Acórdão nº 2128/09.2TJLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelEZAGÜY MARTINS
Data da Resolução15 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2.ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação I - “A” intentou ação declarativa, com processo comum, sob a forma sumária, contra “B”, pedindo:

  1. Se declare ser o Autor legitimo dono e possuidor das frações autónomas que identifica e a posse das mesmas pelo Réu insubsistente, ilegal e de má fé, por falta de qualquer título que a legitime.

  2. Se condene o Réu ou quem eventualmente ocupar as ditas frações a reconhecer ao Autor o direito de propriedade das mesmas e a restitui-las no estado em que se encontravam, bem como todos os bens móveis que ali se encontravam e ainda na totalidade das custas a que o processo dê causa e em procuradoria condigna.

  3. Se condene ainda o Réu a pagar ao Autor a quantia de € 1.200,00, por cada mês que decorre desde o dia 20 de outubro de 2009 e durante o período de tempo em que subsistir a ocupação e ainda na quantia de € 525,00 por mês, a título de rendas por este dispendidas, também enquanto subsistir a ocupação ilegítima e ilegal descrita.

    Alegando, para tanto e em suma, que é dono e legítimo possuidor das duas frações autónomas “B” e C””, de prédio urbano em regime de propriedade horizontal, que identifica, as quais comprou em 9 de maio de 2002.

    Sendo anteriormente arrendatário das ditas frações, destinadas a escritório.

    Tendo autorizado o Réu, seu filho, no ano de 2000/2001, a mudar a sua oficina de reparação de máquinas fotográficas de uma das salas da fração B –que o A. lhe havia emprestado, em 1998-1999, para nela montar tal oficina – para a fração C, assim também a título precário.

    Ficando A. e R. a habitar a fração B.

    Tendo o A., que passava a maior parte do tempo em Angola, regressado definitivamente a Portugal em 2009, o Réu impediu-lhe a entrada em qualquer das frações, recusando-se a deixar aquelas.

    Assim obrigando o Autor a arrendar, por € 525,00 mensais, um andar, para ele e seu filho menor de oito anos nele habitarem.

    Contestou o Réu, “retificando” datas e dizendo, no essencial, que o A. “comprou e deu verbalmente” as frações em causa àquele para o mesmo aí exercer a sua atividade profissional, em compensação do que tinha dado às irmãs do Réu.

    O qual, há mais de vinte anos assumiu o pagamento de rendas à anterior proprietária, dos contratos de fornecimento, um em nome do A, e outros até em nome de terceiros, bem como dos IMI e do condomínio.

    Dizendo ainda, em reconvenção, que na sequência de uma inundação no rés do chão Dt.º se viu obrigado a fazer obras necessárias e urgentes de restauro, que orçaram em € 12.770,00.

    Tendo ainda pago por conta do A., de IMI, às Finanças, a quantia de € 774,10, e, de condomínio, a quantia de € 1170,00.

    Para além de haver gasto € 1.986,05, em móveis de cozinha, de que a mesma fração não dispunha.

    Remata pedindo: - que seja decretado o direito ao arrendamento a favor do Réu , cuja renda deverá ser fixada pelo Tribunal, requerendo-se a nomeação de perito avaliador do Tribunal para o referido efeito; - que seja o Reconvindo condenado no pagamento (está implícito) ao Réu da quantia de € 16.682,15 acrescidos dos juros legais que se venceram a contar da citação e até efetivo e integral pagamento.

    Houve réplica do A., sustentando a improcedência das “exceções invocadas pelo Réu – quando, de forma confusa, pretende fazer-se passar por arrendatário numa primeira fase e como proprietário numa segunda fase das frações dos autos – bem como do pedido reconvencional.

    Por despacho de folhas 133-134, considerando que tendo em atenção a reconvenção deduzida, o processo, atento o novo valor da causa, passava a seguir a forma ordinária, ordenou a remessa dos autos, para distribuição, às Varas Cíveis de Lisboa.

    Onde prosseguiram os autos seus termos, com saneamento e condensação.

    Vindo, realizada que foi a audiência final, a ser proferida sentença decidindo: “a) julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, a.1) declarar o autor legitimo dono e possuidor das frações id. nos autos e a ocupação das mesmas pelo réu insubsistente e ilegal, por falta de titulo que a legitime; a.2) condenar o réu a reconhecer ao autor o direito de propriedade sobre as mesmas e a restitui-las no estado em que se encontravam, bem como todos os bens móveis que aí se encontravam; a.3) condenar o réu a pagar ao autor a quantia de 525,00 euros, a título de renda por este dispendida, enquanto subsistir a ocupação pelo réu.

  4. julgar o pedido reconvencional parcialmente procedente, por provado, e, em consequência, condenar o autor a pagar ao réu a quantia de 1,944,10 euros, relativa ao pagamento de IMI e condomínio, acrescida de juros legais, desde a citação até efetivo pagamento, no mais se absolvendo o autor dos pedidos contra si formulados.”.

    Inconformado, recorreu o Réu, formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: “1.ª Face ao supra exposto em defesa da dignidade do ora Recorrente e a uma condigna habitação e atendendo que o mesmo sempre residiu naquelas fracções e cumpriu com as suas obrigações legais e, maxime, face ao mesmo não deter condições para poder mudar-se para outra habitação deve o Tribunal constitui-lo arrendatário das fracções com renda compatível com o mercado; 2.ª O ora Recorrente em razão da profissão que exerce não tem forma de obter rendimentos que lhe possibilitem a mudança de residência por os mesmos serem mesmo muito parcos; Assim sendo, 3.ª Em total respeito com a Lei fundamental, conforme o estatuído no Art. 65.º n.º 1 CRP, deve o Tribunal para a garantia e defesa da validade do ius permitir ao ora Recorrente que a este seja Locado as fracções em apreço melhor identificadas supra; 4.ª Face aos factos e considerandos supra vertidos deve concluir-se que o ora Recorrente era titular do direito de “posse” das referidas fracções a partir do momento em que o ora Recorrido lhe transmitiu que lhe as doava; 5.ª O ora Recorrente sempre exerceu o poder de facto sobre as identificadas fracções desde finais da década de 1980, na convicção de que eram suas as fracções; 6.ª Comprovada pelo comportamento e conduta adoptada publicamente e à vista de todos os vizinhos e moradores que detinha sobre as fracções um valido direito; 7.ª Direito esse, mais uma vez manifestado aquando da realização das obras efectuadas nas fracções e com o pagamento de todas as despesas inerentes às mesmas; 9.ª Resulta da prova produzida em audiência que ora Recorrente efectivamente teve despesas e gastos com a manutenção e conservação das fracções; 10.ª Despesas essas, das quais não restam dúvidas que as mesmas serviram para fazer face à conservação e prevenção da deterioração das fracções, cujo custo foi suportado na integra pelo ora Recorrente; Assim, 11.ª Em respeito e obediência pela Lei nos termos do Art. 1273.º CC, deve o ora Recorrente ser indemnizado de todas as despesas que efectuou; 12.ª Devendo, o ora Recorrido ser condenado a ressarcir o Recorrente pelas despesas que efectuou nas fracções 13.ª A CRP. Dispõe no n.º 1 do art.º 65 que todos têm direito para si e para a sua família a uma habitação, de dimensão adequada…e o recorrente não tem outra nem meios económicos para a adquirir ou sequer possibilidade de pedir um empréstimo para esse fim; 14.ª É filho do recorrido tendo estes outras habitações onde poderá morar sempre que vem a Portugal, pois é totalmente falso que alguma das vezes tivesse ficado alojado em Arroios; Finalmente, salvo melhor por douta opinião contrária, a Sentença recorrida entre outras, violou as seguintes disposições legais: - Art. 65.º n.º 1 CRP; - Art. 216.º, 1251.º e 1273.º CC; - Art. 265.º n.º 3, 579.º, 582.º CPC.

    - art.º 65 n.º 1 da CRP“.

    Requer a revogação parcial da decisão Recorrida “Condenando-se o recorrido a dar de arrendamento as frações com rendas compatíveis com as de mercado e ainda a indemnizar o ora recorrente de todas as despesas relativas a benfeitorias efectuadas nas identificadas frações;”.

    Contra-alegou o Recorrido, pugnando pela manutenção do julgado.

    II – Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.

    Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objeto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil – são questões propostas à resolução deste Tribunal: - se o Réu exerceu a sua posse sobre as identificadas frações desde finais da década de 1980.

    - se o Réu tem o direito de ser indemnizado, pelas obras a que procedeu nas ditas frações.

    - se deverá ser reconhecido ao Réu o direito a que lhe sejam dadas de arrendamento as frações em causa, e com rendas “compatíveis com as de mercado”.

    * Considerou-se assente, na 1.ª instância, a matéria de facto seguinte:

    1. O autor é dono e legitimo possuidor de duas fracções autónomas, designadas pelas letras “B” e “C” correspondentes, respectivamente ao rés do...

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