Acórdão nº 80/12.6YRPRT de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA CECÍLIA AGANTE |
Data da Resolução | 18 de Setembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Revisão de Sentença Estrangeira 80/12.6YRPRT Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório B…, solteira, maior, de nacionalidade portuguesa, com residência habitual em … . …. Lugano Suissa, e, em Portugal, na Rua …, n.° .., …, Tarouca, vem requerer revisão e confirmação de sentença estrangeira, contra C…, residente na Rua …, .., Vila Pouca de Aguiar, pedindo a revisão da sentença proferida em 26 de Janeiro de 1994, transitada em julgado em 13 de Setembro de 1994, pelo Tribunal Distrital de Maloja, na Suíça.
Alega, em síntese, que a sua mãe, D…, teve com o requerido, C…, uma relação amorosa e, das relações sexuais que mantiveram entre si, ocorreu o seu nascimento em 12 de Abril de 1993. O requerido não reconheceu a paternidade e, intentada a competente acção de investigação de paternidade na Suíça, onde residiam, o requerido foi declarado pai e condenado a pagar as prestações alimentícias devidas.
Junta documentos, designadamente a sentença revidenda e a perícia médico-legal a que foi submetido o requerido, concluindo por uma probabilidade de 99,999999.
Citado, o requerido deduz oposição, aduzindo, em súmula, que a requerente não junta a sentença proferida pelo Tribunal Distrital de Maloja, pelo que está impedido de observar a sua autenticidade e da tradução junta. Conclui que tal omissão deve determinar o desentranhamento da petição inicial ou o convite à requerente a juntar o documento em falta. Como é cidadão português, tal como a requerente, à acção em causa deveria ter sido aplicada a lei portuguesa. E nesse caso a solução ter-lhe-ia sido mais favorável. Desde logo não teria sido considerado pai presuntivo e os alimentos não teriam sido estabelecidos no valor de 650 francos suíços até aos 12 anos e 750 francos até à maioridade. Foi apurado que auferia 1800 francos suíços, mas tinha muitas dívidas. Por outro lado, não participou no processo, pois foi julgado sem ter contestado a acção. Como não resulta da sentença se foi ou não citado para a acção, deve ser negada a revisão. Impugna a factualidade articulada na petição inicial.
A autora responde à oposição com a afirmação de ter junto cópia da sentença, autenticada pela Chancelaria do Estado de Cantão de Grisões. As Convenções de Haia e sobre o reconhecimento e Execução das Decisões Relativas a Obrigações Alimentares prevalecem sobre as leis ordinárias portuguesas e, por isso, a decisão proferida deve ser reconhecida em Portugal, uma vez que os dois Estados ratificaram aquelas Convenções. Da decisão revidenda resulta que o requerido foi citado e que renunciou à apresentação de contestação e não pagou a provisão necessária à realização da perícia de ADN.
Notificados para alegações, o Ministério Público pronuncia-se no sentido da revisão da sentença.
Igual conclusão expressa a autora, reiterando o articulado inicial.
O réu apelou aos argumentos já apresentados na oposição, iterando o argumento de que a aplicação da lei portuguesa implicaria uma decisão mais favorável, quer ao nível da declaração de paternidade quer ao nível da prestação de alimentos fixada à menor.
-
O Tribunal é competente e inexistem nulidades, excepções ou quaisquer questões prévias que obstem ao conhecimento da pretensão deduzida.
-
A acção importa a apreciação das seguintes questões: 3.1. Falta de participação do réu no processo que deu origem à decisão revidenda.
3.2. Privilégio da nacionalidade.
-
Fundamentação de facto (factos documentalmente provados) 1. A autora, B…, nasceu em …, Suíça, em 12-04-1993 e encontra-se registada como filha de D…, de nacionalidade portuguesa, solteira (assento de nascimento do Consulado Geral de Zurique, na Suíça – fls. 7).
-
-
Por sentença de 26-01-1994, transitada em julgado em 13-09-1994, proferida pelo Tribunal Distrital de Maloja, na Suíça, foi julgada procedente a acção de investigação de paternidade e judicialmente reconhecida a relação de filiação da autora e C…. Mais foi julgada procedente a acção de alimentos e C… condenado a pagar à autora CHF 650 desde o seu nascimento até aos 12 anos e CHF 750 desde então até à sua maioridade e, caso necessário, até que esta possa concluir a sua formação. Prestações que são pagas mensal e antecipadamente ao legal representante da menor e que são actualizadas anualmente em 1 de Janeiro ao Índice Nacional de Preços no Consumidor vigente no mês de Novembro do ano precedente (doc. fls. 8 a 33).
-
Nessa sentença, dentre os fundamentos de facto, consta que D… e C… mantiveram uma relação afectiva e, de 16-06-1992 a 14-10-1992, ou seja durante o período determinante para a presunção de paternidade nos termos do artigo 262, par.1, do Código Civil Suíço, mantiveram entre si relações sexuais. Facto que foi confirmado por escrito pelo réu em 14-06-1993, que declarou não estar em condições de pagar a provisão para a realização da perícia de ADN (doc. fls. 8 a 33).
-
Dessa mesma sentença consta que, por decisão de 14-04-1993, as Autoridades Tutelares da Comarca de Oberengadin instauraram uma curatela para a autora, nomeado como seu curador E…, incumbido, entre outras funções, de intentar acção de determinação de vínculo biológico e de prestação de alimentos (doc. fls. 8 a 33).
-
Da mesma sentença consta que o réu não participou no procedimento judicial, renunciou à apresentação da contestação, não pagou a provisão para a realização da perícia e o processo correu termos à sua revelia (doc. fls. 8 a 33).
-
O direito 1.
Falta de participação do réu no processo que deu origem à decisão revidenda Estatui o artigo 1094º, 1, do Código de Processo Civil que «sem prejuízo do que se ache estabelecido em tratados e leis especiais, nenhuma decisão sobre direitos privados, proferida por tribunal estrangeiro ou por árbitros no estrangeiro, tem eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, sem estar revista e confirmada».
Confirmação de sentença que supõe a verificação simultânea dos seguintes pressupostos (artigo 1096º do Código de Processo Civil): «a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a sentença nem sobre a inteligência da decisão; b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do país em que foi proferida; c) Que provenha de tribunal estrangeiro cuja competência não tenha sido provocada por fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses; d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal português, excepto se foi o tribunal estrangeiro que preveniu a jurisdição; e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do país do tribunal de origem, e que no processo hajam sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes; f) Que não contenha decisão cujo reconhecimento conduza a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português».
Não se suscitam dúvidas sobre a autenticidade dos documentos relativos à sentença revidenda, nem sobre a inteligibilidade da decisão e seu conteúdo, que estabelece o reconhecimento de paternidade do réu relativamente à autora e fixa uma prestação de alimentos a seu favor.
O réu questiona a autenticidade da sentença revidenda, alegando não ter sido notificado da junção da sentença proferida pelo Tribunal Distrital de Maloja, mas reconhecendo a notificação da respectiva tradução.
A sentença encontra-se junta aos autos, conforme o patenteado de fls. 20 a 33, impressa em papel timbrado do “TRIBUNEL DISTRICTUEL MALÖGIA”, exibindo, na primeira folha, os dados relativos à emissão da certidão, incluindo a apostilha, conforme à Convenção de Haia de 5 de Outubro de 1961, da Chancelaria de Estado do Cantão de Grisões da Confederação Suíça (fls. 21). A própria tradução da sentença exibe os carimbos e menções apostas pelo Consulado Geral de Portugal em Zurique, designadamente declarando que o mesmo corresponde, quanto ao conteúdo e forma, à versão do documento original em idioma alemão (fls. 19).
Mesmo não havendo dúvidas quanto à autenticidade do documento, face ao teor da oposição do réu, procurando assegurar-lhe plenamente o exercício do contraditório, determinei a sua notificação do texto original da sentença revidenda. E, notificado, sobre essa matéria remeteu-se ao silêncio, sanando a correspondente arguição.
-
-
Privilégio de nacionalidade Na sua oposição, o réu contrapôs o privilégio de nacionalidade, à luz da previsão do artigo 1100º, 2, do Código de Processo Civil, e, como observo da sentença revidenda, foi dada aplicação à lei suíça. Ora, aquele privilégio impõe que se averigue se o resultado da acção ter-lhe-ia sido mais favorável se o tribunal estrangeiro tivesse aplicado o direito material...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO