Acórdão nº 2604/09.7TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução10 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2604/09.7TBPVZ.P1 (Apelação) Tribunal recorrido: Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim (1.º Juízo Competência Cível) Apelante: Companhia de Seguros B…, S.A.

Apelada: C… Sumário: Se a lesão resultante de acidente de viação apenas determina um maior dispêndio de esforço e energia na realização das tarefas diárias, este dano deve ser ressarcido como dano biológico que é, segundo os parâmetros da avaliação do dano não patrimonial, pelo que, na determinação do valor da compensação, não pode ser abatido o valor do capital de remição pago à sinistrada, no âmbito do processo de acidente de trabalho.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO C… intentou a ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a Companhia de Seguros B…, S.A.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €78.588,03, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, assim discriminada: - a título de danos não patrimoniais €40.000,00 (correspondendo €25.000,00 pelo desfeiamento e €15.000,00 pelo quantum doloris); - a título de danos patrimoniais - lucros cessantes –, €19.391,78; - pela incapacidade total temporária €3.395,75; - pelo dano funcional ou biológico €15.000,00; e - pelas despesas com tratamentos, consultas e exames €800,50.

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em suma, que no dia 16/07/2008, quando se encontrava no meio da passadeira destinada a peões, a atravessar a Rua …, na EN .., Póvoa de Varzim, foi colhida pelo veículo automóvel de matrícula ..-..-TQ, conduzido pelo seu proprietário, D… e cuja responsabilidade civil emergente de acidentes de viação havia sido transferida para a ré, através da celebração de contrato de seguro.

Em consequência a autora sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais que pretende ver ressarcidos.

A ré contestou, por impugnação, alegando, em síntese, que o acidente foi considerado também acidente de trabalho, tendo no âmbito desse processo, pago à autora, na qualidade de seguradora também da responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho, a quantia de €1.235,03, a título de perdas salariais, tendo a sua entidade patronal aceitado pagar-lhe, ao mesmo título, €412,61.

Concluiu pelo julgamento da ação de acordo com a prova a produzir.

Foi proferido despacho saneador. Selecionou-se a factualidade assente e elaborou-se a base instrutória, que foi objeto de reclamações, decididas conforme consta de fls. 133.

A fls. 111 veio a ré apresentar articulado superveniente, nos termos do artigo 506.º do Código de Processo Civil (CPC), alegando que correu termos no Tribunal do Trabalho de Barcelos, o processo nº 866/08.6TTBCL (acidente de trabalho) no qual foi proferida sentença que condenou a ré (bem como e entidade empregadora) a pagar à ora autora, uma pensão anual e vitalícia, obrigatoriamente remível, pelo que, em 08/01/2010, a ré fez entrega à autora do capital de remição de €2.842,70, declarando-se esta paga de todas as pensões até à data do cálculo. Concluiu que o capital de remição deve ser levado em consideração na indemnização a fixar.

Tal articulado foi admitido liminarmente e cumprido o contraditório. Por despacho de fls. 137 considerou-se assente a matéria vertida no referido articulado, a ser considerada em sede de sentença.

Durante a instrução foi realizada perícia médico-legal, cujo relatório se encontra junto a fls. 149-152 e 230-234.

Realizado o julgamento, em 07/05/2012, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou “ré Companhia de Seguros B…, S.A. a pagar à autora C… a quantia total de 29.726.50€, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, desde a data da presente decisão até integral pagamento, quanto à quantia de 26.000€ e, desde a data da citação até integral pagamento, quanto à restante quantia, absolvendo-se a ré do demais peticionado pela autora.” Inconformada, apelou a ré, pugnando pela alteração da sentença em relação ao quantum indemnizatório.

Contra-alegou a autora, e ampliou o âmbito do recurso ao abrigo do artigo 684.º, n.º 1, do CPC, pugnando pela alteração do valor fixado, mas em sentido oposto.

Conclusões da apelante: “1. A indemnização fixada a título de dano não patrimonial, pelo Dano Estético e Dores Sofridas é excessivo.

  1. Não sendo a dor e os sentimentos mensuráveis há que recorrer a juízos de equidade.

  2. Quantificando o grau de intensidade do dano e especialmente o estético pelo mínimo, a realidade económica, política, social e cultural do país e os valores que vêm sendo sufragados pelos nossos Tribunais, a indemnização devida a este título não pode ser fixada em quantia superior a 10.000€, o que se requer.

  3. A indemnização fixada de 5.000€ pelo dano biológico a título de dano não patrimonial (dano futuro) é justa e adequada.

  4. Porque a Ré já pagou à A. a título de capital de remissão 2.842,79€, deve tal quantia ser deduzida no montante a pagar, sendo, assim, a este respeito, a Ré apenas ser condenada a pagar a quantia de 2.157,21€.

  5. Não deverá ser fixada à A. qualquer indemnização por danos patrimoniais, relativamente à perda de capacidade de ganho (dano futuro) já que esta inexiste objectiva e subjectivamente, considerando, ainda, que a A. foi já indemnizada pelos esforços acrescidos para desempenho das suas funções.

  6. Relativamente aos “ganhos cessantes” e ITA, deve a Ré ser condenada apenas a pagar a quantia de 1.278,36€, considerando que não foi deduzida a quantia já recebida de 1.647,64€, que a Ré e entidade patronal da A. foram condenadas a pagar no âmbito do processo decorrente do acidente dos autos que também foi de trabalho.

  7. Assim, à quantia de 2.926,00€ deve-se deduzir os 1.647,64 que a Ré e entidade patronal da A. foram condenadas já a pagar, sob pena de enriquecimento sem causa da A..

  8. Caso assim não se entenda, o que apenas por dever de patrocínio se admite, deveria e deve ser atendida a reclamação à fixação dos factos assentes e Base Instrutória, nomeadamente deve ser selecionado para a Base Instrutória o alegado no artigo 13º da contestação, repetindo-se, nesta parte, o julgamento.

    Termos em que deve revogar-se a decisão recorrida, condenando-se a recorrente tão só na forma propugnada nestas alegações, assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA.

    Foram violados: artigos 496º, 562º, 564º e 566º, todos do Código Civil.” Conclusões da apelada: “1.º- Os montantes indemnizatórios de €29.726,50 fixados na sentença em impugnação nem de perto, nem de longe, poderão compensar os danos sofridos e a sofrer pela A.

    1. - E se assim ocorre na sentença em análise, a situação agrava-se consideravelmente nas alegações do presente recurso, logo que a Ré atribui para os itens dano estético e quantum doloris apenas o valor conjunto de €10.000,00!...

    2. - E mais se agrava o desequilíbrio quanto à compensação entre danos sofridos e respectivos valores atribuídos nas alegações da Ré, e ainda a título de danos não patrimoniais, na versão de dano biológico (danos futuros), logo que esta as quantifica em €5.000,00!...

    3. - E agrava-se ainda mais o referenciado desequilíbrio, entre aqueles dois vectores, quando a Ré, recusando-se a ver o que vem decidido a págs. 26 da sentença em crise; 5.º- E a respeito do que alegou no seu recurso, a págs. 6 e 7, sobre os valores atribuídos para compensação do dano biológico, considerado nas duas versões (de dano não-patrimonial e dano patrimonial), ali declara que a A., no 1.º tipo de dano (dano não patrimonial), não deve ser ressarcida, porque não existe tal dano; e no 2.º tipo (dano patrimonial), que o mesmo já foi pago à A., em sede de processo de direito laboral.

    4. - E no entanto, a Ré esquece que a A., porque no fulgor dos seus 29 anos, e adornada pela beleza e graça de que era portadora, antes do evento, e exercendo a exigente actividade comercial, os danos porque sofreu, sofre e continuará sofrendo vida fora, devem ser valorados diferentemente do que ocorre num outro sinistrado não contemplado ou adstrito àquelas circunstâncias!...

    5. - Assim, como danos patrimoniais propriamente ditos e em qualquer das versões que os entendamos, a Ré só acaba por conceber, no presente processo, os parcos €2.926,00, mas que entretanto já os havia entregue à A., em sede do processo laboral referenciado na precedente 5.ª Cl.ª!...

    6. - E, na verdade, nos termos deduzidos da Tabela Financeira, elaborada na Faculdade de Economia do Porto, por Júlio Serra e João Antunes, e sempre cum grano salis, resulta ter a A. direito a ser ressarcida, por tal dano patrimonial, com o montante de, pelo menos, €19.391,78.

    7. - A título de danos morais, na versão do quantum doloris e prejuízo estético, considera a A. ter direito aos €40.000,00 reclamados na P. inicial.

    8. - E, na verdade, atendendo aos sofrimentos consistentes nas dores físicas e morais de que a A. é objecto, e consideradas nos itens 3 e 5, alínea C) destas contra-alegações, bem como ao desfeiamento anotado no presente trabalho, maxime no item 4 da mesma alínea C), só através do assim fixado ressarcimento de tais danos é que se há-de encontrar o equilíbrio entre esses danos sofridos e a atribuída soma.

    9. - Entendendo a A. não haverem sido correctamente ressarcidos os danos patrimoniais propriamente ditos e o dano biológico, (este considerado na sua versão de complemento, destinado a corrigir os resultados das tabelas numéricas utilizadas na medida dos danos físicos e morais das vitimais de acidentes de viação), a A. procede à ampliação do presente recurso, interposto pela Ré.

    10. - Como atrás (Cl.ª 7.ª), já se alegou, só através do emprego da escala numérica, referenciada nas sobreditas conclusões, é que os Magistrados Julgadores poderão eficazmente equacionar tal tipo de dano e manter-se a coberto do seu próprio subjectivismo!...

    11. - Daí que só atribuindo à A. aquela ali reclamada quantia (de €19.391,78), ocorrerá, data venia, o correcto ressarcimento da A. que, ditado pela referida tabela financeira, veio a resultar dos inerentes...

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