Acórdão nº 474/08.1TTVRL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução15 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 474/08.1TTVRL.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 194) Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1754) Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…. intentou a presente acção declarativa com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra o CENTRO HOSPITALAR DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO, EPE e contra o Estado Português, pedindo a declaração de ilicitude do seu despedimento e a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de € 155.660,66 a título de créditos laborais e derivados da cessação ilícita, e nas prestações vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da decisão final.

Alegou em síntese que iniciou funções no ainda Hospital Distrital de Chaves em 01/06/1999 no âmbito de estágio profissional de 9 meses; em seguida celebrou contrato a termo certo pelo período de 3 meses, tendo sido renovado por igual período; posteriormente foi celebrado novo contrato, com a denominação de contrato de prestação de serviços, com início em 01/09/2000. Este contrato, apesar de estar sujeito ao termo de 1 mês foi sucessivamente renovado por mais de 7 anos, até que o R. manifestou a vontade de não o renovar em 30/11/2007.

Apesar da sua denominação, o contrato constituía um verdadeiro contrato de trabalho, invocando o A. os vários elementos que, no seu entender, o demonstram. Invoca o A. os direitos que em função da errada qualificação do contrato lhe foram sonegados, bem assim como os direitos derivados da cessação do vínculo, incluindo danos morais.

O Estado Português deduziu contestação invocando a sua ilegitimidade passiva.

O R. Centro Hospitalar veio deduzir contestação, por impugnação, alegando que a celebração do contrato de prestação de serviços se ficou a dever à necessidade da produção de trabalhos específicos por parte do A., não estando o mesmo submetido a regras hierárquicas e inexistindo os elementos que caracterizariam este contrato como sendo de trabalho.

Também por imposição legal e atenta a imperatividade do tipo de vínculo à administração pública este contrato não poderia ser senão de prestação de serviços. Quanto aos danos invocados o R. entende que os mesmos não são devidos, sendo ainda calculados de forma desproporcionada pelo demandante. Concluiu pela sua absolvição dos pedidos.

Em articulado de resposta, veio o A. pronunciar-se sobre o que entendeu serem excepções inominadas na contestação do R. Centro Hospitalar, entre elas a caducidade, reiterando a p.i.

Foi proferido despacho saneador, que julgou o Estado Português parte ilegítima, e seleccionados os factos assentes e controvertidos, de que o R. Centro Hospitalar reclamou, o que foi atendido.

Procedeu-se a julgamento, gravado, tendo o tribunal respondido à base instrutória e motivado tal resposta, sem reclamação.

Foi seguidamente proferida sentença cuja parte dispositiva é a seguinte: “(…) julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência declara-se que o “contrato de prestação de serviços” celebrado entre as partes se traduziu num verdadeiro contrato de trabalho por tempo indeterminado; que este contrato de trabalho é nulo por não ter sido precedido do necessário concurso público; que o despedimento de que o A. foi alvo em 30/11/2007 foi ilícito e por via desta ilicitude, condena-se o R. no pagamento ao A. da quantia de € 51.973,67 (cinquenta e um mil novecentos e setenta e três euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida do montante relativos ás remunerações que o mesmo deixou de auferir, desde a indicada data, até ao trânsito em julgado da presente decisão. Mais se condena o R. a pagar ao A. a quantia de € 10,000,00 (dez mil euros), a título de indemnização pelos danos morais decorrentes do despedimento ilícito acima consignado.

Custas pelo R. sem prejuízo da isenção de que beneficia.

Inconformado, interpôs o R. Centro Hospitalar o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: 1. A decisão do tribunal a quo deve ser revogada, pois existe incorrecto julgamento da matéria de facto e bem assim do vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, e devendo, por isso, ser alterada ou anulada à luz do artigo 712.º, n.º 1, al. a) primeira parte e n.º 4 do C.P.C.

  1. A decisão recorrida considerou provado que: “(..) 31. O A. nunca gozou férias, excepto quanto aos dias de compensação a que acima se alude no n.º 27 supra.

  2. O R. negou ao A. o direito a férias.” 3. Contudo não existe nos autos prova que impusesse a decisão recorrida, atente-se nas declarações prestadas pelas testemunhas C….. e D….., depoimentos nos quais o tribunal se estribou para justificar a referida decisão, que no nosso entender são insuficientes para valorar esses factos como provados.

  3. Tais factos deveriam ter sido considerados não provados, na óptica deste recurso, resultam da circunstância de nos autos não existir, prova suficiente, objectiva e imparcial com razão de ciência, que impusesse a decisão recorrida.

  4. Ora, em face das declarações prestadas pelas testemunhas não podiam os referidos factos ter sido dados como provados, de facto não é garantido pela testemunha, especificamente pela testemunha C…., que o A. não tenha passado férias apenas nos dias de compensação – ponto 31 dos factos provados -, e bem assim não podia a testemunha D…. afirmar tal facto, uma vez que não é credível e nem decorre do seu depoimento que estivesse todos os dias com o Autor, ora recorrido.

  5. Por outro lado, e não obstante ambas as testemunhas afirmarem que o recorrido não tinha direito a férias, nenhuma das testemunhas referem que lhe tenha sido negado o direito a férias – ponto 32 dos factos provados -, isto é, que o recorrido tivesse pedido férias e que tal pedido lhe fosse negado, pelo que da afirmação de carácter genérico “não tinha direito a férias” não se poderá inferir que lhe tenha sido negado o direito a férias.

  6. Importa ainda referir que, a prova testemunhal não se afigura um meio de prova idóneo para dar como provado os referidos factos. À semelhança de outros pedidos e respectivos despachos dos administradores competentes nele apostos, os quais se encontram juntos autos, caso tivesse sido efectuado algum pedido, sobre o gozo de férias existiria despacho, pelo que, em nosso modesto entendimento, também não deveria ter sido dado como provado que o R. tenha negado o direito a férias, aliás em face dos depoimentos prestados constitui um claro afronte das regras de experiência comum, julgar tal facto como provado.

  7. Acresce ainda que, o vínculo que o A. mantinha com o R. era de prestador de serviços, pelo que em face disso poderia gozar férias quando bem entendesse.

  8. Quanto à contradição entre o facto 8 e os factos 12., 15., 16., 17., 21 e 22 dos factos provados, refere o ponto 8 da sentença que foi dado como provado que: “8. Foi como trabalhador independente e tendo como actividade principal a formação profissional que o autor em 21/07/2000 declarou o seu início de actividade à Direcção Geral de Impostos, actividade que exerceu para múltiplas entidades e das quais recebeu os devidos honorários.” 10. Ora, a prova deste facto decorre das Declarações de IRS do A. juntas aos Autos, designadamente a Declaração de IRS de 2007, da qual constam outras duas entidades para quem prestou serviços além do ora R.

  9. Contudo, e não obstante, o referido ponto já constar da matéria de facto assente da Base Instrutória, em audiência de julgamento, e na sequência da prova testemunhal produzida, foi dado como provado nos pontos 12., 15., 16., 17. 21., e 22. Ao seguintes factos: “12. Durante a referida relação o A. teve adstrito à execução da sua actividade, não tendo que alcançar qualquer resultado. (…) 15. O A. exerceu sempre a sua de forma subordinada e segundo a direcção, controlo e fiscalização do referido R.

  10. E estava integrado na estrutura, orgânica, dinâmica e cadeia hierárquica da Instituição.

  11. O local e o horário de trabalho do A. era previamente imposto pelo R. (…) 21. O seu trabalho para a R. exigia a sua dedicação a tempo inteiro.

  12. Impedindo o autor de trabalhar para outras entidades que não o R.” 12. Decorre do referido ponto 8 que foi dado com provado que o A. exerceu a sua actividade para diversas entidades enquanto trabalhador independente e com a actividade principal de formador, sendo que a prova de tal facto assenta em prova documental a qual destronará a prova testemunhal que esteve na base da prova produzida relativamente aos restantes factos provados 12., 15., 16., 17., 21 e 22..

  13. Como é que o A., enquanto trabalhador independente, que exercia funções em diversas entidades e delas recebia honorários, tinha condições para cumprir um horário de trabalho, trabalho que exigia a sua dedicação a tempo inteiro e impedindo o Autor de trabalhar para outras entidades que não o R. e já agora, como é que, atendendo ao referido ponto 8, exercia a sua actividade de forma subordinada e segundo a direcção, controlo e fiscalização do referido R. e encontrando-se integrado na estrutura, orgânica, dinâmica e cadeia hierárquica da Instituição? 14. Esta deficiência e contradição a que aludimos contende e colide com a boa decisão da causa.

  14. Sendo assim, há, pois, que decidir qual dos referidos ponto se deverá considerar efectivamente provado, isto é, se o ponto 8 que já constava da matéria de facto assente do despacho saneador, e que se estriba em prova documental ou então, se os restantes pontos invocados, que se baseiam em prova testemunhal.

  15. Em face da prova que os sustenta, é inequívoco que se deverá considerar provado o referido ponto 8 com todas as consequências legais daí advenientes.

  16. O artigo 337.º do Código de Trabalho foi incorrectamente aplicado e interpretado.

  17. Ora, sem prejuízo, do alegado no ponto supra, alínea a) quanto ao incorrecto julgamento da referida matéria de facto relativa à violação do direito a férias, importa, no que tange a este ponto fazer a aplicação do artigo transcrito.

    ...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT