Acórdão nº 1/09.3TAVLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução11 de Julho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo comum singular 1/09.3TAVLG do 2º Juízo Criminal da Maia Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – Artur Oliveira Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No processo supra identificado em epígrafe, 1. deduziu o Magistrado do MP acusação contra o arguido B…, imputando-lhe a prática de factos que qualificou como susceptíveis de integrar, a prática, como autor material e sob a forma consumada, de um crime de falsificação de documento, p. e p. à data dos factos, pelo artigo 256º/1 alínea b) C Penal e, actualmente, pelo artigo 256.º, alínea d) do mesmo diploma e, 2. deduziu o ofendido C…, pedido de indemnização civil contra o arguido B… e contra o D…, S.A., peticionando a sua condenação solidária no pagamento da quantia € 75.250,00, acrescida de juros legais, correspondente ao dano de natureza patrimonial que alega ter tido.

Efectuado o julgamento foi proferida sentença, onde se decidiu: 1. como questão prévia, julgar o tribunal materialmente incompetente para conhecer o pedido de indemnização civil formulado por C… contra o D…, SA. e, em conformidade, se absolveu o réu/demandado da instância; 2. julgar a acusação totalmente procedente por provada e em consequência se condenou o arguido B…, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256º/1 alínea d) C Penal, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 7,50, o que perfaz a quantia total de € 1.350,00 e, 3. julgar a parte subsistente do pedido de indemnização civil, totalmente procedente por provado e em consequência se condenou o demandado B…, a pagar ao demandante C… a quantia de € 75.250,00 , acrescida de juros moratórios contados à taxa legal desde a data da notificação ao demandado do pedido.

  1. 2. Inconformados, com o assim decidido, quer quanto à questão prévia, quer na parte condenatória da sentença, interpuseram recurso, respectivamente, o demandante e o arguido, apresentando, cada um, aquilo que qualificam como de conclusões, mas que nem num sentido deveras abrangente do que se deve entender como de resumo das razões do pedido, se pode qualificar como tal e, que por isso aqui se não procede à sua transcrição, apenas se enunciam as questões aí, por ambos, abordadas: - quanto ao recurso do demandante: andou mal a decisão recorrida ao julgar o tribunal a quo incompetente, m razão da matéria, para conhecer da eventual responsabilidade civil extra-contratual do demandado D…, SA.; isto porque, nos termos do artigo 73º/1 C P Penal o pedido de indemnização civil pode também ser deduzido contra pessoas com responsabilidade meramente civil, como é o caso do demandado D…, SA.; e o demandado aceitou a revogação do cheque por conta da declaração do arguido e dessa forma recusou o seu pagamento durante o período de apresentação a pagamento previsto no artigo 29º da LUCheq, violando o disposto no artigo 32º do mesmo diploma, o qual aponta para a ineficácia de qualquer ordem de revogação dos cheques durante o prazo legal de apresentação, o que o faz incorrer em responsabilidade civil por factos ilícitos, nos termos dos artigo 14º do Decreto 13004 e 483º C Civil; o conhecimento desta questão deve ser feita neste processo, invocando o princípio de adesão, por razões de celeridade, eficácia e economia, que estão na génese daquele; o que acontece, de resto, nas acções destinadas à efectivação de responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, em caso e existência de seguro, em que é admissível a intervenção principal provocada no âmbito de pedido de indemnização civil; - quanto ao recurso do arguido: deve ser considerado que quem tem legitimidade para apresentar queixa, bem como para deduzir pedido cível, é E…, que era o portador do cheque, que figurava como tomador e que foi quem o apresentou a pagamento e, não, que o fez, em ambos os casos, C…, que não foi beneficiário de qualquer endosso e que pese embora seja exequente no processo que conduziu à penhora, não tinha legitimidade para o fazer; donde deve ser revogada a decisão recorrida que deve ser substituída por outra que por falta de legitimidade, julgue extinto o procedimento criminal contra o arguido e deve ser julgado improcedente o pedido cível, pela mesma falta de legitimidade de quem o formulou; por outro lado, o tribunal não poderia julgar como provado, o ponto 3. dos factos provados, no que respeita ao facto de ter participado no acordo celebrado entre o exequente e o executado F…, invocando, para tanto, as suas próprias declarações e o depoimento da testemunha, seu pai, F… e do funcionário bancário, G…, que o cheque haja sido emitido e entregue ao ofendido para pagar uma dívida, sendo este o seu legítimo portador, até porque da análise do cheque resulta que o mesmo foi preenchido pelo arguido á ordem de E…, que era o seu legítimo portador; também dos depoimentos transcritos na motivação, resulta a verificação do vício da vontade, declarado por si próprio, pois que o cheque foi emitido e entregue sob forte pressão psicológica e sem ter a noção das consequências do seu acto; quanto aos pontos 10. e 11. o arguido não alcançou para si ou para terceiros, um benefício, pois que por virtude do cheque passou a ser executado, em outro processo, juntamente com o seu pai e, mesmo que assim se não entenda o portador poderia proceder á execução do cheque, que foi apresentado a pagamento dentro do prazo legal e não foi por causa da sua declaração relativa à existência de erro e vício da vontade que o ofendido viu frustrada a sua cobrança; os pontos 8. e 9. e parte do 3., atentos os depoimentos das testemunhas F… e H…; o tribunal deveria ter julgado como provados todos os factos julgados como não provados, atentos os depoimentos transcritos, teria que se julgar como provado que o arguido desconhecia que se tinha constituído fiador, com renúncia ao benefício da excussão prévia, que em momento algum lhe foi explicado tal instituto, nem quais as legais consequências dele resultantes, bem como que não estava consciente da obrigação que estava a assumir; discorda depois do julgamento acerca da subsunção dos factos no tipo legal de falsificação, ideológica, que exige que o acto exarado em documento além de falso seja também, juridicamente relevante; voltando, neste segmento a defender que o ofendido não ficou impedido, por via da sua conduta, de obter a cobrança coerciva do seu crédito, pois que o arguido por virtude da emissão do cheque, passou, também a executado; e poderia o portador do cheque proceder à sua execução, dado que foi apresentado a pagamento dentro do prazo legal, pelo que nunca seria por causa da sua declaração da existência de erro e vício da vontade que viu frustrada a cobrança do seu crédito; donde, mesmo que se considere como falsa a sua declaração, a mesma não tem relevância jurídica, ficando, por isso, fora do alcance da norma contida no artigo 256º/1 alínea d) C Penal; donde, afirma que não resulta verificado o elemento subjectivo do tipo, a intenção de causar prejuízo a outrem ou ao Estado ou de alcançar para si ou para outrem um benefício ilegítimo, o que se traduz num dolo específico.

  2. 3. Apenas o D… respondeu ao recurso, apresentado pelo demandante cível pugnando pelo seu não provimento.

  3. Subidos os autos a este Tribunal, dele teve vista o Exmo. Sr. Procurador da República, que emitiu parecer, reportado tão só, ao recurso da parte criminal, no sentido da improcedência do recurso interposto pelo arguido.

    Seguiram-se os vistos legais.

    Teve lugar a conferência com observância de todo o legal formalismo.

    Cumpre agora apreciar e decidir.

  4. Fundamentação III. 1. Como é por todos consabido, são as conclusões, resumo das razões do pedido, extraídas pelo recorrente, a partir da sua motivação, que define e delimita o objecto do recurso, artigo 412º/1 C P Penal.

    Assim, as questões suscitadas pelos recorrentes, para apreciação pelo tribunal de recurso, são, atendendo à sua precedência lógica, as seguintes: 1. recurso do demandante saber se o D…, SA. assume a qualidade, exigida pelo artigo 73º/1 C P Penal, de pessoas com responsabilidade meramente civil, para efeito de poder ser demandado no pedido cível deduzido pelo demandante; 2. recurso do arguido: saber se, quer a queixa, quer o pedido cível, foram apresentados por quem para o efeito dispõe de legitimidade; saber se existem factos erradamente julgado e, a questão da subsunção dos factos ao Direito.

  5. 2. Vejamos então, o mérito de cada um dos recursos.

  6. 2. 1. Recurso do demandante III. 2. 1. 1. É do seguinte teor o segmento da sentença reportada à questão prévia, cuja decisão vem impugnada pelo demandante cível: “o ofendido C… formulou pedido de indemnização civil contra o arguido e contra o D…, S.A.

    , pretendendo ser ressarcido de danos patrimoniais, peticionando, assim, a condenação solidária no pagamento da quantia € 75.250,00, acrescida de juros legais.

    Alega, para o efeito, que o D…, S.A.

    tem legitimidade passiva pois que ao abrigo do artigo 73º/1 C P Penal, o pedido de indemnização civil pode ser deduzido contra pessoas com responsabilidade meramente civil.

    Na contestação apresentada ao pedido de indemnização civil, o D…, S.A.

    suscita, como questão prévia, o facto de a matéria que eventualmente fundamentaria a responsabilidade do Banco, se tratar de matéria cuja apreciação cabe apenas e tão só aos tribunais civis.

    Vejamos se lhe assiste razão.

    Por força do princípio da adesão, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei (artigo 71º C P Penal quer antes quer depois da revisão operada pela Lei nº 59/98 de 25 de Agosto).

    A dedução do pedido cível em processo penal é a regra e a dedução em separado a excepção (vide artigos 71º, 72º e 75º C P Penal), sem prejuízo de quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização inviabilizarem uma decisão rigorosa...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT