Acórdão nº 220/08.0GEETR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES SILVA
Data da Resolução09 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 220/08.0GBETR.P1 Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO: Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal colectivo, tendo sido submetido a julgamento, o arguido B… foi condenado, pelo cometimento de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 3.º, n.º 6 e 86.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 5/2006, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), no montante global de € 1.600,00 (mil e seiscentos euros), ou, subsidiariamente, 133 (Cento e trinta e três) dias de prisão, nos termos do art. 49.º, n.º 1 do Código Penal; Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem.

CONCLUSÕES: A) A nossa discordância assenta desde logo no facto de o Tribunal “a quo” ter dado como provado que o arguido tinha na sua posse: uma arma de fogo longa, com 113 cm de comprimento total, de marca …, de dois canos paralelos de arma lisa, calibre 12, de funcionamento tiro a tiro, encontrando-se em boas condições de conservação e funcionamento (esta arma encontra-se manifestada e registada em nome de C…); uma carabina, com um cano com o comprimento de 23 cm, com uma alma lisa, de 12mm de diâmetro, tendo o cano sido soldado a outra peça metálica que faz caixa da culatra; O arguido tinha em seu poder as mencionadas armas que, pelas suas características, sabia ser de detenção e uso proibidos por lei; O arguido atuou de modo livre e voluntário, tendo perfeito conhecimento que não lhe era permitido tal comportamento; O arguido agiu de modo livre e consciente, bem sabendo da censurabilidade e punibilidade da sua conduta”.

B) Factos que deveriam ter sido dados como não provados, tendo existido erro notório na apreciação da prova. Não existe, salvo melhor opinião qualquer prova produzida nos autos que permita alcançar essa convicção do tribunal “a quo”.

C) O Tribunal “a quo” no douto acórdão na sua Parte II sob os pontos 3, 5, 6 e 7, menciona tais factos provados.

Estes factos dados como provados não têm sustentação em prova alguma, dado que não foi produzida ou examinada em sede de audiência de discussão e julgamento qualquer prova dos mesmos.

D) A prova em que o tribunal “a quo” funda a decisão proferida é apenas documental e foi produzida na fase de inquérito resumindo-se apenas aos autos de busca e apreensão de fls. 120-122, o exame à arma de fls. 249 e seguintes para aferição das características da arma e a informação de fls. 93-94 quanto à falta de titularidade da licença do arguido para porte ou detenção de arma.

E) Pois que, o arguido se encontrava dispensado de comparecer em audiência, as testemunhas arroladas pela acusação, filhos e irmã do arguido, no uso de um direito conferido por lei se recusaram a depor, Cfr. página 6 do douto acórdão.

F) Acresce que, a testemunha D…, agente da GNR, arrolada pela acusação foi prescindida pelo Exmo. Senhor Procurador Adjunto do Ministério Público, não tendo sequer tido qualquer intervenção na elaboração dos documentos que serviram de base à formação da convicção do tribunal a quo. Pois que, esta testemunha não teve intervenção nas diligências de busca e apreensão levadas a cabo na fase de inquérito, como se constata do auto de busca de fls. 120-122 onde se encontram identificados os agentes que a executaram, e do qual não consta a identificação da testemunha em causa.

G) Do teor e conteúdo dos documentos de fls.120-122, fls. 249 e seguintes e fls. 93-94 ou de qualquer outro dos documentos constantes dos autos não se pode inferir que se encontram preenchidos por parte do arguido os elementos do tipo legal pelo qual foi condenado.

H) As diligências levadas a cabo na fase de inquérito de busca e apreensão foram despoletadas pelo teor do auto de notícia de fls. 2-3 dos autos na parte onde se refere: “mais informo que segundo um das vítimas, dentro da residência do agressor (leia-se arguido/recorrente) reside um menor (filho) que terá ameaçado o agressor (leia-se arguido/recorrente) de morte com arma de fogo, tipo caçadeira. Segundo o que esta guarda conseguiu apurar, dentro da residência ou no veículo que o denunciante se faz transportar o agressor existem fortes possibilidades de o mesmo ter uma arma de fogo tipo caçadeira”.

I) Incompreensivelmente a investigação afastou-se redondamente dos factos constantes no auto de notícia e encetou prossecução criminal contra o arguido/recorrente sem que, saliente-se, contra o mesmo houvesse qualquer indício de se encontrar na posse de arma de fogo. Pelo contrário, do auto de notícia ressaltam indícios de que as armas que foram encontradas na residência do arguido se encontravam na posse de outrem, ali também residente.

J) Não se apurou quem eram as pessoas que residiam naquela morada juntamente com o arguido, as quais poderiam ser as detentoras ou possuidoras das armas encontradas. Não foi encetada investigação por parte dos órgãos de polícia criminal competentes no sentido de aferir a verdade material.

Em suma, a prova é inexistente no que diz respeito à identidade do autor do crime pelo qual o recorrente foi condenado.

K) Nada, nenhum meio de prova nos autos, de carácter documental ou testemunhal, indicia sequer que as armas se encontrassem na posse do arguido/recorrente e muito menos comprova tal facto. O tribunal “a quo” valorou, desse modo, prova objetivamente inexistente, olvidando a manifesta inexistência de prova suficiente para a condenação do arguido e o princípio da presunção de inocência, por manifesta falta de prova inequívoca.

L) Ao não ter aplicado o principio in dúbio pro reo, o tribunal a quo violou as garantias de defesa do arguido preceituadas no art.º 32.º n.º 2 e 18.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa. Pois que, todo o arguido se presume inocente até que exista condenação transitada em julgado, que permita inferir o contrário.

M) Violou o preceituado nos artigos 262.º e 355.º do CPP ao condenar o arguido com base em provas obtidas em fase de inquérito e que não foram produzidas ou examinadas em audiência e sobre as quais não foi possível ao arguido exercer, sem qualquer restrição, o contraditório, ou seja, defender-se.

Desse modo, o tribunal “a quo” formou a sua convicção acerca da matéria de facto provada com base única e exclusivamente no teor dos autos de busca e apreensão, os quais não foram confirmados em audiência pelos seus autores de forma a poderem ser valorados na decisão final.

N) E violou ainda o preceituado no art.º 86.º n.º 1 da Lei n.º 5/2006, ao ter proferido decisão condenatória sem que o tipo legal de crime se encontra-se preenchido.

O) Logo deverá o Venerando Tribunal da Relação, dado o erro notório na apreciação da prova, modificar a matéria de facto dada como provada para: No dia 19 de Março de 2009, na residência sita em …, n.º .., em …, foram apreendidas: uma arma de fogo longa, com 113 cm de comprimento total, de marca …, de dois canos paralelos de arma lisa, calibre 12, de funcionamento tiro a tiro, encontrando-se em boas condições de conservação e funcionamento (esta arma encontra-se manifestada e registada em nome de C…); uma carabina, com um cano com o comprimento de 23 cm, com uma alma lisa, de 12mm de diâmetro, tendo o cano sido soldado a outra peça metálica que faz caixa da culatra.

P) E, modificar a matéria de facto dada como não provada, acrescentando-lhe que não se logrou provar que: 1. O arguido tinha em seu poder as mencionadas armas que, pelas suas características, sabia ser de detenção e uso proibidos por lei; 2. O arguido atuou de modo livre e voluntário, tendo perfeito conhecimento que não lhe era permitido tal comportamento; 3. O arguido agiu de modo livre e consciente, bem sabendo da censurabilidade e punibilidade da sua conduta”.

Q) Parece assim ao arguido que é por demais evidente que o tribunal “a quo” fez uma errada valoração da prova e, desse modo está o acórdão ferido do vício a que alude o art.º 410.º, n.º 2, al.c) do CPP, e, por isso, no limite, conforme dispõe o art.º 426.º, n.º 1 do CPP deverá ocasionar o reenvio do processo para novo julgamento.

Todavia e porque os autos, atenta a compilação dos meios de prova recolhidos na fase de inquérito e a ausência de produção e exame de prova na audiência de...

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