Acórdão nº 161/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Junho de 2008
Magistrado Responsável | JOÃO GOMES DE SOUSA |
Data da Resolução | 03 de Junho de 2008 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
A - Relatório: No âmbito do processo comum perante tribunal singular n.º ... do Tribunal Judicial de ... foi o arguido A. ... por sentença de 21-07-2006, na procedência da acusação, e na parte crime: Condenado como autor de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137º, n.º 1 CP, na pena de 320 (trezentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), no total de € 1.920,00 (mil e novecentos e vinte euros) e no mais legal.
Mais foi julgado parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido por B. ...e C. ... e condenar a demandada Companhia de Seguros "X" a pagar aos demandantes, a quantia global de € 151.424,56 (cento e cinquenta e um mil quatrocentos e vinte e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos), assim repartidos: . Em conjunto aos demandantes B... e C. .. - € 1.785,20 (mil setecentos e oitenta e cinco euros e vinte cêntimos), acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação da demandada seguradora para contestar o pedido civil, até efectivo e integral pagamento; Em conjunto aos demandantes - € 74.819,68 (setenta e quatro mil oitocentos e noventa e nove euros e sessenta e oito cêntimos); . À demandante C. - € 44.891,81 (quarenta e quatro mil oitocentos e noventa e um euros e oitenta e um cêntimos); . Ao demandante B. .. - € 29.927,87 (vinte e nove mil novecentos e vinte e sete euros e oitenta e sete cêntimos); E absolvida a demandada companhia de Seguros X do demais contra si peticionado.
Absolvido o demandado A.... do pedido civil contra si formulado.
*..................... *Procedeu-se a um primeiro julgamento, tendo sido proferida sentença onde se julgou a acusação improcedente, absolvendo-se o arguido do crime pelo qual vinha acusado e relegando-se o pedido civil para os meios comuns para aí ser conhecido.
De tal decisão os demandantes/assistentes interpuseram recurso para este Tribunal da Relação de Évora, tendo este Tribunal, por acórdão de 09.11.2004, decidido o reenvio do processo para apurar das concretas e parciais questões ali suscitadas, a saber, apurar se a via era (ou não) visível numa extensão não inferior a 100 metros, ou se o arguido não olhou, ou olhou e não viu o motociclo, entre outras circunstâncias relativas ao acidente em causa.
O Tribunal de ... procedeu a novo julgamento onde veio a conhecer de toda a matéria suscitada ab initio no processo, concluindo pela decisão de condenar o arguido e a demandada cível, como supra referido.
Mais foi decidido declarar prescritas as contra-ordenações e determinar o consequente arquivamento dos autos nesta parte.
* *Inconformado, o arguido interpôs recurso peticionando a sua absolvição ou, a ser considerado que o arguido mesmo assim cometeu o crime previsto no artigo 137 nº 1 Código Penal, a pena a aplicar deverá ser especialmente atenuada nos termos do disposto no artigo 72º nº 1 Código Penal e, mesmo em caso de condenação nos precisos termos da sentença, ainda assim e por aplicação do disposto no artigo 71º do CP a pena a aplicar será, não só a de multa, mas fixada não praticamente no seu máximo mas sim em 135 dias de multa à taxa de 6 euros diários perfazendo 810 euros, com as seguintes conclusões: NULIDADE DA SENTENÇA 1 -Deve ser considerada nula a sentença por violação do disposto no artigo 379 nº 1 c) CPP e tendo em conta que não se pronunciou nem nada disse sobre a questão essencial de o semáforo ter passado de verde para amarelo quando o arguido por ele passava ao entrar no cruzamento das Quatro Estradas e vindo de ... .
Isto quereria dizer que, conforme a sequência confirmada de todos os semáforos, no sentido ... /... de onde vinha o motociclo o semáforo teria passado também nessa altura para amarelo, e que depois, tendo em conta a forma lenta como o arguido se desloca para o local do embate, a forma como dá passagem a outro veículo, torna-se claro que o semáforo já estaria vermelho ou pelo menos no fim do ciclo do amarelo.
Em face da nulidade e dos elementos constantes do processo o tribunal de recurso pode proceder à correcção desta nulidade - art. 379 nº 2 Código de Processo Penal Esta omissão de pronúncia sobre a matéria da contestação acarreta a nulidade da sentença, prevista no art. 379°, nº 1, c) do CPP e deverá conduzir à repetição do julgamento, nos termos da decisão do reenvio, quando mais não seja, para "averiguar dos factos em falta e considerados indispensáveis e necessários para a decisão" (v. Ac. RC, de 24-Out-1990, CJ, XV, 5, 72), a menos que o Tribunal da Relação entenda que deverá haver renovação da prova para evitar esse reenvio.
AL TERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA POR PROVADA E QUE ESTEVE NA BASE DA CONDENAÇÃO 2- Deve ser eliminada por não sustentada em qualquer elemento credível a matéria respeitante ao ponto 11 da factualidade dada por provada na sentença recorrida, no sentido de que no sentido de marcha da vítima a sinalização luminosa encontrava-se verde. Manter-se-á a resposta dada e já apreciada em acórdão dessa Relação de que o sinal se encontrava amarelo.
Em face dos elementos de facto constantes no processo e do disposto no art. 412 n° 3 CPP, tem a Relação poderes para considerar como não credível o depoimento de E. ... quanto à cor do semáforo, mantendo que o semáforo estava amarelo no sentido em que se apresentava o motociclo, tal como havia ficado provado no primeiro julgamento.
As provas contidas nos autos impõem claramente uma decisão diversa da que foi tomada na sentença em apreço e que por isso pode ser tomada por esse Tribunal de recurso.
Contudo e caso assim esse Tribunal não entenda dever-se -á optar pela renovação da prova nomeadamente com o depoimento da testemunha DMP registado na cassete 232, lado B, e cassete 233 lado A que choca completamente com as declarações prestadas pelo arguido e pelas demais testemunhas que se encontravam claramente no local do acidente art. 412 nº 3, a) a c) e nº 4 CPP 3- Deve ser dada por não provada porque não sustentada em qualquer elemento probatório e completamente conclusiva, a matéria constante dos pontos 20, 21 e 22 da sentença recorrida, ao invés da parte inicial do ponto 20 que já constava nas anteriores decisões e que será apenas "O arguido não representou nem quis o resultado verificado" 4 -O tribunal não apreciou nem valorou como devia o Estudo constante a fls. 666, realizado cientificamente pela maior sumidade nacional sobre reconstituição de acidentes de viação que aprecia em concreto e não academicamente os vários elementos de facto que estiveram presentes na produção do acidente de viação, concluindo que o motociclo vinha com uma velocidade fixada entre 95 km/h e 103 km/h o que é uma precisão importante.
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Não analisou como o deveria ter feito a douta sentença a fotografia com legenda na qual se vê o tempo de aproximação do motociclo ao local de embate a uma velocidade de 90 km/h fixado em 4 segundos a uma distância de 100 metros, tempo necessária mente reduzido em caso de velocidade superior e em caso de redução de visibilidade tendo em conta o facto de ser de noite, do plano para o arguido ser inclinado a subir, e de existirem arbustos mesmo que pequenos no local 5 -O condutor do motociclo imprimiu ao veículo que conduzia uma velocidade que não lhe permitiu parar o mesmo no espaço livre à sua frente, violando o disposto no art. 24 nº 1 CE, e bem assim violou o especial dever de cuidado quanto à redução de velocidade nos cruzamentos, referida no artigo 25 nº 1 t) CE, assim como o dever geral de cuidado retirado do art. 15 do C.P., sendo a velocidade desadequada a causa principal do acidente. Foi o motociclo que foi embater com o veículo conduzido pelo arguido sendo que tinha suficiente espaço à direita do local de embate e tendo em conta o sentido de marcha do motociclo para passar, não se tendo provado que de alguma forma o veículo automóvel tapasse completamente a faixa de rodagem do motociclo.
6 Contribuindo o condutor do motociclo de forma decisiva para o acidente, e em grau muito superior aquele em que contribuiu o arguido, deverá a sentença ser alterada neste ponto, passando a constar que o acidente se deveu em maior proporção à velocidade desadequada que o condutor do motociclo imprimia a este veículo.
7 Constam dos autos elementos claros que imputam ao condutor do motociclo a prática de conduta reprovável e assim o Tribunal da Relação deverá revogar a sentença em recurso, determinando por acórdão que a conduta da vítima violou de forma decisiva o dever contido no art. 15 do CP e bem assim o disposto no art. 29 nº 2 CE, contribuindo a sua conduta em grau muito superior à do arguido para a produção do acidente.
A ser considerado que o arguido mesmo assim cometeu o crime previsto no art. 137 nº 1 CP a pena a aplicar deverá ser especialmente atenuada nos termos do disposto no art. 72 nº 1 CP 8 -Mesmo em caso de condenação nos precisos termos da sentença, ainda assim e por aplicação do disposto no art. 71 do CP a pena a aplicar será, não só a de multa, mas fixada não praticamente no seu máximo mas sim em 135 dias de multa à taxa de 6 euros diários perfazendo 810 euros.
VENERANDOSJUÍZESDESEMBARGADORES O recorrente tem perfeita consciência de que o acto de condução é algo de perigoso e que nele se tem de proceder com o máximo cuidado sempre tendo em atenção a globalidade das regras estradais.
O recorrente como oficial da GNR constata diariamente com as situações mais gravosas no campo da sinistralidade automóvel e tem contribuído o mais que pode para a elas pôr cobro.
A forma como em ambas as sentenças se deu como provado que entrou no cruzamento dando toda a prioridade a pelo menos um veículo que se apresentava no sentido ... /... coloca a todos a interrogação sobre qual a razão porque não deu também passagem ao motociclo conduzido pela infeliz vítima.
A sua velocidade era reduzidíssima como ficou provado, nenhuma pressa tinha nem se dirigia a qualquer evento onde fosse forçosa e...
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