Acórdão nº 2503/12.5TBVFR-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO AREIAS |
Data da Resolução | 13 de Novembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
7Processo nº 2503/12.5TBVFR-A.P1 – Apelação Relator: Maria João Areias 1º Adjunto: Maria de Jesus Pereira 2º Adjunto: Rui Moreira Acordam no Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção): I – RELATÓRIO B… e esposa, C… vieram apresentar-se à insolvência, formulando, ainda, pedido de exoneração do passivo restante, alegando factos tendentes a justificar a concessão deste benefício e concluindo estarem verificados todos os requisitos para o mesmo lhes ser deferido.
Declarada a insolvência dos requerentes, no Relatório por si apresentado ao abrigo do art. 155º do CIRE, o Administrador de Insolvência pronunciou-se no sentido do deferimento do pedido de exoneração do passivo restante.
Na assembleia de apreciação do relatório o único credor presente, D…, S.A., manifestou a sua oposição ao deferimento do pedido de exoneração do passivo restante, sem indicação de qualquer motivo.
Foi proferido despacho a indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelos insolventes.
Inconformados com tal decisão, os insolventes dela vieram interpor recurso de apelação, concluindo a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: 1. Se o devedor for uma pessoa singular, pode ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste.
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Está-se na presença do princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a possibilidade de os devedores singulares se libertarem de algumas das suas dívidas e assim lhes permitir a sua reabilitação económica, inspirado no modelo de “fresh start”, concedendo-lhe a exoneração dos créditos da insolvência que não forem integralmente pagos no processo ou nos cinco anos posteriores ao seu encerramento deste, restando-lhe uma nova oportunidade de vida.
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Para o devedor ter acesso a tal benefício e ser deferido o pedido, a lei impõe que se verifiquem certos requisitos e procedimentos, os quais se mostram fixados nos artigos 236.º a 238.º do CIRE.
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No caso concreto o preenchimento destes requisitos não foi questionado pela Mma. Juiz “a quo”.
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O que o Tribunal a quo considerou é que tais requisitos não são taxativos, e que podem “existir outros fundamentos que determinem o indeferimento liminar, designadamente, a situação de manifesta improcedência do pedido, por não haver quaisquer bens que possam garantir o pagamento de, pelo menos, parte dos créditos, como sucede no caso em apreço, do que resulta a manifesta improcedência do pedido”.
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A concessão efectiva da exoneração pressupõe a não existência de fundamentos para um indeferimento liminar, ou seja, a verificação de alguma das condições previstas no n.º 1 do art. 238.º do CIRE.
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Da análise de todos os motivos que se impõem ao tribunal para averiguação e ponderação para o deferimento ou indeferimento liminar do pedido, resulta que a função do Juiz será a de verificar, mesmo com produção de prova, se necessário, se o insolvente merece ou não que lhe seja dada uma nova oportunidade, ainda que apenas com concretização a prazo de 5 anos, submetendo-o a um período experimental, denominado “período de cessão”, findo o qual poderá terminar em sucesso ou não do mesmo pedido.
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Para ser proferido despacho inicial é necessário que os devedores preencham determinados requisitos e desde logo que tenham tido um comportamento anterior ou actual pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa-fé no que respeita à sua situação económica e aos deveres associados ao processo de insolvência.
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Esta apreciação não é discricionária, obrigando a uma produção de prova e a um juízo de mérito, que consistirá na aferição do preenchimento dos requisitos substantivos que se destinam a perceber se o devedor merece uma nova oportunidade que lhe seja dada e que consiste em se submeter a um período probatório que pode, a final, resultar num desfecho que lhe seja favorável.
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Pese embora o processo de insolvência ter sido declarado findo por insuficiência da massa falida e com decisão transitada, não se torna impossível ou inútil o prosseguimento do processo para averiguação dos pressupostos do artigo 238.º do CIRE.
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Os credores, de harmonia com o disposto no artigo 233.º, n.º 1 al. c) do CIRE, poderão exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamentos e do n.º 1 do artigo 242.º.
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Da conjugação sistemática e da interpretação destes normativos resulta que o encerramento do processo de insolvência decretado na assembleia de credores e de apreciação do relatório, tem os seus efeitos definidos no artigo 233.º, n.ºs 1 e 2, mas dentro destes não está abrangido e nem tem reflexo imediato o pedido de exoneração do passivo restante.
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O legislador não exigiu, como requisito ou pressuposto da concessão da exoneração do passivo restante, que o devedor possuísse bens ou auferisse rendimentos suficientes que pudesse ceder para pagamento aos credores e, nas diversas situações que determinam o indeferimento liminar do pedido – enumeradas no artigo 238.º –, não incluiu a inexistência de rendimentos ou a impossibilidade de o devedor ceder uma parte dos rendimentos auferidos.
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Analisando as várias hipóteses previstas no artigo 238.º do CIRE, verifica-se, no caso em apreço, que: o pedido foi tempestivamente deduzido, não ocorre qualquer das situações contempladas pelas alíneas b), c), e), f) e g) do citado normativo, atendendo-se quanto à alínea f) que dos certificados do registo criminal dos Insolventes nada consta.
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No que tange à alínea d) do n.º 1 do artigo 238.º do CIRE, verifica-se que os Requerentes se apresentaram à insolvência mais de seis meses após evidenciar incapacidade para satisfazer a generalidade das suas obrigações já vencidas.
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Embora esta situação traduza, em abstracto, um prejuízo para os credores, tal não é suficiente para concluir que, no caso concreto, esse prejuízo existe, pois, para tal efeito, não é bastante o simples acumular do montante de juros e o mero atraso na cobrança dos créditos por parte dos credores, sendo necessário que ocorra, em concreto, uma impossibilidade ou dificuldade acrescida na satisfação dos créditos que existiam à data em que se verificou a insolvência, decorrente do aumento do passivo ou da diminuição do activo.
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Do facto de os devedores se atrasarem na apresentação à insolvência não se pode concluir imediatamente que daí advieram prejuízos para os credores, sendo que considerando o preceituado no artigo 342.º, nº/s 1 e 2 do CC, compete ao administrador da insolvência e credores – e não aos devedores - o ónus de prova dos requisitos previstos no n.º 1 do artigo 238.º do CIRE, em virtude de se tratar de factos impeditivos da pretensão de exoneração do passivo restante formulada pelos insolventes.
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Da análise da oposição manifestada...
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