pelos Recorrentes, bem como o depoimento de parte do Recorrido ter versado, em grande medida, sobre o teor das várias plantas e dos registos fotográficos dos imóveis, que se mostraram imprescindíveis para auxiliar não só aquelas, como o próprio Tribunal; Isto posto, E - O Tribunal a quo decidiu manter a providência cautelar de restituição provisória da posse, não aceitando os Recorrentes, porém, tal decisão, porquanto resulta da sentença recorrida factos que foram julgados incorrectamente, mormente, os pontos 8) - desde “bem como o acesso por parte do Requerente” até ao final), 10) - a partir de “com cerca de 19 m2” até ao final e 12) e cuja prova produzida impunha uma decisão distinta, mais tendo o Tribunal a quo fundamentado a sua decisão numa série de factos que, igualmente, não correspondem à verdade; F - O Tribunal firmou a sua convicção, para tanto, no depoimento prestado pelo Recorrido (com início em 27/07/2012, às 11:06:58 e final em 27/07/2012, às 11:58:28 da gravação da prova produzida em audiência de julgamento) e pela esposa deste, E… (depoimento com início em 27/07/2012, às 15:14:19 e final em 27/07/2012, às 15:56:27 da gravação da prova produzida em audiência de julgamento), que qualificou como rigorosos; G - No entanto, quando analisados, facilmente se constata que são contraditórios e confusos quanto à referida composição e mesmo concreta localização do anexo, resultando dos mesmos várias contradições e imprecisões, designadamente, quanto ao número de passagens existentes entre os dois prédios em análise, pelo que, deve ser alterada toda a matéria de facto cujo fundamento teve por base estes dois depoimentos; H - Quanto ao ponto 10) da matéria de facto provada não compreendem os Recorrentes, como é possível que o Tribunal tenha concluído pela área do anexo-19 m2, quando nenhuma das testemunhas, incluindo, o Recorrido, tenha sequer mencionado tal número, além de que nem das plantas juntas aos autos, se consegue descortinar tal área; I - É, ainda, inaceitável que o Tribunal tenha ilidido a presunção prevista no art. 7.º do Código do Registo Predial, como o fez, com base nos supra identificados depoimentos e apenas em face do alegado uso por parte do Recorrido de dois acessos existentes não só para o anexo, como para toda a área envolvente à residência da Recorrente e cuja propriedade não está em causa; J - Por sua vez, dos pontos 8) e 9) da factualidade provada resulta a existência de duas entradas que permitiam o acesso ao anexo em causa, no entanto, na fundamentação da sentença, o Tribunal recorrido foi além da factualidade que deu como provada e concluiu que “os dois acessos” eram usados pelo Recorrido para aceder ao anexo, o que não encontra correspondência com a prova produzida, mormente, dos depoimentos já acima identificados; K - Mais, foi referido, unanimemente, por todas as testemunhas apresentadas pelos Recorrentes, que o portão que se situa a meio do muro não era sequer visível em virtude da existência, naquele mesmo local, de vasta vegetação, do que se retira que não era feito uso daquele para passagem entre os prédios-vejam-se os depoimentos prestados pelas testemunhas F… (depoimento com início em 27/07/2012, às 25/31 24 11:59:44 e final em 27/07/2012, às 12:26:00 da gravação da prova produzida em audiência de julgamento), G… (depoimento com início em 27/07/2012, às 12:27:07 e final em 27/07/2012, às 12:46:50 da gravação da prova produzida em audiência de julgamento) e H… (depoimento com início em 27/07/2012, às 14:24:40 e final em 27/07/2012, às 15:12:20 da gravação da prova produzida em audiência de julgamento), que justificaram e bem a circunstância de serem frequentadores, há vários anos, da propriedade da Recorrente, pelo que, se impõe uma reapreciação dos mesmos, cuja credibilidade foi colocada, indevidamente, em causa pelo Tribunal a quo; L - Também o facto vertido no ponto 12) da factualidade provada, não encontra correspondência em nenhuma prova produzida, resultando, antes pelo contrário, desta que o Recorrido nunca pagou à Recorrente qualquer montante a título de renda ou a qualquer título (ponto 13) da factualidade provada) e ressaltando dos recibos de renda, a inexistência a qualquer referência ao número de porta do prédio que é propriedade da Recorrente, o n.º 626 e onde se situa o anexo em causa; Por sua vez, M - No que concerne à propriedade do muro que divide os dois imóveis, apesar de não resultar dos factos provados a sua qualidade de muro de meação, considerou, porém, o Tribunal a quo, que “em face da dúvida criada sobre a alegada propriedade exclusiva da...

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