Acórdão nº 235168/08.6YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução11 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 235168/08.6YIPRT.P1 *Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção: I. Relatório B…, com domicílio profissional na Rua …, n.º .., …, …, Maia, requereu, em 24/9/2008, procedimento de injunção contra C…, Lda., com sede na …, n.º …., R/C, Matosinhos, peticionando o pagamento da quantia de 18.704,45 €, correspondente ao capital de 18.565,72 €, juros de mora vencidos no montante de 42,73 € e taxa de justiça paga no valor de 96,00 €.

Fundamenta tal pretensão na prestação de serviços, a pedido da requerida, no âmbito da sua actividade de advogado, para a compra do imóvel onde se encontra sedeada, durante o período de 12/5/2005 a 13/11/2007 e ao abrigo de um contrato datado de 24/9/2008, importando os honorários e as despesas em 18.565,72 €, que esta não pagou, não obstante ter sido interpelada em 3/9/2008.

A requerida deduziu oposição, por impugnação e alegando que foi criada em 2007, sendo formada por dois sócios – D… e E… –, os quais consultaram o requerente, tendo em vista a compra do aludido imóvel, tendo-lhe feito entregada de quantia superior a 1.000,00 €, pelo que entendem que nada mais lhe é devido.

Apresentados os autos à distribuição e distribuídos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato ao 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos, em 12/11/2008, foi proferido despacho a convidar o autor a “aperfeiçoar o seu requerimento, concretizando a matéria de facto alegada, designadamente os serviços prestados à R., no âmbito do mencionado contrato forense, com a junção aos autos da respectiva nota de honorários da qual conste tais serviços”.

O autor correspondeu ao convite nos termos que constam de fls. 42 e 43, juntando a nota de fls. 46 a 50-a e esclarecendo que nela não foi indicado, por lapso, o valor da aquisição do imóvel, o qual foi de 300.000,00 €, que as reuniões com os representantes da ré tiveram lugar na sede desta, nas datas ali referidas, que foi o representante da demandada –D… – quem procedeu à fixação dos honorários, na reunião de 11/1/2005, e que a ré obteve um benefício de 29.250,00 € por ter ocupado aquele espaço sem pagar qualquer contrapartida, desde 25/7/2007 até à outorga da escritura de compra em Maio de 2008.

Em 15/6/2009, teve início a audiência de discussão e julgamento, que prosseguiu nos dias 15 e 28 de Outubro e terminou no dia 11 de Dezembro de 2009.

E, em 7/3/2012, foi lavrada sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.

Inconformado com o assim decidido, o autor interpôs recurso para este Tribunal e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “

  1. DOS FACTOS: 1 - A douta sentença ora posta em crise deveria ter dado como provado o facto A) dos factos não provados.

    2 - Através de uma análise exaustiva e minuciosa dos elementos que foram determinantes para a convicção do Tribunal, deveria resultar em termos do facto em causa, conclusões coerentes com a prova produzida, algumas delas diversas das conclusões alcançadas pelo Tribunal a quo.

    3 - Desde logo, a própria Apelada nunca pôs em causa o mandatado do Autor, ora Apelante, para prestar serviços no âmbito da sua actividade de advogado, no processo de compra c venda do imóvel sito na …, n.º …., r/c, em Matosinhos.

    4 - Das diversas diligências realizadas para o efeito, o Apelante sempre actuou na convicção séria de mandatário e a postura da Apelada ao longo do processo sempre foi revestida da qualidade de mandante.

    5 - O que se verifica, quer pela posição assumida pela Apelada no articulado de Oposição apresentado nas presentes autos, quer pela prova que a mesma produziu em sede de audiência de julgamento.

    6 - Tal mandato também se extrai da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento por parte do Apelante, em especial pelo depoimento das testemunhas F… e G…, bem como pelos documentos n.ºs 15 e 18 juntos pelo Apelante.

    7 - Resulta, salvo o merecido respeito por opinião contrária, que o Apelante, enquanto Advogado, prestou à Apelada os serviços discriminados na Nota de Despesas e Honorários junta aos autos, ainda que enquanto sociedade irregular, na pessoa individual dos seus dois únicos sócios.

    8 - Tendo sido a Apelada, ainda que irregular, numa fase de “pré-vida”, que mandatou o Apelante para patrocinar o processo de compra e venda do imóvel que se destinava à sede da sociedade e onde a mesma exerce a sua actividade.

    9 - Igual ao objecto social e anteriormente à constituição da Apelada já os seus sócios exerciam tal actividade.

    10 - Pelo que resultaram provados factos e meios de prova produzidos mais que suficientes para que o Tribunal "a quo" pudesse considerar como provado o facto elencado na alínea A) dos factos não provados.

  2. DO DIREITO: 11 - Na fundamentação do direito, salvo o devido respeito, o Tribunal "a quo' não fez uma aplicação adequada do direito aos factos, nomeadamente dos preceitos legais que invoca.

    12 - Contrariamente ao expresso na sentença recorrida, o Apelante fez prova mais que suficiente de que estava mandato pela Apelada, existindo na realidade um contrato de mandato; 13 - Sendo pressuposto de tal mandato uma retribuição tal como peticionado nos autos, cumprindo o mandatário, ora Apelante, o disposto no artigo 1161º do C. Civil, tendo a Meritíssima juíza a quo dado como provado os serviços prestados e melhor descritos nos factos dados como provados.

    14 - Resultando ainda da prova produzida a existência de um contrato de mandato entre o Apelante e a Apelada e pese embora os serviços prestados pelo Apelante se tenham iniciado em data anterior à constituição da Apelada, os mesmos tinham um único objectivo: a compra do imóvel.

    15 - A descrita compra constituía um interesse comum à Apelada e aos seus dois únicos sócios, D… e E….

    16 - Nunca foi posto em causa a assunção do mandato e das suas inerentes obrigações, quer individualmente pelos sócios, quer pela própria sociedade, ora Apelada.

    17 - Pelo exposto, encontra-se a Apelada obrigada a cumprir o preceituado no artigo 1167º do Código Civil, designadamente nas suas alíneas b) e c).

    18 - Ao ter decidido como se decidiu, violou a Meritíssima Juíza do Tribunal "a quo" o disposto nos artigos 1157º, 1158º, 1161º e 1167º alíneas b) e c), todos do Código Civil.

    19 - Assim como violou o disposto no artigo 19º do Código das Sociedades Comercias, dando-lhe uma interpretação diferente da que deveria ter sido dado "in casu".

    20 - Pois salvo o devido respeito, o contrato de mandato existente entre o Apelante e a Apelada encontra-se abrangido pela alínea a) do n.º 1 do artigo 19 º do Código das Sociedades Comerciais, a qual remete para o artigo 16º n.º 1 do mesmo diploma.

    21 - Tendo o referido preceito 16º n.º 1 aqui aplicabilidade, uma vez que: "Devem exarar-se no contrato de sociedade, com indicação dos respectivos beneficiários, as vantagens concedidas a sócios em conexão com a constituição da sociedade, bem como o montante global por esta devido aos sócios ou terceiros, a título de indemnização ou de retribuição de serviços prestados durante essa fase, exceptuados os emolumentos e as taxas de serviços oficiais e os honorários de profissionais em regime de actividade liberal." 22 - Sendo a factualidade provada nos autos mais do que suficiente para preencher o disposto no artigo 19º n.º 1 alínea a) do código das Sociedades Comerciais, recaindo sobre a Apelada a obrigação de proceder ao pagamento da quantia peticionada nos autos a titulo de mandato forense.

    Sem prescindir, 23 - O Tribunal "a quo" nunca poderia ter julgado totalmente improcedente a presente acção, pois tendo resultado provados os factos elencados em 8), 9) e 10), teria a Meritíssima Juíza "a quo" que cumprir o estatuído no artigo 65º n.º 1 do Estatuto da Ordem dos Advogados, fixando os horários adequados aos serviços melhor descritos nos pontos 8) e 9) e, ao beneficio que a Apelada obteve em consequência dos serviços prestados pelo Apelante melhor descritos em 10).

    24 - Pelo que, ao ter-se decidido como se decidiu, a sentença recorrida violou de igual modo o estatuído no artigo 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

    25 - E não tendo sido respeitado o citado artigo, faz com que a Apelada enriqueça à custa do Apelante sem qualquer causa justificativa, podendo configurar o instituto do enriquecimento sem causa previsto no artigo 473º do C. Civi1.

    TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO, QUE V. EX.ªS DOUTAMENTE SUPRIRÃO E, PELAS ADUZIDAS RAZÕES, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE CONDENE A APELADA NO PEDIDO, PROSSEGUINDO OS SEUS TRÂMITES NORMAIS ATÉ FINAL, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, COMO É DE INTEIRA E SÃ JUSTIÇA!” A ré contra-alegou pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 707.º, n.º 2, 2.ª parte, do CPC.

    Tudo visto, cumpre apreciar e decidir o mérito do presente recurso.

    Sabido que o seu objecto está delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, este na redacção introduzida pelo DL n.º 303/2007, de 24/8, aqui aplicável, visto que a propositura da acção é posterior a 1/1/2008 – cfr. art.º 12.º do mesmo diploma), importando conhecer as questões (e não razões) nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (cfr. art.º 660.º, n.º 2 do mesmo Código), as questões a dirimir consistem em saber:

    1. Se pode/deve ser alterada a matéria de facto; b) E...

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