Acórdão nº 319/06.7SMPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDA LOBO
Data da Resolução06 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 319/06.7SMPRT.P1 1ª secção Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO O Ministério Público vem interpor recurso do douto despacho da Mª Juíza do 3º Juízo Criminal do Porto que determinou a cessação da execução da pena de prisão aplicada ao arguido B…, em virtude do pagamento da multa em que havia sido condenado e que não havia pago anteriormente.

Da motivação do recurso constam as seguintes conclusões: «1- Tendo o arguido sido condenado numa pena de prisão que foi declarada exequível e tendo iniciado o cumprimento de tal pena, não pode evitar o cumprimento da mesma através do pagamento da multa aplicada em substituição.

2 – Assim, ao permitir tal possibilidade, a decisão recorrida violou, por incorreta interpretação, a norma do artigo 43º, nº 2, do Código Penal; 3 – Pelo que deverá a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o arguido ao cumprimento de 87 dias de prisão ainda em falta e ordene a restituição ao arguido da quantia liquidada.» O arguido respondeu à motivação do recurso, reafirmando a tese sustentada no douto despacho recorrido, a qual, em seu entender será imposta pela coerência interna do sistema, que encara a pena de prisão como extrema ratio. Alega ainda que, mesmo que assim não se entendesse, deve aplicar-se neste caso, e uma vez que o não pagamento da multa não lhe é imputável, o disposto no artigo 49º, nº 3, do Código Penal (aplicável ex vi do artigo 43º, nº 2, do mesmo diploma), que prevê a suspensão de execução da pena de prisão em causa.

Nesta instância o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, reiterando a posição assumida pelo Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância.

Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

*II – FUNDAMENTAÇÃO É o seguinte o teor do douto despacho recorrido: «Fls. 249 e ss.: Por sentença proferida nos presentes autos em 05.06.08 (fls. 70 e ss.), foi o arguido condenado pela prática, de um crime de condução ilegal, na pena de 90 dias de prisão, substituída por igual tempo de multa, à razão diária de €5,00, num total de €450,00, bem como, nas demais custas processuais.

Por despacho de fls. 163, proferido em 09/03/10, notificado ao arguido em 15/08/11 (cfr. fls. 236 v.), foi a referida prisão declarada exequível.

O arguido não recorreu do referido despacho, nada disse ou requereu, pelo que o referido despacho transitou em julgado.

O arguido foi detido em 06/01/12, para cumprimento da pena de prisão de 90 dias em que foi condenado nos presentes autos (cfr. fls. 248).

Por requerimento de fls. 249, veio o arguido requerer a sua imediata libertação, em virtude de ter efectuado o pagamento da multa, alegando que não o fez antes por dificuldades económicas e comprovou documentalmente tal pagamento.

A Digna Magistrada do Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento do requerido, nos termos constantes da promoção que antecede, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

Decidindo: Antes de mais, caberá referir que no caso dos autos não está em causa uma mera pena de multa, convertida em prisão subsidiária, pelo que não é aplicável o disposto no art. 49.º, n.º 2, do Cód. Penal.

No entanto, compulsados os autos verifica-se que ao arguido foi aplicado nos presentes autos uma pena curta de prisão, a qual foi substituída por multa.

Pese embora a controvérsia actualmente existente sobre se o arguido pode ou não, a todo o tempo, obstar ao cumprimento da respectiva pena de prisão, pagando a multa, tendo em conta os doutos acórdãos da Relação do Porto, de 04/03/09, relatado pelo Exm. Senhor Dr. Juiz Desembargador Melo Lima e de 12/01/11, relatado pelo Exm. Senhor Dr. Juiz Desembargador Castela Rio, proferidos em situação idêntica ou similar à dos presentes autos (www.dgsi.pt), cujo entendimento se mostra mais favorável ao arguido, atento o pagamento da multa efectuado, determino a imediata passagem de mandados de libertação do arguido.

D.N., pela via mais expedita.»*III – O DIREITO O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[1], sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P.[2].

Assim, a questão que importa decidir é a de saber se pode ser evitada a execução da prisão decorrente do não pagamento de uma multa resultante da substituição de pena de prisão (nos termos do artigo 43º nº 1 do Código Penal), pelo pagamento posterior dessa multa (situação prevista no artigo 49º, nº 2, do mesmo Código).

Caso não seja seguido tal entendimento, haverá que apurar se pode aplicar-se ao caso em apreço o disposto no artigo 49º nº 3 do Código Penal, que prevê a suspensão da execução da pena de prisão em causa quando o não pagamento da multa não seja imputável ao condenado.

Antes de mais, importa realçar que nos presentes autos, o arguido foi condenado por sentença proferida em 05.06.2008, depositada nessa data e notificada pessoalmente ao arguido em 03.04.2009 (cfr. 134 a 141), pela autoria material de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. no artº 3º nº 1 do Dec-Lei nº 2/98 de 03.01 na pena de 90 (noventa) dias de prisão substituída por igual tempo de multa à razão diária de € 5,00.

No hiato processual que antecedeu o despacho em crise, mais concretamente entre a notificação da sentença ao arguido e o trânsito do despacho proferido a fls. 163 (notificado pessoalmente ao arguido em 05.08.2011 – cfr. fls. 234 vº), o que verdadeiramente estava em causa era o não pagamento da multa resultante de substituição daquela pena de noventa dias de prisão inicialmente fixada, ao abrigo do disposto no artº 43.º do Cód. Penal e não, o não pagamento de multa como pena principal inicialmente fixada, para o qual está prevista a conversão de prisão subsidiária, cujo regime distinto encontra expressão nos artºs 47.º e 49.º, do mesmo diploma legal.

Preceitua aquele artigo 43.º n.º 1: «A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, exceto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. (…)» Dispõe o n.º 2 do mesmo preceito: «Se a multa não for paga, o condenado cumpre a pena de prisão aplicada na sentença.

É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 49.º».

Por outro lado, preceitua o artigo 49.º, ao que releva: «1. Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, (…). 2. O condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado; 3. Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa (…); 4. O disposto nos nºs 1 e 2 é correspondentemente aplicável ao caso em que o condenado culposamente não cumpra os dias de trabalho pelos quais, a seu pedido, a multa foi substituída. Se o incumprimento lhe não for imputável, é correspondentemente aplicável o disposto no número anterior.» Do confronto entre os regimes definidos em tais normativos, decorre, à evidência, ser distinto o relativo ao incumprimento como o dos presentes autos, que decorre do não pagamento da multa de substituição de pena de prisão, (fixada nos termos do aludido artigo 43.º, n.º 1), daquele outro no qual o que está em causa é o não pagamento da multa quando fixada (nos termos do artigo 47.º) enquanto pena principal e esta, por não ter sido paga, foi convertida em prisão subsidiária.

Como refere o Prof. Figueiredo Dias[3] a pena de multa de substituição – como é a aplicada nos autos - constitui...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT