Acórdão nº 1607/09.6TVPRT.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução05 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1607/09.6 TVPRT.P2 1º Juízo Cível do Porto – 2ª secção Apelação Recorrente: B… Recorrida: C… Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO A autora C…, residente na Rua …, nº …, Porto, intentou a presente acção declarativa contra a ré B…, residente na Rua …, nº …, Porto, pedindo que se condene a ré a ver declarada a caducidade do contrato de arrendamento em causa nos autos e a despejar de imediato o arrendado, entregando-o à autora livre de pessoas e bens, mas com tudo o que o compõe, bem como a pagar à autora uma indemnização correspondente ao prejuízo mensal de €300,00, desde 03/02/2008 até efectiva entrega do imóvel, acrescida dos juros legais de mora.

Invoca a autora, como causa de pedir, a sua qualidade de proprietária do prédio urbano constituído por casa de quatro pavimentos e fachada poente, sito na Rua …, nsº … a …, da freguesia de …, do concelho do Porto; a celebração entre a anterior proprietária e D…, pai da aqui ré, de um contrato de arrendamento que teve por objecto o rés-do-chão do referido prédio, com o nº …, contrato esse que foi sucessiva e automaticamente renovado; a caducidade do referido contrato de arrendamento, na sequência do falecimento do arrendatário, em 3 de Agosto de 2008; a não entrega do arrendado por parte da ré e o valor médio de €300/mês, considerado ajustado pela autora, face à localização e estado de conservação do imóvel, como valor a pagar pela ré, a título de indemnização pela ocupação ilícita do imóvel, desde 03/02/2008 até efectiva entrega do arrendado.

A ré contestou excepcionando a transmissão do direito ao arrendamento por morte do arrendatário e peticionando a condenação da autora como litigante de má fé.

A autora respondeu à matéria de excepção invocada pela ré, concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador, o qual teve o Tribunal por competente, o processo por próprio e as partes por capazes e legítimas.

Com observância do legal formalismo, realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

Seguidamente proferiu-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência: - declarou a caducidade do contrato de arrendamento em causa nos autos; - condenou a ré a despejar de imediato o imóvel referido na al. b) dos factos provados e a entregá-lo à autora, livre de pessoas e bens, mas com tudo o que o compõe; - condenou a ré a pagar à autora a quantia mensal de €13,08, desde 4/2/2008 até efectiva entrega do referido imóvel, acrescida dos juros legais de mora desde a data da sua citação, em 2/9/2009.

No mais absolveu-se a ré do peticionado.

Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a ré B…, que finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões:

  1. Não foi valorada devidamente a prova produzida na audiência de discussão e julgamento, quanto à matéria de facto alegada no art.º 26.º e 27.º da contestação; b) De acordo com os meios probatórios constantes da gravação realizados no processo, impunha-se que tivesse sido dado como provado que “pelo menos desde o ano de 1983 que a ré habitualmente abria e encerrava o estabelecimento de tabacaria e papelaria, atendia também a clientela e fornecedores durante o período da sua actividade e assegurava o regular funcionamento e exploração do estabelecimento, actividades essas que exercia em comum juntamente com o seu falecido pai.” c) As passagens da gravação do processo relativas ao depoimento da testemunha E… permitem concluir que a ré não se limitava a atender clientes e fornecedores, pois abria e encerrava o estabelecimento, começou a tomar conta do estabelecimento, que o pai, primitivo arrendatário começou a passar as contas, as coisas para ela, que quanto a cheques e compras para o estabelecimento era a ré que fazia tudo, e quando o pai ficou doente, estava a ré à frente da loja.

  2. Também as passagens da gravação do processo relativas ao depoimento da testemunha F…, levam a concluir que a ré fazia trocas de mercadorias com outros comerciantes para servir clientes, quando havia falhas de jornais ou revistas, actos próprios de quem realmente está a explorar um estabelecimento.

  3. Por sua vez, as passagens da gravação do processo relativas ao depoimento da testemunha G… permitem concluir que a ré não teve outro trabalho, ou modo de vida, que não fosse trabalhar na tabacaria instalada no arrendado, juntamente com o pai, num período de tempo que se situa desde 1962 até hoje, o que mostra que a ré se sustentou dali.

  4. Ou ainda, as passagens das gravações do processo relativas aos depoimentos das testemunhas H… e I…, que conhecem a ré há mais de 30 anos, e sempre a viram a praticar actos próprios do quotidiano do estabelecimento comercial, precisando que essa actividade decorria desde que a mãe dela ficou doente, perdendo o pai capacidade física para tomar conta do negócio.

  5. E, finalmente, a prova documental dos autos, designadamente, a carta registada e o sobrescrito do Tribunal Cível de Lisboa endereçadas à ré com a designação “J…”, colocam-na ligada à actividade comercial do estabelecimento, a assegurar o seu regular funcionamento e exploração.

  6. O tribunal recorrido errou na apreciação da prova quanto à matéria de facto alegada no art.º 27 da contestação, tendo ficado provado o requisito previsto na parte final do nº 1 do art. 58º do NRAU, uma vez que a ré desenvolvia, há mais de três anos, uma actividade no locado explorado pelo arrendatário falecido, seu pai.

  7. Tanto a Doutrina como a última Jurisprudência, designadamente, Menezes Leitão (Arrendamento Urbano, pag. 123) e Maria Olinda Garcia “Arrendamentos para o Comércio pag. 74), e os AC do TRPorto proferido no Proc. 2367/09.6T2OVR.P1, 2009 e o Ac. Rel. de Lisboa de 29.10.2009 (Proc. 380/07.7 TJLSB.L1.6 – disponíveis em www.dgsi.pt, respectivamente, são no sentido de que “o preenchimento da excepção prevista na parte final do nº 1 do art. 58º do NRAU basta-se com o desenvolvimento, há mais de três anos, de uma actividade no locado explorado pelo arrendatário falecido, independentemente da natureza do vínculo que o liga à empresa a funcionar no estabelecimento.” j) Com a alteração à matéria de facto fica demonstrado que a ré há mais de três anos no período que antecedeu imediatamente a morte do arrendatário, seu pai, vinha explorando, em comum com ele, o estabelecimento que funcionava no arrendado sito na Rua …, …, Porto.

  8. O contrato de arrendamento a que os autos se reportam, celebrado em 1965, tem, como fim principal, o exercício do comércio, pelo que prevalecem, como foi bem decidido, quanto às causas de extinção do contrato, o regime que é próprio para tais contratos.

  9. O óbito do primitivo arrendatário, pai da ré, ocorreu durante a vigência do Novo Regime do Arrendamento Urbano, pelo que cumpre aplicar o regime previsto nas normas transitórias (art.º 26.º, 27.º e 58.º da Lei 6/2006 de 27/02).

  10. Não operou a caducidade do contrato de arrendamento, tendo-se transmitido para a ré o direito ao arrendamento, que é da maior importância para ela, quer para poder continuar a actividade comercial e sustentar-se economicamente, quer ainda, porque ali tem a sua habitação.

  11. O tribunal recorrido violou o disposto no n.º 2 do artigo 653º do Código de Processo Civil e o disposto na parte final do nº 1 do art. 58º do NRAU (Lei 6/2006 de 27/02).

    Não consta dos autos a apresentação de contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais, cumpre então apreciar e decidir.

    *Aos presentes autos, face à data da sua entrada em juízo, é aplicável o regime de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT