Acórdão nº 207/12.8YRPRT de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS LAMEIRAS
Data da Resolução05 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de ApelaçãoProcesso nº 207/12.8YRPRT --- -----1ª Apelação: (.) Apelante - B…, residente na Rua … nº …, em …, …, em Santa Maria da Feira; (.) Apelada - C…, Companhia de Seguros SA, com sede na Rua … nº .., em Lisboa.

--- -----2ª Apelação: (.) Apelante - C..., Companhia de Seguros SA, com sede na Rua ... nº .., em Lisboa; (.) Apelado - B...

, residente na Rua ... nº ..., em ..., ..., em Santa Maria da Feira.

--- SUMÁRIO: I – Em processo de arbitragem, segmentos decisórios como aquele que julga extemporânea a contestação do demandado ou que o demandante é parte legítima, apenas podem ser impugnados pelo vencido nesses segmentos se ele interpuser recurso da decisão (final) que se pronuncia em definitivo sobre o objecto do litígio, e por adesão a esse recurso (artigos 29º, nº 1, da Lei nº 31/86, de 29 de Agosto [LAV], e 691º, nº 3, do Código de Processo Civil) II – A parte neles vencida, e que os queira impugnar, pode ainda, no contexto recursório da decisão final que haja sido interposto pela parte contrária (nesta vencida), pedir a sua reapreciação, enquanto pressupostos capazes de poderem vir a fazer preterir a viabilidade daquele recurso (artigo 684º-A, nº 1, do CPC); III – Estabelecendo o regulamento de arbitragem a notificação como acto de chamamento do demandado para se defender, e aceitando este como genuíno, para esse efeito, o aviso postal registado que lhe foi enviado, é-lhe subtraída a possibilidade de, depois, vir reclamar a seu favor, para lá do prazo peremptório, ainda período de dilação (artigos 16º, alínea b), da LAV, 198º, nºs 1 e 4, 202º, 252º-A e 254º, nºs 1 e 3, do CPC); IV – Conquanto a ilegitimidade de alguma das partes constitua excepção dilatória, impõe-se ao tribunal o seu conhecimento oficioso (artigos 288º, nº 1, alínea d), 494º, alínea e), e 495º, início, do CPC); contudo, apenas quando os elementos constantes dos autos permitam evidenciar a sua subsistência (artigos 510º, nº 1, alínea a), final, e 660º, nº 1, do CPC); V – Em processo arbitral a falta da apresentação da defesa pelo requerido não acarreta, em princípio, outra consequência que não seja a de a parte faltosa não poder exprimir a sua posição sobre o litígio; e não obsta a que o juiz árbitro, fazendo uso das suas faculdades oficiosas, possa proceder à produção de provas que essa parte aí lhe haja proposto ou sugerido (artigo 265º, nº 3, do CPC); VI – A decisão arbitral carece de ser fundamentada, em particular na óptica de facto (artigo 23º, nº 3, da LAV); padecendo de nulidade se o não estiver (artigos 27º, nºs 1, alínea d), e 3, e 29º, nº 1, da LAV) VII – A densidade dessa fundamentação só será salvaguardada se minimamente for perceptível, por um lado, o escrutínio probatório acerca de cada um dos factos controversos relevantes para a boa decisão da causa (artigo 653º, nº 2, do CPC), por outro, quais deles são os que exactamente constituem a base para o enquadramento normativo do direi-to material aplicável (artigo 659º, nºs 2, início, e 3, do CPC); VIII – Ainda que o tribunal da Relação anule uma sentença arbitral, é-lhe permitido substituir-se à primeira instância e conhecer do objecto do recurso (artigo 715º, nº 1, do CPC); porém, apenas se o processo comportar todos os elementos que sejam necessários a um consciencioso conhecimento; IX – Estando em causa a carência da matéria de facto e (além do mais) a avaliação de prova pessoal, cujo depoimento não foi gravado, não se divisa possível proceder a essa substituição (artigo 712º, nº 1, alínea a), final, do CPC); e nem sequer por via de uma renovação de meios de prova (artigo 712º, nº 3, do CPC), cuja feitura apenas se prevê em apoio à alteração da decisão de facto da primeira instância, em quadro recursório com esse objecto e de viabilidade precedentemente reconhecida (artigo 712º, nºs 1 e 2, do CPC); X – Na hipótese referida em IX –, por já se achar extinto o poder jurisdicional do juiz árbitro (artigo 25º da LAV), deve o tribunal da Relação limitar-se a decretar a anulação da decisão.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1.

O procedimento da arbitragem.

1.1.

B… remeteu reclamação [1] para intervenção do serviço de mediação e arbitragem, do Centro de Informação, Mediação, Provedoria e Arbitragem de Seguros, no litígio que o opõe a C…, Companhia de Seguros SA. Alegou que, no dia 21 de Agosto de 2011, quando seguia ao volante do seu automóvel, de matrícula ..-IE-.., foi embatido por um outro, conduzido por D…, seguro na companhia reclamada; e que o embate só aconteceu por exclusiva responsabilidade desta condutora. Decorrentemente suportou prejuízos; concluindo a pedir que a seguradora seja condenada a pagar-lhe, entre perdas materiais e morais, um total de 68.863,43 €; para lá ainda de uma quantia diária vincenda, por privação de uso do veículo; e também de juros vincendos.

Juntou documentos; arrolou testemunhas; pediu que fosse recolhido o seu depoimento; e, caso necessário, ainda a inspecção ao local do acidente.

1.2.

O processo seguiu para julgamento arbitral.

Por registo postal de 27 de Dezembro de 2011, a seguradora foi notificada “para, no prazo de 10 dias, contestar, bem como apresentar todos os elementos de prova que reputem convenientes” (v fls. 134).

1.3.

Por peça apresentada no dia 13 de Janeiro de 2012,[2] a seguradora contestou; argumentou que os factos que apura evidenciam uma divisão equitativa de responsabilidades dos condutores pela eclosão do sinistro; e terminou a dizer que a reclamação há-de julgar-se em função da prova produzida.

Indicou testemunhas; e juntou documentos.

1.4.

O reclamante respondeu;[3] e para arguir a extemporaneidade da contestação; terminando a pedir o seu desentranhamento e o seguimento do pro-cesso como se ela não existisse, “com a decisão segundo o direito constituído (artigo 12º, nº 1, do RSMAS), sem prejuízo do disposto no artigo 14º do RAC do Cimpas”.

A essa resposta, respondeu a reclamada;[4] invocando beneficiar de 5 dias de dilação na contagem do prazo para contestar (artigo 252º-A, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil); bem como, e de todo o modo, sempre o juiz árbitro dispor de todos os elementos no processo para bem julgar. Ademais, ainda aproveitou para invocar ilegitimidade do reclamante, por não ser ele, mas a sociedade E…, Ld.ª a proprietária do veículo que conduzia.

Voltou a responder o reclamante;[5] mantendo a tese da intempestividade da contestação; afirmando a incongruência da excepção de ilegitimidade deduzida; pedindo a censura da reclamada como litigante de má-fé; e, por fim, a título subsidiário, suscitando o incidente da intervenção principal provocada da identificada sociedade.

A reclamada pronunciou-se ainda;[6] para dizer nada opôr à pedida intervenção; mas rejeitar a censura por litigância de má-fé.

1.5.

Foi designado dia para a audiência de julgamento.

No início dela o reclamante juntou peça para exercício do direito ao contraditório, relativamente às excepções substantivas deduzidas pela demandada na sua contestação”;[7] findando por dizer deverem ser “julgadas improcedentes”; e aproveitando, ainda, para requerer a junção de mais documentos.

Entretanto, intui-se que foram ouvidas testemunhas; e que foi suspensa a audiência.[8] Aproveitando o reclamante, nesse intermédio, para, em novo requerimento,[9] solicitar outras diligências probatórias.

Houveram novas pronúncias da reclamada; sobre a peça apresentada em audiência,[10] e sobre a outra subsequente, ambas do reclamante.[11] Respondendo-lhe, outra vez, este.[12] 1.6.

O juiz árbitro produziu a decisão arbitral (v fls. 320 a 326).[13] E nela decidiu-se: (1) ordenar o desentranhamento da contestação por extemporânea; (2) não existirem excepção ou questões prévias a obstar ao conhecimento de mérito; e (3), com fundamento numa “repartição igualitária da culpa do acidente de ambos os condutores”, em julgar “a reclamação parcialmente provada, por procedente, condenando-se a reclamada a pagar ao reclamante, … a quantia de 11.338,00 € (onze mil trezentos e trinta e oito euros)”.

A decisão foi notificada às partes.[14] 2.

As (2) instâncias recursórias.

2.1.

O reclamante inconformou-se; e interpôs recurso.

2.1.1.

Alegou; e findou com as conclusões se transcrevem.

i.

O presente recurso tem por fundamento principal, a impugnação da decisão arbitral, nos termos do disposto no art.º 676.º, n.º 1, do CPC ex vi art.º 20.º, n.º 2, do RAC do Cimpas, visando a alteração da decisão ou a sua anulação (art.º 685.º-A, n.º 1, do CPC), que inclui a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto (art.º 685.º-B, do CPC, com os fundamentos previstos no n.º 1, do art.º 712.º, do CPC), tendo por desiderato a regra da substituição ao tribunal recorrido, nos termos e ao abrigo do disposto no art.º 715.º, do CPC; CONSEQUÊNCIA DERIVADA DA EXTEMPORANEIDADE DA CONTESTAÇÃOii.

Nos presentes autos, foi concedido provimento à excepção de extemporaneidade da apresentação contestação da Demandada/Recorrida, por não ter sido respeitado o aludido prazo e ordenado o desentranhamento de tal articulado; iii.

Embora não seja estabelecida a cominação de confissão dos factos articulados pelo Demandante, o art.º 9.º, n.º 5, do Regulamento de Arbitragem e Custas do Cimpas (RAC) estatui que “Na falta de contestação, o Juiz Árbitro decidirá com base nos elementos constantes do processo”; iv.

A intenção do legislador, na previsão do n.º 5, do art.º 9.º, do RAC consistiu em que o Juiz Árbitro esteja vinculado a decidir imediatamente, tendo apenas por base os elementos constantes do processo nessa fase processual, os quais circunscrevem-se ao alegado na petição inicial e os documentos ou outros elementos probatórios juntos ou suscitados pelo Demandante; v.

Sendo inadmissível ao Juiz Árbitro decidir com base em qualquer “posição”, “alegação”, “comunicação” ou prova apresentada pela parte demandada, como sucedeu in casu; vi.

Tendo a decisão de extemporaneidade sido proferida na própria decisão arbitral (sentença final), a consideração nesta de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT