Acórdão nº 1056/09.6TBLSD-D.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução26 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

1056/09.6TBLDS-D.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 1056/09.6TBLSD-D.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 713º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. A acção de impugnação da resolução de acto em benefício da massa insolvente em que não sejam invocados factos extintivos do direito de resolução e apenas se impugnem os factos invocados para fundamentar a resolução impugnada é uma acção declarativa de simples apreciação negativa.

  1. A alegação de inexistência de prejuízo para a massa insolvente ou a inexistência de má fé da contraparte no negócio objecto de resolução não constituem factos extintivos do direito de resolução, mas antes a impugnação dos factos invocados para fundamentar o exercício do direito de resolução pelo administrador da massa insolvente.

  2. O administrador da insolvência está onerado com a alegação e prova dos factos constitutivos do direito de resolução que exerceu em benefício da massa falida, sem prejuízo do que decorre do princípio da aquisição processual (artigo 515º do Código de Processo Civil).

  3. A declaração de resolução deve indicar os concretos fundamentos invocados para legitimar o exercício desse direito potestativo, não podendo a deficiência de fundamentação da declaração de resolução ser suprida na contestação à acção de impugnação da resolução.

    *** * ***Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório A 26 de Janeiro de 2010, no Tribunal Judicial da Comarca de Lousada, B… instaurou a presente acção contra a Massa Insolvente de C… representada pelo Administrador da Insolvência, pedindo que seja revogada a resolução em benefício da massa insolvente relativa ao contrato de compra e venda celebrado a 18 de Junho de 2009, no Cartório Privado da D… e nos termos do qual comprou a C…, pelo preço de € 42.500,00, metade indivisa do prédio urbano sito na Rua …, nº …, …, inscrito na matriz predial respectiva da freguesia de …, sob o artigo 863, requerendo simultaneamente a intervenção principal da D…, S.A.

    e de E…, S.A.

    .

    Para fundamentar a sua pretensão, a autora alegou, em síntese, que na qualidade de proprietária de metade indivisa do prédio urbano sito na Rua …, nº …, …, inscrito na matriz predial respectiva da freguesia de …, sob o artigo 863, e no âmbito do respectivo direito de preferência, adquiriu a C… outra metade indivisa do mesmo prédio, com recurso a crédito bancário contraído junto da D… no valor de 42.500,00 €, importância entregue para pagamento da instituição financeira E… que havia emprestado a C… a quantia monetária para aquisição dessa mesma metade indivisa, não obstante a vontade real deste último ter sido a de intervir como mero fiador, ficando, no entanto, por mero lapso, a constar da respectiva escritura pública como comprador juntamente com a aqui autora, ao tempo sua mulher; que daquela forma apenas quis por fim à “suposta” e “errónea” compropriedade, sem recorrer à anulabilidade do contrato por erro na declaração, altura em que assumiu igualmente os restantes encargos do prédio. Mais invocou que a carta enviada pela ré massa insolvente à A., comunicando-lhe a resolução do referido contrato de compra e venda da metade indivisa com base nos pressupostos dos números 1, 2, 4, e alíneas a), b) e c) do n.º 5 do art. 120.º do Código de Insolvência e Recuperação das Empresas[1] e do art. 123.º do mesmo diploma legal, não apresenta os respectivos motivos. Por último, alega que desde 1996 está separada de pessoas e bens do seu actual ex-marido, de quem está divorciada desde 1998, pelo que desconhecia a situação de insolvência deste último.

    Efectuada a citação da ré, a mesma veio contestar alegando que o seu administrador cumpriu a lei, que a autora sabia do estado de insolvência do seu ex-marido e que a escritura realizada entre os dois teve lugar nos dois anos que precederam o início do respectivo processo de insolvência.

    Foi admitida a intervenção principal activa da D…, S.A.

    e de U…, S.A.

    , procedendo-se à citação das intervenientes.

    A D…, S.A.

    contestou aderindo ao articulado apresentado pela autora e alegando que a venda objecto de resolução não representou qualquer prejuízo para a massa insolvente já que o respectivo valor foi integralmente para o credor hipotecário E… que, assim, não reclamou créditos no processo de insolvência, no âmbito do qual, em face dos valores em causa, fosse esse o caso, o produto da venda da metade indivisa do insolvente sempre reverteria a favor daquele credor hipotecário.

    E…, S.A.

    contestou afirmando que a sua relação jurídica com a autora e o insolvente se encontra extinta por terem sido liquidados todos os montantes mutuados.

    O Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital do Porto veio comunicar a concessão de apoio judiciário à ré na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

    Realizou-se audiência preliminar no decurso da qual se determinou que os autos seguissem a forma ordinária, fixou-se o valor da causa em € 42.500,00, proferiu-se despacho saneador tabelar e procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória.

    As partes ofereceram os seus meios de prova após a realização da audiência preliminar, em prazo adrede concedido.

    Efectuou-se a prova pericial requerida pela ré.

    Designou-se dia para a audiência de discussão e julgamento, ficando a data designada sem efeito em virtude de ter sido deferido requerimento das partes para suspensão da instância por trinta dias.

    Foi junta aos autos informação dando conta da declaração de insolvência da autora, tendo o Sr. Administrador da Insolvência da autora declarado que mantinha o mandato outorgado pela autora nestes autos e que o imóvel inscrito na matriz predial urbano sob o artigo 863 da freguesia de … foi apreendido no âmbito da insolvência da autora.

    Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, respondendo-se à matéria vertida na base instrutória.

    Proferiu-se sentença a julgar a acção totalmente improcedente, absolvendo-se a ré do pedido.

    Inconformada com a sentença, a D…, S.A.

    interpôs contra tal decisão recurso de apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “a)Por douta sentença, ora em crise, veio a ação de impugnação da resolução ser declarada improcedente pela verificação dos respetivos pressupostos previstos no artigo 120.º do CIRE; b) Dispõe o artigo 120.º, n.º 2 que “consideram-se prejudiciais à massa os actos que diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência.” c)No entanto, logrou-se provar que, no caso em concreto, houve um elemento justificativo da não prejudicialidade do negócio à massa insolvente; d)Atendendo ao suposto valor do prédio de € 143.000 que nunca seria vendido por metade de 70% do valor base, o produto da venda da metade indivisa seria exclusivamente utilizado para o pagamento dos créditos garantidos.

    e)Tendo o Banco E…, S.A. duas hipotecas registadas a seu favor e não existindo quaisquer outros credores cujos créditos seriam graduados com preferência àquele, fica demonstrada a não prejudicialidade do negócio, f)Não se pode aferir à prejudicialidade do ato atendendo somente a uma hipótese abstrata de o produto da venda não ser absorvido para a satisfação do crédito garantido.

    g) Não se encontram reunidos os pressupostos para a resolução do negócio em benefício da massa insolvente já que não se verificou qualquer diminuição do ativo do insolvente, pelo contrário, houve uma diminuição do seu passivo em valor muito superior.

    h)Mas, ainda que se considerassem preenchidos todos os requisitos, a referido resolução, tal resolução não é oponível à ora Recorrente, já que a mesma está de boa fé face ao negócio celebrado e à situação de insolvência do vendedor, nos termos do art. 124º nº2 do CIRE.

    i)A Recorrente celebrou dois contratos de mútuo somente com a A. B… que, por sua vez, os destinou à liquidação das hipotecas junto do Banco E…, S.A., sendo aliás exatamente iguais os valores dos contratos de mútuo.

    j) Tendo registado a seu favor duas hipotecas sobre o imóvel referido no artigo 2.º.

    k) Tendo sido constituídos direitos sobre os bens transmitidos em benefício de terceiro e estando a Requerente de boa fé, a resolução do negócio não lhe é oponível nos termos do artigo 124.º, 2 do CIRE.

    L)No limite sempre as hipotecas da D… se devem manter em vigor, por um lado incidem sobre a totalidade do imóvel, encontrando-se apenas a apreendida metade do mesmo para a massa, e estando igualmente apenas em causa a resolução da compra e venda da metade do imóvel.

    M)Sendo uma das caraterísticas fundamentais da hipoteca a sua indivisibilidade.

    N)Por outro lado, face à não existência de má fé por parte da D….

    O)Caso entenda este Douto Tribunal julgar improcedente o recurso e manter a sentença proferida pela 1º Instância sempre se deverá entender que mantendo-se as hipotecas da D…, deverá o crédito desta ser relacionado pelo Sr Administrador de Insolvência”.

    Não foram oferecidas contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

  4. Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 684º, nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redacção aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da não prejudicialidade para a massa insolvente do negócio jurídico objecto de resolução; 2.2 Da qualidade de terceiro de boa-fé por parte da recorrente e dos reflexos desta posição jurídica; 2.3 Da relacionação do crédito hipotecário da recorrente pelo Sr. Administrador da Insolvência.

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