Acórdão nº 6029/10.3TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelMÁRCIA PORTELA
Data da Resolução29 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 6029/10.3TBMTS.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B….. intentou acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra C….., S.A., e D…., S.A, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 14.203,18, acrescida de juros legais que se vencerem a partir da citação até integral pagamento, condenação essa que deverá ainda ter lugar ainda que não se apure a culpa do condutor do veículo “QJ”, por aplicação do risco ou responsabilidade objectiva.

Alegou para o efeito, e em síntese, que no dia 2009.12.04, pelas 8h05m, na A28 Km 11.570, concelho de Matosinhos, ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-..-MR, conduzido pelo A., e sua propriedade, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-QJ, propriedade e conduzido por E…...

Tal acidente decorreu do despiste do QJ, ocasionado por uma condução desatenta do seu condutor, e posterior embate entre os dois veículos supra mencionados. Mais alega o A. que o acidente não resultou de causa ou força maior estranha ao funcionamento dos veículos.

Invoca que do sinistro decorreram danos materiais no seu veículo, implicando para a sua reparação um montante de 5.403,18 €, vendo-se ainda privado de utilizar o seu veículo por um período de 110 dias, sofrendo incómodos e vendo-se obrigado a recorrer, nas suas deslocações diárias de casa para o trabalho e no contacto com clientes, a empréstimo de um veículo equivalente ao veículo sinistrado, no que despendeu o valor de 8.800,00 €.

Mais alegou que a R. C…., S.A., assumiu por contrato de seguro em vigor à data do acidente, e posteriormente, a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros pelo citado “QJ”, sendo a 2.ª co-R., D….., S.A., aqui demandada em virtude da Condição Especial IDS (indemnização Directa ao Segurado), à qual as seguradoras dos intervenientes aderiram.

Contestaram as RR..

A R. D….., S.A., excepcionou a sua ilegitimidade por não ser a seguradora do veículo a cujo condutor o A. imputa a responsabilidade pelos danos reclamados nestes autos, sendo certo que a convenção IDS apenas a obrigava à regularização amigável do sinistro, em sede extrajudicial. Frustrando-se tal tentativa de resolução amigável, deixou de ser responsável pelo pagamento de qualquer quantia, daí decorrendo a sua ilegitimidade.

Impugnou ainda a 2ª R. parte da factualidade invocada na petição inicial, alegando que nos termos do disposto no artigo 41.º, do Decreto-Lei .L. n.º 291/2007, de 21 de Agosto, o A. só terá direito a indemnização equivalente ao valor venal do veículo, deduzido do valor do salvado, e não ao valor da reparação, posição que comunicou atempadamente ao A.. Mais invocou que só poderá ser considerada responsável pelos dias de paralisação que mediaram o acidente e a comunicação ao A. com a posição final sobre os danos.

A 1ª R., Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A., impugnou parte da factualidade invocada na petição inicial, alegando também que atento o valor venal do veículo do A., e o valor estimado para a sua reparação, confrontamo-nos com uma situação de perda total, pelo que terá o A. apenas direito a uma indemnização de € 2.750,00, ou, caso fique na posse dos salvados, de € 2.525.00. Mais alegou que tendo sido comunicados tais valores a 29 de Dezembro de 2009, o A. não tem direito aos valores que reclama a título de privação do veículo.

Respondeu a A., pugnando pela improcedência da excepção.

Foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a excepção de ilegitimidade arguida, face ao alegado pelo A. e ao disposto no artigo 26.º CPC, e julgando a acção improcedente quanto à co-R. D….., S.A., absolvendo- a do pedido.

Não se procedeu à selecção da matéria de facto dada a simplicidade da matéria controvertida, nos termos do disposto no artigo 787.º, n.º 2, CPC.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a R. C….., S.A., no pagamento ao A. da indemnização de € 4.351,59, acrescida dos correspondentes juros de mora à taxa legal aplicável, desde a data da sua citação nos presentes autos até integral e efectivo pagamento.

Inconformados recorreram o A. e a R..

O A. apresentou as seguintes conclusões: «1. No presente recurso, o recorrente pretende demonstrar e concluir que, a Douta Sentença recorrida, enferma de erro de interpretação dos factos, e de direito, os quais impõe, sempre a sua total procedência da acção e, não a sua procedência parcial, como foi decidido.

  1. Com o devido respeito, não se nos afigura correcta a decisão ora posta em crise, quer no que respeita à apreciação da matéria de facto, quer no que concerne à aplicação de Direito.

  2. Foram dados como provados os seguintes factos, especialmente relevantes para a decisão a adoptar: a) No dia 04 de Dezembro de 2009, pelas 8h05m, na A 28 Km 11.570, concelho de Matosinhos, ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-..-MR, conduzido pelo autor, sua propriedade, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-QJ, propriedade e conduzido por E…...

    1. No indicado dia, hora e local, o autor conduzia o “MR”, no sentido Viana- Porto, pela hemifaixa direita, sendo esta, constituída por três vias.

    2. O A. circulava pela via da esquerda, a velocidade não superior a 90 Km/hora e com atenção ao trânsito que então se processava no local.

    3. À mesma hora, pela mesma estrada e na via do meio, à frente do “MR”, seguia o veículo “QJ”, no mesmo sentido de marcha do autor.

    4. De forma totalmente inesperada, o “QJ”, entrou em despiste, fazendo pião, de forma que o referido veículo, ficou em sentido oposto, do da sua marcha.

    5. Consequentemente, o mencionado “QJ” subitamente embateu com a parte frontal do seu veículo, no veículo do autor.

    6. O autor nada pôde fazer para evitar o acidente, em virtude do brusco e inesperado aparecimento do “QJ”.

    7. Como consequência directa e necessária do acidente, resultaram para o veículo automóvel do autor, múltiplos danos a exigir serviços de reparação de chapeiro, de pintor, de electricista e estofador, bem como, a substituição de múltiplas peças, que em consequência do embate ficaram destruídas e irreparáveis, designadamente, um guarda-lamas frente, uma óptica direita, um pisca direito, um para-choques frente, um espelho retrovisor direito, uma grelha, radiador, capôt, tudo no valor de 5.403,18 €, já acrescido do respectivo IVA.

    8. Em consequência do acidente, o autor ficou privado da utilização do seu veículo, por um período de 110 dias, necessários à aquisição de uma viatura equivalente, e por privado do seu uso, sofreu incómodos e viu-se obrigado a recorrer, nas suas deslocações diárias de casa para o trabalho e no contacto com clientes, a empréstimo de um veículo equivalente ao veículo sinistrado.

    9. A R. C….., S.A., assumiu por contrato de seguro titulado pela apólice nº 0900353279 em vigor à data do acidente, a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros pelo citado “QJ”.

  3. O Douto Tribunal a quo, mediante esta factualidade, decidiu aplicar o regime do artigo 502º, do Código Civil, da responsabilidade civil objectiva, ou pelo risco, como subsidiariamente peticionou o recorrente, situação que se enquadrava neste regime, e não contemplando no artigo 493º, do Código Civil, da responsabilidade civil por factos ilícitos.

  4. Sendo certo que, ocorreu um despiste do veículo “QJ”, fazendo peão, de forma a que o referido veículo ficou em sentido oposto, do da sua marcha.

  5. Consequentemente, o mencionado “QJ”, subitamente embateu com a parte frontal do seu veículo, no veículo do recorrente, nada podendo este, fazer para evitar o acidente, em virtude do brusco e inesperado aparecimento do “QJ”.

  6. Efectivamente, o condutor do “QJ” violou objectivamente a norma do Código de Estrada, vigorando a presunção «tantum juris», de negligência contra o autor material da contravenção, dispensando-se, pois, a prova, em concreto, da falta de diligência.

  7. Efectuando uma síntese compreensiva do essencial da factualidade que ficou consagrada, importa reter, neste particular, que o veículo automóvel “QJ” entrando em despiste e, consequentemente em peão, a conduta do condutor revela que actuou de forma grosseira, negligente, imperita, inconsiderada e inábil.

  8. Consequentemente, impõe – se concluir que o acidente ficou a dever-se à culpa exclusiva do citado condutor do “QJ”.

  9. Não concordamos assim, com a contradição explanada na sentença, se por um lado o Douto Tribunal considera que ocorreu um despiste e que o mesmo violou, objectivamente a norma do Código de Estrada, por outro lado, considera que não é possível imputar tal facto, ao referido condutor do “QJ” a título de dolo ou negligência.

  10. E, de outra maneira não poderia ser, aquele que viola objectivamente a norma do Código de Estrada, fá-lo sempre, quanto mais não seja, a título de negligência.

  11. Ao contrário da conduta automobilística, imperita e inábil do “QJ”, o recorrente circulava pela via da esquerda, a velocidade não superior a 90 Km/hora e com atenção ao trânsito, que então se processava no local, conforme resultou provado, da matéria de facto.

  12. Assim, uma pessoa diligente, com a prudência e cuidado de um bom pai de família, toma as devidas precauções, para evitar o acidente e a referida colisão de veículos.

  13. Pelo que, existe manifesta culpa do condutor do “QJ”.

  14. A ser assim, encontram-se preenchidos todos os requisitos para a emergência da obrigação da Ré, C….., S.A., em virtude desta assumir por contrato de seguro, titulado pela apólice nº 0900353279, indemnizar o recorrente, no pagamento de 8.703,18 €, acrescido dos correspondentes juros de mora, à taxa legal aplicável, desde a data da sua citação, nos presentes autos, até integral e efectivo pagamento, por força da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, previsto pelo artº 483º do Código Civil.

    Caso assim não se entenda, por mera cautela se dirá o...

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