Acórdão nº 290/1999.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução18 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 290/99 – 3.ª Des. José Fernando Cardoso Amaral (Relator – nº. 8) Des. Fernando Manuel Pinto de Almeida (Adjunto) Des. Trajano Amador Seabra Teles de Menezes e Melo (Adjunto) 1. RELATÓRIO A “B…”, com sede na Rua …, nº. …, em Lisboa, intentou, em 30-09-1999, na Comarca de Lamego, onde foi distribuída ao 2º. Juízo Cível, a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra: 1ª. – “C…, Ldª.

”, sociedade comercial com sede na …, freguesia …, concelho de Lamego, entretanto declarada falida e representada pelo respectivo Liquidatário; 2ºs – D…, proprietário, e mulher E…, doméstica, residentes na mesma freguesia.

Pediu a condenação dos 2ºs. RR. D… e esposa a abrirem mão do prédio rústico denominado “F…”, sito na freguesia …, Concelho de Lamego, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego, sob o nº. 00748/290694, e inscrito na respectiva Matriz sob o artigo D-209º, restituindo-se o mesmo, material e juridicamente, ao património da 1ª Ré C…. [1] Alegou, para tanto, a A., em síntese, que: - É credora da Ré C…, pelo valor de Esc. 20.726.918$60, titulado por quatro letras de câmbio e por uma livrança, todas vencidas, crédito esse originado pela concessão de diversos financiamentos e levantamentos “a descoberto”.

- Nem a Ré C…, nem os restantes co-obrigados, procederam ao pagamento das quantias tituladas pelas referidas letras e livrança, nas datas dos respectivos vencimentos, nem posteriormente, não obstante, para tanto, terem sido interpelados pela A.; - Em 31/08/1999, o crédito da A. sobre a Ré C…, incluindo juros vencidos e Imposto de Selo, ascendia a Esc. 23.310.561$10.

- Por não terem sido pagas, o A. deu as aludidas letras e livrança à execução, em diversos processos; - Não são conhecidos quaisquer bens ou direitos à Ré C… e aos demais co-obrigados nos títulos de crédito mencionados, passíveis de reponderem pelas dívidas em causa; - Face ao comportamento evidenciado pela Ré, traduzido no alegado propósito de não pagar as aludidas dívidas, a A. requereu contra a C…, Ldª. e contra os seus sócios, ora RR., G… e H…, providência cautelar de arresto, tendo por objecto quatro veículos automóveis, uma fracção autónoma dada de hipoteca à I… e o prédio rústico denominado “F…”, sito na freguesia …, Concelho de Lamego, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº. 00748/290694 e inscrito na respectiva Matriz sob o artigo D-209º; - No âmbito da aludida providência cautelar, foi proferido, em 08/07/98, despacho de indeferimento liminar, o qual foi notificado em 09/07/98; - Proferido o dito despacho, a Ré C…, através do seu sócio-gerente G…, declarou, a breve trecho, alienar o supra identificado prédio rústico cujo arrolamento foi requerido pela ora A., tendo a 1ª R., através de escritura pública outorgada em 13/07/1998, declarado dar em cumprimento, aos ora 2ºs. RR., o mesmo prédio, para pagamento da dívida de Esc. 8.000.000$00; - A 1ª Ré transmitiu também três das viaturas cujo arresto foi requerido pela A.; - Com a transmissão do dito prédio operada, a A. vê drástica e consideravelmente diminuída a garantia de satisfação dos créditos, anteriores, que possui sobre a Ré, resultando para a A. um agravamento ou mesmo impossibilidade de os ver satisfeitos; - A transmissão do prédio rústico mencionado foi realizada dolosamente, para impedir a satisfação dos créditos da A.; - Com ela a A. foi colocada na impossibilidade de obter a satisfação do seu crédito, senão total pelo menos parcial; - Os 2ºs. RR. tinham perfeito conhecimento, no acto em que o prédio lhe foi transmitido, que essa sua transmissão causava prejuízos à A., sendo que não ignoravam as dívidas da Ré C… perante a A. e estavam inteirados da situação patrimonial da mesma Ré, bem sabendo que tal imóvel, saindo da esfera jurídica da 1ª Ré, diminuiria consideravelmente as garantias patrimoniais destinadas a satisfazer o crédito que a A. possui sobre a 1ª Ré, podendo agravar a impossibilidade dessa satisfação ou mesmo impedi-la.

Com a petição, foram juntos documentos e procuração.

Os RR. foram devidamente citados (fls. 88 a 90.

A Ré C… não apresentou contestação.

Os Réus D… e mulher E… contestaram, alegando, resumidamente, que: - Os RR./contestantes não tinham conhecimento dos invocados créditos da A. sobre a 1ª Ré, de que, à data em que foi outorgada a escritura pública de dação em cumprimento ora impugnada, tinha sido requerida pela A. providência cautelar de arresto relativamente ao prédio que foi objecto daquela dação, nem da situação patrimonial da 1ª Ré; - Aliás, são estranhos a todas as operações bancárias alegadas, nem conhecendo alguns dos intervenientes; - A 1ª R. decidiu entregar aos 2ºs. RR. o prédio rústico em referência, em virtude de ter para com estes uma dívida acumulada de Esc. 8.000.000$00, que tem origem em múltiplos empréstimos particulares que lhe efectuaram, o que os 2ºs. RR. aceitaram; - Os 2ºs. RR. desconheciam se a 1ª Ré tinha ou não bens suficientes para garantir todas as dívidas que tivessem e qual o seu montante; - Na dação em cumprimento que realizaram e ora impugnada, nem a 1ª Ré, nem os 2ºs. RR. estavam de má-fé.

Concluíram no sentido da improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

Juntaram procuração.

A Autora replicou, impugnando a existência da invocada dívida da 1ª Ré para com os 2ºs. RR. e reiterando o alegado na petição inicial.

Naquele articulado, a A., alegando que o declarado contrato de “dação” não correspondeu à vontade das partes, foi ficcionado em conluio entre os co-RR, com o propósito de, mediante a aparência criada, subtrair o prédio ao património da devedora e, assim, enganar a Autora e prejudicá-la, procedeu, ainda, à ampliação do pedido em termos de ser decretada, com as legais consequências, a nulidade do contrato de dação em cumprimento celebrado entre os co-réus C…, Ldª., e D… e mulher, E…, condenando-se estes a abrirem mão do imóvel acima identificado, restituindo-o, material e juridicamente, ao património da ré C….[2] Os RR. D… e mulher apresentaram tréplica, impugnando os factos relativos à alegada simulação, mantendo o alegado na contestação e concluindo como nesta.

Proferiu-se despacho saneador tabelar, procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à organização da Base Instrutória (por remissão, mas dactilografadas pela secretaria a fls. 129 a 134), que não sofreram reclamação das partes.

Estava em curso a audiência de discussão e julgamento (cfr. actas de fls. 506 a 509 e 583 a 585), quando, entretanto, por despacho proferido a fls. 599 a 601 dos autos, foi julgada extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide, relativamente à 1ª. Ré C…, Ldª. – em virtude de esta ter sido declarada falida e de, por sua vez, no respectivo processo, ter sido declara extinta a instância, também por inutilidade da lide, com fundamento na inexistência de bens no património da falida – considerando-se que aquela deixou de ter existência jurídica e determinando-se que os autos prosseguissem apenas quanto aos 2ºs. RR.

Inconformados com tal despacho, os 2ºs. RR. dele interpuseram recurso de agravo, para este Tribunal da Relação do Porto, o qual foi admitido, com subida deferida, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 620).

Concluiu-se, depois, a audiência de julgamento (cfr. actas de fls. 679 a 681 e 682).

A fls. 684 a 696 foi decidida a questão-de-facto, aí se dando resposta aos quesitos da Base Instrutória, de que não houve reclamação.

Seguiu-se-lhe a prolação de sentença (em 11/11/2008-fls. 700 a 717).

Os RR vieram arguir a sua nulidade, considerando que a condenação versou sobre objecto diverso do peticionado, nulidade esta que foi julgada inadmissível (fls. 731).

Admitido recurso da sentença interposto pelos RR, nos termos de fls. 731, como de apelação, subiram os autos a esta Relação do Porto, onde, por Acórdão de 7/12/2009 (fls. 766 a 780), conhecendo-se do agravo supra referido, foi entendido que, em face da extinção da Ré Sociedade, devia ter sido determinada a continuação, sem mais, do processo contra os sócios da mesma, representados pelo liquidatário, e, assim, decidido conceder provimento àquele recurso e, em consequência, revogar o despacho em causa, na parte recorrida, e ordenado o prosseguimento, nos termos referidos, anulando-se tudo o que se processou após o despacho impugnado e não se conhecendo do objecto da apelação, por prejudicado.

Uma vez regressados os autos ao Tribunal de Lamego, aí foram citados os sócios da C…, Ldª., G… e H… (fls. 802 e 803), bem como o Liquidatário Judicial nomeado J… (que constituiu mandatário forense) e, após, designou-se data para a continuação e finalização da audiência.

No decurso desta, em consonância com o despacho proferido e exarado na acta de fls. 816, foram reinquiridas as testemunhas que já o haviam sido antes mas em sessão posterior ao despacho revogado e, portanto, abrangida pela anulação do processado (cfr. fls. 817 e 820-821).

A fls. 822 a 834 foi proferida nova decisão sobre a questão-de-facto, aí se dando resposta aos quesitos da Base Instrutória, do que não houve reclamação.

Seguiu-se-lhe a prolação de nova sentença (em 19/10/2011-fls. 837 a 856), na qual foi julgada a acção procedente, por provada, e em consequência, decidido: a) Declarar a ineficácia em relação à A. do contrato de dação em cumprimento do prédio rústico denominado “F…”, sito na freguesia …, Concelho de Lamego, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº. 00748/290694 e inscrito na respectiva Matriz sob o artigo D-209º, celebrado por escritura pública outorgada em 13/07/1998, no Cartório Notarial de Tabuaço, lavrada de fls. 43v a 44v, do Livro 28-A, na medida do necessário para satisfazer o crédito da A., no montante de € 92.162,48 (noventa e dois mil cento e sessenta e dois euros e quarenta e oito cêntimos), acrescido de juros de mora, contados desde a data do vencimento das letras e livrança indicadas na al. D) dos factos provados e, ainda, de imposto...

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