Acórdão nº 291/10.9PAVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução24 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pr291/10.9PAVFR.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – A assistente B… veio interpor recurso do douto despacho do 2º Juízo de Competência Criminal de Santa Maria da Feira que indeferiu, por inadmissibilidade legal, o requerimento de abertura de instrução por si interposto e que indeferiu a arguição de nulidade do inquérito por si efetuada.

São as seguintes as conclusões da motivação do recurso: «1 – A ora recorrente não se conforma com o despacho proferido pelo Juiz de Instrução, em que considerou rejeitou o requerimento de abertura de instrução por inadmissibilidade legal, bem como, não atendeu à nulidade do inquérito por si invocada, dele interpondo o presente recurso; 3 – A reclamante impugna matéria de direito e vem arguir nulidade do despacho; 2 – O Juiz de Instrução não se pronunciou sobre o facto da recorrente estar em tempo ou não, aquando da sua apresentação de queixa, bem como ignorou a circunstância da mesma ter requerido apoio judiciário também na modalidade de nomeação de defensor oficioso e consequências legais daí decorrentes, o qual veio a ser proferido; 3 – Pelo exposto em 2), o despacho proferido é nulo, por violação do disposto no artigo 379.º n.º 1 alínea c), do CPP, já que se deveria ter pronunciado e não pronunciou, facto este relevante para a boa decisão da causa; 4 – Aquando da apresentação da queixa, a recorrente relatou também factos que se enquadram em crime contra a honra, cujo procedimento depende de acusação particular; 5 – O Ministério Público não procedeu a qualquer notificação da assistente e ora recorrente para efeitos de acusação particular e declarou encerrado o inquérito; 6 – Em crime de natureza particular, o que é o caso, o Ministério Público, por si só, carece de legitimidade para arquivar os autos; 7 – Esta nulidade do inquérito foi arguida e o Juiz de Instrução decidiu não se verificar a mesma, ao invés, ultrapassou a questão e decidiu de mérito, quando estava impedido legalmente de o fazer; 8 – Ao interpretar extensivamente, quando deveria ter interpretado restritivamente, o Juiz de Instrução violou o disposto nos artigos 285.º, 69.º n.º 2 alínea b), e, 287.º n.º 1 alínea b), todos do CPP; 9 – Por outro lado, sem mais, o Juiz de Instrução considerou inadmissível legalmente e rejeitou o requerimento de abertura de instrução, interpretando extensivamente o artigo n.º 287.º n.º 3, do CPP, quando o deveria ter interpretado restritivamente; 10 – Salvo melhor opinião, quando muito, deveria ter convidado a assistente a aperfeiçoar o seu requerimento, já que tal situação não contraria qualquer Princípio Penal, muito pelo contrário, o seu artigo 4.º do CPP, apela aos princípios de Processo Civil para integração de lacunas, logo, não é pelo simples facto de não estar previsto no CPP tal situação que, necessariamente, acarrete a sua não aplicação; 11 – Não obstante o mencionado, a recorrente expressamente remete para o seu requerimento de constituição de assistente, onde aí se enumera as circunstâncias de tempo, modo e lugar dos factos, bem como, no próprio requerimento de abertura de instrução, a mesma de forma clara enumera as razões de discordância com a tomada de posição do Ministério Público, pelo que se considera que o Juiz de Instrução, com o devido respeito, fez uma interpretação abusiva e extravasou o próprio espírito do nosso legislador, patente nas reformas efetuadas.» O Ministério Público junto da primeira instância respondeu à motivação do recurso, pugnando pela improcedência do mesmo.

O Ministério Público junto desta instância apôs o seu visto.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – As questões que importa decidir são, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, as seguintes: -a de saber se o despacho recorrido é, ou não, nulo, nos termos do artigo 379º, nº 1, c), do C.P.P., por não se ter pronunciado sobre a questão de saber se era tempestiva a queixa apresentada pela assistente em 10 de junho de 2010 e relativa à prática de crime de injúrias; - a de saber se o requerimento de abertura de instrução apresentado pela assistente deverá, ou não, ser admitido, por obedecer aos requisitos legais (ou, pelo menos, deve ser ela convidada a aperfeiçoar tal requerimento).

III – É o seguinte o teor do douto despacho recorrido: «Requerimento de fls. 108 e ss: Veio a assistente B…, na sequência do despacho de arquivamento proferido pela Digna Magistrada do Ministério Público, inconformado com o mesmo, requerer abertura de Instrução, alegando para tanto, em síntese, que se verifica, in casu, a prática, pelo arguido C… de um crime de ofensas à integridade física simples, praticado contra si. Conclui requerendo que seja proferido despacho de pronúncia pela prática do aludido crime.

Cumpre, assim, apreciar liminarmente o requerimento de abertura de instrução, afim de se decidir pela sua admissão ou rejeição.

Ora, compulsado o teor do aludido requerimento, afigura-se-nos ser de rejeitar o mesmo, porquanto está ferido de nulidade por inobservância das formalidades legais impostas. Dito por outras palavras, o mesmo não obedece ao disposto no art. 287°, n.º2 do Código de Processo Penal (CPP, doravante), por referência ao art. 283°, n.º3, al. a) e b) do CPP, o que torna inadmissível a instrução.

Assim é que, o requerimento de abertura de instrução deduzido pelo assistente destina-se a comprovar judicialmente a decisão de arquivamento do inquérito, e deve conter as razões de facto e de direito que o levam a discordar de uma tal decisão, mas além disso há-de constituir, substancialmente, uma verdadeira acusação.

Na verdade, não basta ao assistente expor os motivos da sua discordância relativamente à decisão tomada pelo Ministério Público, pois que o seu requerimento, conforme se dispõe claramente nos arts. 287°, n.º2 e 283°, n.º 3, al. b) e c) do Código de Processo Penal, tem de configurar substancialmente uma acusação, com a narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança e a indicação das disposições legais aplicáveis, sob pena de nulidade.

Assim, em obediência aos princípios basilares do processo penal, a solução legal referida para o requerimento da abertura da instrução que não contenha os factos integradores dos elementos objectivos e subjectivos típicos de um crime não pode ser outra, na medida em que o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente fixa o objecto do processo, delimitando a actividade de investigação e cognição a desenvolver pelo juiz de instrução, de tal forma que, nos termos do art. 309°, n.º1 do CPP, é nula a decisão instrutória que, entre outros, pronuncie o arguido por factos que constituam alteração substancial dos descritos no requerimento para abertura de instrução.

Acresce que, a fixação do objecto do processo, com base no requerimento de abertura de instrução, nos termos atrás expostos, está também interligada com o direito do arguido se defender das imputações que lhe são feitas (cfr. art. 61°, n.º 1, al.s b) e f) do CPP e art. 32° da Constituição da República Portuguesa), o que passa pela informação, em concreto, dos factos objectivos e subjectivos que lhe são imputados e os termos em tal é feito- cfr. art. 6° da...

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