Acórdão nº 169/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Março de 2008
Magistrado Responsável | FERNANDO RIBEIRO CARDOSO |
Data da Resolução | 04 de Março de 2008 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, precedendo conferência, na Relação de Évora: 1.
O Ministério Público deduziu acusação e requereu o julgamento, com intervenção do Tribunal colectivo, do arguido A.P.S.
, melhor identificado nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de maus tratos a cônjuge, p. e p. pelo art. 151.º n.º1 e 2 do Código Penal, em concurso real com um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º n.º1, alin. d) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro.
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Remetidos os autos à distribuição e cabidos em sorteio à Vara de Competência Mista de ..., o senhor juiz, por seu despacho de 27 de Setembro de 2007, rejeitou a acusação quanto ao crime de detenção de arma proibida, por entender que os factos nela vertidos não são susceptíveis de integrar a prática pelo acusado desse crime que lhe foi imputado.
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Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso desse despacho pugnando pela sua revogação e substituição por outro que receba a acusação contra o arguido no que respeita igualmente a esse crime. O Recorrente extrai da motivação de tal recurso as seguintes conclusões: 1.ª - Na acusação considerou-se ter o arguido cometido o crime de detenção de arma proibida, por, no dia 11 de Fevereiro de 2007, pelas 14h35m, trazer consigo uma faca de cozinha de marca desconhecida e sem qualquer número de referência, composta por um punho em madeira com 11, 80 cm de comprimento e uma lâmina com 20 cm, com o comprimento total de 32 cm, do tipo "corto-perfurante", não tendo justificado a sua posse e achando-se estar preenchido o art. 86°, n.° l, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro.
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- A douta decisão recorrida entendeu que a referida "faca de cozinha", enquanto arma branca, teria aplicação definida, pois que serviria para os usos diários do arguido, que a transportava no seu veículo.
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- É manifesto o vício interpretativo no qual a douta decisão recorrida incorre, ao querer estender o requisito de "sem aplicação definida" às "armas brancas", quando resulta claro da letra da lei que o mesmo, apenas e tão-só, se refere aos "instrumentos".
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- O conceito de "instrumentos sem aplicação definida" já constava do anterior regime legal, designadamente, do art. 3.º n.º l, alínea f), do Decreto-Lei n.º 207°-A/75, de 17 de Abril, o qual proibia a detenção, uso e porte de armas brancas ou de fogo com disfarce ou ainda de outros instrumentos sem aplicação definida, que pudessem ser usados como arma letal de agressão, não justificando o portador a sua posse, pelo que o elemento histórico também ampara a nossa posição.
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- Aliás, o conceito de "arma branca" está bem delineado no art.2°, n.° l, alínea l), da Lei n.° 5/2006, de 23 de Fevereiro, não fazendo sentido que o legislador o quisesse, no art. 86°, n.° l, alínea d), tomar mais fluído ou ambíguo, acrescentando-lhe a expressão sem aplicação definida.
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- Fez o douto despacho recorrido uma incorrecta interpretação do art. 86°, n.° l, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro.
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- Ainda que se assim se não considere, sempre teríamos como duvidoso que a faca de cozinha que o arguido transportava no seu veículo automóvel fosse uma "arma branca com aplicação definida", por o mesmo a utilizar nos seus" usos diários", já que não resultam dos autos quaisquer referências a que o arguido se servisse dela para esses seus "usos diários"(até porque se trata de uma faca de cozinha transportada num veículo automóvel!), pelo que, também por aqui, não deveria o douto despacho recorrido ter rejeitado a acusação." 4.
Não houve resposta ao recurso, que foi admitido por despacho de 20.11.2007.
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Senhor juiz manteve o despacho recorrido (cf. fls.21).
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Nesta Relação o Senhor Procurador-Geral Adjunto, louvando-se na argumentação expendida pelo recorrente, defendeu a procedência do recurso.
6.1 - Cumprido o disposto no art. 417 n.º2 do CPP, não houve resposta.
6.2 - Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre decidir.
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Atento que o objecto do recurso é demarcado pelas conclusões que o recorrente extrai da correspondente motivação (art. 412.º n.º 1, do Código de Processo Penal) e ponderados os poderes de cognição deste Tribunal...
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