Acórdão nº 448/11.5TTVFR-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução10 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 448/11.5TTVFR.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 513) Adjuntos: Des. António José Ramos Des. Eduardo Petersen Silva Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, aos 08.07.2011, apresentou requerimento de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento (art. 98º-C do CPT, na redação do DL 295/2009, de 13.10) contra C…, Ldª, juntando decisão escrita do alegado despedimento com invocação de justa causa.[1].

Frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na audiência de partes, a empregadora apresentou articulado a motivar o despedimento (art. 98º-J do CPT), alegando em síntese e pelas razões que invoca, ser válido o despedimento por ocorrido com justa causa.

O trabalhador contestou invocando, em síntese e no que importa ao recurso, a nulidade do procedimento disciplinar por omissão do relatório preliminar de inquérito e de relatório final do instrutor, deficiência quer da nota de culpa, por falta de suficiente concretização, designadamente temporal, das acusações imputadas, quer da decisão de despedimento por omissão de pronúncia e vício de fundamentação. Invocou ainda o que designou de “prescrição” por, nos termos do art. 329º, nºs 1, 2 e 3 do Código do Trabalho, atento o decurso do prazo de 60 dias sobre o conhecimento dos factos.

A empregadora respondeu à contestação, concluindo, no que importa ao recurso, no sentido da inexistência dos invocados vícios do procedimento disciplinar.

Foi proferido despacho saneador que, no que importa ao recurso, referiu o seguinte: “O Autor veio alegar a nulidade do processo disciplinar por omissão de relatório preliminar de inquérito, omissão de relatório final do instrutor, pela formulação de nota de culpa deficiente e pela falta de fundamentação da decisão.

A Ré, no articulado de resposta pugnou pela improcedência da invocada nulidade.

Cumpre apreciar e decidir: Como resulta de forma clara do disposto nos art. 352º, 357º, 381° e 382° do Código do Trabalho, a elaboração de relatório preliminar de inquérito e de relatório final do instrutor não é imposta pelo legislador como obrigatória e muito menos a sua omissão configura uma nulidade do processo disciplinar.

Alega, no entanto, o Autor que não foram indicadas as circunstâncias de tempo, modo e lugar do comportamento que lhe foi imputado.

Conforme resulta do disposto no art. 353º/ 1 do Código do Trabalho, a nota de culpa deverá conter a "descrição circunstanciada dos factos que são imputados (ao trabalhador)". Deste preceito resulta que na nota de culpa devem ser indicados os factos concretos integradores da infracção e as condições de tempo, modo e lugar em que ocorreram. Não bastam, em consequência, imputações vagas e genéricas ou juízos de valor. Todavia, não é exigível à entidade empregadora aquela precisão e perfeição necessárias no processo criminal, bastando que o trabalhador possa compreender a acusação e fique a saber quais os factos de que é acusado.

Compulsaria a nota de culpa, verifica-se que na mesma foram feitos constar, com relevo para a questão que ora se aprecia, factos concretos e concretizadores da infracção que lhe é apontada - exercício de actividade concorrente com a entidade patronal - nomeadamente, nos art. 10º, 11º e 16° a 21° e mesmo os constantes de 13° e 14° com referência às entidades referidas em 15°.

Os demais factos, descritos de forma mais genérica, não afectam a possibilidade de defesa do trabalhador, posto que tais elementos não serão determinantes para percepção da imputação e da possibilidade de defesa quanto à mesma.

De facto, a descrição, nos termos em que foi feita, não carecia de identificação mais concretizada, designadamente através da indicação da data da ocorrência dos factos, a fim de que fosse cabalmente identificada pelo Autor e este dela se pudesse adequadamente defender.

Também no que se refere à falta de fundamentação da decisão entendo que não assiste razão ao Autor.

De facto, dúvidas não existem que ao trabalhador tem de ser assegurado o direito de defesa bem como se exige a fundamentação da decisão que venha a ser proferida.

Vejamos o caso dos autos: Analisada a decisão administrativa verifica-se que a mesma se encontra suficientemente fundamentada constando da mesma da mesma os factos que foram imputados na nota de culpa e que os mesmos foram considerados provados pela prova produzida na fase instrutória do processo disciplinar, que os corroborou e que os mesmos, no entendimento da entidade empregadora, consubstanciam, prática de infracção disciplinar grave, fundamentadora da decisão de aplicar a sanção de despedimento, não incumbindo à entidade empregadora fazer análise dos argumentos jurídicos arguidos pelo trabalhador.

Do articulado do Autor resulta claro que a causa de nulidade invocaria não é a de falta de fundamentação da decisão, mas a de discordância com a decisão proferida por não terem sido valorados elementos constantes dos autos e da forma pretendida pelo Autor. Esta discordância não é, no entanto, fundamento da nulidade da decisão, mas sim da sua impugnação judicial.

O Autor, na contestação deduzida nos autos, vem invocar a prescrição do exercício da acção disciplinar da Ré, alegando para o efeito que à data da instauração do processo disciplinar a mesma já tinha conhecimento dos factos constantes da nota de culpa há mais de 60 dias.

A Ré veio responder à invocada excepção, pugnando pela improcedência da mesma.

Cumpre apreciar e decidir: A excepção invocada constitui uma excepção peremptória que a ser julgada procedente, determina a invalidada do processo disciplinar, no entanto, a apreciação da mesma depende de prova a produzir uma vez que factos essenciais se encontram controvertidos.

Pelo exposto, relego para a decisão a proferir a final a apreciação da invocada excepção de prescrição.

(…)”[2] Inconformada com tal decisão, veio o A. recorrer (recurso que subiu em separado, imediatamente), formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: 1ªO despacho saneador proferido no presente processo apreciou erroneamente a excepção de nulidade do processo disciplinar arguida pelo A/Apelante por omissão de relatório preliminar de inquérito, omissão de relatório final do instrutor, pela formulação de nota de culpa deficiente e pela falta de fundamentação da decisão; ao entender que não assistia razão ao A.

  1. Tal despacho saneador viola a lei, a Doutrina e a Jurisprudência, porquanto premeia uma entidade patronal que fez do processo disciplinar dos autos uma “farsa' .

  2. O Apelante considera que o despacho saneador faz uma apreciação totalmente incorrecta e limitadora do espírito que está subjacente a um processo disciplinar e aos poderes a que estão adstritos o Instrutor (quando é nomeado) e a entidade patronal.

  3. Assim, passou despiciendo ao Tribunal que o processo disciplinar referente a este processo se iniciou em 27 de Abril de 2011, com a comunicação da entidade patronal ao trabalhador de que ficava suspenso preventivamente para organização do processo disciplinar e que obrigava à "... instauração de um processo de inquérito tendo em vista um apuramento rigoroso da situação." (Cfr. fls. 2 do processo disciplinar), quando na verdade se constata que este foi um falso motivo para suspender o trabalhador, dado que não existiu nenhum processo prévio de inquérito, o que é violador do art. 352° do Código do Trabalho.

  4. O Apelante constata que depois de terem sido inquiridas as testemunhas arroladas por si e juntos 3 documentos, o Instrutor do Processo não fez rigorosamente mais nada, isto é, não fez qualquer relatório final ou qualquer apreciação crítica da instrução do processo e foi a gerência da entidade patronal quem procedeu ao despedimento de forma peremptória, dando por remissão para a hora e local aconteceram os factos e o próprio manifestou dificuldade em defender-se de situações em que desconhecia tais elementos.

  5. Deste modo, o Instrutor do processo não fez qualquer iuízo ou análise crítica da prova decorrente da instrução do processo disciplinar, nem a entidade patronal.

  6. A ré/apelada não analisou as questões de direito arguidas pelo trabalhador. Tal comportamento da Ré configura uma verdadeira omissão de pronúncia na fundamentação da decisão, dado que perante as alegações de direito do A. de que os factos não estavam concretizados temporal e factualmente e que os mesmos estariam claramente prescritos, o Sr. Instrutor e a Ré tinham de tomar posição sobre estas questões de Direito, fundamentando a sua procedência ou não, e não limitar-se a um lacónico "Improcedem igualmente as questões de direito...".

  7. A R/Apelada formulou uma nota de culpa deficiente o que é nulidade insuprível do processo disciplinar.

  8. A análise factual da nota de culpa e da resposta à nota de culpa permite concluir que a entidade patronal não cumpriu o art. 351% n° 1 do Código do Trabalho, designadamente, não juntou nota de culpa circunstanciada dos factos que imputava ao trabalhador, bem como o trabalhador não compreendeu correctamente toda a acusação, dado que em quase todas as situações não lhe foi dito em que data, hora e local aconteceram os factos e o próprio manifestou dificuldade em defender-se de situações em que desconhecia tais elementos.

  9. Perante uma nota de culpa que enferma de deficiência ao não descrever os factos relevantes, com menção das circunstâncias de tempo, lugar e modo da sua ocorrência, a mesma é nula por violação do art. 353% n° 1 do Código do Trabalho.

  10. Esta nota de culpa deficiente faz o processo disciplinar enfermar de uma nulidade insuprível, dado não constar uma descrição dos factos relevantes, com menção das circunstâncias de tempo, lugar e modo da sua ocorrência, tornando o despedimento efectuado ilícito, assim como sempre estariam também prescritos os factos, nos termos do estatuído do art. 3290, n° 1, 2 e 3 do Código do Trabalho.

  11. A nota de culpa do processo disciplinar dos autos tem um vício de base, e esse vício é o facto da nota de culpa...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT