Acórdão nº 1019/09.1TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelTELES DE MENEZES
Data da Resolução24 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 1019/09.1TBPVZ.P1 (24.04.2012) – 3.ª Teles de Menezes e Melo – n.º 1322 Des. Mário Fernandes Des. Leonel Serôdio Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B… e mulher C…, D… e E… e marido F… instauraram a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra G… e H…, S.A., pedindo:

  1. Se declare a nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre os AA. e o R. G…, no dia 05.04.2007, a que se alude no artigo 22.º da petição inicial, por divergência entre a declaração negocial dele constante e a vontade real de todos os declarantes, nos termos dos artigos 240º e seguintes do Código Civil; b) Se ordene o cancelamento da inscrição pela AP46, de 05.04.07 da descrição nº 124, da freguesia de … da Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, relativa ao registo de aquisição a favor do R. G…; c) Se ordene o cancelamento da inscrição pela AP34, de 16.07.07 da descrição nº 124, da freguesia de … da Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim, relativa ao registo de hipoteca a favor do R. H…, S.A.; d) Se condene o R. a restituir aos AA. o imóvel objecto do contrato de compra e venda, completamente livre de quaisquer ónus ou encargos.

    Alegaram que no início do ano de 2007, o 1.º R. procurou o A. B… e propôs-se celebrar com os AA., que eram comproprietários de um terreno de lavradio no …, …, Póvoa de Varzim, descrito na CRP sob o n.º 124 e inscrito na matriz sob o art. 315.º, um contrato de permuta, a fim de aquele edificar sobre o imóvel dos A.A. um empreendimento habitacional constituído por várias moradias unifamiliares, dando em troca aos AA. uma parte da construção a realizar. Seriam edificadas 16 moradias unifamiliares, das quais 3 seriam entregues aos AA., duas geminadas e uma independente, até 05.04.2010. Como garantia de cumprimento da obrigação de entrega das casas aos AA., o R. aceitou pagar € 1.000.000,00 caso não cumprisse, bem como uma penalização mensal de € 600,00 e € 400,00 em caso de atraso na entrega, consoante se tratasse das casas geminadas ou da outra. Os AA. aceitaram a permuta nos termos indicados. Para formalização do contrato de permuta acertado o 1.º R. sugeriu e os AA. aceitaram que se procedesse à celebração de escritura pública, tendo o R. proposto e convencido os AA. a celebrarem uma escritura pública de compra e venda, para poder, desde logo, iniciar o processo tendente à elaboração e aprovação dos projectos de construção, pois podia apresentar todos os processos na câmara municipal e demais entidades em seu nome e, por outro lado, como tudo implicava despesas elevadas, precisava que fossem facturadas em seu nome, para abater aos lucros que iria ter, assim suavizando os impostos que iria pagar. Embora não correspondesse ao contrato negociado e acertado entre AA. e R., fruto da amizade que ligava aqueles a este, os AA. acabaram por aceder à formalização do negócio nos termos propostos pelo R., pelo que foi celebrada escritura de compra e venda em 05.04.2007, declarando-se nela que o preço era de € 79.620,00, e que os vendedores já o tinham recebido. No entanto, o 1.º R. não pagou aos AA. qualquer quantia, nem estes a receberam, e o preço declarado não tinha qualquer correspondência com o valor real do imóvel, com base no qual foram acertados todos os contornos do contrato de permuta efectivamente acordado entre as partes. Acontece que o 1.º R. se encontrava muito endividado e fugiu para o Brasil, tendo o seu mandatário dito aos AA. que ele não podia cumprir a obrigação assumida perante eles. Em 2007, o 1.º R. constituiu uma hipoteca voluntária a favor do 2.º R., para “garantia de todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade I…, Lda (…) decorrentes da abertura de crédito no montante de 650.000,00, ao juro de 8,5%, acrescido de 4% na mora a título de cláusula penal e € 26.000,00 para despesas”, sendo o montante máximo assegurado de € 919.750,00. O 2.º R. tinha conhecimento de que o imóvel dos autos veio à propriedade do 1.º R. nas precisas condições referidas, sabendo que a escritura de compra e venda não correspondia ao negócio real efectivamente celebrado, tendo conhecimento de que o preço não correspondia ao valor real do imóvel e que o 1.º R. não pagara aos AA. qualquer quantia, e que o 1.º R. se obrigara a pagar aos AA. as 3 moradias. Nem os AA. nem o 1º R. quiseram celebrar o referido contrato de compra e venda (negócio aparente ou simulado), mas antes um contrato de permuta (negócio real ou dissimulado), correspondente à vontade real das partes.

    H…, S.A. contestou, alegando desconhecer os factos invocados pelos AA. e os negócios celebrados pelo 1.º R. e aqueles, nomeadamente a compra e venda titulada por escritura outorgada em 5 de Abril de 2007, por serem anteriores ao estabelecimento das relações comerciais entre os RR.. A sociedade I…, Lda pediu-lhe um financiamento sob a forma de abertura de crédito em 30.05.2007, o qual lhe foi concedido no montante de € 650.000,00, que foi colocado à disposição da sociedade em 27.07.2007. O 1.º R., como representante da sociedade, pediu o financiamento dizendo que se destinava a desenvolver um projecto imobiliário de construção de 16 moradias num terreno de que era proprietário. O 2.º R. subordinou a concessão do financiamento à constituição de garantias reais e pessoais por parte do proponente, pelo que em 20.06.2007 outorgou com o 1.º R., em seu nome pessoal e em representação da sociedade, uma escritura de abertura de crédito com hipoteca, na qual o 1.º R. a título pessoal constituiu hipoteca sobre o prédio rústico atrás identificado, a qual foi devidamente registada. O 2.º R. agiu de boa fé, não tendo praticado qualquer acto com o objectivo de prejudicar eventuais direitos dos AA.

    O R. G… foi citado editalmente e, porque não ofereceu contestação, foi citado o M.ºP.º, nos termos do art. 15.º/1 do CPC, que também não contestou.

    Os AA. replicaram, impugnando os factos alegados pelo 2.º R. e concluindo como na p. i.

    Realizou-se audiência preliminar, nela se lavrando saneador e organizando a condensação.

    Após instrução procedeu-se ao julgamento e veio a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo os RR. do pedido.

    II.

    Recorreram os AA., concluindo: 1 - Salvo o devido respeito pela posição sufragada na douta Sentença ora em crise, entende-se que a mesma padece de um duplo vício, porquanto procede a um incorrecto julgamento da matéria de facto, ao mesmo tempo que não extrai de forma correcta as consequências jurídicas da matéria de facto apurada no decurso da audiência de discussão e julgamento; 2 - Pelos motivos expostos nos itens 4º a 27º supra, impõe-se a reapreciação e alteração da matéria de facto dada como provada, uma vez que a prova produzida durante a audiência de discussão e julgamento, implica uma resposta positiva à matéria dos quesitos nº 9º, 10º, 11º, 14º, 15º, 16º, todos da douta Base Instrutória (B.I.), e que a Mmª Juiz “a quo”, ou considerou como não provada, ou formulou uma resposta restritiva.

    3 - Da matéria de facto apurada e transcrita nos itens 28º a 49º supra – incluindo a que, como se espera, resultará da alteração ao julgamento da matéria de facto realizada em primeira instância - resulta de forma clara e inequívoca que as declarações negociais que constam da escritura de compra e venda datada de 05 de Abril 2007, celebrada entre A.A. e primeiro Réu, não correspondem à vontade real dos ali intervenientes e as correspondentes à sua vontade real não foram transpostas para a dita escritura pública; 4 - Resulta da matéria de facto apurada que, desde o primeiro momento, que as partes quiseram celebrar um contrato de permuta, por força do qual os A.A. entregariam o terreno ao Réu, que em troca, lhes entregaria uma parte da construção que pretendia edificar sobre o mesmo (três das dezasseis moradias unifamiliares que pretendia construir sobre o prédio dos autos), aceitando suportar todos os custos inerentes à referida construção; 5 - Nunca, foi vontade dos A.A. vender ao primeiro Réu o prédio de que eram comproprietários, assim como, nunca foi vontade do mesmo Réu comprar o referido prédio; 6 - Nunca foi vontade ou intenção dos A.A. receber uma determinada quantia em dinheiro e o primeiro Réu nunca teve a intenção de desembolsar, como efectivamente nunca desembolsou, qualquer quantia em numerário, fosse a que consta da escritura, fosse qualquer outra, para pagamento do preço. Para além disso, o preço que as partes fizeram constar da referida escritura não tem qualquer correspondência com a realidade, já que o prédio dos autos valia cerca de 1.000.000,00 €; 7 - Entre A.A. e o primeiro R. foi, desde o início das negociações, acordado um contrato de permuta, nos termos do qual os A.A. entregariam o prédio dos autos, recebendo em troca de um conjunto de fracções (no caso três moradias), procedendo as partes à formalização da acordada permuta através da celebração de escritura pública outorgada apenas e só depois de concluída a construção, por só nessa altura o construtor estar em condições de cumprir integralmente as obrigações a que se obrigara aquando das negociações; 8 -...

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