Acórdão nº 597/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução29 de Abril de 2008
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, precedendo conferência, no Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.

  1. Nos autos de processo sumário n.º -- do Tribunal Judicial de ..., o arguido F.A.

    , melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento, pela prática, em autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos art. 292.º n.º1 e 69.º n.º1, alin. a), ambos do Código Penal, vindo a ser condenado, por sentença proferida em 17 de Dezembro de 2007, pela prática desse crime, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de €10,00, o que perfaz €1.200,00, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses.

  2. Inconformado, o arguido veio, em 21 de Janeiro de 2008, interpor recurso daquela decisão, nos termos constantes de fls.88 a 87, requerendo a respectiva absolvição, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões (transcrição): "I - Da prova produzida em audiência de julgamento não podem ser dados como provados os factos constantes nos n.ºs 1, 2, 3, 4, 5 e 9 da alin. A (factos provados) do ponto II (Fundamentação) da douta sentença recorrida.

    II - Nos termos do Art.° 14 da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que revogou a o Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, só podem ser utilizados nos testes quantitativos de álcool no ar expirado analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna, da Justiça e da Saúde (Portaria n.º 1006/98, de 30 de Novembro) e que sejam aprovados por Despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.

    III - No entanto esta aprovação, está ainda dependente da aprovação prévia de marca e modelo pelo Instituto Português de Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros aprovado pela Portaria n.º 748/94, de 13 de Agosto em vigor à época dos factos.

    IV - Tal aprovação prévia de modelo foi efectuada pelo Instituto Português de Qualidade, através do despacho de aprovação de modelo com o n. ° 21.06.96.3.30, datada de 26 de Junho de 1996, e foi publicado na III Série do Diário da República em 25/09/1996.

    V - Tal Despacho do Instituto Português de Qualidade fixou a validade da mesma aprovação por um período de 10 anos a contar da data da sua publicação no Diário da República.

    VI - Assim, a validade de tal aprovação expirou em 25/09/2006, pelo que no dia 18 de Novembro de 2007 tal analisador - Drager 7110 MK III P - não se encontrava aprovado por qualquer um dos organismos - IPQ e ANSR - conforme impõe a legislação em vigor.

    VII - Em consequência, o talão emitido pelo referido analisador quantitativo, junto aos autos a fls. 5 não pode servir de meio prova.

    VIII- Nos termos do Art.°125 do C.P.P só são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.

    IX - Ora, como os analisadores só podem ser utilizados nas condições acima referidas, pelo que senão as respeitarem, como aconteceu no caso em apreço, não podem os talões emitidos por tais analisadores servir de meio de prova.

    X - Ora, não podendo servir de meio de prova tal documento, não existe nos autos qualquer outra prova que permita levar à conclusão que o arguido conduzia o seu veículo automóvel com uma taxa de álcool de 1,58 g/l.

    XI - Aliás, a própria meritíssima Juiz reconhece que o Tribunal recorrido se convenceu que a taxa de alcoolémia apresentada pelo arguido corresponde à apurada pelo alcoolímetro Drager 7110 MK III P, com n.º arna 0049, por se tratar de aparelho devidamente aprovado para o efeito e sujeito à competente verificação metrológica.

    XII - Demonstrado que está que tal aparelho não se encontra devidamente aprovado pelas entidades competentes, não existe prova nos autos da taxa de alcoolemia que o arguido apresentava no dia 18 de Novembro de 2007, pelas 20h20m, no exercício da condução do seu veículo automóvel.

    XIII - Teriam que ser dados como provados os seguintes factos com interesse para a decisão a proferir: - No dia 18 de Novembro de 2007, cerca das 20h20m, o arguido conduzia o veículo ligeiro especial para animais, com a matrícula -----QO, na rotunda, o que fazia após ter ingerido bebidas alcoólicas; - A pesquisa do álcool no sangue por ar expirado foi realizado com o aparelho Drager 7110 MK III P com o n.º de série "arna 0049"; - Tal aparelho não se encontrava, à data dos factos, devidamente aprovado para efeito, tendo expirado o prazo de validade do Despacho de aprovação do modelo do Instituto Português de Qualidade - 10 anos - no passado dia 25/09/2006.

    - Tal aparelho foi sujeito a verificação periódica, pelo Instituto Português de Qualidade, em 24/05/2007, apresentando erros inferiores aos erros máximos admissíveis; - Notificado da possibilidade de realizar contraprova o arguido não pretendeu fazê-la.

    - O arguido foi já condenado no âmbito do Processo sumário n.°---/, por sentença de 12/07/2003, pela prática em 11/07/2003 de um crime de condução em estado de embriaguez, na pena de 60 dias de multa à taxa diária de € 4,00, num total de € 240,00, e na pena acessória de conduzir pelo período de 3 meses, pena já extinta pelo cumprimento; e no Processo Comum n.° ---/, por sentença de 01/02/2005, pela prática em 12/07/2003 de um crime de desobediência, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 4,00, pena já extinta pelo pagamento; - O arguido havia ingerido bebidas alcoólicas ao almoço e posteriormente cerca das 16h30m, em quantidades não apuradas; - Na ocasião percorreu um quilómetro; - O arguido é comerciante de animais, auferindo a título de vencimento a quantia de € 500,00 mensais; - Vive com a esposa, que trabalha na mesma actividade, e três filhos de 18, 14 e 4 anos de idade; - Suporta cerca de € 500,00 mensais a título de despesas com a sua filha de 18 anos que é estudante universitária em Lisboa; - Vive em casa própria; - O veículo que conduzia é de sua propriedade e é um veículo marca "Opel", modelo "Campo", com matrícula do ano 2000, que se encontra pago; - O arguido é ainda proprietário dos seguintes veículos automóveis: um veículo de marca "Bedford Isuzu" com matricula do ano 2000; um veículo de marca "Suzuki" modelo "Vitara" com matricula de 1997 ou 1998; um veículo de marca "Mercedes", modelo "220" com matrícula do ano 2000, encontrando-se todos integralmente pagos.

    XIV - Teriam que ser dados como não provados os seguintes factos: - Que as bebidas alcoólicas ingeridas pelo arguido lhe tenham determinado uma taxa de álcool de 1,58 g/l; - Que o arguido soubesse que a taxa de álcool por si apresentada sempre seria superior a 0,5 g/l; - Que o arguido tenha agido de forma livre, voluntária e consciente, sabendo e querendo praticar facto proibitivo e punível por lei; - O local onde foi realizado o teste de pesquisa de álcool por ar expirado encontrava-se a uma temperatura que situava entre os 15° C e os 35°; XV - Assim, alterada a matéria de facto dada como provada nos termos acima referidos, ficando pois a decisão da matéria de facto em conformidade com a prova produzida em audiência de julgamento, ou mais concretamente com a ausência de prova, a sentença deverá ser revogada e em consequência o arguido, ora recorrente, absolvido.

    XVI - Dessa forma foram violados dois dos princípios fundamentais do Direito Penal e Processo Penal, que são "in dubio pro reo" e da presunção de inocência do arguido, o primeiro consagrado no Artigo 32° da Constituição da República Portuguesa.

    XVII - Por outro lado, também não se pode aceitar que, apenas, pelo facto de ao arguido lhe ter sido transmitida a taxa de alcoolémia e este ter declarado não pretender realizar contraprova, não possa em sede audiência de julgamento pôr em causa o resultado apurado.

    XVIII - Se aceitássemos não ser possível discutir-se o valor apurado, estaríamos em face de uma norma violadora do n.° l, do artigo 32° da C R. P. e, "por isso, inconstitucional já que se estariam a restringir direitos fundamentais. " XIX - Deve-se entender que, o indiciado infractor pode defender-se, sem quaisquer restrições, pondo em causa a taxa de alcoolémia em causa, alegando mesmo a não verificação/prática da infracção, ainda que tenha prescindido da contraprova.

    XX - Ao considerar válido o talão de fls.5 emitido por um aparelho, que contrariamente ao afirmado na douta sentença recorrida, que não se encontrava devidamente aprovado para o efeito, a sentença violou o Art.° 14 da Lei n.° 18/2007, bem como Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros aprovado pela Portaria n.° 748/94, de 13 de Agosto em vigor à época dos factos e posteriormente revogado pela Portaria n.° 1556/2007, de 10 de Dezembro, que aprovou o novo Regulamento dos Alcoolímetros e ainda o Art.° 125 do C. P.Penal.

    XX - Em resumo, não se tendo apurado nos autos que o arguido conduzisse o veículo automóvel em causa apresentando uma taxa de álcool igual ao superior ao limite mínimo legal (quer em matéria criminal, quer em matéria contra-ordenacional), por não se ter apurado, em concreto, a mesma, não se encontra desde logo preenchido o elemento objectivo do ilícito de que o arguido foi condenado, pelo que se impõe a absolvição do arguido, com o que V. Exas. farão como sempre JUSTIÇA." 3. O Ministério Público, em 1.ª instância, respondeu ao recurso nos termos constantes de fls.143 a 147, defendendo, no essencial, que o aparelho Drager foi aprovado por despacho de 06.08.1998 do Director Geral de Viação, sendo este o despacho a levar em conta, sendo que a validade da aprovação apenas expirará em 06.08.2008, pelo que deverá ser mantida a sentença recorrida.

  3. O recurso foi admitido por despacho de 29 de Fevereiro do ano em curso (v.fls.148).

  4. Nesta instância, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto...

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