Acórdão nº 3513/10.2TAMTS-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução23 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 3513/10.2TAMTS-A.P1 Relator: Melo Lima Acordam em Conferência na 1ªSecção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO 1. Nos autos de Instrução nº 3513/10.2TAMTS-A, pendentes pelo Tribunal de Instrução Criminal do Porto (3ºJuízo), requerida pelo arguido B… - por não se conformar com a acusação deduzida pelo Ministério Público e acompanhada pela Assistente C…, que lhe imputava a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art° 152°, nos 1, al. b) e 2, do C. Penal, negando a prática dos factos ou, de todo o modo, invocando insuficiência de indícios quanto à prática dos factos acusados - o Exmo. Juiz de Instrução Criminal designou Debate Instrutório, no decurso do qual, 1.1 À RECLAMAÇÃO (oral e escrita) apresentada pelo Arguido relativamente ao despacho de indeferimento das diligências de instrução por si requeridas, ditou para Ata, decisão do seguinte teor: «Indefere-se aliás douta reclamação apresentada, porquanto se entende que as diligências requeridas pelo arguido ultrapassam a natureza indiciária exigida para a prova nesta fase do processo, conforme resulta, nomeadamente, do artigo 301º nº3 do CPP.[1] Considera-se também não assistir razão ao requerente quando invoca a nulidade prevista no artº 120 nº2 al. b), 2ª Parte do CPP, uma vez que a realização da instrução não pressupõe todas as diligências para a descoberta da verdade, mas apenas as diligências necessárias à comprovação da suficiência de indícios, só podendo constituir nulidade a omissão posterior – entenda-se posterior à instrução – das diligências que possam reportar-se essenciais para a descoberta da verdade.» 1.2 Depois de o Exmo. Juiz ● Ter feito “uma exposição sumária sobre os atos de instrução a que se procedeu e sobre as questões de prova relevantes para a decisão instrutória a que se procedeu e sobre as questões de prova relevantes para a decisão instrutória que apresentem, em sua opinião, carácter controverso — art° 302°, n° 1, do C.P. Penal, nomeadamente a questão dos objectos apreendidos e outros não apreendidos, alegadamente pertencentes à assistente e que o legislador parece ter relacionado com o crime de violência doméstica, nos termos do art. 21° da Lei 112/2009, situação dos objectos que também foi referida pela denunciante nas suas declarações a fis. 90, provavelmente na sequência da comunicação que lhe foi feita dos seus direitos como vítima, a fls. 34, e situação que também foi referida pelo arguido a fls. 207, último parágrafo”, e ter concedido ao Ministério Público e aos advogados presentes para se pronunciarem sobre a necessidade e conveniência de uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação do Ministério público, nos termos e para os efeitos do art. 303°, n°.1 do CPP; ● Ter dito ao defensor do arguido e às demais pessoas presentes considerar que “o disposto nos arts. 1°, 2°, 3°, 14° e 21° da Lei 112/2009, de 16 de Setembro, para uma protecção integral dos direitos da vítima exige necessariamente que a questão da retenção de bens da vitima, pelo arguido, seja devidamente ponderada no processo e levada à decisão instrutória de pronúncia ou não pronúncia, tanto mais que foi uma matéria de facto suscitada no inquérito e que deveria ter sido ponderada quando da formulação da acusação, nos termos do art. 283°, n°.3, ai. b) do CPP”, “admitindo-se a possibilidade dessa ponderação não ter sido feita, embora não esteja demonstrado o contrário, e ter sido a questão da restituição dos objectos suscitada pela assistente antes da instrução e questionada a legalidade dessa medida pelo arguido, só podendo o tribunal proferir uma decisão sobre essa matéria se a mesma for incluída no objecto da instrução”, Comunicou ao arguido e ao seu defensor a possibilidade de lhe serem imputados os seguintes factos: «i. Por via da actuação do arguido, a assistente abandonou a casa de morada de família com a filha menor no dia 6 de Agosto de 2011, deixando na mesma morada, sita na Rua …, …, …, vários pertences pessoais, nomeadamente roupas, utensílios de cozinha, máquinas, secador a outros objectos, prendas que foram oferecidas à depoente, nomeadamente os constantes da relação de fls. 351 a 352, parte dos quais foram encontrados na residência do arguido, designadamente os constantes do auto de busca e apreensão de fls. 393 a 397, com referência, na parte aplicável, aos objectos listados a fis. 398 a 401.

ii. Por diversas vezes, a assistente tinha tentado acordar com o arguido a entrega desses bens, mas este sempre se negou, proibindo a assistente de ir lá a casa buscá-los. O arguido chegou a dizer que os levava, mas nunca mostrou disponibilidade para os entregar. Com essa recusa da entrega dos bens, o arguido pretendeu menosprezar os direitos e a integridade moral da assistente, pretendendo dessa forma causar-lhe transtornos e incómodos desnecessários, bem sabendo que dessa forma a prejudicava na sua integridade psíquica, podendo afectar a sua saúde, e causando-lhe ou podendo causar despesas desnecessárias, nomeadamente, a substituição desses bens.

Elementos de prova que sustentam esta imputação: - as declarações da assistente e o auto de busca e apreensão supra referido e termo de entrega de fis. 402 a 404.» «Concede-se ainda ao arguido, o prazo de 8 dias, para apresentar a sua defesa, incluindo meios de prova, sobre esta matéria.» 2. Inconformado com esta decisão dela interpõe recurso o arguido assim concluindo a respetiva motivação: A. O Arguido é acusado de um crime de violência psicológica, nos termos da acusação pública, tendo requerido a abertura de instrução.

B. Com recurso às declarações da Assistente prestadas em sede de inquérito, e nunca, qualquer que seja a justificação ou expediente processual, prestadas em sede de instrução, nem constam, ao que se sabe da acusação da assistente - o meio próprio para aditar factos novos que não alteram substancialmente o objecto do processo -, o Tribunal a quo ordena busca domiciliária e apreensão de bens que alegadamente são da Assistente e alegadamente se encontram na residência onde os pais e irmã e sobrinho do arguido habitam por alegadamente estarem relacionados com o crime imputado ao Arguido — o único que se conhece é o que consta da acusação pública.

C. Da acusação pública, que fixa o objecto do processo, não resulta qualquer matéria de que os bens podem estar relacionados com o crime imputado, recorrendo o Tribunal, então, às declarações da Assistente nunca prestadas em instrução mas sim em inquérito para justificar o meio de obtenção de prova — justificação que o Tribunal se socorre em sede de debate instrutório e não como ponderação fundamentada anterior à ordem de busca e apreensão.

D. Declarações da Assistente que o Tribunal não pode conhecer e, ainda que pudesse, das mesmas não resulta qualquer indício que a alegada não entrega dos bens tem como fundamento alguma violência psicológica relacionada com o crime imputado.

E. Para além de constituírem factos posteriores aos delimitados na acusação, ou seja, esta fixa o termo no final de Julho de 2010, quando a Assistente sai de casa — e que tinha tanto medo do Arguido que vai de férias um mês sem qualquer justificação e quando regressa, em vez de regular as responsabilidades parentais apresenta queixa contra o Arguido - tendo a alegada omissão de entrega dos bens sido posterior, constituindo portanto, a ter qualquer relevância penal, facto autónomo, que, só por si, imporia alteração substancial dos factos.

F. O Tribunal fundamenta a busca domiciliária e apreensão quanto a factos, novos, em nada relacionados com o crime pelo qual o arguido é acusado, não investigados, mas que alegadamente resultam das declarações da Assistente em inquérito, sendo que o Tribunal justifica a inclusão dos factos com tais declarações e com a busca que deu causa, ponderando se o Ministério Público os atendeu ou não em sede de inquérito.

G. Que culmina com a conclusão que os factos de inquérito, não levados à acusação — nem sendo, ao que se sabe incluídos na acusação da Assistente — constituem factos a incluir no objecto do processo, sem contraditório, justificam, para o Tribunal, meios de obtenção de prova. Por tudo isto, H. A busca domiciliária e consequentemente a apreensão são ilegais e nulas, por não se relacionarem com o crime imputado ao arguido, não foram investigados, por não terem qualquer fundamento factual no objecto do processo, alias, constituindo factos autónomos extravasando a delimitação da acusação pública.

Para além disso, I. O Tribunal a quo, retira, no âmbito do despacho de que se recorre a fls. 423, das declarações da assistente prestadas em sede de inquérito e da busca domiciliária e apreensão (estas ilegais e nulas como referido) que a assistente deixou bens pessoais na residência onde o casal habitava e que o arguido se recusou entregar, “(...) pretendendo dessa forma causar-lhe transtornos e incómodos desnecessários, bem sabendo que desse forma a prejudicava na sua integridade psíquica, podendo afectar a sua saúde, e causando-lhe ou podendo causar despesas desnecessárias, nomeadamente, a substituição desses bens”.

J. Ora das declarações da Assistente - que o Tribunal a quo não pode conhecer nem a matéria integra o objecto do processo para além de o extravasar temporal e espacialmente - de todo resulta qualquer elemento subjectivo imputado ao arguido, sendo que se percebe que o Tribunal teria que encontrar subterfúgio para tentar ‘ligar” os bens pessoais que manter apreender a questões psicológicas que de alguma forma pudesse relacionar com o crime de violência doméstica ao nível dos alegados maus tratos psicológicos! K. Os factos descritos no despacho importam factos novos que alteram substancialmente o objecto do processo, sendo autónomos — posteriores à delimitação temporal do crime imputado - e dando origem a um crime novo e diverso do que o arguido é acusado.

L. Ou mesmo considerando algum elemento de conexão sempre imporia uma agravação da ilicitude e culpa do arguido para além...

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