Acórdão nº 1965/12.5TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução30 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pc. 1965/12.5TBVFR.P1 – 2ª Sec.

(apelação) ______________________________ Relator: M. Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria João Areias* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B… e C…, residentes em …, Santa Maria da Feira, intentaram o presente processo especial contra D…, residente no mesmo local, pedindo a destituição deste da gerência da sociedade “E…, Lda.”, com suspensão imediata do exercício das respectivas funções.

Alegaram, para tal, que no exercício da gerência da sociedade “E…, Lda.” [elas também são gerentes desta], o requerido levou a cabo uma série de actos dolosos que conduziram a mesma a uma grave situação financeira, pois, por um lado, passou a utilizar o imóvel em que se encontra a sede daquela, propriedade dela, na produção e actividade de uma outra sociedade, “F…, Lda.”, da qual ele é o verdadeiro dono e gerente, violando a obrigação e não concorrência, e, por outro, tem-lhes vedado o acesso à sociedade que pretendiam que voltasse a laborar, tendo dispensado alguns trabalhadores da mesma e transferido outros para a “F…”.

Ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 1484º-B do CPC, foram inquiridas testemunhas para apreciação do pedido de suspensão da gerência.

Foi depois proferida decisão de tal «incidente», tendo a pretensão das requerentes sido julgada improcedente, com a consequente não suspensão do requerido do exercício das funções de gerente na aludida sociedade.

Inconformadas com tal decisão, interpuseram as requerentes o recurso de apelação em apreço, cuja motivação culminaram com as seguintes conclusões: “I. Relativamente a sociedade comercial “E…, Lda.”, resulta da matéria de facto dada como provada, designadamente, que: (i) A sócia G… é sogra do Requerido, de idade avançada e que nunca exerceu qualquer actividade na sociedade ou em negócios relacionados a cortiça; (ii) Tem como objecto social a indústria de rolhas e artefactos de cortiça, e o comércio de importação e exportação de produtos análogos; (iii) As Recorrentes são sócias e gerentes da referida sociedade, embora nunca exerceram de facto as funções de gerência; (iv) O Requerido, único gerente não sócio, é quem exerce efectivamente tal função; (v) Vincula-se mediante a assinatura de 2 gerentes, sendo necessariamente uma delas a do Requerido; II. Quanto a sociedade comercial “F…, Lda.”, resulta da matéria de facto dada como provada que: (i) Na sua constituição, o Requerido foi designado único gerente; (ii) Tem como objecto social a indústria de preparação de cortiça; (iii) O capital é integralmente detido por H…, nora do Requerido; (iv) Embora não formalmente, é o Requerido quem gere as actividades da sociedade e comanda seu destino, e é o seu verdadeiro dono; (v) A sede efectiva em que labora coincide com a sede da “E…, Lda.”; III. Os objectos sociais das referidas sociedades, ainda que não descritos de forma totalmente idêntica, as actividades são coincidentes, sendo certo que o objecto da “E…, Lda.”, engloba necessariamente o objecto e actividade da “F…, Lda.”; IV. Pela análise das respectivas certidões permanentes das sociedades é possível verificar que ambas têm o mesmo CAE Principal (código …..-..) – “indústria de preparação de cortiça C”; V. Restando provada a coincidência das sedes, bem como que as sociedades exercem a mesma actividade económica, depreende-se que o Requerido faz uso das instalações da “E…, Lda.”, para exercer as actividades da “F…”, Lda.”, sendo o único gerente de facto de ambas sociedades; VI. Em momento algum houve formalização contratual entre as sociedades que autorizasse o uso das instalações mediante a contraprestação de determinado rendimento, já que a assunção de quaisquer obrigações pela “E…, Lda.” sempre dependeria da assinatura de alguma das Recorrentes em conjunto com o Requerido, o que de facto nunca se verificou; VII. Após tomar conta da sede da “E…, Lda.”, para o exercício de actividade concorrente, o Requerido vedou o acesso das Recorrentes, designadamente através da sua intimidação, inviabilizando qualquer iniciativa destas para reinício das actividades económicas da primeira sociedade, uma vez que estas passaram a temer pela própria integridade física; VIII. Tendo sido matéria de facto dada como provada que o Requerido figura como dono e gerente de facto da “F…”, utilizando a sede da “E…, Lda.”, para o exercício da mesma actividade económica, conforme CAE Principal das sociedades, é evidente que a actividade desenvolvida pela primeira sociedade é totalmente concorrente com aquela até então desempenhada pela segunda; IX. Além das instalações, o Requerido disponibilizou o know-how que não lhe pertence, à “F…”; X. Diante do acima exposto, não persistem quaisquer dúvidas de que o Requerido, ao administrar as actividades económicas da “F…” exerce actividade directamente concorrente com a “E…, Lda.”, incorrendo em violação aos deveres inerentes ao cargo de gerente, designadamente a proibição de não concorrência prevista no artigo 254.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC); XI. Em decorrência da referida concorrência, o Requerido abandonou por completo as actividades da “E…, Lda.”, que outrora fora uma empresa pujante e que agora se encontra sem actividade por culpa do Requerido; XII. Na verdade, a “F…” mais não é do que a forma encontrada pelo Requerido, seu verdadeiro dono e gerente de facto, para, em conluio com seus familiares, tentar contornar a obrigação de não concorrência que subsiste para o Requerido, por força da sua qualidade de gerente da “E…, Lda.”; XIII. Foi dado como provado o facto do Requerido, enquanto gerente da “E…, Lda.” ter celebrado uma escritura de confissão de dívida e hipoteca a favor de uma terceira sociedade – “I…, Lda.”, sem qualquer contrapartida, ou seja, a título gratuito! XIV. Da qual também era gerente e da qual a sócia detentora de 50% do capital social da “E…, Lda.”, G…, sua “testa de ferro”, também era sócia; XV. À data da celebração da escritura, a sociedade “I…, Lda.”, favorecida pela garantia, era proprietária de pelo menos um imóvel, de acordo com a matéria de facto dada como provada; XVI. Acresce que a referida escritura de confissão de dívida e hipoteca veio agora a ser executada, no âmbito do Processo n.º 5587/11.0TBVFR, 3º Juízo Cível do Tribunal de Santa Maria da Feira, conforme matéria de facto dada como provada; XVII. Tal garantia foi prestada em completa e absoluta violação dos seus fins sociais, conforme dispõe o artigo 6.º, n.º 3, do CSC; XVIII. Na confissão de dívida e hipoteca, que teve como intervenientes tão-somente o núcleo familiar do Requerido, também não há qualquer especificação que justificasse efectivamente a dívida; XIX. As Recorrentes somente tiveram conhecimento da execução da referida garantia por consultarem as pautas públicas de distribuição, o que lhes permitiu apresentar a devida oposição à execução, em nome da “E…, Lda.”; XX. Note-se ainda que a sociedade “I…, Lda.”, supostamente a verdadeira devedora caso a dívida de facto existisse, não foi sequer accionada judicialmente para pagar o débito; XXI. Em prejuízo da “E…, Lda.”, as testemunhas do exequente são a mulher e filhos do ora Requerido; XXII. O Requerido também ofende os deveres de diligência quando veda que as Recorrentes tenham acesso às contas ou respectiva contabilidade da “E…, Lda.”, em total desobediência do disposto no artigo 214.º, CSC; XXIII. Além de que desde que o Requerido é gerente da “E…, Lda.” que esta não apresenta as suas contas; XXIV. Na qualidade de sujeitos passivos do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), as sociedades comerciais estão obrigadas a efectuar a prestação anual da declaração de informação contabilística e fiscal (artigos 2.º, 117.º e 121.º, do Código do IRC (Decreto-Lei n.º 159/2009); XXV. A IES obriga as sociedades comerciais a entregar a declaração anual de informação contabilística e fiscal, bem como o registo da prestação de contas; XXVI. Assim, por mera análise da certidão permanente da “E…, Lda.” é possível verificar que o Requerido, na condição de gerente da sociedade, não cumpre com a obrigação de entrega da declaração anual contabilística e registo da prestação de contas há já vários anos; XXVII. Todos os factos acima elencados revelam nitidamente a falta pelo Requerido do cumprimento dos deveres inerentes ao exercício da função de gerente, em integral desobediência dos preceitos do artigo 64.º, do CSC; XXVIII. Ora, definitivamente, deixar de apresentar as respectivas contas, elaborar planos de forma a onerar os bens da sociedade para mais tarde dispor deles, não contestar as acções judiciais que são interpostas contra a sociedade, utilizar bens desta na actividade de outra sociedade detida por interposta pessoa, mas da qual é gerente, e que por sua vez faz concorrência...

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