Acórdão nº 121/08.1TTBGC.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução21 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 121/08.1TTBGC.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 154) Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1712) Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, engenheiro …, residente em Bragança, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, com sede em Lisboa, pedindo a condenação deste a: 1- Reconhecer que o denominado contrato de prestação de serviços constitui desde o seu início um verdadeiro contrato de trabalho por tempo indeterminado; 2- Reconhecer a ilicitude do despedimento / resolução unilateral do contrato de trabalho por parte do R.; 3- Pagar ao A. uma indemnização não inferior ao montante das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento (20/4/2007) até ao trânsito em julgado da sentença do Tribunal (incluindo o valor relativo a férias, subsídios de férias e de Natal referentes ao mesmo período), no valor de € 12.040,84; 4- pagar ao A. a título de indemnização legal o correspondente à quantia de um mês de remuneração base (€860,06) por cada ano ou fracção, com antiguidade reportada a 21/04/2003 e até ao trânsito em julgado da sentença, no valor, à data da propositura da acção, de €4.300,30; 5- Pagar ao A. a importância correspondente aos juros de mora liquidados sobre a totalidade das quantias referidas, vencidas desde a data da respectiva constituição em mora e vincendos, até integral e efectivo pagamento; 6- Pagar ao A. a quantia de €1000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos com o despedimento.

Alegou, em síntese, que: - Foi admitido ao serviço do R. mediante a celebração de um contrato de trabalho a termo certo em 19/07/1999, que foi renovado sucessivamente por duas vezes, tendo caducado em 18/07/2002, após o que ficou em situação de desemprego por um período de sete meses; - Em 21/4/2003 celebrou com o R. um Contrato de Prestação de Serviços, que cessou em 20/04/2007 por denúncia do R.; - Mediante tal contrato o A. comprometeu-se a prestar serviços no âmbito do Projecto SNIRB, solicitados pela Direcção Geral de Agricultura de Trás-os-Montes, necessários à prossecução dos objectivos do R. e este comprometeu-se a pagar Àquele a quantia mensal de € 809,47, acrescido de IVA à taxa legal em vigor; - Tal contrato, porém, consubstanciou, de facto, uma relação laboral, com subordinação jurídica e económica por parte do A., tendo este trabalhado sob as ordens e instruções dos superiores hierárquicos do serviço onde prestava funções, auferido um vencimento fixo mensal, actualizado de acordo com as tabelas remuneratórias da Administração Pública, gozado férias como qualquer trabalhador e cumprido um horário de trabalho previamente fixado pelo R., em instalações pertencentes ao Ministério da Agricultura e com instrumentos de trabalho fornecidos pelo R.; - O A. sofreu danos de natureza não patrimonial em consequência da cessação do contrato; - O contrato denominado de prestação de serviços é nulo por força do disposto no art. 10º nº 6 do D.L. 184/89 de 2/06 e do disposto no art. 7º nº 4 da Lei 23/2004, de 22/06; - Contudo, o contrato de trabalho nulo produziu os seus efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual se manteve em execução material efectiva, nos termos do art. 115º do Código do Trabalho; - Dado que o R. pôs termo ao contrato sem invocar a sua nulidade, a execução do mesmo só deixará de produzir os seus efeitos com o trânsito em julgado da sentença que declare a sua nulidade e a sua cessação traduz-se num despedimento ilícito porque não precedido de processo disciplinar e por inexistência de justa causa, conferindo ao A. os direito aos créditos reclamados.

Contestou o R., excepcionando a caducidade da acção e impugnando, no essencial, os factos alegados pelo A. Subsidiariamente, para o caso de se considerar que existe contrato de trabalho, invocou a nulidade deste.

O A. respondeu, pugnando pela improcedência da excepção peremptória e impugnado, no essencial, os factos alegados na contestação.

Foi proferido despacho saneador, no qual, após fixado o valor à causa, se julgou improcedente a excepção peremptória de caducidade. Foi dispensada a elaboração da base instrutória (fls. 97/100).

Inconformada, a R. interpôs recurso do despacho saneador, na parte em que julgou improcedente a excepção peremptória de caducidade, o qual foi admitido, com efeito devolutivo e subida imediata, em separado. Porém, por douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20/06/2009 foi negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida.

Procedeu-se a julgamento tendo sido fixada a matéria de facto provada e não provada, sem reclamação.

Foi afinal proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, e absolveu o R.

Inconformado, o A. interpôs o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: “1ª. Nos pontos 23 e 39 da douta resposta à matéria de facto proferida em 01-04-2009, considerou-se que “O A. desempenhava as suas funções com autonomia técnica e com grande dedicação” e “As tarefas do A. eram desempenhadas com total autonomia técnica e funcional”.

  1. Salvo o devido respeito, considera-se que as respostas relativas a tal “autonomia técnica e funcional” constituem meros conceitos e questões de direito, conclusivos e não suportados em factos concretos que a tal pudessem reconduzir, que, atento o disposto no artº 646º, nº 4, CPC, deverão considerar-se não escritas.

  2. Na mesma douta resposta à matéria de facto foram dados como não provados os factos constantes do artº 15º da petição inicial, onde se alegou que “15º. O seu serviço era prestado em instalações pertencentes ao Ministério da Agricultura e por consequência ao ora R.”.

  3. Salvo o muito devido respeito, entende-se que tal resposta negativa foi dada em contradição com os factos dados como provados, designadamente, nos pontos 14, 26 e 32 dos factos dados como provados, pelo que deve a douta decisão ser alterada em conformidade.

  4. Salvo o devido respeito, não se concorda com o entendimento constante de fls. 8 da douta sentença, quando considerou não ser aplicável à situação em apreço a presunção de laboralidade estabelecida no art. 12º do Código do Trabalho.

  5. O contrato de prestação de serviços constante do doc. 2 com a petição inicial foi celebrado em 21 de Abril de 2003 e o Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003 entrou em vigor em 1-12-2003.

  6. O art. 8º da respectiva Lei Preambular, sobre a aplicação da lei no tempo, estabelece que “(…) ficam sujeitos ao regime do Código do Trabalho os contratos de trabalho … celebrados ou aprovados antes da sua entrada em vigor, salvo quanto às condições de validade e aos efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento”. (sublinhado nosso).

  7. Em face de tal redacção, não sendo o contrato celebrado em 21-04-2003, de trabalho, ou de prestações de serviços, sujeito a qualquer forma especial, antes ou depois, não são as naturalmente condições de validade que impedem a aplicação do novo código do trabalho.

  8. Por outro lado, a relação jurídica entre A. e R. foi iniciada em 21-04-2003 com a celebração do contrato a que chamaram de prestação de serviços e perdurou sucessivamente até 20-04-2007, verificando-se assim que, apesar de se iniciar antes da entrada em vigor do Cod. Trabalho de 2003, a mesma perdurou para além de 1-12-2003, data da respectiva entrada em vigor, sendo os factos em apreciação temporalmente sucessivos.

  9. Razão pela qual se entende que, pelo menos a partir de 1-12-2003, a relação jurídica sucessivamente existente entre as partes é regulada pelo Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003, beneficiando o Autor, por via disso, da presunção de laboralidade a que se reporta o respectivo artº 12º.

  10. A fls. 10 da douta sentença considerou-se que “2.2 No caso em apreço o contrato assumiu a forma escrita (cf. fls. 23 a 24, pelo que é conhecido o que foi clausulado pelas partes e o nome que deram ao negócio jurídico que celebraram, o que constitui um ponto de partida para a interpretação da vontade negocial. De acordo com as regras estabelecidas nos arts. 236º e segs. do Código Civil, a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se conhecer a vontade real deste. Nos negócios formais, porém, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência na letra do documento, ainda que imperfeitamente expresso, a não ser que corresponda à vontade real das partes e as razões determinantes da forma não se ponham a essa validade.” 12ª. Sempre com o muito devido respeito, não se concorda com tal entendimento, tendo em conta que nenhum dos contratos, de trabalho ou prestações de serviços, traduzem qualquer negócio de exigência formal, nos termos do artº 220º, Código Civil, sendo por isso inaplicável o disposto no artº 236º, CC.

  11. Pelo que deve a relação jurídica existente entre as partes ser qualificada pela forma como a mesma se produziu e executou no tempo, independentemente do teor do contrato celebrado e denominado como “de prestação de serviços”.

  12. De qualquer forma, ainda que não se considere pela aplicação da presunção de laboralidade prevista no artº 12º do Código do Trabalho, mesmo assim, entende-se que o Autor provou estarem preenchidos os elementos constitutivos do contrato de trabalho, tendo demonstrado os necessários e pertinentes índices de laboralidade.

  13. Entende-se que os factos dados como provados impõem que se considere que a relação jurídica existente entre as partes seja qualificada como contrato de trabalho, por corresponder a um contrato pelo qual o A. se obrigou, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a favor do Réu, sob autoridade e direcção...

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