Acórdão nº 2015/09.4TBPFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Janeiro de 2013
Magistrado Responsável | FERNANDO SAMÕES |
Data da Resolução | 15 de Janeiro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 2015/09.4TBPFR.P1 Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção: I. Relatório B…, Lda.
, com sede na Rua …, apartado …, …, Vila Nova de Famalicão, instaurou, em 2/12/2009, no Tribunal Judicial de Paços de Ferreira, onde foi distribuída ao 3.º Juízo, acção com processo ordinário contra o Condomínio …, sito no Gaveto da …, Paços de Ferreira, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 35.171,45 €, depois de rectificada, correspondente ao capital de 34.380,23 € e juros vencidos desde 28/4/2009, acrescida de juros vincendos até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou, em resumo, que: Celebrou com o réu um contrato de empreitada, nos termos do qual se comprometeu a executar obras de reabilitação daquele edifício pelo preço de 57.603,32 €, o que fez, tendo concluído tais obras em Março de 2009 que o demandado aceitou sem reclamar qualquer defeito no prazo acordado de 30 dias.
Do referido preço, encontra-se em dívida o montante de 34.380,23 €, que deveria ter sido pago até 28/4/2009, data do vencimento da factura emitida e entregue ao réu no final dos trabalhos.
O réu contestou e deduziu reconvenção, alegando, em síntese: Em Março de 2009, a obra não estava concluída, faltando realizar os trabalhos que comunicou à autora, estando ainda por concluir parte desses trabalhos à data da apresentação da contestação, pelo que não está obrigado a pagar o remanescente do preço, podendo lançar mão da excepção de não cumprimento.
Os trabalhos executados apresentam defeitos que comunicou à autora, mas que não reparou.
Estipularam uma cláusula penal, no valor de € 50,00 por cada dia de atraso na conclusão da obra, que a autora devia terminar até 30 de Dezembro de 2007.
Concluiu pela improcedência da acção e pedindo que a autora seja condenada a pagar-lhe, a título de cláusula penal, a quantia de 42.700,00 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação da reconvenção até integral pagamento, bem como a eliminar os defeitos da obra.
A autora replicou impugnando a matéria alegada, mantendo a posição assumida na petição inicial, excepcionando a ineptidão do pedido reconvencional por não poder peticionar a reparação de defeitos ao mesmo tempo que alega que a obra não está concluída, alegando que alteraram a data de conclusão da obra para Março de 2009, nada deve a título de cláusula penal e que o montante peticionado é manifestamente excessivo até porque não sofreu qualquer prejuízo. Concluiu pela improcedência das excepções e da reconvenção e pela procedência da acção.
O réu treplicou, impugnando os factos novos alegados pela autora, defendendo a inexistência da invocada ineptidão do pedido reconvencional e mantendo a posição assumida na contestação/reconvenção.
Na fase do saneamento, foi decidido não existir a invocada ineptidão do pedido reconvencional, admitida a reconvenção e proferido despacho saneador, após o que foi elaborada a condensação, com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, de que não houve reclamações.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi decidida a matéria de facto controvertida como consta do douto despacho de fls. 288 a 295, que não foi objecto de reclamações.
E, em 31/8/2012, foi proferida douta sentença que decidiu: “a) julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência: - condenar o R. a pagar à A. a quantia de € 34.380,23 (trinta e quatro mil trezentos e oitenta euros e vinte e três cêntimos), no momento em que vier a ocorrer a conclusão das obras de reabilitação da envolvente exterior vertical do edifício e a verificação dos trabalhos realizados nos termos previstos na cláusula 3ª, nº 1, al. d), do contrato referido no ponto 5 da matéria de facto; - absolver o R. do restante pedido; b) julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência: - condenar a A./reconvinda a reparar a obra de reabilitação do sistema de impermeabilização do edifício, na parte em que permite a existência das infiltrações e humidades referidas no ponto 25 da matéria de facto e na despensa do apartamento referido no ponto 23 da matéria de facto; - absolver a A./reconvinda do restante pedido.” Inconformado com o assim decidido, o réu/reconvinte interpôs recurso de apelação para este Tribunal e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “I - Na douta sentença ora apelada o Tribunal a quo decidiu, entre o mais, absolver a A. do pedido reconvencional efectuado com base na cláusula 9ª do contrato de empreitada junto aos presentes autos.
II – E é desta decisão de absolvição que visa o presente Recurso.
III – A cláusula 9ª aposta no contrato de empreitada traduz-se juridicamente por uma cláusula penal.
IV – E, de entre as três espécies de cláusulas penais que, em face do princípio da liberdade contratual é permitido às partes, estamos face a uma cláusula penal do tipo puramente compulsória.
V – O instituto das cláusulas penais rege-se pelos arts. 809º a 812º do Código Civil.
VI – E o art. 812º define os termos em que é permitido ao Juiz reduzir o montante de uma cláusula penal.
VII – Nunca esteve em causa a capacidade negocial das partes, a sua capacidade de gozo e exercício de direitos, não existem vícios de vontade ou má-fé das partes que possam por em causa a sua vontade negocial.
VIII – Ou seja, as partes, livre e de comum acordo, celebraram um contrato de empreitada onde inseriram, para além de outras, uma cláusula penal.
IX – Aquela cláusula prevê que o atraso na conclusão da obra implica o pagamento da A. à R. de uma quantia de €50,00 por cada dia de atraso.
X – Ainda no contrato as partes estipularam o prazo de três meses para a realização da obra – de 30 de Setembro de 2007 a 30 de Dezembro de 2007.
XI – Conforme resulta provado a obra ainda não terminou, pelo que a cláusula penal é devida.
XII – Ao sabor do instituto supra mencionado, e no sentido do disposto no art. 812º do Código Civil, o Juiz a quo jamais poderia ter eliminado/suprido a cláusula penal em apreço, até porque está fora do âmbito dos seus poderes.
XIII – E é neste sentido que vêm decidido as instâncias superiores, bem como tem entendido a doutrina.
XIV – Aliás, no caso em concreto, o Juiz a quo estava inclusive impedido de reduzir a cláusula penal.
VEJAMOS XV – Na douta sentença apelada a cláusula penal aposta no contrato de empreitada foi classificada como excessiva.
XVI – E, conforme resulta quer do art. 812º do Código Civil, quer da Jurisprudência e doutrina supra transcritas, o Juiz está impedido de suprimir uma cláusula penal e ainda impedido de reduzir uma cláusula penal meramente excessiva, apenas podendo lançar mão do art. 812º quando considere, justificadamente, que a cláusula penal é manifestamente excessiva.
XVII – Ao considerar a cláusula penal excessiva, classificação que não concordamos mas que ora não releva para a boa decisão da causa, o Juiz nunca poderá proceder à redução da mesma.
XVIII – Nem tão pouco se afigura razoável a fundamentação dada na douta sentença para a eliminação da cláusula penal.
XIX – Não é razoável desde logo porque se traduz numa violação evidente dos arts. 810º, 811º e 812º do Código Civil.
XX – Mas também não o é porque o princípio da liberdade contratual levou as partes à estipulação de diversas cláusulas no contrato de empreitada.
XXI – Dessas cláusulas resultam, naturalmente, direitos e deveres para as partes.
XXII – Resultou provado que a R. sempre cumpriu com as suas obrigações.
XXIII – E, só ainda não é devido o remanescente do preço do contrato de empreitada porque a A. não cumpriu as suas obrigações – não concluiu a obra.
XXIV – E esse incumprimento deve-se exclusivamente à falta de vontade da A. em concluir os trabalhos.
XXV – Resultou provado que na pendência da acção principal a A. efectuou trabalhos na mesma zona do prédio onde se falta acabar a obra.
XXVI – Refira-se ainda que a A. alegou um sem fim de motivos para o atraso da obra, mas de todos eles não logrou provar nenhum.
XXVII – É que para além de violar expressamente os preceitos legais já citados, não é sequer razoável, do ponto de vista da equidade, que a cláusula penal seja suprimida ou sequer reduzida atendendo a que a obra (com preço final de quase €70.000,00) não está concluída por culpa exclusiva da A. e ainda que a obra tinha o prazo máximo de três meses e, na presente data, já se passaram quase cinco anos desde a data aprazada para a conclusão dos trabalhos.
XXVIII – Assim, atendendo à decisão proferida, caso a A. permaneça “sem vontade” de terminar a obra, como até então, pelo período adicional de 10 anos, não existem repercussões para a mesma, não obstante no momento da celebração do contrato de empreitada ter querido e aceite de livre vontade a cláusula penal aqui em apreço.
EM SUMA 23 – Ao decidir absolver a A. do pedido relativo à cláusula penal, a douta sentença ora apelada enferma de errada aplicação e interpretação da lei que reconduz à violação dos arts. 810º, 811º e 812º, todos do...
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