Acórdão nº 503/11.1TJVNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelFILIPE CAROÇO
Data da Resolução11 de Julho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 503/11.l TJVNF.P1– 3ª Secção (apelação) Juízos Cíveis de Vila Nova de Famalicão Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Teresa Santos Adj. Desemb. Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, casado, residente na Rua …, n.º ., freguesia de …, Vila Nova de Famalicão, instaurou processo especial de inquérito judicial contra: 1. C…, LDA, com sede na …, n.º …, ….-… freguesia de …, Vila Nova de Famalicão; 2. D…, casado, residente na Rua …, n.º .., r/c, ….-… Braga; 3. E…, casado, residente na …, n.º …, ….-…, na referida freguesia de …; e 4. F…, casado, residente na Rua …, nº .., ….-… …, Vila Nova de Famalicão.

Alega, aqui em síntese, que a 1ª R. é uma sociedade comercial que se dedica à indústria e comércio de máquinas, com o capital social de € 105.000,00 na qual todos os sócios foram nomeados gerentes no contrato de sociedade, apesar de se obrigar suficientemente com a intervenção de dois deles.

Após vicissitudes ligadas à cedência de quotas, o capital social está actualmente distribuído por oito quotas, quatro delas no valor unitário de € 15.000,00, igualmente distribuídas pelo A., 2º, 3º e 4º R.R., sendo cada um dos dois últimos R.R. ainda titulares de uma quota no valor de € 7.500,00.

Aproveitando a desnecessidade da intervenção do autor, os 2º, 3º e 4º R.R. levam a cabo toda gestão da sociedade sem lhe dar qualquer informação, sem prestarem contas e sem lhe permitir qualquer intervenção activa nos negócios da sociedade, deixando-o numa posição em que não tem contactos com clientes ou fornecedores, não tem acesso à facturação ou qualquer elemento contabilístico e não tem acesso a contas bancárias, seus extractos ou movimentos, tratando-o como um trabalhador da empresa ao qual até já enviaram uma carta de despedimento. Além disso, estão a delapidar o património social desde há vários anos lesando também, com gravidade, o património do A.

Com vista a aumentarem a sua remuneração sem alterarem a do A., os 2º, 3º e 4º R.R. deliberaram, por duas vezes consecutivas, em assembleia geral realizada no dia 21.5.2007 e em 31.3.2010, em atribuir a si mesmos gratificações, com o argumento de que se empenham mais na sociedade do que o A., o que não corresponde à realidade. Aumentaram assim a sua retribuição em detrimento da remuneração do A. não obstante a sua falta de acordo, também com prejuízo para a sociedade.

O 2º R. renunciou à gerência em 1.3.2010 e são agora gerentes apenas o A. e os 3º e 4º R.R., detentores da maioria do capital.

Alegando ainda que o direito à informação é um direito fundamental dos sócios, invoca o seu direito à obtenção, pelos gerentes, da informação verdadeira, completa e elucidativas sobre a gestão da sociedade, facultando-lhe também a consulta da respectiva escrituração, livros e documentos, destinando-se ainda o inquérito judicial a obter a redução, por via judicial, das remunerações dos 2º, 3º e 4º R.R.

Para tanto formulou o seguinte pedido, ipsis verbis: «Nestes termos e nos mais de direito que V. Ex.a mui doutamente suprirá, deverá o presente processo seguir os seus termos, conforme disposto nos art°s 1479° e segs. CPC, para serem efectuadas as diligências pertinentes à averiguação dos factos alegados.

Mais requer que, nos termos do disposto no art. 255° do Código das Sociedades Comerciais, que as gratificações referidas nos anteriores artigos 25° a 29° atribuídas aos segundo, terceiro e quarto réus, sejam consideradas remunerações variáveis, e que em consequência seja reduzida e fixada no valor máximo de 1.600,00 € a remuneração de cada gerente, devendo ainda os segundo, terceiro e quatro réus restituírem à primeira ré a quantia de (9.600,00 € x 2) 19.200,00 € correspondente aos montantes das gratificações que receberam indevidamente.» Citados, todos os R.R. contestaram a acção, em peça única, considerando que o A. não alegou factos concretos justificativos e adequados à sua pretensão e ao processo utilizado, designadamente que alguma vez lhe tivesse sido negada informação solicitada ou que esta fosse falsa, incompleta ou não elucidativa. Tem, aliás, acesso a todas as informações da sociedade e é regularmente convocado para todas as assembleias gerais da sociedade, entre elas de aprovação de contas e deu voto de aprovação das contas de exercício de 2006, 2007, 2008 e 2009.

Além disso, impugnaram parcialmente os factos da petição inicial, fazendo notar que o A. pode exercer e exerce os seus poderes de gerente e pratica vários actos a ela inerentes, não praticando outros porque não quer.

Por outro lado, no que concerne à remuneração dos sócios, os 2º, 3º e 4º R.R. são também trabalhadores da empresa e trabalham fora do horário normal de trabalho, mesmo com deslocações ao estrangeiro e abdicando de descanso, ao fim-de-semana inclusive, ao contrário do A. que se limita a cumprir este mesmo horário, nas instalações da empresa. Daí a fixação da gratificação, sem que se deixasse de atender aos resultados líquidos favoráveis da sociedade, que também distribuiu dividendos, incluindo ao demandante e prémios aos trabalhadores.

Só a partir de 2008 é que o A. começou a votar contra a deliberação de atribuição de gratificações aos gerentes aqui R.R. e sabe bem porquê que têm sido atribuídas. Os respectivos montantes não são gravemente desproporcionados, nem tão pouco constituem um aumento da remuneração dos gerentes réus em detrimento do autor visto serem atribuições esporádicas, sem carácter de regularidade ou obrigatoriedade.

E fazem culminar a contestação com os seguintes termos: «Deverá a presente acção ser considerada improcedente e, em consequência:

  1. Não deverá ser ordenada a realização de qualquer diligência nos termos peticionados pelo autor; b) Não deverão os réus gerentes ser condenados a restituir à primeira ré a quantia de 19.200,00 € por não corresponder a um montante recebido indevidamente, nem, de qualquer modo, ver reduzida a sua remuneração de gerência.» (sic) O A. apresentou articulado superveniente, sobretudo comentando o relatório de contas do exercício relativo ao ano de 2010 e a forma discriminada como se considera tratado relativamente aos R.R. pessoas físicas na distribuição de dividendos.

    Os R.R. exerceram o contraditório, reafirmando a não omissão de qualquer informação ao A. e a não invocação por ele de factos que possam impedir o exercício desse direito. No que respeita ao aumento das suas gratificações, por eles mesmos votadas e aprovadas, continuam a justificá-lo pelo seu maior esforço e desempenho a favor da sociedade quando comparados com o do A. que recebeu os dividendos a que tinha direito.

    Foi ordenada e realizada perícia colegial à contabilidade da sociedade.

    Frustrou-se o objectivo de conciliar as partes (cf. acta de fl.s 202 e 203).

    Foi então proferida decisão que julgou o inquérito judicial à sociedade improcedente e, em consequência, absolveu os R.R.

    Inconformado, o A. apelou daquela decisão, com as seguintes CONCLUSÕES: «

    1. A douta sentença recorrida parte de uma premissa que, no nosso modesto entendimento, é manifestamente errada e que parece ter inquinado todo o seu raciocínio. Com efeito, o Tribunal “a quo” partiu do princípio que o Autor solicitou a realização do presente inquérito apenas com fundamento em alegada recusa de informação ao sócio plasmada no art. 268º do CSC. No entanto, tal não corresponde à verdade.

    2. Com efeito, o Código das Sociedades prevê diversas situações em que se pode requerer um inquérito judicial a uma sociedade, nomeadamente: a) falta de apresentação das contas de exercício (art. 67º CSC) ou recusa na sua aprovação (art. 68º/2 CSC); b) a recusa, incompletude ou falsidade de informação (arts. 292, 181º/6, 450º,216º, 292/2 e 6, todos do CSC) c) a deliberação ilícita de distribuição de bens aos sócios (art. 31º/3 CSC); d) a redução da remuneração dos gerentes (art. 255º/2 CSC) C) Ora, dos factos alegados pelo Autor nos seus articulados, nomeadamente nos arts. 17º a 37 da sua p.i., constata-se que aquele fundamentou também o seu pedido também na: deliberação ilícita de distribuição de bens aos sócios (art. 31º/3 CSC) e, sobretudo, na redução da remuneração dos gerentes (art. 255º/2 CSC) D) Ora, parece-nos indubitável que, tendo fundamentado a presente acção na redução da remuneração de gerentes e na distribuição ilegal de lucros, obviamente que o Autor só poderia pedir quer a redução dessas retribuições indevidas, quer a respectiva restituição à sociedade. Tendo sido esse precisamente o seu pedido. Basta atentar na p.i.; E) Tal possibilidade legal decorre expressamente do art. 255º/2 do CSC, o qual dispõe que: “As remunerações dos sócios gerentes podem ser reduzidas pelo tribunal, a requerimento de qualquer sócio, em processo de inquérito judicial, quando forem gravemente desproporcionadas quer ao trabalho prestado quer à situação da sociedade.” F) Face ao exposto, não podem subsistir dúvidas, face ao plasmado no art. 255º/2 do CSC, que um sócio pode pedir a redução de remuneração de outros sócios gerentes, recorrendo à figura processual do inquérito judicial, com fundamento na desproporção da remuneração. (cfr. Raul Ventura em “Sociedades por Quotas – Comentário ao Código das Sociedades Comerciais”, volume III, pag. 70) Ora, como vimos já, foi precisamente isso que fez o Autor. e bem !!!!!!!!!! G) Aliás, sobre esta matéria, o mesmo Raul Ventura em “Sociedades por Quotas –Comentário ao Código das Sociedades Comerciais”, volume III, pag. 73 e 74, refere expressamente o seguinte: “As prestações patrimoniais, pecuniárias ou não, atribuídas unilateralmente pela sociedade, com fundamento mais ou menos directo, no serviço que lhe foi prestado, e carácter esporádico, constituem gratificações, as quais se distinguem por um lado, da...

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