Acórdão nº 211/09.3TBCLB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução27 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Em 25 de Setembro de 2009[1], B… (A. e aqui Apelado), demandou A… - Estradas …, S.A.

(R. e aqui Apelante)[2], invocando um acidente ocorrido cerca das 22H do dia 21/01/2007 num troço da AE25 (Km 138,2) consistente no embate de um pesado (matrícula espanhola …), pertencente ao A., num grupo de javalis que repentinamente se atravessaram naquela via concessionada à R. Assim, tendo esse embate produzido estragos no veículo, que era então conduzido por um empregado do A., formula este último um pedido indemnizatório, reportado a esses danos, no valor de €7.710,91.

1.1.

Contestou a R. negando ser-lhe assacável, como concessionária daquela auto-estrada, qualquer responsabilização indemnizatória pelo mencionado acidente.

1.2.

Finda a fase dos articulados e saneado o processo (os factos logo assentes e a base instrutória constam de fls. 89/92)[3], realizou-se o julgamento. Findo este, fixados que foram os factos provados (v. fls. 184/187), proferiu o Tribunal a Sentença de fls. 188/199 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso –, condenando a R. A…, na procedência parcial da acção, a pagar ao A. a quantia de €6.165,91, acrescida de juros à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento. 1.3.

Inconformada, apelou esta R. a fls. 210/240, concluindo o seguinte: “[…] 1.3.1.

O A./Apelado respondeu ao recurso pugnando pela confirmação da decisão.

III – Fundamentação 2.

Relatado que está o essencial do iter que conduziu à presente instância de recurso, cumpre apreciar os fundamentos da apelação, tendo em conta que as conclusões formuladas pela Apelante, a cuja transcrição se procedeu no item anterior, operaram a delimitação temática do objecto do recurso. É isto o que resulta dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC).

Vendo as conclusões, isolamos os seguintes fundamentos do recurso: (a) impugnação do julgamento consubstanciado na determinação dos factos (artigo 712º, nº 1 do CPC) referido às respostas aos quesitos 7º e 27º; (b) com ou sem alteração dos factos, discute adicionalmente a Apelante a aplicação à situação da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho (concretamente da presunção constante do respectivo nº 1 do artigo 12º), dado estar em causa acidente de tráfico anterior à entrada em vigor desta Lei; finalmente, (c) entende a Apelante, em qualquer caso, ter logrado afastar a presunção de culpa sobre ela eventualmente impendente.

Os factos considerados provados na primeira instância foram os seguintes: “[…] 2.1. (a) Refere-se a impugnação dos factos, como se disse, às respostas aos quesitos 7º e 27º (estão estes transcritos na nota 4, supra), sendo que o Tribunal a quo respondeu positivamente ao primeiro destes (que veio a corresponder ao ponto 8 dos factos), remetendo quanto ao quesito 27º para a resposta dada ao primeiro (ao 7º), valendo esta resposta pela asserção de não provado.

Tudo se prende – é esse o sentido do quesito 7º, sendo que o 27º pretende afirmar a posição da R. quanto à incolumidade de todas as vedações da A25 naquela noite em que ocorreu o sinistro –, tudo se prende, dizíamos, com a caracterização da realidade retratada nas fotos nºs 6, 7, 8 e 9 de fls. 142/144, quanto à estrutura da rede de vedação do espaço adjacente à auto-estrada, junto a um colector de passagem de águas que dá para uma calha de escoamento das águas provenientes desse colector. Percebe-se que a afirmação, essencialmente descritiva, contida no quesito 7º entronca na tese do A., expressa no subsequente quesito 8º[4], na tentativa de alvitrar uma concreta explicação desvaliosa para a concessionária quanto ao aparecimento dos animais na faixa de rodagem, sendo que tal explicação (em concreto) foi considerada não provada pelo Tribunal respondendo negativamente a esse quesito 8º e acrescentando subsistirem a esse respeito dúvidas quanto à detecção de uma causa que explique a entrada dos animais no perímetro de protecção à auto-estrada.

Interessa aqui reter a fundamentação agregada com a qual o Tribunal a quo abonou a resposta positiva ao quesito 7º (que a Apelante contesta) e a resposta negativa ao quesito 8º: “[…] As respostas aos artigos 7 e 8 basearam-se no depoimento de …, conjugado com o da testemunha …, tendo-se ainda considerado o fotograma a fls. 142. Da conjugação de tais elementos, resultando incontestada a existência de um acrescento na rede de vedação que, junto ao solo, estava fixado com uma pedra, acabou por ficar o Tribunal em dúvida sobre se, por ali, poderiam passar os animais que o veículo atropelou, posto que a testemunha … opinou que sim, sendo certo que a testemunha … esclareceu que tal acrescento se destina a permitir a passagem pena vedação de detritos arrastados no canal de escoamento que ali passa, que o mesmo só abre para fora, impedindo que algum animal passe para dentro e mais ainda que a pedra foi lá posta por desconhecidos, tendo lá sido mantida por sua ordem, para fins meramente probatórios nos presentes autos.

Em face de tais contradições em sede de juízos meramente valorativos, sem outros elementos de prova e não se afigurando úteis quaisquer outros, na medida em que, não se conhecendo sequer a dimensão dos animais colhidos, nunca se poderia, com a necessária segurança, mesmo recorrendo a meios de prova adicional, concluir se eles lá teriam conseguido passar ou não, não pôde o Tribunal dar outra resposta que não a negativa, por via da aplicação dos critérios de repartição do ónus da prova.

[…]” [transcrição de fls. 186].

Note-se, preliminarmente, que esta Relação – rectius, neste aspecto, o ora relator – procedeu à audição integral do registo áudio da prova testemunhal, formando com base nesta uma convicção autónoma assente na sua própria livre valoração dessa prova[5]. É, pois, com base nesta revisão da prova que concluímos aqui pela completa adequação da resposta positiva ao quesito 7º, compaginada com a resposta negativa ao subsequente quesito 8º, sublinhando que se tratou fundamentalmente (nesse quesito 7º) de expressar a realidade ilustrada por fotografias existentes nos autos, tiradas pela testemunha … (no quadro da averiguação documentada a fls. 102/104), cuja veracidade não foi contestada pela R. (que em julgamento não se coibiu, como todos os outros intervenientes, de utilizar essas fotografias para colocar questões às testemunhas) e que foi confirmada pela testemunha …, funcionário da R. (responsável pela vigilância daquele troço e que confirmou até a existência da pedra que se vê nas fotos), como expressão da realidade daquele local. Coisa diferente seria dizer que os javalis terão passado (acedido à faixa de rodagem) por aquele local em concreto – como pretendeu, sem êxito, o A. Todavia, o Tribunal a quo, respondendo negativamente ao quesito 8º, arrumou esta questão, limitando-se a descrever o que existe (que é o que está fotografado), sem realizar qualquer outra extrapolação.

Vale isto – e trata-se de uma questão simples em que a Apelante não tem manifestamente razão na crítica que pretende dirigir à resposta dada pelo Tribunal a quo – pela confirmação da resposta positiva ao quesito 7º (a qual, aliás, até nos parece relativamente inócua para o percurso decisório realizado pela primeira instância).

E o mesmo se diga da resposta negativa ao quesito 27º, na qual está em causa a asserção de que as vedações da A25, na proximidade do local do acidente na data em que este ocorreu, estariam em bom estado de segurança e conservação. Note-se que esta afirmação pela testemunha … (vigilante da R.), reportada à data do acidente, não se apresenta como suficientemente expressiva (para não dizer pouco fiável) da asserção positiva contida no quesito, sendo que esta testemunha, não obstante afiançar categoricamente esse bom estado das vedações naquele dia, falha no fornecimento de outros dados relativos ao acidente: já não se lembrava se tinha sido de...

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