Acórdão nº 534/10.9TASTS-GK.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelAUGUSTO LOURENÇO
Data da Resolução24 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 534/10.9TASTS-GK.P1 Acordam, em conferência, os Juízes da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO No âmbito do processo de inquérito nº 534/10.9TASTS-GK que corre termos no 1º Juízo Criminal de Santo Tirso, e à ordem do qual se encontra preso preventivamente o arguido B…, aquando da reapreciação da medida coactiva de prisão preventiva, decidiu o Sr. Juiz de Instrução, a requerimento do Ministério Público, declarar a “especial complexidade do processo”, bem como manter a prisão preventiva ao recorrente, nos termos e com os fundamentos do despacho de fls. 39 a 49 deste traslado, (fls. 3.627 a 3.637 dos autos).

*Inconformado com a decisão, veio o arguido, B… a recorrer nos termos de fls. 50 a 53 deste traslado, tendo apresentado as seguintes conclusões: «1 – O recorrente não é alvo da extensão invocada para justificar a declaração de excepcional complexidade, nem quanto a si é necessária a produção de mais e melhor prova.

2 – O arguido tem uma dimensão temporal na sua alegada actividade delituosa circunscrita entre Novembro e 1 data da detenção, não tem, assim, qualquer actividade antes dessa data, não era referência, não era conhecido e não era o alvo central e determinante da investigação.

3 – A lei para evitar um ónus de extensão da privação da liberdade, prevê a separação dos processos no artigo 30º, nº 1, al. a) do CPP, o que deve ser declarado.

4 – A decisão recorrida ao declarar a excepcional complexidade violou o artigo 215º, nº 4 do CPP, pelo que deverá ser revogada e substituída pela separação do processo quanto ao recorrente.

5 – Para além disso, a decisão mantém a medida coactiva, nivelando situações que necessitam de ponderação diferenciada.

6 – Efectivamente, nivelam-se situações completamente distintas, sem se atender à realidade do recorrente que só é conhecido na investigação a partir de 5 de Novembro de 2011, que não tem uma participação autónoma, que não tem conversas interceptadas no seu telefone, que não tem contactos efectuadas para si de compradores, fornecedores, co-arguidos (excepção feita ao co-arguido C…), que não tem elementos relevantes na busca; não tem indicações de contas para evidenciar actos de compra, venda, dívidas decorrentes de negócios de droga, que não tem veículo automóvel e que o veículo de marca … não é seu.

7 – Mais acresce que nesta fase o próprio co-arguido veio esclarecer e perante o JIC que o produto estupefaciente apreendido no dia da detenção era seu e destinado ao seu consumo.

8 – Mesmo que se aponte, como foi o caso do acórdão já proferido, que existe conversa interceptada de teor capaz de se referir a actos de tráfico, a intercepção, por si só, impõe que se faça alguma distinção nas medidas coactivas e se revogue a decisão quanto ao recorrente.

9 - Assim, face ao supra dito, proporcional, adequada e suficiente no caso dos autos para o recorrente será obrigar o recorrente a apresentar-se periodicamente perante os órgãos de polícia criminal.

10 – A decisão recorrida ao aplicar a medida coactiva da prisão preventiva ao recorrente violou, assim, os artigos 193º, 202º, nº 1, al. a) e 204º, al. c), todos do CPP e artigo 28º, nº 2 da CRP.

Revogando-se a decisão recorrida nos termos sobreditos, far-se-á justiça».

O Ministério Público, apresentou a sua resposta às alegações do recorrente, (fls. 54 a 60), tendo defendido a improcedência do recurso e concluindo nos seguintes termos: - «Resulta ainda da investigação realizada o elevado número de arguidos (vinte e dois) que colaboravam entre si sendo os autos constituídos por seis volumes principais e por dezenas de volumes anexos com milhares de intercepções telefónicas efectuadas, validadas e reputadas com interesse para os autos e com dezenas testemunhas ouvidas — cfr. a respeito, o despacho de acusação entretanto proferido.

Resulta ainda dos autos que todos os vinte e dois arguidos “supra” referidos (como aliás é normal neste tipo de criminalidade) actuavam em rede de forma muito organizada, estruturada e complexa (sofrendo tal rede mutações ao longo de todo o ano de 2010 e do ano de 2011 o que torna ainda mais complexa a definição do alcance e a compreensão da sua forma de actuação).

Revela-se, por isso mesmo, o procedimento criminal instaurado de especial complexidade atento o número de arguidos envolvidos e o carácter altamente organizado do crime por que estão acusados como, aliás, refere o n°3 do art. 215 do CPP, o qual, entendemos, tem plena aplicabilidade ao caso aqui em apreço.

Atendendo-se então à forma como estava arquitectada (1 conduta (te todos os arguidos, (10 esquema de compra e venda entre eles montado e à interligação entre eles daí resultante reputou-se, assim, ser do interesse para a pretensão punitiva do Estado que quanto a todos eles (e não apenas tão só quanto aos que estavam presos preventivamente,) fosse efectuada no seu todo uma só investigação, fosse proferido uni só despacho acusatório e fosse realizado um só julgamento e como tal, para esse efeito, promoveu-se a declaração de especial complexidade do procedimento insta tirado (o que veio a ser deferido,) por forma a se reunir, em tempo útil, a prova necessária para esse desiderato.

Isto sem embargo de ser extraída certidão para continuação das investigações relativamente à demais matéria que ficou pendente e que tem uma natureza acessória ponderando-se os interesses - sempre conflituantes - entre a pretensão punitiva do Estado e dos arguidos em não verem a sua prisão preventiva excessivamente prolongada, conforme resulta do teor do despacho de fls. 4231 e seguintes dos autos.

Como é bom de ver, face ao ‘supra” exposto, entendemos não poder haver lugar à separação de processos a que os recorrentes aludem, nos termos e nos moldes em que entendem deveria ser feita urna vez que a audiência de julgamento a realizar só faz sentido se toda a rede (leia-se: os arguidos que integravam essa rede) fosse julgada ao mesmo tempo.

Todavia, como se disse, não foram olvidados também os interesses dos arguidos sujeitos a prisão preventiva, no sentido de não verem a sua situação demasiadamente prolongada, pelo que, finda a investigação quanto ao “grosso” da matéria factual que constitui o núcleo central do processo, ordenou-se urna separação de processos ao abrigo do art. 30, 1101, ai. a) do CPP quanto à matéria ainda por investigar e que tem urna natureza acessória na parte em que se refere aos arguidos acusados na fase do inquérito.

Da medida de coacção prisão preventiva manda pela Sr. Juíza de Instrução “a quo” relativamente aos recorrentes: afigura-se-nos estarem verificados, no caso concreto, os pressupostos da aplicação da medida de coacção mais gravosa (prisão preventiva), designadamente o perigo de fuga e o perigo de continuação de actividade criminosa sendo os indícios recolhidos da prática do crimes que lhes é imputado (p. e p. no art. 21, n°1 e 24, ais. b) e c) do DL 15/93) fortíssimos, resultando dos autos que arguidos pertenciam a um esquema de compra e venda de produtos estupefacientes (Canábis, Cannabis, MDMA e Cocaína) em quantidades elevadas e com vendas quase diárias aos consumidores finais ao longo de dois anos (2010 e 2011) - a respeito veja-se mais o vez o teor do despacho de acusação já proferido para cuja factualidade, elementos de prova aí indicados e promoção quanto ao seu estatuto processual se remete e ainda o teor do despacho de fls. 3633 a 3637.

A tudo isto acresce ser o crime por que os arguidos se encontram acusados muito grave, ser elevado o desvalor da sua conduta elevado, ser elevado o alarme social que tal conduta causa na sociedade, ser elevadíssimo o perigo de continuação, da sua parte, de actividade criminosa no que a este tipo de criminalidade diz respeito e serem gravíssimos os efeitos perniciosos que a venda de produtos estupefacientes provoca na comunidade (seja nos efeitos nefastos que causa na saúde dos toxicodependentes seja por estar na origem da maioria dos crimes contra o património que estes cometem como forma de sustentarem o seu “vício”).

Por fim: entende-se deverem os recursos interpostos subir de imediato, em separado e com efeito suspensivo.

Pelas razões invocadas ‘supra” consideramos não assistir razão aos arguidos/recorrentes, devendo-se manter a decisão recorrida quer na parte em que declarou o procedimento instaurado de especial complexidade quer na parte em que manteve os arguidos recorrentes sujeito à medida de coacção de prisão preventiva e, assim, fazer-se Justiça».

*Neste Tribunal, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, emitiu o Douto Parecer de fls. 78 a 79, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso.

*O recurso foi tempestivo, legítimo e correctamente admitido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

*FUNDAMENTOS O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões, extraídas pelo recorrente, da respectiva motivação[1], que, no caso "sub júdice", se circunscreve à questão de saber se estamos perante uma situação em que a excepcional complexidade do processo deva ou não ser declarada e se, se justifica a manutenção da prisão preventiva aplicada ao arguido B….

*DESPACHO RECORRIDO «A fls. 3484 a 3487 veio o Ministério Público promover que se declarasse a especial complexidade do processo e, consequentemente, se elevasse para um ano o prazo de prisão preventiva previsto no artigo 215º, nº 1, alínea a), por força do disposto no nº 3, do Código de Processo Penal.

Alega, para tanto e em resumo, que: - nos presentes autos se investiga a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. nos artigos 21º, nº 1, e 24º, alínea b), do D.L. nº 15/93, de 22/01, criminalidade esta legalmente definida como “altamente organizada” nos termos do artigo 1º, alínea m), do Código de Processo Penal; - existem, pelo menos, 26 arguidos/denunciados (que elenca) que compravam e vendiam, durante o ano de 2010 e até 20/12/2011, produtos estupefacientes – haxixe, pólen de haxixe, plantas de haxixe, MDMA, cocaína e cannabis – em quantidades que oscilavam entre o quilograma e...

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