Acórdão nº 8157/08.6TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | ANA PAULA AMORIM |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
EnriqSCausa8157-08.6TBVNG-85-12TRP Trib Jud Vila Nova de Gaia-2VCompMista Proc. 8157-08.6TBVNG Proc.85-12-TRP Recorrente: B…, Lda Recorrido: C…, SA Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Soares Oliveira Ana Paula Carvalho * * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção – 3ª Cível) I. Relatório Na presente acção que segue a forma de processo ordinário em que figuram como: - AUTORA: C…, SA com sede na Rua …, nº .., …, Vila Nova de Gaia; e - RÉ: B…, Lda com sede na Rua … …/…, Apartado …., ….-… pede a Autora a condenação da Ré a pagar a quantia de € 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euro) a título de capital, acrescido dos juros vencidos no valor de € 9.887,80 (nove mil oitocentos e oitenta e sete euro e oitenta cêntimo), num total de € 134.887,80 (cento e trinta e quatro euro e oitocentos e oitenta e sete euro e oitenta cêntimo) e ainda, dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento.
Alega para o efeito e em síntese que em 12.04.2007 celebrou com a Ré dois contratos-promessa: um contrato-promessa de compra e venda e um contrato-promessa de cessão da posição contratual ficando convencionado que a celebração dos dois contratos estava interligada, nomeadamente no que concerne ao preço convencionado para o contrato definitivo. No contrato-promessa de cessão da posição contratual ficou acordado entre as partes que a Ré assumia a posição da Autora no contrato de leasing celebrado com o D…, pelo valor ali acordado, superior ao valor do prédio e fracções, existindo uma diferença de € 125.000,00 (valor acordado € 475.000,00 e valor real € 350.000,00). Para compensar a diferença convencionaram o preço de € 775.000,00 no contrato de compra e venda, apesar do valor efectivo e real do prédio ser de € 650.000,00.
Mais refere, que o Banco D… estabeleceu como condição para a cessão a amortização extraordinária, valor que a Ré assumiu pagar e que ascendia ao montante de € 125.000,00.
Alega, ainda, que em 21.11.2007 foi celebrada a escritura pública de compra e venda, pelo preço de € 775.000,00, que foi integralmente pago pela Autora. Contudo, por facto imputável à Autora não foi celebrado o contrato de cessão da posição contratual, o que determinou a Ré à resolução do contrato-promessa de cessão. Por esse motivo, a Ré não procedeu á amortização extraordinária junto do Banco D….
Conclui a Autora, que a Ré recebeu a mais a quantia de € 125.000,00, pois, uma vez que não se celebrou o contrato de cessão, não se justificava o acerto de valores e desta forma enriqueceu o seu património sem justa causa, visando a Autora com a presente acção a restituição desse valor.
-Citada a Ré contestou defendendo-se por excepção e por impugnação.
Alega, em síntese, que o suposto acordo a que se refere a Autora reveste a natureza de acordo simulatório, cuja prova está dependente da junção de documento, sendo nulo o acordo celebrado.
Considera, ainda, que não existe qualquer enriquecimento da Ré à custa da Autora, porque o contrato de compra e venda foi integralmente cumprido, em conformidade com o contrato-promessa e o incumprimento do contrato promessa de cessão decorre de facto imputável à Autora.
Alega, por fim, que os valores reais dos contratos são os que constam dos contratos-promessa celebrados e foi esse o valor considerado na celebração do contrato de compra e venda.
-Na Réplica a Autora manteve a posição inicial e veio requerer a ampliação do pedido e da causa de pedir.
Alega, em síntese, que ficou convencionado entre as partes que a Ré procedia ao pagamento da amortização, mas esse valor seria suportado pela Autora, o que justifica o pagamento da quantia de € 125.000,00 a mais, no preço da compra e venda do imóvel, sendo neste contexto que as partes celebraram os contratos promessa. Invoca a reserva mental da Ré.
Pede, em alternativa ao pedido deduzido na petição, a condenação da Ré no pagamento à Autora a título de indemnização da quantia de € 125.000,00, acrescida de juros legais desde a notificação da réplica até efectivo pagamento.
-Na Tréplica a Ré veio opor-se à ampliação da causa de pedir e pedido e impugnou os factos alegados.
-Elaborou-se o despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto.
-Realizou-se o julgamento, com gravação da prova.
O despacho que contém as respostas à matéria de facto consta de fls. 313-314.
-Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Nos termos expostos, julgo procedente a acção e, em consequência, condeno a Ré a pagar á A. a quantia de € 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil euros), acrescida de juros, calculados à taxa legal e contados desde 10 de Janeiro de 2008.
Custas a cargo da Ré. “-A Ré veio interpor recurso da sentença.
-Nas alegações que apresentou a recorrente formulou as seguintes conclusões: “1. A B…, sociedade aqui recorrente, terá em primeira instância sido condenada a pagar à A.ª a quantia de € 125.000,00, acrescida de juros, calculados à taxa legal e contados desde 10 de Janeiro de 2008.
-
No caso em apreço verifica-se que a douta Sentença foi constatado que “ … a vontade real correspondeu à vontade declarada com excepção do preço estabelecido para os dois negócios jurídicos e a sua forma de cumprimento.”. Ora, 3. Nesse “contexto” não se pode nem deve “ignorar” que estamos diante duma situação, dum negócio jurídico simulado, sem “coincidência” entre a vontade real e a vontade declarada, o que de acordo com a Lei é/ou deve ser considerado como nulo. Acontece que; 4. Conforme e é “consabido” o Art.º 394 n.º 2 do Cód. Civil estabelece uma regra relativa à simulação, designadamente, à sua prova que é a de que nem o acordo simulatório nem o regime dissimulado, quando invocados pelos simuladores – conforme é aqui o caso dos presentes autos, pois foi a C… quem o fez - são susceptíveis de prova testemunhal, quando o negócio simulado conste de documento autêntico, autenticado ou particular, conforme é o caso dos presentes autos, pelo que a ser assim tem a presente acção – face à sua causa de pedir – forçosamente que improceder, desde logo, porque a norma jurídica em questão – Art.º 394 n.º 2 do CC – devia assim ter interpretada e aplicada, considerando-se assim como violada. Consequentemente; 5. E tendo em conta a existência nos presentes autos de prova documental “bastante” para rebater a prova testemunhal entretanto produzida, verifica-se porém que tais meios probatórios não foram devidamente valorizados, pelo que a ser assim devem considerar-se como incorrectamente julgados os pontos constantes dos itens 1.º, 2.º e 3.º da base instrutória que assim impunham uma decisão diversa da que ora se impugna e recorre. Por outro lado; 6. Como não ficou provado que a B… actuou com reserva mental, não pode na sentença condenar-se a Apelante a pagar, a titulo de indemnização, uma quantia que para esse efeito sequer tem justificação, havendo pois motivos para se considerar que houve um erro na determinação da norma jurídica aplicada.
-
Por outro lado e ao invés do que terá ficado provado na douta Sentença, o único cheque que foi naquela escritura entregue à Apelante tratou-se dum cheque bancário – previamente já emitido - no valor de € 275.000,00. Posto isto; 8. Não é possível e muito menos verdade que se possa dar como provado que a testemunha E…, tenha, no acto da escritura – sic: “…sugeriu, na ocasião em que preenchia o valor do cheque, que este fosse de € 150.000,00 – descontando assim ao mesmo o valor de e 125.000,00….”, facto este que; 9. Que leva a E… a considerar que se está perante um concreto ponto de facto incorrectamente julgado, existindo no processo concretos meios probatórios que impunham uma decisão diversa da recorrida, impugnando-se deste modo a matéria dada como provada em 4.º, 5.º e 6.º da base instrutória.
-
O certo é que e não obstante o “concluído” supra, a testemunha E… aquando inquirida em audiência de julgamento sobre tal assunto terá dito que : ““…na data da escritura alertei o Dr. F… que como nós não tínhamos feito o negocio do apartamento que só passava e fazia a emissão do cheque menos o diferencial do negócio da casa…”, situação essa que conforme será fácil de se depreender, não corresponde minimamente à verdade. Por outro lado; 11. E tendo em conta a posição profissional da testemunha F…, funcionário da Ré B…, não é crível que esta – assim sem mais – tivesse a “veleidade” de – sem quaisquer poderes e/ou autorização para tal – afirmar que - sic: “…que tal quantia seria reembolsada à A. caso não fosse avante a celebração do contrato definitivo da cessão da posição contratual, reconhecendo a R, nesse caso, não teria direito a tal quantia…” !.
-
Note-se que consta da escritura pública de compra e venda e está assim dado como provado que a B… se fez na mesma representar pelo seu sócio e gerente G…, logo seria de todo lógico que estando lá aquele e fosse necessário dizer/falar o que quer que fosse designadamente, aquilo que a testemunha E… diz ter ouvido do funcionário F…, tivesse – como é obvio – sido dito pelo identificado sócio e gerente. Acontece porém que; 13. Isso não aconteceu, como não aconteceu ter sido possível inquirir a testemunha E… sobre tal facto, tendo na altura dos factos o Sr. Juiz fundamentado tal impossibilidade – conforme gravado em CD – no facto de a mesma assim o impedir de responder aos quesitos em apreço !. Ora; 14. Conforme já vertido nestas “alegações” , a Apelante é da opinião não viola o principio do dispositivo as respostas explicativas aos quesitos que se socorrem de factos instrumentais não alegados, pelo que a ser assim nada podia impedir a testemunha E… de responder á pergunta que lhe foi colocada – isto é – se na data da escritura o representante legal da B… lá estava e sobre tal assunto se manifestou ? 15. Pretende-se com isto demonstrar que a C… sabia perfeitamente que o valor que faltava efectivamente pagar era o de e 275.000,00 e não o de € 150.000,00, não merecendo por isso o depoimento da testemunha E…, qualquer credibilidade. Posto isto...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO