Acórdão nº 122/11.2TJPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | FILIPE CAROÇO |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. nº 122/11.2TJPRT.P1 – 3ª Secção (apelação) Juízos Cíveis do Porto Relator Filipe Caroço Adj. Desemb. Teresa Santos Adj. Desemb. Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.
B…, LDA.
, pessoa colectiva nº ………, com sede na Rua …, …, ….-… Porto, intentou acção declarativa com processo experimental (Decreto-lei nº 108/2006, de 8 de Junho) contra C…, LDA.
, pessoa colectiva n.º ………, com sede na Rua …, …, Armazém ., ….-… …, alegando, no essencial, que adjudicou à R. a obra de impermeabilização do terraço da fracção autónoma “B” de um edifício. Na execução dos trabalhos foi detectada a entrada de água no interior daquela fracção e ainda nos tectos das fracções “A” e “C” imediatamente abaixo do terraço, facto que foi denunciado pela A. à R., tendo esta passado a invocar que estava a executar a impermeabilização na perfeição e que a resolução do problema passava pela remoção das soleiras das portadas daquele espaço, trabalho não contratado e cuja execução acarretaria um acréscimo no preço.
Porém, na perspectiva da A., foi contratada a impermeabilização total do terraço, sendo obrigação da R. resolver o problema das infiltrações sem qualquer acréscimo de preço, tendo a demandada assegurado na fase da contratação que seria possível executar uma solução técnica que não passasse pela retirada das soleiras.
A R. pediu insistentemente à A. uma garantia bancária do valor ainda em dívida (10% do preço da obra) ou qualquer outro documento equivalente, para a continuação dos trabalhos, mas, não tendo sido contratada nem aceite pela A., após vários contactos e na recusa da prossecução da obra, a demandante declarou resolvido o contrato com base no incumprimento definitivo da R., tendo contratado terceiros para executar a parte da obra que a R. não realizou e no que despendeu a quantia de € 8.186,04, da responsabilidade da última.
Terminou com o seguinte pedido: «Nestes termos e nos mais de direito, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e, consequentemente, ser a Ré condenada no pagamento à Autora da quantia de € 8.186,04 (oito mil cento e oitenta e seis euros e quatro cêntimos), acrescida dos juros vencidos e vincendos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.» (sic) Citada, a R. contestou a acção. Alegou que nunca recusou executar os trabalhos que contratou, a A. nunca perdeu o interesse na sua prestação e não poderia tê-la substituído por terceiro, já que nem em mora a R. se encontrava.
Por outro lado, além de haver humidade com sinais de anterioridade relativamente à obra, o orçamento apresentado pela R. não contempla a execução de trabalhos relativos a caixilharias nem soleiras, por onde entra água, mas apenas do terraço, tendo a A. manifestado até que não queria mexer nestas últimas, razões pelas quais o contrato não inclui mais do que “a total e completa impermeabilização do terraço”, que a R. executou na perfeição, só não realizando a o acabamento das floreiras dada a substituição que a A. fez da R. por terceiro, impedindo a contestante da sua realização.
A R. não podia aceitar que os trabalhos a mais fossem incluídos no preço da empreitada. A sua intervenção não causou qualquer dano.
A A. sempre teria de exigir a prévia eliminação dos defeitos, sem que pudesse eliminá-los por terceiro à custa da R.
Por outra via ainda, é exagerado o valor da indemnização solicitada.
Termina no sentido de que a acção seja julgada improcedente, com absolvição do pedido.
Teve lugar a audiência de julgamento que culminou com prolação da sentença, cuja decisão tem o seguinte teor: «Pelo exposto, julga-se a acção improcedente, por não provada, e em consequência absolvo a R. C…, do pedido de condenação no pagamento da quantia de € 8.186,04 (oito mil cento e oitenta e seis euros e quatro cêntimos), acrescida de juros, formulado pela A. B…, Ld.a.» (sic) Desta decisão apelou a A., formulando as seguintes conclusões: «1. Pelas razões acima expostas em III, deverá ser dado como provado que a Autora/Recorrente contratou com a Ré/Recorrida a completa impermeabilização do terraço (no sentido de abranger todos os trabalhos de impermeabilização, nomeadamente as soleiras).
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Pelas razões acima expostas em IV, deverá ser dado como provado que quando os trabalhos ficaram parados, encontrava-se por completar a impermeabilização total.
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Pelas razões acima expostas em V, deverá ser alterada a alínea xx) dos factos provados, passando a constar somente que “No orçamento apresentado pela R. não estavam contemplados os trabalhos referentes a caixilharias e soleiras”, retirando-se a parte “tendo o representante da A. dito à R. que não queria mexer nas mesmas”.
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Conforme se deixou acima em VI, estamos no presente caso perante uma obrigação de resultado, resultado esse que não foi obtido pois consiste na impermeabilização do terraço e não na mera aplicação de materiais ou construção de uma obra com base nas instruções do dono de obra.
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Como melhor se explanou em VI, dos articulados da Autora/Recorrente resulta à saciedade que foi o comportamento culposo da Ré/Recorrida que levou ao incumprimento contratual da sua parte e à resolução do contrato, não se alcançando que a Ré/Recorrida tenha logrado ilidir a sua culpa na verificação do incumprimento contratual, que só a si é imputável.
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A mora da Ré/Recorrida converteu-se em incumprimento definitivo pelo decurso dos prazos admonitórios que a Autora/Recorrente lhe foi razoavelmente fixando, pelo que esta procedeu à resolução do contrato por comportamento culposo daquela.
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O incumprimento definitivo da obrigação pela Ré/Recorrida confere à Autora/Recorrente o direito a ser indemnizada pelos prejuízos causados por esse incumprimento, o que corresponde ao custo das obras de conclusão dos trabalhos não realizados pela Ré/Recorrida, entretanto efectuadas por terceiros contratados pela Autora/Recorrente.» (sic) Culmina as suas alegações defendendo a revogação da decisão recorrida, com prolação de nova decisão que condene a R. no pedido da acção.
A R. respondeu à apelação no sentido da confirmação da sentença proferida na 1ª instância.
*Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II.
O objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do acto recorrido, delas retirando as devidas consequências, e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 660º, nº 2, 684º e 685º-A, do Código de Processo Civil[1], na redacção que foi introduzida pelo Decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, aqui aplicável).
O Tribunal deve apreciar todas as questões decorrentes da lide, mas, embora o possa fazer, não tem que discutir todos os argumentos ou raciocínios das partes, ou seja, apenas deve considerar o que for necessário e suficiente para resolver cada questão[2].
Questões a decidir: 1- Erro na apreciação e decisão da matéria de facto; 2- Qualificação e objecto do contrato celebrado entre A. e R.; e 3- Não cumprimento definitivo e resolução do contrato.
*III.
É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância: (da petição inicial)
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A Autora é a dona e legítima proprietária da fracção identificada pela letra “B”, correspondente às entradas nºs …, … e … do prédio urbano sito na Rua …, nºs …, …, …, … e …, no Porto, instituído em regime de propriedade horizontal através do documento particular de 14 de Setembro de 2009.
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A Autora pretendia proceder à impermeabilização do terraço de uso exclusivo existente na sua fracção, bem como a reabilitação do mesmo através da construção e floreiras e colocação de um novo piso.
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Tendo em vista a obtenção das melhores condições do mercado, a Autora auscultou várias empresas.
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Foi no decorrer deste processo de recolha de propostas comerciais que a Ré, após contactos telefónicos com sócio-gerente da Autora, D…, e deslocação ao local, apresentou à Autora o orçamento n.º …./…./.., de 24/09/2009, cuja cópia foi junta com a p.i. como doc. 2.
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Após negociação, a Ré considerou rever o seu anterior orçamento e apresentou à Autora o Aditamento 1 ao orçamento n.º …./…./.., de 08/10/2009, cuja cópia foi junta com a p.i. como doc. 3.
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O valor proposto foi de € 7.288,00, sendo que tal valor não incluía IVA.
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O preço seria pago em prestações, uma de 45% (quarenta e cinco por cento) do preço com a adjudicação da empreitada, outra de 45% (quarenta e cinco por cento) do preço com o início dos trabalhos e uma terceira e última de 10% (dez por cento) do preço no final dos trabalhos.
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A Autora adjudicou à Ré a execução dos trabalhos em causa.
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A Ré emitiu e entregou à Autora a factura n.º 90, de 13/10/2009, no valor de € 7.288,00, acrescido de IVA no valor de € 1.457,60 (mil quatrocentos e cinquenta e sete euros e sessenta cêntimos), num total de € 8.745,60, conforme doc. n.º 4 .
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A Autora pagou os primeiros 45%, no montante de € 3.935,52, em 14/10/2009, com a adjudicação da empreitada conforme doc. 5 junto com a p.i. a fls. 24.
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A A. pagou os segundos 45%, igualmente no montante de € 3.935,52, em 28/10/2009, conforme doc. n.º 6 junto com a p.i. a fls. 25.
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Após o que os trabalhos tiveram o seu início.
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Em data que se não pode precisar mas que se situa em finais de Novembro/inícios de Dezembro de 2009, foi detectada entrada de água nos tectos das fracções “A” e “C” imediatamente abaixo do terraço que estava a ser objecto dos trabalhos, assim como no interior da própria fracção “B” onde se situa terraço em causa.
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A Autora denunciou esse facto à Ré, através de contactos pessoais e telefónicos, à semelhança do que vinha acontecendo.
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A Ré foi negando a existência de qualquer deficiência nos seus trabalhos, face ao que entendia estar incluído no orçamento acordado.
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A Autora, assim como os proprietários das fracções imediatamente abaixo onde existiam as infiltrações, foram reclamando a total e completa impermeabilização do terraço.
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A R. propôs soluções que implicariam o...
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