Acórdão nº 193/12.4TBOAZ-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO LIMA COSTA
Data da Resolução25 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 193/12.4TBOAZ-B Juiz Relator: Pedro Lima da Costa Primeiro Adjunto: Araújo de Barros Segundo Adjunto: Judite Pires Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.

Sumariamente, alega a B1…: Na República Popular da China, a B1… encomendou e comprou a E…, Ltd, 9.950 peças de vestuário pelo preço de 163.323,60€; Conforme convencionado, o preço seria pago no prazo de 90 dias após o último embarque da mercadoria, segundo a convenção Free on Board; Para garantir o pagamento da encomenda, a E…, Ltd, exigiu uma carta de crédito irrevogável no valor do dito preço, pagável através do F…, carta essa em que figurasse como beneficiária não a E…, Ltd, e sim a D1…, o que foi aceite pela B1…; A B1…, agora na qualidade de fornecedora de G…, SL, era a beneficiária da carta de crédito …………., também no montante de 163.323,60€, emitida pelo H…, SA; O C1.., depois de ter recusado emitir uma carta de crédito autónoma à B1… para o efeito de pagar à D1… e de ter recusado descontar a carta de crédito …………., aceitou tão só intervir no endosso dessa carta de crédito …………., por forma a que nela figurasse como segunda beneficiária a D1…, mantendo-se a B1… como primeira beneficiária; Considera a B1… que o C1…, dessa forma, não assumiu qualquer responsabilidade própria e acrescida no pagamento da carta, já que esse pagamento é assumido exclusivamente pelo H…, limitando-se o C1…, enquanto banco transferente, a assegurar que o primeiro beneficiário, a B1…, cedia o seu crédito ao segundo beneficiário, a D1…; Embora o H… considere, e bem, que caducou o prazo de validade da carta de crédito, o C1… propõe-se, se não houver decisão do tribunal em sentido contrário, a pagar à sua custa o crédito em causa ao F…, banco este que representa a D1…, exigindo depois o seu reembolso à B1…; A B1… não aceitou que o C1…, em caso de recusa de pagamento por parte do H…, lhe pudesse exigir o valor da carta de crédito; Entretanto, o fornecedor chinês – ciente de que só poderia receber o crédito titulado pela carta de crédito se a mercadoria fosse embarcada até 30/8/2011 e se quer a factura, quer o packing list, indicassem expressamente o dito total de 9.950 artigos – dolosamente fez constar falsamente: - no bill of lading …………09 e respectiva packing list o embarque de 3.718 peças, quando efectivamente remeteu 3.535 peças; - nesse bill of lading, que o embarque ocorreu em 30/8/2011, quando efectivamente ocorreu em 1/9/2011; - no bill of lading …………31 e respectiva packing list, reportado a embarque, tempestivo, de 25/8/2011, o embarque de 3.517 peças, quando efectivamente remeteu 2.082 peças; - uma vez que o pagamento da carta de crédito dependia da entrega de mercadorias no valor global do crédito, ou seja, 163.323,60€, imputou às mercadorias esse mesmo valor total, desdobrado em 87.925€ no bill of lading …………31 e de 75.398,60€ no bill of lading ………..09.

Ora, se o fornecedor tivesse feito constar de um bill of lading a data de embarque como sendo 1/9/2011, se tivesse feito constar as quantidades reais embarcadas e se tivesse indicado o preço correcto dessas quantidades reais embarcadas, convenceu-se a B1… que o banco obrigado ao pagamento da carta de crédito recusaria pagar a mesma; Foi para obstar a essa recusa que o fornecedor fez constar aqueles elementos falsos; Vieram a ser entregues à B1… 5.610 peças, faltando 4.340 peças, peças estas que o fornecedor diz ter já embarcado em 8/9/2011, mas que a B1… ainda não recebeu; Acresce que os artigos recebidos apresentavam defeitos gravíssimos e a reparação desses defeitos, bem como a circunstância de só ter sido recebida parte da encomenda, fez com que a B1… só pudesse entregar aos seus clientes as respectivas encomendas para além dos prazos convencionados, apenas satisfazendo parcialmente as mesmas e tendo de suportar descontos nos preços entre 10% a 40%; O C1… comunicou à B1… que a obrigação do H… tinha caducado em 11/10/2011 e que irá pagar, ele mesmo, no dia 22/11/2011 o dito valor de 87.925€ e no dia 25/11/2011 o dito valor de 75.398,60€, não obstante ter sido informado sobre os referidos elementos de falsidade; A B1… terá prejuízos e incorrerá na ruína se o C1… lhe vier a exigir o que alega querer pagar; A soma das peças declaradas como enviadas é de 7.235 peças, o que excede a variabilidade prevista na carta de crédito para que fosse paga, variabilidade essa que é de 5% em relação à dita quantidade de 9.950 peças; A B1… não solicitou ao C1… que se obrigasse ao pagamento do montante da carta de crédito e este também não está obrigado a esse pagamento, seja pela existência dos referidos elementos de falsidade, seja por o C1… ser mero endossante, seja ainda por o C1… não ter confirmado a carta de crédito, antes inscrevendo nela “without our confirmation”.

Foi imediatamente proferido despacho, em 21/11/2011, decidindo-se deferir o procedimento cautelar e condenando-se o C1… a abster-se de pagar à D1…, enquanto beneficiária, o valor integral ou parcial da carta de crédito …………., ou, caso o C1… entenda pagar, intimando-se esse C1… a suspender esse pagamento até decisão final com trânsito em julgado, por se entender ser esse o meio processual próprio, onde existindo todas as garantias, melhor se poderá definir sobre o eventual direito de reembolso alegado pelo C1….

O C1… e a D1… foram notificados da petição inicial por carta registada com aviso de recepção expedida em 12/12/2011, sendo ainda a D1… notificada do despacho de 21/11/2011, nos termos e para os efeitos do art. 385 nº 6 do Código de Processo Civil (CPC).

Apresenta as seguintes conclusões: 1. Estando em causa uma carta de crédito em que o H… assume a qualidade de Banco emitente e a requerente a qualidade de 1.ª Beneficiária, a omissão de intervenção daquele Banco determina a violação do disposto no artigo 28.º/1 do CPC, pelo que as partes são ilegítimas para estar na acção.

  1. O Tribunal a quo deu como indiciados os factos sob os números 10.º, 11.º, 13.º, 18.º, 20.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 33.º.º 34.º, 35.º e 42.º, da douta sentença. Factos esses que, salvo o devido e muito respeito, foram incorrectamente julgados, porquanto contêm matéria conclusiva e de direito e contradizem os documentos apresentados pela requerente sob os docs. 4, 7, 9, para além de contraditórios entre si, como melhor vem especificado no corpo das presentes alegações.

  2. Entende ainda a 2ª requerida que estando em causa um crédito documentário, foi violado o artigo 405.º, e as Regras e Usos Uniformes relativas aos Créditos Documentários, da Câmara de Comércio Internacional (UCP 600), na medida em que não se retiraram todas as consequências dos artigos 4/a 10/a 24 e 38 do mencionado normativo.

  3. Em especial, a reconhecida irrevogabilidade do crédito documentário não foi relacionada com a sua função de garantia (nos mesmos termos que uma garantia bancária à primeira solicitação), o que determina que sejam considerados pelos agentes como o sangue das transacções comerciais internacionais.

  4. Não foi igualmente tido em conta o disposto no artigo 24 UCP 600 que manda fazer fé nos documentos apresentados ao Banco para pagamento do crédito.

  5. Se os mencionados documentos não mereceram qualquer oposição por parte do Banco pagador e se a mercadoria foi de facto, como foi admitido, expedida pela 2ª requerida e recebida pela requerente, que a utilizou, como reconhece e em mais de 60%, não existe qualquer fundamento para colocar em causa a fé dos documentos apresentados à 1.ª Requerida.

  6. Não existe, pois, fundamento, à luz das Regras e Usos Uniformes relativas aos Créditos Documentários, da Câmara de Comércio Internacional, para considerar não estarem preenchidas as condições do crédito documentário, condições essas aliás, que a requerente alterou à revelia dos restantes intervenientes.

  7. As características do crédito documentário dos autos, assim como todo o circunstancialismo trazido pela requerente não permitem sequer concluir estarem preenchidos os requisitos do número 1 do artigo 381.º do CPC.

  8. Por último, os factos permitem ainda concluir pela existência de uma situação de venire contra factum próprio, se considerarmos que à...

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